sexta-feira, 1 de julho de 2016

Sobre as origens do Convento de Fiães (Melgaço)

Igreja do Convento de Fiães
Um livro editado em 1903 fala-nos do convento de Santa Maria de Fiães e a dada altura questiona o autor: Quem foram os primeiros “habitadores” do mosteiro? Fala-nos então em algumas pistas acerca das origens deste mosteiro que nos levam até ao século IX. Ainda hoje, a comunidade científica não tem provas concludentes acerca do “nascimento” deste convento em terras melgacenses. Alude também a uma imagem milagreira chamada de Santa Maria de Fiães, já desaparecida. Neste livro, encontramos referências à fundação de uma comunidade de eremitas em Fiães em tempos que permanecem um mistério:
“Ter que rebuscar origens, nas velhas crónicas dos conventos, é ingrato labor a que satisfatórios resultados nem sempre correspondem.
Do seu confronto nasce a dúvida, que nunca se desvanece, por ser tanto mais intrincado o dédalo quanto mais se aprofunda o estudo.
Nesses livros, em que a unção religiosa devia transparecer, da calma e isenção de seus autores, não é raro ver-se aquela perdida, ou esta apaixonada em controvérsia mesquinha, para firmar primazias e direitos que nunca existiram.
Nestas condições, pouco se pode coligir e aproveitar, e ainda por estarem inéditos os principais escritos que a cada passo se encontram citados.
Duas são as ordens que por seus cronistas reclamam a prioridade daquela habitação.
— A Augustiniana, e a Benedictina. Assevera o cronista Frei António da Purificação, da Ordem Augustiniana, que o mosteiro de Santa Maria de Fiães, que está junto ao rio Minho, a distância de uma légua da Vila de Melgaço, foi edificado no anno de 870, e chama a seu favor a opinião de Frei Hieronymo Roman, que na sua História Ecclesiastica de Hespanha, não declarando o tempo da sua fundação, afirma contudo, que no Mosteiro de Santa Cruz de Coimbra, achou memórias de como ele fora em tempos antigos de eremitas d’esta Ordem, acrescentando que as achou também nos cartórios dos Conventos de S. Cristovão de Lafões, e de S. João de Tarouca.
Era naquele ano Sumo Pontífice, Adriano segundo, ou João nono que lhe sucedeu. Reinava, em parte de Hespanha e de Portugal, o inclito Rei D. Afonso Magno, com cujo favor e amparo nos fomos conservando naquele lugar, até ao tempo dos réis portugueses.
Mais tarde, roubado e assolado o convento pelos Mouros, Afonso Paes, e dois irmãos seus que professaram, dotaram-no e repararam-no e o deram à Ordem do Cister que já por esse tempo havia sete mosteiros neste reino.
Tinha o D. Abade, grandes proeminências, as quais o mesmo cronista não quis referir para se não deter com argumento alheio.
Contesta a asseveração feita por Frei Leão de S. Tomás, no prólogo das Constituições da Ordem de S. Bento, de terem vivido neste mosteiro frades de hábito preto, e argumenta que este habito não convinha aos de S. Bento, mas sim, foi e era mais próprio aos da Ordem Augustiniana.
Parece que naquele tempo, já o hábito não fazia o monge. Na obra Beneditina Lusitana, Frei Leão de S. Tomás, — assevera igualmente, — que o mosteiro de Fiães foi, em tempos mais antigos, dos monges pretos da Ordem de S. Bento, e chama a reforçar a sua opinião, a de Frei Bernardo de Braga, e Frei João do Apocalipse, os quais afirmavam que constava isso de uma escritura de descambo ou troca que se fez entre o mosteiro de S. Cristovão e o de Ganfei, da Ordem Beneditina, que no cartório dele se conservava: « Especifica o mesmo padre, em suas memórias, que foi fundado o de S. Cristovão na era de 889, por alguns anos antes, por ser naquele ano que se fez o descambo.”
