sexta-feira, 17 de junho de 2016

Uma visita a Melgaço de há 50 anos atrás (Parte 1)

Frente do desdobrável (Janeiro de 1955)
Em Janeiro de 1955, é publicado um desdobrável destinado a promover o concelho de Melgaço que era uma espécie de um guia para o visitante. No mesmo, encontramos um texto da autoria do professor António Pinho, de Paderne, que parece uma verdadeira declaração de amor pela sua terra.

Melgaço e a sua região

“Eis a vila e concelho mais setentrionais da mais setentrional província desta Pátria Camoniana que nos foi berço; eis o torrão que se impõe pelos seus motivos históricos e pelos panoramas inconfundíveis que, através dele, se dominam, para aquém e além fronteiras.
Melgaço, antiga fortaleza árabe, terra lusitana de mais antiga e ilustre história, foi mandada povoar pelo Rei Conquistador, que lhe concedeu foral e a elevou a concelho.
Assoalhado numa acidentada encosta, reclinada para o rio Minho que, a seus pés, desliza, sinuoso e meigo, e sulcado por riachos fertilizantes por entre encostas alterosas, o concelho de Melgaço enquadra-se numa das mais fascinantes e paisagísticas regiões minhotas que o pintor à tela tem confiado.
Se, porém, a sua situação geográfica é, sobremaneira, privilegiada, não é só esta, já por si, assas forte, que, distinguindo-o, o ilustra e diz típico, entre os mais genuinamente portugueses.
São as belezas inebriantes com que a Natureza caprichou em fadá-lo. São os seus artísticos monumentos. É o folclore das romarias e cortejos. É a uberidade do seu solo. São os costumes das suas gentes. É a vegetação das suas campinas e vergeis. São as construções do último quartel a esmaltarem-no. É a policromia de seus panoramas. É o murmúrio da água das suas fontes, sumamente, são todos os atributos paisagísticos, históricos, arqueológicos, etnográficos e folclóricos que tornam bem distinto este canteiro, o primeiro, desse “jardim à beira mar plantado” que o Épico, singularmente, cantou.
A sua vila assenta arraiais em torno do Castelo, que outrora a escudou e hoje a vela, mirando, altivo, defronte, o Edifício dos Paços do Concelho e, em silêncio, escutando os segredos dos pares enamorados que, do simétrico e colorido jardim da Praça da República se encaminham para a Avenida Salazar, por onde, divagando, desfrutam toda a magia e encanto da vasta e singular paisagem que daí se domina.
Para o ocaso, a três quilómetros desta, num pitoresco recanto, brotam, em duas bicas, as afamadas “águas minerais” que ao doente aliviam e ao são proporcionam bebida agradável. Sim, a essa distância situa-se a Estância Hidrológica do Peso.
O Peso... Insigne “boulevard” sob ramada compacta de árvores frondosas; rincão onde o sol, noutras partes, calcinante, enamorando a copa do arvoredo, que sofre as inclemências do astro-rei, para prodigamente oferecer ao aquista ou ao visitante, a sombra, uma sombra perfumada pelo aroma inconfundível da flor das tílias que se evola nos ares e cala nos corações.
Estância de cura e turismo, de vilegiatura e repouso, é o Peso. Ali afluem, na época calmosa, inúmeras pessoas que, extasiadas, esquecem, como que por encanto, aquelas preocupações do dia a dia que a todos encurtam a vida e comprometem a alma. Aí, tudo distrai e seduz...
É o harmonioso marulhar das água do bucólico regatozinho. São os campos de jogos, onde se pratica o ténis e joga o golf. É mais além, o maravilhoso Balneário, onde se exercita a mais avançada terapêutica, que bem digno é duma visita. É adentro do majestoso pavilhão, o cantar da água da “bica” que, qualquer coisa, parece segredar às solicitas empregadas, as quais num constante vai-vem, levam um copo vazio, enquanto a miraculosa água a outro abranda sofrimento ou mitiga a sede.
E, por toda a parte se vê gente que admira, comenta, medita, lê, conversa, discute e, assim, neste cantinho abençoado, o espírito esclarece-se, o país encontra-se, a saúde melhora-se e as horas voam!...
Mas o businar das caminhetas dos hotéis lembra a hora de jantar. Mergulha-se, então, a Estância no silêncio e o buliço é agora nos hotéis e pensões onde a culinária é de primeira qualidade.
A levante limita este concelho, em parte, o Trancoso que, dando seguimento, em Alcobaça, à raia seca demarcada, que vem desde a Ameijoeira, vai lançar as suas águas no Minho, no local onde este diz adeus à Nação Vizinha – e vá lá o prolóquio: onde a voz de um português se faz ouvir em duas províncias espanholas, Orense e Pontevedra, que, com  a do Minho, ali confinam – para, caudaloso e ofegante, banhar terras portuguesas.
Ali é Cevide e, mais acima, é S. Gregório, que se alcandora nas ribas dum e doutro, a meia encosta do Monte do Facho, fitando – qual sentinela alerta – assim altaneiro, a Galiza a quem se liga por uma excelente ponte internacional que dá acesso à cidade de Orense.
Esta risonha povoação que, olhada defronte, à distância, se nos assemelha a um presépio, dista pouco mais de meia dúzia de quilómetros da sede de concelho, à qual se liga por uma excelente via nacional, donde, a cada passo, se topa com excertos de paisagens das mais imponentes e majestosas que se podem oferecer a olhos humanos. Abstemo-nos de traçar aqui o seu perfil para não corrermos o risco de falsear a verdade, denegrindo-lhes, porventura, o que de sui generis as descrimina, que bem digno é o estro do poeta, da fidelidade do pintor ou do sentimento emotivo de pena melhor aparada. Far-nos-emos eco somente de que, a caminho de S. Gregório, tudo se patenteia e conjuga em manifestações grandiosas de beleza incomparável, em vistas panorâmicas sem confronto que, seguidamente, a nossos olhos se desdobram e nos fazem admirar, cada vez mais a obra do Criador.
Lá no alto, a sul, é Castro Laboreiro, é serra..."


(Continua na próxima publicação) 

Desdobrável completo (Clique para ampliar) 

Sem comentários:

Enviar um comentário