quarta-feira, 20 de junho de 2012

O Mosteiro de Paderne na Idade Média e Renascimento

Pelo arrolamento das igrejas de Entre Lima e Minho feito entre 1258-1259, verifica-se que o ‘Monasterium de Paderni’ pertencia ao bispado de Tui (Costa, 1981). Confirma-se este enquadramento pelas ‘Inquirições’ de D. Afonso III, de 1258 ao referir que o Rei não era padrom (padroeiro) do mosteiro mas que recebia dos frades, em cada ano, a ‘quarta de collecta’ (PMH, 1888: 377).

Como outras congregações, a de Paderne aumentou a sua riqueza patrimonial por doações testamentárias de terrenos feitas por habitantes da Ribeira Minho. Os monges exploraram estes domínios por arrendamento recebendo dos cultivadores rendas e foros. Do rio Minho obtinham recursos piscícolas quer pela exploração directa de pesqueiras quer pelo seu emprazamento e consequente entrega das prestações em pescado. Não admira pois que a situação económica do mosteiro fosse tida em conta quando em 1320 se determinou “a taxa a pagar a el-Rei D. Dinis pelos benefícios eclesiásticos do bispado de Tui” (Costa, 1981): 500 libras. Era, depois da contribuição do mosteiro de S. Fins de Friestas (1.100 libras), a maior taxa. Ganfei pagava 300 libras e Longos Vales apenas 100 (idem,.

A acumulação do mosteiro em bens veio a desencadear a intervenção do procurador de D. Pedro I que lhes embargou umas ‘casas e vinhas e herdades’. Os monges reclamaram ao rei justificando-se que ‘dessas herdades e posições’ pagavam-lhes ‘foros e direitos’.D. Pedro veio a ordenar que não lhes fossem embargadas as referidas propriedades obrigando-se o mosteiro a continuar a pagar-lhe os ‘meus foros e direitos’. (INIC, 1984: 485). Em 27 de Março de 1360, o mesmo rei confirmou e outorgou ao mosteiro “privilégios, liberdades e foros e bons costumes” (Marques, 2002: 18) e D. Afonso IV, em 26 de Abril de 1475 “estendeu os privilégios do mosteiro a todos os moradores do couto, tendo-os isentado de todos os encargos e servidões do concelho” (idem). D. Manuel I, em 8 de Setembro de 1497 “confirmou-lhe todos os privilégios que lhe tinham sido outorgados até essa data” (idem, ibidem). Pelo Censual de D. Diogo de Sousa (1514-1532), o rendimento do mosteiro de Paderne foi avaliado em 714 e ½ reis, mantendo, assim, uma boa posição relativamente aos outros mosteiros da Ribeira Minho: Ganfei rendia 723 reis; Longos Vales: 713 e ½ reis (ADB, 1514-1532: 480-485).

Como outros mosteiros crúzios, o de Paderne também não escapou ao processo, desencadeado a partir de meados de Quatrocentos, de “apropriação por comendadores, uma boa parte dos quais estrangeiros, usurpando até à exaustão os rendimentos das mesas priorais para proveito pessoal, descuidando a vida claustral e a vivência espiritual dos religiosos residentes” (Gomes, 2000). Em 1527 inicia-se a reforma da Congregação “para acabar com as vicissitudes dos Priores Comendatários” (Dias, 2000). O Papa Paulo III confirmou os estatutos que haviam sido elaborados por Fr. Brás de Barros como reformador de Santa Cruz de Coimbra. Os priores deixaram de ser perpétuos para serem trienais. Em 1539, o Capitulo Geral “resolveu constituir como Prior mor da Congregação de Santa Cruz o Prior de Santa Cruz de Coimbra” (idem, ibidem) o que foi confirmado logo a seguir pelo Papa Paulo III (idem). Em 1594, por morte do Comendatário perpétuo, Diogo de Alarcão, Paderne aderiu ao mosteiro de Santa Cruz de Coimbra tendo sido eleito D. Nicolau dos Santos como seu primeiro Prior Trienal (Costa, 1868; Silva, 1983: 9).

A nova administração procurou rentabilizar os recursos monásticos adoptando uma gestão mais consentânea com a conjuntura. Uma das vertentes utilizadas foi a alteração do modo do recebimento das rendas substituindo-se o pagamento em dinheiro pelas entregas em espécie. Ao assim procederem, os frades de Paderne procuravam ladear as consequências das crises monetárias conduzindo a frequentes desvalorizações. Não foi fácil a aplicação desta medida. Houve reacções dando lugar a processos litigiosos. Um deles ocorreu em 1604 entre os frades crúzios e os herdeiros de Gregório de Mogueimas Fajardo e de sua mulher D. Catarina de Távora. Estes, foreiros da Quinta de Pontizelas, entregavam ao Mosteiro a pensão em dinheiro desde o tempo do comendatário Agostinho de Mogueimas que havia mudado o modo de pagamento da referida pensão originariamente em espécie.

O Mosteiro considerava que a mudança da pensão do pão meado, vinho e galinhas para dinheiro lhe causava ‘lezão enormíssima’ pois a pensão “não se podia mudar nem diminuir conforme a constituição signodall do arcebispado” (idem).

Os foreiros alegaram que as terras da Quinta de Pontizelas eram “antigamente terras infructífferas mattos agrestes, corcovas e penedias muito ásperas, e pedregulhaes tudo cousas incapazes de fructo e muito cheas de cobras e bichos peçonhentos, e tall era fama em toda a freiguesia, e o sabião os antiguos e ouvirão aos mortos. E que os antecessores dos reos seu pai e avoos e os outros possuidores atrás romperão as dittas terras e as levantarão de fogo morto desbastando mattos, arrazando montes e penedias, e com grande custo de suas fasendas reduzirão as terras ao culltura, e nellas fizerão vinhas, cazas e devesa, que tinhão de maneira que quoanto na quintam avia erão obra do reo e dos seus antecessores, e nada os comendatários nem frades fizerão nas terras sobreditas e que o reo tinha feito nellas valia muitos mill cruzados (…) que pelas razões sobredtitas numqua o mosteiro autor nem seus comendatários e priores ouverão mais pensão dos possuidores da ditta quintam que quinhentos e sesenta reis em dinheiro e numqua em tempo algum receberão pão nem vinho e gallinhas de pensão della, e de tempo inmemorial a esta parte de mais de cento e duzentos annos estava o reo em poses per si e seus antecessores de não paguar mais que a ditta copia de quinhentos e sesenta reis em dinheiro, e o sabem os vivos e o (ouvir)ão aos mortos” (idem ibidem: 33). Estes argumentos convenceram o Rei Filipe II que, em 23 de Janeiro de 1607, decidiu a favor dos foreiros (idem ibidem). Durante a Guerra da Restauração, o prior de Paderne, “fez grandes serviços à pátria, como capitão-mor do seu couto” (Leal, 1875).

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