segunda-feira, 29 de abril de 2013

Excursão a Castro Laboreiro em 1904 pelo grande José Leite de Vasconcelos





"Por fim entrámos na villa, que é como os Crastejos chamam á sua terra, visto que ella o foi algum dia. Ainda que as instituições sociaes mudem, o vulgo, que está afeito á linguagem tradicional, conserva esta longo tempo, em contradicção com os factos.
   Apesar da sua rusticidade, Castro-Laboreiro procura acompanhar o progresso: possue algumas lojas de negócio, uma fonte de cantaria, e um Commendador, que é ao mesmo tempo o Professor primario da freguesia, o Sr. Mathias Lobato, pessoa amável, a quem os forasteiros ficam sempre devendo obsequios.
   Ao longe o castello, posto num alto, provocou logo a minha visita, porquanto esperei encontrar ahi alguns vestígios proto –ou prehistoricos; na sua última fase, é todavia de epoca portuguesa, o que se vê da architectura e de uma inscripção. Nada encontrei no interior. Sem embargo, quem procedesse a excavações, talvez encontrasse qualquer cousa junto d’aquela mole de granito, onde, por causa da inexpugnabilidade do sitio, que fica de mais a mais entre dois regatos, jazeu certamente o primitivo Castro. De lá se goza ampla vista de aldeólas, por exemplo, Corveira, Laceiras, Barreiro, Açoreira, Meijoeiro (quartel permanente da guarda-fiscal), Dorna, Entalada, Pontes, Mareco, solitarias, entre arvoredos e montes. Várias d’ellas servem de inverneiras. Em contraste com ellas ha as brandas, por exemplo, Portos, Seara, Eiras, onde se passa o verão; a palavra branda está, quanto a mim, por ‘’veraada < veranata, e corresponde á hespanhola vernada; cfr. de um lado, o gall. e crastejo gando, e hesp. ganado, e do outro, o hesp. braña  ‘’pasto de verano’’, de veranea.
   No dia da nossa chegada havia na villa feira de gado. Tive por conseguinte ensejo de observar muitos homens juntos: apresentavam-se geralmente de cara rapada, vestiam de çaragoça (jaqueta, calças e collete), traziam chapeu de panno ou carapuça, e varapau. Mulheres, por ser de gado a feira, não andavam lá muitas. O trajo ordinario d’ellas é: camisa; faxa vermelha; collete; jaqueta; saia branca; saiote; saia de côr, quasi sempre preta, feita de foloado ‘’pano de lã de ovelha ou de linho’’, que se fabrica em Castro; mandil; singuidalho, do mesmo ou de outro panno; na cabeça capella, que póde ser substituida por lenço; nas pernas calções e piucas, meias sem pé, que se prendem com uma liga ou baraça; e nos pés chancas. A outras peças de vestuario já acima me referi. No inverno, tanto homens como mulheres se abrigam das neves, chuvas e friagens com o corucho, especie de capuz de burel que se traz na cabeça, e tem uma especie de aba que se prolonga pelas costas abaixo; a palavra corucho provém talvez de corona + suff. –ucho.
   O sr. Abbade de Melgaço é natural da freguesia de Castro, e por isso fácil lhe foi apresentar-me em muitas casas para eu observar os costumes.
   Uma das industrias caseiras mais correntes é a de fiar. Ha grande variedade de rocas no nosso país, e cada uma das peças e componentes d’ellas tem seu nome: assim a parte bojuda, onde se colloca o fiado, chama-se em Castro rocanço, e apresenta tres saliencias; o cone truncado que cobre o fianço chama-se naipo, por ser feito de cartas de jogar (naipe). Fianço é o nome do fiado. Os fusos são de duas especies: de ferro, para linho, e de pau para lã; adquiri alguns mais curiosos, que trouxe para o Museu Ethnologico. Aos pesos de tear (feitos de madeira) ouvi dar o nome de catolcas.
   A cozinha consta de: lareira, borralheira, especie de camara para recolher o borralho, coberta por uma lage que se chama copeira ou pilheira; escanos, postos ao lado da lareira, para se sentarem; almario, simples prateleira para louça; masseira; fumeiro ou ‘’caniço’’, pôsto superiormente á lareira, para ahi se enxugar a roupa; arcaz, caixa para guardar os cereaes.
   Os Crastejos servem-se, mais ou menos, de pratos de madeira, tanto para comerem, como para conservarem a comida. Eu vi d’estes pratos. Tambem se usam cuncas ‘’malgas’’ ou ‘’tigelas’’ da mesma substancia; d’antes todos comiam nellas, hoje porem só as crianças. Consta-me que esta ‘’loiça’’ se fabrica na Galliza, e se exporta de lá para o Alto-Minho. Ha colheres de madeira, que se chamam igualmente cuncas. A fórma masculina cunco applica-se a uma gamella de pau para se bater a massa do pão antes de ir para o forno, ao que se chama patiar o pão (em S. Gregorio dizem afupar o pão.
   Para iluminação das casas, os mais pobres fazem uso de guiços, que são pedaços de urzes secas (gândaros), de queirogas sêcas e de tojos secos, descascados do tempo, e que se accendem á maneira de vela: sustentam-nos na mão, ou espetam-nos num buraco da parede; de vez em quando esmoucam-nos, quebrando no chão a parte carbonizada, para os reaccenderem. Na Galliza acontece o mesmo, e o nome é igual, só se escreve com z. Com os guiços concorrem vantajosamente candeias de lata, suspensas em seu velador, como é geral no Norte e Centro do país; outr’ora havia-as de ferro e alimentavam-nas de sil ou banha de porco.
   Terminarei aqui a parte descritiva, mencionando a cama, palavra que significa propriamente ‘’leito de madeira’’; assim se diz: ‘’o carpinteiro faz uma cama’’. A cama consta de um caixão grande, com quatro banzos ou pernas, que terminam superiormente em pirâmides. Os mais pobres ahi dormem sobre palha, envolvidos numa manta de burel (sem enxergão ou lençoes); de travesseiro serve um farrapo. Num dos banzos da cabeceira enrola-se o rosario em que rezam.
   No regresso de Castro-Laboreiro trouxemos ate Portellinho o mesmo caminho da ida. Ás alturas de Portellinho desviámo-nos da rota, por montes quasi nus de arvoredo, á vista de Lamas de Mouro, em direcção a Covalhão e Urjaes, d’onde seguimos até ao Peso. Acompanharam-nos constantemente as duas mesmas mulheres, que eram como duas cabras monteses, na rijeza physica e nos modos.

