sexta-feira, 28 de setembro de 2018

Melgaço fotografado pelo pioneiro do cinema em Portugal em 1903 e 1904



As Águas de Melgaço, no início do século XX, atraíam um grande número de aquistas sendo muitos deles personalidades ilustres da sociedade portuguesa. Pelas Águas de Melgaço, passaram Presidentes da República, Ministros, intelectuais, investigadores, artistas, entre outros. Uma das grandes personalidades portuguesas ligadas à arte que esteve em Melgaço foi Aurélio da Paz dos Reis (1862-1931), pioneiro do cinema em Portugal, autor dos primeiros filmes em Portugal, ainda no século XIX sendo também um talentoso fotógrafo ainda que amador.
Aurélio da Paz dos Reis esteve em Melgaço pelo menos em 1903 e 1904 e fotografou as Águas de Melgaço de uma forma única. A Nascente, os aquistas, o Hotel Quinta do Pezo, os passeios dos aquistas das termas ao rio Minho, a Paderne ou a S. Gregório, tudo com um certo glamour, compõe uma bela coleção de raras imagens da nossa terra nessa época. Existem pelo menos quase meia centenas de fotos tiradas em Melgaço por este realizador de cinema que fazem parte do seu extenso espólio.
Partilho com vocês algumas das mais belas e raras fotografias de Aurélio da Paz dos Reis tiradas em Melgaço...


Aquistas das Termas do Peso (Melgaço) em 1903, na margem do rio Minho
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Passeio a S. Gregório (Melgaço), na Ponte Internacional em 1903
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Passeio a S. Gregório (Melgaço), na Ponte Internacional em 1903
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Nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1903
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Vista sobre a Nascente das Termas do Peso (Melgaço) em 1903
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Ao lado da Nascente das Termas do Peso (Melgaço) em 1903
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No Hotel Quinta do Peso, nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1904
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No Hotel Quinta do Peso, nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1904, na saída para um passeio
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Aquistas em passeio nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1903
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Nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1903
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Nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1903
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Nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1903, em passeio
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Nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1903, em passeio
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No Hotel Quinta do Peso, nas proximidades das Termas do Peso (Melgaço) em 1904
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Aquistas na margem do rio Minho ao lado da barca, nas proximidades
das Termas do Peso (Melgaço) em 1904
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No Hotel Quinta do Peso, no Peso (Melgaço) em 1904, uma foto de grupo
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Aquistas a descer da barca na margem do Minho, no Peso (Melgaço) em 1903
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Junto ao Convento de Paderne (Melgaço) em 1903, à saída da missa
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sexta-feira, 21 de setembro de 2018

Eurico da Silva, um melgacense autor de algumas das mais famosas novelas brasileiras da sua época.



