sexta-feira, 2 de novembro de 2018

Sobre uma célula comunista no Ribeiro (Castro Laboreiro) em tempos de repressão




Nos tempos da guerra civil espanhola e nos anos seguinte ao conflito, afluíram a terras de Castro Laboreiro, centenas de refugiados galegos e de outras regiões de Espanha. Alguns deles eram ativistas políticos anti-franquista pertencente a forças de esquerda como o Partido Comunista Espanhol e contam com a colaboração de operacionais de esquerda do lado de cá da fronteira, além do precioso encobrimento que a população castreja lhes deu. Inclusivamente se fala que no Ribeiro (Castro Laboreiro) chegou a existir uma célula ativa do Partido Comunista Espanhol.
Num trabalho de investigação publicado em 2007, Angel Rodriguez Gallardo fala-nos dessa realidadeNo fim da guerra civil, na Serra de Castro Laboreiro, o Partido Comunista Espanhol mantinha um ponto de apoio de entrada em território espanhol controlado por vários dos refugiados que ali operavam e que tinham  como base de operações as aldeias do Ribeiro de Baixo e Ribeiro de Cima (Castro Laboreiro), muito próximas das aldeias galegas de Pereira e Olelas, no concelho galego de Entrimo. Estes lugares eram na época habituais pontos de passagem duma secular rota de contrabando. O grupo de refugiados estabelecido nestas terras serranas diversificou durante vários anos as suas atividades, pois dedicaram-se não só a atividades políticas ou de guerrilha, mas também ao contrabando e à obtenção de documentação para conseguir que alguns desses refugiados saíssem de Portugal em direção ao México ou outros países da América Latina.
Em 1940, o Partido Comunista Espanhol conclui a montagem da sua estrutura no norte de Portugal, graças à presença de quadros enviados de países da América Latina. Em 5 de Março de 1941, aconteceu um episódio na cidade do Porto, em que um grupo de comunistas galegos e vários polícias portugueses se enfrentaram, de que resulta a morte de um legionário e um soldado da Guarda Fiscal e um agente da PVDE gravemente ferido. Se antes deste episódio, as autoridade portuguesas vinham intensificando o controlo sobre os refugiados galegos e outros espanhóis no norte de Portugal, a partir deste incidente recuou a disposição repressiva sobre essa comunidade de exilados, que terminou com várias detenções. Apesar de a partir de Julho de 1941, o Partido Comunista Espanhol continuará com o objetivo de manter uma estrutura sólida em Portugal, os erros de organização e as caídas de quadros em diferentes pontos da Península Ibérica acabarão destruindo essa possibilidade. Tudo isto num contexto de militantes sitiados em diferentes locais com deslocações ilegais e contínuas em penosas condições no meio de uma guerra mundial e dentro de um país que tinha uma ditadura pro-nazi.
Os grupos de refugiados e de guerrilheiros que utilizavam Portugal como lugar de proteção começaram a ter problemas com essa cada vez mais numeroza presença de forças policiais portuguesas pela área de fronteira, especialmente aqueles que permaneciam com contactos estáveis na zona de Montalegre, Chaves e Vila Verde de Raia.
O enfrentamento em setembro de 1945, entre membros do grupo de Demetrio Garcia Álvarez, O Pedro, e Juan Salgado Riveiro, O Juan, moradores de Oimbra – Verin, com apoios em Cambedo e no Barroso, quando tentavam praticar um assalto e foram supreendidos por uma patrulha da Guarda Civil, fez piorar a situação dos refugiados espanhóis em Portugal. A partir desse episódio, intensificou-se o efetivo de controlo sobre a fronteira, que culminou nesta região com o cerco a Cambedo, em que se aconteceram as mortes de Juan Salgado Rivero e Bernardino Garcia, e a detenção de Demetrio Garcia Alvarez, em 22 de dezembro de 1946. Foi esse o mesmo ano em que Manuel Perez Rodriguez, galego que tinha estado refugiado duas vezes no norte de Portugal, a segunda em Castro Laboreiro, regressou à sua aldeia natal depois de ser apanhado em 1944 no Ribeiro de Baixo e ser conduzido a Madrid por estar implicado num processo militar. Dez anos depois de começar a guerra civil espanhola, Manuel Pérez Rodriguez podia contemplar desde a sua casa natal a ressaca de anos de efervescência na raia castreja, com a paulatina desaparição dos grupos de refugiados instalados no norte de Portugal. Ainda hoje, aos seus noventa e quatro anos, pode continuar a olhar para a raia, o pedaço de brumosa raia, perguntando-se pelas razões pelas quais um homem como ele, um silencioso protagonista da História, havia de ser vítima de dois fenómenos repressivos peninsulares do século XX, transformando-se assim, como tantos outros, num galego em fuga de Franco e da Repressão, num galego vítima de Salazar."




Extraído de: GALLARDO, Angel Rodriguéz (2007) - Refuxiados e Fuxidos nos Montes de Laboreiro. Cuaderno Arraiano, Verão 2007.

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