   Castro Laboreiro, 1904

  Extraído de Vasconcellos, J. Leite de (1916) - Excursão a Castro Laboreiro in: Revista Lusitânia, Lisboa.

sábado, 27 de abril de 2013

PESO (Melgaço) 1967 - Margens do rio Minho, nas proximidades da passagem internacional de barco

PESO (Melgaço) - Margens do rio Minho, nas proximidades da passagem internacional de barco. Postal circulado datado de 1967 (Data do carimbo do correio da estação do Peso) e enviado de Melgaço para Lisboa.




quarta-feira, 24 de abril de 2013

A Capela da Senhora da Graça (próximo da vila de Melgaço): algumas notas históricas



A construção desta capela remonta ao século XVII. Os documentos mais antigos levam-nos a  1609, a 10 Julho e referem-se à instituição de 6 missas na Capela da Graça pelo abade da freguesia, Tristão de Castro, por sua alma e de seus defuntos. Em 1610, a 12 Fevereiro dá-se a abertura do testamento do Abade Tristão na Quinta de Surribas. Foii primeiro administrador da capela Gregório de Castro, filho do instituidor. Em 1618, a 8 Julho é a data em que este já era falecido. Sucedeu-lhe na administração Gregório de Castro, filho do anterior e de D. Crecência da Rocha, morrendo solteiro sem descendência. A administração da capela passou assim para Pedro de Castro, irmão do primeiro e tio do segundo, sendo casado com a filha e herdeira de Marcos Pereira Velho e mulher D. Eulália Tabeira da Costa, senhores da Casa do Supegal. Em 1644, Pedro de Castro já era falecido. O quarto administrador foi Diogo Pereira de Castro, filho primogénito de Pedro de Casto, casado com D. Ana Soares Lobato de Lanções. Sabe-se que já no século XVIII sucedeu-lhe seu filho Mateus Pereira de Castro, cavaleiro professo da Ordem de Cristo e, por morte deste, seu irmão Bernardo Pereira de Castro e Lanções. Herdou depois a Quinta de Sopegal e a capela anexa ao morgado sua filha D. Ana Maria Pereira de Castro e Lira, que casou com António Luís Malheiro Pereira. Este foi o sétimo administrador da capela, a que sucedeu seu filho João Malheiro Pereira de Castro e Lira, que casou com D. Maria Joaquina de Abreu Coutinho, não gerando filhos. Em 1806, a 10 Dezembro, a capela da Senhora da Graça pertencia à Casa e Morgado de Sopegal, de que era senhor e administrador João Malheiro Pereira de Castro e Lira, Fidalgo da Casa Real. Neste documento, a capela é descrita como sendo de pedra de cantaria, com cornija e pirâmides nos quatro cantos, com cruz lavrada para Este, com seu entablamento de pedra lavrada e campanário na fronteira e duas frestas. Tinha a porta para Oeste com seu rocio murado à volta da capela, com a entrada por um corte na parede do lado Sul. Estava madeirada e forrada de novo, com porta nova de castanho, e ainda não se tinha feito o retábulo, por se ter arruinado o que tinha. O rocio da capela tinha para Este 20 varas, a Norte 13, a Oeste 13 e a Sul, partindo para a estrada que ia da vila para Rouças 16 varas. Enquanto duravam as obras, a imagem de Nossa Senhora da Graça estava na Igreja Matriz da freguesia. Sabe-se que em 1831, a 13 Maio