Eurico António Crispim da Silva nasceu em Paços (Melgaço), no dia 18 de Setembro de 1898. Era filho de Francisco Crispim, carpinteiro, natural de Rouças, e de Maria Teresa Trancoso da Silva, lavradeira, natural de Paços, moradores no lugar de Merelhe da dita freguesia. Era neto paterno de João Manuel Crispim e de Maria Rodrigues, e neto materno de Francisco Trancoso e de Francisca Afonso. Foi batizado na igreja paroquial de Paços a 22 desse mês e ano. Foram seus padrinhos António Trancoso da Silva, negociante, residente no Rio de Janeiro, Brasil, representado por Luís Martins, casado, lavrador, do lugar de Sá, Paços, e Alexandrina Gonçalves Torres, solteira, camponesa, moradora no lugar da Granja.
Artista multifacetado, foi ator, autor de teatro, roteirista de rádio, roteirista de cinema, autor de telenovelas, produtor teatral, produtor de rádio, diretor de cinema e dramaturgo luso-brasileiro, célebre autor de radionovelas durante a era dourada da rádio, tendo uma rua com o seu nome no estado do Rio de Janeiro (Brasil).
Eurico da Silva emigrou de Melgaço para o Brasil em 1916, e em 1919 iniciou a carreira de ator com a peça "O Mártir do Calvário" (de Eduardo Garrido), apresentada no Teatro Carlos Gomes.
A mudança para o Rio de Janeiro dera-se por ter ali alguns amigos padeiros, mas logo Eurico Silva se interessa pelo meio artístico.
A primeira das 15 peças que escreveu estreou em 1932, pela companhia de Procópio Ferreira, para quem traduziu outras tantas.
Em 1939, transferiu-se para o rádio, atuando no programa "Teatro em Casa" da Rádio Nacional como ator e produtor. Dois anos mais tarde voltou para o teatro e em 1945 voltou à emissora.
Como produtor tornou-se responsável por vários programas famosos à época, como Versos e Melodias, Casa da Sogra, Neguinho e Juraci, e foi autor de 28 radionovelas, além de ter traduzido outras, como "O Direito de Nascer", de Félix Caignet, transmitida em 1951 em 273 capítulos, e que veio a ser o maior sucesso do género já registado no país.
Com a estreia da televisão, é um dos redatores das novelas da Rede Tupi, onde escreveu "Olhos que Amei", em 1965, ano em que faleceu.
No cinema, foi roteirista parceiro de J. Rui em filmes como "Não Adianta Chorar" (1945) e com Oscarito no elenco. Dirigiu ainda três filmes.
Fundou e dirigiu a Companhia de Comédias Cazarré-Elza-Delorges, administrou a companhia do Procópio Ferreira e a de Joracy Camargo, tendo ainda nos anos 40 participado da Sociedade Brasileira de Autores Teatrais.
A sua obra é quase interminável. No arquivo Miroel Silveira, constam 33 peças de teatro escritas por Eurico António Crispim da Silva. As peças escritas por Eurico Silva foram as seguintes, com a respetiva companhia que encenou a primeira vez:
- O pai que eu inventei – 1942 – Companhia Procópio Ferreira, Empresa Pereira da Costa e Gioso Ltda.
- Pense alto (Viva o amor) – 1933 – Companhia Procópio Ferreira;
- Divorciados – 1934 – José Soares; 1944 – Cia. Procópio Ferreira; 1944 – Teatro Escola de Campinas; 1953 – Escola Técnica de Teatro Tiradentes.
- A felicidade pode esperar – 1944 – Rádio Difusora SP; 1945 - Pavilhão Teatro Mazzaropi.
- Filhos de ninguém – 1950 – Circo Teatro Piolim; 1962 – Circo Teatro Irmãos Liendo.
- Um homem – 1935 – Moderna Companhia de Comédia; 1944 – Circo Teatro Liendo e Simplício; 1946 - Circo Teatro Di Lauro.
- Entrou aqui uma mulher (adap.) – 1933 - Companhia Procópio Ferreira.
- Um caso de polícia – 1933 – Companhia Procópio Ferreira.
- A mulher que eu achei - 1935 - Moderna Companhia de Comédia.
- Frederico Segundo – 1935 – Companhia Procópio Ferreira.
- Delicadeza – 1933 – Companhia Procópio Ferreira.
- A mulher que se vendeu - L Navarro e A Torrado - 1937
- Veneno de cobra – 1945 – Circo Teatro Mazzaropi;
- Acontece que eu sou baiano – 1947 – Circo Teatro Piolim.
- A felicidade pode esperar – 1949 – Circo Teatro Piolim.
- O grande marido – 1956 - Companhia Jayme Costa.
- O grande Alexandre – 1964 – Grupo Experimental Flamingo de Artes.
Nota - A peça "O grande marido" foi depois adaptada para o cinema, com o título de Um Marido Barra-Limpa, rodado em 1957 e que marcou a estreia do comediante Ronald Golias embora o seu lançamento só tenha ocorrido dez anos depois.