São Chistovão, foi o primitivo nome do mosteiro de Fiães. Em seguida, nota que o autor da Crónica Augustiniana chamou seu a este convento, o que contesta e espanta-se de também não ter feito de sua Sagrada Religião, um outro de freiras bentas, que ficava próximo ao de São Cristovão, e se chamava de S. Pedro de Merufe. Depois explica com graça a causa da morte deste mosteiro, — que foi a pobreza, repetindo a frase de Diogenes: paupertas non parna agritudo est. A pobreza é grande doença; — isto depois do mosteiro ter tido em seu principio a liberalidade cristã, como mostrava pelo dístico seguinte:
Quas pietas jungens Moniales pristina ditae
Pauperies delet petre Morufe tuas.
Exalta-se por não suceder o mesmo ao de Fiães, que era mais antigo, e estava fronteiro à Galiza, onde as guerras entre Portugal e Castela andavam acesas, servindo o mosteiro de castelo, em defesa do Reino, mostrando-se os padres Cistercienses, tão devotos no coro como Moisés no campo, e rebates tão valorosos
como Josué, tendo por seu capitão ao glorioso São Cristovão governador das armas daquelas partes. Não quis Frei Leão, ter a percepção de que tudo neste mundo acaba, e que a doença que feriu de morte o mosteiro de Merufe, tornar-se-ia epidémica para aquelas casas, como o atestaram o de Fiães, e muitos outros para quem a pobreza também foi grande doença.
O Padre Carvalho, na sua Corografia, assegura que o mosteiro foi de monges Bentos, no reinado de D. Ramiro I, e de sua mulher D. Paterna, da qual supõe ter tomado o nome o Vale de Paderne e admite, por isso, que se ela não foi a fundadora deste mosteiro, foi então do de S. Paio, que existiu no mesmo termo de Melgaço. Isto pelos anos de 851, do que encontrou notícia, sendo aquele referido mosteiro um dos primeiros desta ordem que houve em Hespanha. O anterior título foi, São Cristovão de Fiães, e como pelos anos de 1150 houvesse entrado em Portugal a Reformação da Ordem do Cister, — para a qual passaram os de São Cristovão de Lafões, e de Santa Maria de Bouro, ambos de eremitas de S. Agostinho, — cujos filhos, deixando o hábito preto, vestiram a branca cogula de São Bernardo no ano de 1159: este de São Cristovão de Fiães; — levado também pela fama de grande santidade dos novos filhos de São Bernardo, que haviam vindo de França, — que também foi a melhor coisa que de lá veio, diz Frei Agostinho, — se passaram à sua Ordem, e acrescenta: “Como o exemplo, que é muito poderoso, dos Eremitas, assim os de São Cristovão de Lafões, onde era prelado o nosso Santo Frei João Cerita, como o de Santa Maria de Bouro, mandaram o prior do Convento de Fiães e dois religiosos a pedir aos filhos de São Bernardo a relação de seus Estatutos, e modo de vida, e a que dar obediência ao seu Abade. É de crer que ficando-lhe o Convento do Bouro tão vizinho, a ele recorressem, e que dele se lhe mandasse algum religioso para lhe praticar o modo de sua vida e Santa Reformação. E desde então até ao presente ficou esta casa de Fiães sujeita à Ordem de Cister.»
Depois que receberam a reforma Cisteriense, tomaram para padroeira a Virgem Maria, pela grande devoção que São Bernardo lhe tinha, e deixando o antigo titulo de São Cristovão, passaram a denominar aquela casa: — Santa Maria de Fiães. Assim como é de tradição antiga que os mesmos eremitas, quando voltaram monges, trouxeram consigo uma imagem da Senhora de Fiães, a qual era de pedra branca, com guarnições de ouro, tendo sobre o braço esquerdo o Infante Jesus. Tinha de altura quatro palmos. Após a vinda desta Santa, começaram-se a operar os milagres naqueles que com fé viva a ela recorriam. Diz mais:

«Esta Santa Imagem, já hoje não existe, que a devia acabar o tempo. Foi muito grande incúria daquele mosteiro não a mandar reparar, por que a cabeça e mãos, que eram encarnadas, não se podiam desfazer, e o corpo podia-se consertar com algum betume, de gesso pó de pedra com cera. Depois mandaram fazer outra, que colocaram em seu lugar.”  (Extrato retirado de: OLIVEIRA, Gilherme (1903) - Uma visita às ruínas do Real Mosteiro de Fiães. Livraria Ferreira, LIsboa.)

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