João Malheiro instituiu por testamento a herdeira universal de todos os bens vinculados D. Maria Antónia de Almada Leite Machado Malheiro, filha de Inácio Leite Pereira de Almeida Pinheiro e de D. Grácia Flávia Machado de Melo Pereira Malheiro, prima co-irmã do testador. Em 1836, a 17 Janeiro, ocorre a morte de D. Maria Antónia, solteira e ainda em vida do testador. A 23 Fevereiro desse ano, João Malheiro P. Celina indicou como sua herdeira uma irmã de D. Maria Antónia, D. Grácia Xavier, Viscondessa da Azenha. A 1840, a 2 Março, após a morte da viscondessa, herdou a capela da Senhora da Graça e sua fábrica, a filha D. Emília Correia Leite de Almada. Em 1847, a 13 Maio, D. Emília casou com Dom Santiago Garcia Y Mendoza, o qual acabou por desbaratar o grande dote de esposa;  Em 1860, a 5 Maio, verifica-se a compra da capela pelo reverendo António Joaquim Feijó, reitor de São Miguel da Facha, filho dos Senhores do Morgado da Casa da Torre. Em 1864, a 6 Março, ocorre a compra da Capela por Manuel José Esteves Melgaço, bem como os foros pertencentes à mesma, por 250$000. No ano de 1871, a 29 Setembro,  achando-se a capela ao abandono e completamente inútil para o culto, Manuel José Esteves Melgaço e esposa D. Maria Rita Alves reedificaram-na e aumentaram-na. Como para a devida habilitação para o culto, o arcebispo de Braga exigia que os pretendentes reconstituíam o património dos bens imobiliários necessários à sua manutenção permanente de 6$000 livres de encargos, os outorgantes doam para património da capela e sua fábrica a sua propriedade, que produzia pão e vinho e era terra de rega e lima, com suas águas, regalias e servidões, e que eles compraram ao reverendo Dinis Ferraz de Araújo, ex-abade de Rouças, a qual rendia anualmente 14$000. Esta ficava no lugar do Telheiro, freguesia de Rouças. Em 1872, a 12 Junho é a data do autuamento do requerimento apresentado no cartório da Câmara Arquiepiscopal de Braga, onde substituíam o património anteriormente referido por outro sobre inscrições da divida pública portuguesa. No 25 Junho do mesmo ano, depois de organizado o processo, foi deferido a pretensão da capela ser benzida de novo e nela se celebrar missa, pelo arcebispo D. José Joaquim de Azevedo Moura. A 12 Agosto regista-se a provisão de licença para se continuar a celebrar missa na capela. Em 1877, a 14 Agosto, ocorre o casamento de D. Maria de Nazaré Esteves com Francisco António Cerdeira, natural de Rouças. Em 1887, a 14 Agosto, regista-se a morte de Francisco António Cerdeira. Em 1889, a 31 Julho, dá-se o falecimento de Manuel José Esteves Melgaço, ficando a Quinta de Eiró e a capela da Graça para a sua filha D. Maria de Nazaré Esteves. Em 1888, a 2 Setembro é a data do casamento em segundas núpcias de D. Maria de Nazaré Esteves com Vitorino Augusto dos Santos Lima. Posteriormente, D. Maria de Nazaré vendeu a capela da Graça a Ernesto Viriato dos Passos Ferreira da Silva, natural de Braga e casado com uma senhora de Melgaço. Sabia-se que em 1955 este era ainda o administrador da capela. 