Fez também diversas traduções de peças de teatro, algumas já atrás mencionadas:
- O Direito de Nascer (radionovela cubana de Félix Caignet, 1951)
- A filhinha do papai - Serrano Anguita - 1933 – Companhia Procópio Ferreira;
- Uma conquista difícil - Raphael Lopes de Haro – 1943 – Companhia Procópio Ferreira; Cine Teatro Boa Vista.
- Tudo para você – Pedro Muñoz Seca; 1934 - Cia de Comédias Procópio Ferreira.
- Rainha de Thebas – Harry Paulton - 1934 – Companhia Procópio Ferreira.
- O amor envelheceu – S Suarez de Deza - 1934 - Companhia Procópio Ferreira.
- O dinheiro do leão – Carlos Arniches e Estremera – 1935 - Moderna Companhia de Comédia.
- Casado sem saber – A Vallescá - 1935 - Moderna Companhia de Comédia.
- Precisa-se de um filho – Antônio Paso - 1935 - Moderna Companhia de Comédia.
- Não sejas mentirosa – Frenc Molnár 1935 - Moderna Companhia de Comédia.
- Não me olhes assim - Muñoz Seca e Perez Fernandez - 1936 - Companhia de Comédias Procópio Ferreira.
- O automóvel do rei – Natanson e Orbok -1937 -Cia Cazarré Elza Delorges.
- Adeus nobreza – Jacinto Capela e Jos de Lucio - 1936 e 1945 - Companhia de Comédias Procópio Ferreira.
- Precisa-se de um pai - Muñoz Seca e Perez Fernandez - 1934 e 1945 - Companhia de Comédias Procópio Ferreira.

- O irmão do felizardo – Oscar Wilde - 1933 - Cia de Comédias Procópio Ferreira.



Cartaz da Peça de teatro “Veneno de Cobra” de Eurico Silva, obra de 1945. Contém a foto do autor autografada pelo próprio.
Notícia no jornal brasileiro “A Noite” (Rio de Janeiro) de 29 de Novembro de 1957.
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sexta-feira, 14 de setembro de 2018

Convento de Paderne (Melgaço) por volta de 1950 em filme


Este é um pequeno mas raro filme mudo cujas imagens foram recolhidas no convento de Paderne e imediações por volta de 1950. O mesmo foi realizado pelo grande artista melgacense Manuel Alves de San Payo (1892 – 1974) há cerca de 70 anos.
Contei com a ajuda do meu amigo João Paulo Rodrigues, ilustre natural e morador em Paderne, que me auxiliou na descrição do mesmo bem como na identificação de algumas das pessoas que aparecem no filme. Em relação à primeira parte do filme, o João Paulo conta-nos que “o padre que segue a cavalo ficou conhecido em Paderne como o Padre Amigo, o Sr. Prior de então, natural de Fiães e o sacristão era o meu avô, Manuel Joaquim da Costa, do Convento, que tinha combatido na I Grande Guerra, em França, nomeadamente na Batalha de La Lys”.
No filme, podemos ver um plano da Feira do Gado. João Paulo continua, referindo que a feira se fazia “na Corredoura. Mudou várias vezes de local e realizava-se todos os dias 3 e 18 de cada mês.”
Em relação das imagens do interior do claustro, João Paulo acrescenta que “o espaço encontra-se praticamente igual. Naquele tempo, havia uma ligação direta do Convento, coro, para a torre que estava em ruínas. Essa passagem com as obras, para as quais o meu padrinho foi contratado, foi tapada e ainda hoje está. Pelo que não há acesso do Convento para a torre. O acesso à torre dá-se por duas portas, uma que se segue à entrada da sacristia e outra que se situa no antigo parque infantil, feito no tempo do Padre Albertino.
Naquela época, a sacristia também não existia onde está hoje, estava no cemitério velho havendo fotos da época. A entrada da antiga sacristia encontra-se à esquerda da porta de entrada da Capela da Sra. do Rosário, onde dizem que foi a Igreja primitiva. Por causa das obras na torre, nesta época, por volta de 1948 – 1950, os sinos foram retirados da torre, e os cabeçalhos fixados em toros de madeira, num lugar que se chamava Pelinho, e que atualmente é ocupado pelo acrescento do cemitério velho.
O menino de boina que está a tocar os dois sinos é o meu padrinho, irmão da minha mãe, Henrique Costa. Também há outro menino junto que é o falecido pai da Idalina Gonçalves.
A última secção do filme mostra-nos o Compasso Pascal em Paderne na época. A respeito desta cena, o João Paulo refere que “não sei onde é a casa, mas nas escadas vejo o meu falecido tio Abel, que era morador no lugar do Pinheiro com uma menina ao colo.”
Veja e reveja estas raras imagens e viaje no tempo!…







Nota: Um grande obrigado ao João Paulo Rodrigues, padernense de gema, que me ajudou na descrição e interpretação deste vídeo bem como na identificação de algumas pessoas que nele aparecem.
Um outro grande obrigado à Catarina Malheiro pela permissão na divulgação do filme.

sexta-feira, 7 de setembro de 2018

A romaria da Nossa Senhora da Peneda há cem anos atrás


Romaria da Peneda em 1912


A romaria da Nossa Senhora da Peneda (Gavieira - A. de Valdevez) é uma das concorridas de todo o norte de Portugal e tem um caraterísticas singulares. Todos os anos, por esta altura, a esta romaria acorrem muitos melgacenses.
Há cerca de um século, em 1918, José Luíz de Caldas escrevia-nos sobre esta romaria na época:

A Senhora da Peneda

Antes que comecem as vindimas e desfolhadas – dois quadros cheios de luz e encanto da festejada vida campestre – é que passam bandos e bandos de romeiros de dez léguas em redor, a caminho da Peneda.
Num anceio confortável de devoção e regozijo – os traços mais característicos da alma popular – elles lá vão, quer entre os crepes immensos da noite, quer illuminados por pérolas de luar, para o local festivo, agreste, longinquo, que, embora rodeado por montanhas enormes e bruscas, ali arrasta innúmeros campesinos.
Formam-se os grupos. Recordam-se promessas. Rejubila o coração em impulsos d'uma alacridade louçã, virtuosa, querida. Juntam-se cachopas esbeltas com seus namorados. Prepara-se uma esturdia. E, por fim, lá seguem por caminhos invios e pedregosos, atravéz dos tufos rígidos de tojo e urze, em franca galhardia, com sacolas á cabeça e um sorriso nos lábios. São longas horas de inalterável folguedo, sempre abrilhantado affavelmente pelo som dos pandeiros e harmónicas, e pelo trovar metálico, suave, encantador, de raparigas garbosas com pernas roliças ao vento, que então suspira de volupia casta, e arrecadas sobre o peito – o altar mais divino, com o brilho do jaspe e o perfume do mangericão, dos seus conversados.
Soltam cantigas poéticas, admiráveis, lindíssimas, como esta:
Á Senhora da Peneda
Nos leva meigo luas,
Sendo o nosso pegureiro
Nos tempos do verbo amar.
De mistura com toda esta jovialidade alacre, como que espadanando-se em gaiatices e alegria santa, fervilha a devoção por essas veredas montanhosas. São pessoas que ali vão sem falla; outras sem comer nem beber; e ainda outras com velas de cera e valiosas promessas; enquanto lá muitos penitentes sobem a longa escadaria de joelhos ou dentro de caixões. É a fé arreigada do povo humilde a expandir-se sinceramente em manifestações comoventes.
Mas, por outro lado, o aspecto da romaria é deveras interessante e único, com varias patuscadas, as mais alegres travessuras, e as delicias ruidosas do vira e da caninha verde, ora entre amigas e conversados, ora com guapas hespanholas, que ali affluem.
A graça da vida aroal distribui por ali os seus melhores beijos, as suas mimosas caricias, a sua mais enternecida crença, o seu mais expansivo prazer. Parece até que um côro uníssono de vozes, quer ridentes e satisfeitas, quer sentimentaes e sinceras, se levanta para o Azul immenso, bemdizendo a ventura intima da vasta família campesina.
E, decorridos alguns dias de constante diversão amiga, elles lá voltam, com braçados de carqueja e cobertos de pó, para os seus lares tão simples, trocando os pandeiros pela enxada, mas sempre com um êxtase de satisfação bemdita a acalentar-lhes os peitos e um sorriso casto a reflorir momento a momento nas pétalas carminadas de garrulas moçoilas.”



In: Caldas, José Luiz de (1918). A Senhora da Peneda. In O. Xavier Cordeiro (dir.), Novo Almanach de Lembranças Luso-Brazileiro para o anno de 1919, (pp. 77-78). Lisboa: Parceria António Maria Pereira, Livraria Editora.