Informações recolhidas em:
www. monumentos.pt

segunda-feira, 22 de abril de 2013

PRAÇA DO COMMERCIO (MELGAÇO) - Finais do séc. XIX ou inícios do século XX.


A Praça do Commercio corresponde à atual Praça da República já que nessa época e em tempos anteriores era aí que se realizava a feira e onde as pessoas levavam produtos agrícolas e outros para venderem.
Após a mudança de regime político de Monarquia para República em 1910, a praça passou a chamar-se Praça da República homenageando o novo regime.
Esta fotografia foi tirada de cima do edifício que ocupava o espaço onde hoje se encontra a Caixa Geral de Depósitos. Não tenho a certeza mas penso que já nesta altura se encontrava aí escola primária, daí a presença da sineta do lado esquerdo da imagem (caso esteja enganado, corrijam-me!). Vê-se também as "costas" da Fonte S. João e todo o aspeto desta praça na época.
Umas das fotografias de Melgaço mais antigas que conheço...


sábado, 20 de abril de 2013

MELGAÇO (1929) no documentário "Saudades de Portugal" 8


Filme - Documentário de 1929 com o título "Saudades de Portugal nº 8 que nos mostra várias belezas de Portugal, entre as quais este Melgaço lindo...
São imagens raríssimas do nosso concelho em filme que nos mostram cenas do quotidiano em vários pontos do concelho desde S. Gregório, onde a nossa Guarda Fiscal aparece em amena cavaqueira com os Carabineros espanhóis que guardavam a fronteira do lado galego. Vemos também imagens do rio Minho e da vila numa procissão com andores, banda de música e muitos populares. Vemos ainda cenas da vida do campo como um senhor a chamar uma parelha de vacas que puxam um carro...
Muitas outras coisas para ver neste pequeno tesouro. Tratam-se no fundo das imagens que dão movimento às histórias que os nossos avós nos contavam...
A autoria deste filme é da produtora Adriano Ramos Pinto & Irmão.


Fonte: Cinemateca Portuguesa

sexta-feira, 19 de abril de 2013

Senhora da Orada (talvez década de 1940)


 Ao lado, vemos estacionado um automóvel da época. Não consigo precisar a data exata mas dada a semelhança com outros desta década em termos de edição e desenho da letra da legenda, será desse tempo com certeza...

Outros tempos....



quarta-feira, 17 de abril de 2013

Miguel Torga por terras de Castro Laboreiro



Miguel Torga, vulto da literatura portuguesa do século XX, era um apaixonado por Castro Laboreiro e pelo seu modo de vida. Esteve em terras castrejas várias vezes.
A prová-lo, escreveu: "Desanimado, meti para Castro Laboreiro à procura dum Minho com menos milho, menos couves, menos erva, menos videiras de enforcado e mais meu. Um Minho que o não fosse, afinal.
Encontrei-o logo dois passos adiante, severo, de curcelo e carapuça. A relva dera finalmente lugar à terra nua que, parda como o burel, tinha ossos e chagas. O colmo de centeio, curtido pelos nevões, perdera o riso alvar das malhadas. Identificara-se com o panorama humano, e cobria pudicamente a dor do frio e da fome. Um rebanho de ovelhas silenciosas retouçava as pedras da fortaleza desmantelada. E uma velha muito velha, desmemoriada como uma coruja das catacumbas, vigiava a porta do baluarte, a fiar o tempo. Era a pré-história ao natural, à espera da neta.
Ó castrejinha do monte,
Que deitas no teu cabelo?
Deito-lhe água da fonte
E rama de tormentelo.

Bonita, esbofeteada do frio, a cachopa vinha à frente dum carro de bois carregado de canhotas. Preparava a casa de inverno para quando chegasse a hora da transumância e toda a família —pais, irmãos, gados, pulgas e percevejos— descesse dos cortelhos da montanha para os cortelhos do vale, abrigados das neves.
– Conhece esta cantiga?
– Ãhn?
Falava uma língua estranha, alheia ao Diário de Noticias, mas próxima do Livro de Linhagens do Conde de Barcelos.
– É legitimo este cão?
– É cadela.
Negro, mal encarado, o bicho, olhou-me por baixo, a ver se eu insistia na ofensa. O matriarcado teimava ainda...
– A Peneda?
A moça apontou a vara. E, como ao gesto de um prestidigitador, foram-se desvendando a meus olhos mistérios sucessivos. Todo o grande maciço de pedra se abriu como uma rosa. A Peneda, o Suajo e o Lindoso. Um nunca mais acabar de espinhaços e de abismos, de encostas e planaltos. Um mundo de primária beleza, de inviolada intimidade, que ora fugia esquivo pelas brenhas, tímido e secreto, ora sorria dum postigo, acolhedor e fraterno.
Quando dei conta, estava no topo da Serra Amarela a merendar com a solidão. Tinham desaparecido de vez as cangas lavradas e coloridas que ofendiam as molhelhas do suor verdadeiro. A zanguizarra dos pandeiros festivos e as lágrimas dos foguetes já não encandeavam a lucidez dos sentidos. Os aventais de chita garrida davam lugar aos de estopa encardida. Nem contratos pré-nupciais ardilosos, nem torres feudais, nem rebanhos de homens pequeninos, dóceis, a cantar o Avé atrás do cura da freguesia. Pisava, realmente, a alta e livre terra dos pastores, dos contrabandistas e das urzes."


Fonte:

http://www.arraianos.com/Arraianos%20n1%208-2004%20Web.pdf

segunda-feira, 15 de abril de 2013

Águas de Melgaço - A Salvação dos Diabéticos II

Desdobrável da Empresa Vidago, Melgaço & Pedras Salgadas da 1ª metade do sec. XX com publicidade às suas águas. A de Melgaço é descrita como a salvação dos diabéticos à semelhança do marcador de leitura que há uns dias partilhei com vocês.

sábado, 13 de abril de 2013

Diz-se do Presunto de Melgaço em 1886...


José Augusto Vieira na obra “O Minho Pitoresco”, tomo I, de 1886 diz sobre o presunto de Melgaço “ (...) Podes todavia entrar sem receio n’essa hospedaria honesta e limpa, porque se te falta na taboleta o sabor francês da palavra Hotel, não te faltará em compensação à mesa o sabor dos apetitosos bifes de presunto, que ali te servem, como um prato especial da terra! O Presunto de Melgaço! Que epopeia seria necessária para descrever-lhe o paladar fino e delicado, o aroma gratíssimo, a cor rosa escarlate, a frescura viçosa da fibra (...) Houvera-o provado Brillat-Savarin (...) e a sua Physiologia do gosto teria hoje de certo o mais suculento e o mais brilhante de todos os seus capítulos! Alimento sólido e forte, puxavante do verde, (...) o presunto de Melgaço, conhecido em todo o país é por assim dizer a syntese da phisiologia local. Válido, robusto, ágil, com o sangue puro bem oxygenado a estalar-lhe nas bochechas rosadas, o melgacense genuíno destaca-se dos habitantes dos outros concelhos próximos, a ponto de ser entre estes vulgar a phrase de:
- Ter a cara do presunto de Melgaço- quando se falla de alguem com as boas cores de saúde...



Extraído de: VIEIRA, José Augusto (1886) - O Minho Pittoresco, tomo I, edição da livraria de António Maria Pereira- Editor, Lisboa.

quinta-feira, 11 de abril de 2013

ÁGUAS DE MELGAÇO... A Salvação dos Diabéticos

Marcador de leitura com publicidade às Águas de Melgaço designando-as como a salvação para todos os diabéticos. Não consigo precisar a data exata deste marcador de leitura mas pelo aspeto será com certeza da primeira metade do século XX. Para quem sofria desta maleita nesta época, nada melhor que beber esta água como se fosse uma cura quase milagrosa. Mais se refere que não encontra águas com caraterísticas similares em todo o Portugal. 
Observe com atenção.






terça-feira, 9 de abril de 2013

"As mães" ... de Castro Laboreiro na prosa de Eugénio de Andrade


"Quando voltar ao Alentejo as cigarras já terão morrido. Passaram o verão todo a transformar a luz em canto – não sei de destino mais glorioso. Quem lá encontraremos, pela certa, são aquelas mulheres envolvidas na sombra dos seus lutos, como se a terra lhes tivesse morrido e para todo o sempre se quedassem órfãs. Não as veremos apenas em Barrancos ou em Castro Laboreiro, elas estão em roda a parte onde nasça o sol: em Cória ou Catânia, em Mistras ou Santa Clara del Cobre, em Varchats ou Beni Mellal, porque elas são as Mães. O olhar esperto ou sonolento, o corpo feito um espeto ou mal podendo com as carnes, elas são as Mães. A tua; a minha, se não tivera morrido tão cedo, sem tempo para que o rosto viesse a ser lavrado pelo vento.
Provavelmente estão aí desde a primeira estrela. E como duram! Feitas de urze ressequida, parecem imortais. Se o não forem, são pelo menos incorruptíveis, como se participassem da natureza do fogo. Com mãos friáveis teceram a rede dos nossos sonhos, alimentaram-nos com a luz coada pela obscuridade dos seus lenços. Às vezes encostam-se à cal dos muros a ver passar os dias, roendo uma côdea ou fazendo uns carapins para o último dos netos, as entranhas abertas nas palavras que vão trocando entre si; outras vezes caminham por quelhas e quelhas de pedra solta, batem a um postigo, pedem lume, umas pedrinhas de sal, agradecem pela alma de quem lá têm, voltam ao calor animal da casa, aquecem um migalho de café, regam as sardinheiras, depois de varrerem o terreiro. Elas são as Mães, essas mulheres que Goethe pensa estarem fora do tempo e do espaço, anteriores ao Céu e ao Inferno, assim velhas, assim terrosas, os olhos perdidos e vazios, ou vivos como brasas assopradas. Solitárias ou inumeráveis, aí as tens na rua frente, graves, caladas, quase solenes na sua imobilidade, esquecidas de que foram o primeiro orvalho do homem, a primeira luz.
Mas também as podes ver seguindo por lentas veredas de sombra, as pernas pouco ajudando a vontade, atrás de uma ou duas cabras, com restos de garbo na cabeça levantada, apesar das tetas mirradas. Como encontrarão descanso nos caminhos do mundo?
Não há ninguém que as não tenha visto com umas contas nas mãos engelhadas rezando pelos seus defuntos, rogando pragas a uma vizinha que plantou à roda do curral mais três pés de couve do que ela, regressando da fonte amaldiçoando os anos que já não podem com o cântaro, ou debaixo de uma oliveira roubando alguma azeitona para retalhar.* E cheiram a migas de alho, a ranço, a aguardente, mas também a poejos colhidos nas represas, a manjerico quando é pelo S. João. E aos domingos lavam a cara, e mudam de roupa, e vão buscar à arca um lenço de seda preta, que também põem nos enterros. E vede como, ao abrir, a arca cheira a alfazema! Algumas ainda cuidam das sécias que levam aos cemitérios ou vendem nas feiras, juntamente com um punhado de maçãs amadurecidas no aroma dos fenos. E conheço uma que passa as horas vigiando as traquinices de um garoto que tem na testa uma estrelinha de cabrito montês – e que só ela, só ela vê.
Elas são as Mães, ignorantes da morte mas certas da sua ressurreição."

domingo, 7 de abril de 2013

CÂMARA MUNICIPAL DE MELGAÇO EM CONSTRUÇÃO


A primeira pedra do edifício foi lançada em 13 de Abril de 1930. Trata-se de um edifício de linhas simples da autoria do eng. Júlio José de Brito cuja obra foi adjudicada a Manuel Gonçalves Costa.  (informações gentilmente cedidas pela Dra. Elsa Rodrigues, do Arquivo Municipal a que endereço os meus agradecimentos).



sexta-feira, 5 de abril de 2013

Castro Laboreiro na "Corografia Portugueza e descripçam topográfica do famoso reyno de Portugal" (1706)

Castro Laboreiro, 1903


Terra frigidíssima de neves



Em 1706, no seu "Corografia portugueza, e descripçam topografica do famoso reyno de Portugal", diz o Padre António Carvalho da Costa sobre Castro Laboreiro:
«Da Vila de Castro Laboreiro,
Duas léguas e meia de Melgaço entre o Nascente e o Meio-Dia está a Vila de Castro Laboreiro, a que vulgarmente chamam Castro.
É terra montuosa e frigidíssima de neves, seus ordinários frutos são centeio e pouco milho miúdo, muitos gados de toda a casta, as maiores ovelhas Galegas e que dão o melhor burel de todo o Portugal, e assim os melhores lacticínios produzidos dos férteis pastos de hervagens, que aqueles montes tem no Verão, a caça de coelhos, lebres, perdizes, javalis, corças, & “veaçaõ” de lobos, raposas, martas, tourões, ginetas e outros bichos é infinita, e em um pequeno regato grande quantidade de trutas. Não tem outras árvores senão poucos e pequenos carvalhos, bastantes nabos, menos couves Galegas, frias e delgadas águas.
Tem os moradores grandes privilégios, que lhes concederam os nossos reis em remuneração dos grandes serviços que lhes fizeram nos tempos das guerras destes Reinos. Governa-se por Câmara de dois Juízes Ordinários, que também servem nos Órfãos, dois Vereadores e Procurador do Concelho, eleição trienal do Povo e Pelouro a que preside o Ouvidor da de Barcelos e dois Tabeliões que servem em tudo.
Tem em rocha viva um inexpugnável castelo que uns dizem ser obra dos Mouros; outros que levantando-se na Galiza um Conde chamado Vitiza, Utiza ou Guicia contra El Rei Dom Afonso o Magno terceiro em número, mandou conquista-lo por Hermenegildo, Conde das Cidades do Porto e Tui, seu parente e Mordomo, o qual o venceu e lho trouxe preso, pelo que El Rei lhe deu as terras do traidor e entre elas a Vila de Lima, aonde depois seu neto São Rosendo fundou o Mosteiro de Cela Nova e este Monte Laboreiro, em que seu bisneto Dom Sancho Nunes de Barbosa, cunhado Del Rei Dom Afonso Henriques, fundou este Castelo, que se assim foi, seria em oposição das guerras que com o Reino de Leão tivemos. Mas pelos nomes de Castro e Laboreiro, que derivados do latim querem dizer “Castelo Trabalhoso” ou que está em terra trabalhosa, como esta o é para o trato humano, me parece ser do tempo dos romanos; e que seja mais antigo que El Rei Dom Afonso Henriques não há dúvida, pois ele o conquistou com um duro cerco, como se vê de uma Doação ao Couto de Paderne, (…), por onde atribuir-se esta fábrica a El Rei Dom Dinis seria mais reedificação que edifício. Consta de uma torre que pouco antes que os “paisanos” o entregassem aos Galegos voou com o incêndio que um raio causou dando no armazém da pólvora, que sempre o Céu ameaça as últimas ruínas com sinais antecedentes à nossa prevenção. E tem uma muralha tosca com duas portas, uma para o Poente, pela qual se pode ir a cavalo e outra para o Norte, por onde mal pode uma pessoa ir a pé. Vinte homens bastam para o defenderem de grandes exércitos mas é quase incapaz de habitar-se.
A um tiro de arcabuz para o Norte está a Vila em sítio plano, que terá setenta vizinhos, da qual é Senhor o Duque de Bragança, que dá os ofícios. Tem o termo uma Freguesia que é a seguinte.
Santa Maria de Castro, formosa igreja, foi Vigararia anexa à Matriz de Ponte de Lima, passou a Abadia dos Bispos de Tui, quando o eram também destas terras, trocou-a por outras o Bispo Dom João Fernandes de Sotomayor com El Rei Dom Dinis no ano de 1308. E hoje é Comenda da Ordem de Cristo e Reitoria com quarenta mil reis, ao todo cento e vinte mil reis e ordenado para o Coadjutor, e para a Comenda duzentos e cinquenta mil reis, tudo “data” dos Duques. Tem duzentos e vinte vizinhos de que se forma uma Companhia mui alentada.
Entre as mais Ermidas que tem à uma de Nossa Senhora de Anamão, imagem milagrosa, que está num vale junto à raia, metida nuns grandes penhascos, onde foi achada no buraco que a natureza obrou num monstruoso penedo. Dizem que a trouxeram por vezes à Igreja mas que outras tantas se tornou e por isso ali lhe fizeram a Ermida.
Na chão tão “dilstada” que terá cinco ou seis léguas de circunferência, nasce o pequeno rio em que se criam as trutas, no qual há uma pequena ponte que chamam Pedrinha, fábrica de Mouros.
Quando vamos do Porto dos Asnos ou dos Cavaleiros, passamos outro limitado ribeiro pelo qual foi a pé o Santo Arcebispo Dom Frei Bartolomeu dos Mártires a visitar aquela Igreja. Tem virtude esta água para curar a boca “lixosa” das crianças e outras enfermidades. Então disse que tarde ali tornaria outro Arcebispo e assim foi, porque “suposto” o intentou Dom Sebastião de Matos e Noronha e não o conseguiu e só em nossos tempos o fez o Eminentíssimo Cardeal Dom Veríssimo de Lancastre, nosso Inquisidor Geral quando era Arcebispo de Braga.
Para prova da frialdade da terra “baste”, que o vinho se congela no Inverno de modo que para a Missa é necessário aquece-lo, do que se tivera notícia não se admiraria o Aragonês Vitrian nas notas a Filipe de Comines (…) de o cortarem com escopro e martelo junto a Liége no exército de Carlos o Bravo, Duque de Borgonha no ano de 1468, porque como Aragão é terra quente, parecia-lhe que todo o mundo assim devia ser.»
Esta descrição corográfica é a mais antiga que conheço sobre a nossa terra e serviu de base a várias outras, posteriormente elaboradas. Tem várias curiosidades e algumas informações interessantes sobre o Castelo e até sobre uma visita que o famoso e ilustre Frei Bartolomeu dos Mártires terá efectuado à nossa terra, o que terá acontecido algures entre 1559-1581, período temporal em que o dito prelado foi Arcebispo Primaz de Braga.

Curiosa é também a referência ao vinho que congela no inverno "de modo que para a missa é necessário aquece-lo"!


Fonte: Blogue "Longe de Castro Laboreiro"


terça-feira, 2 de abril de 2013

VILA DE MELGAÇO NA DÉCADA DE 1920

A vila de Melgaço na década de 1920 vista do lado este. Linda panorâmica e com bastante qualidade fotográfica para a época.
Esta imagem merece uma observação atenta. Perca um tempinho e veja como tudo mudou...