Há cerca de 100 anos, para ir da vila de Melgaço para Castro Laboreiro, a viagem fazia-se por um antigo e tortuoso caminho que passava por Fiães e Alcobaça. A viagem fazia-se geralmente recorrendo a animais (mulas, burros ou cavalos) e levava de 6 a 8 horas dependendo da carga. O caminho não tinha condições para lá circular um dos raros automóveis que havia na terra. Na época, em 1920, tinha começado a ser publicado o jornal de Castro Laboreiro "A Neve" que se assumia como defensor dos castrejos e que dispunha a pugnar pelos interesses das gentes castrejas. Na sua edição de 20 de Novembro de 1920, encontramos um texto onde o autor chama à atenção da necessidade de se construir uma estrada que ligasse terras castrejas a Melgaço e que rompesse com o isolamento: "Visto
que de hoje para o futuro teremos um jornalzinho para lançar ao país
as nossas reclamações, principiemos. Precisamos de uma estrada. Já
tantas vezes a tem prometido sem cumprirem a sua promessa que, para o
futuro, duvidaremos de tudo mais, que nos prometam.
Agora
seremos nós a pedi-la. Demorará, bem sabemos, mas ao menos que os
nossos filhos tenham a satisfação de se aproveitar dela.
Que
vantagem não traria tanto a Castro Laboreiro, como às localidades
por onde passasse e mesmo a Melgaço essa estrada tão desejada?
Sabemos
que está em projeto e que os engenheiros já fizeram as devidas
marcações, mas sempre tudo como dantes!
Até
agora tem-nos saciado com promessas. Mas cá nos encontramos em
ocasião propícia, para lhe contarmos uma história. Os velhos
amigos estão ausentes sem bilhete de volta e os que cá ficaram
vendo a forma como isto corre, que devem fazer? Não saberei
responder a esta pergunta. Eles que o façam. Diremos mais: estamos
numa situação muito crítica.
O
comércio mudou aos artigos os preços que eles tinham. Na indústria,
a mão de obra encareceu pois os operários, não lhe chegando o
ordenado, tiveram que pedir o aumento do referido ordenado para o
equilibrarem com as assustadoras despesas.
O
agricultor por sua vez também tem que também ter que elevar os
preços aos seus géneros para justamente acompanhar a civilização
dos preços dos géneros. E até o Governo entre nesta onda de
doidice, pois promulga agora num dia uma imensidade de leis que no
dia seguinte revoga, para dali a dias tornarem a valer. A próxima
moeda, quem o diria, anda tão tolinha que ninguém a percebe! Daqui
a pouco tempo teremos de a reformar por ser incapaz de todo o
serviço. Não há nada que não endoidecesse.
Olhem
para o tempo! Às vezes, pensamos ter um dia de Verão e fazemos logo
os nossos projetos, logo ele se revolta e zás!, chuva, neve, vento,
trovoadas, etc. Olhando para isto como não há-de a vida estar mais
cara?! E esta gentinha que tudo compra e a quem faltam os recursos,
como há-de viver?
Precisa
comprar tudo a peso de ouro e às vezes nem assim se obtém. Como
fazer? Não o direi também. Adivinhem-no. Os preços qual balão com
vento favorável, sobem até desaparecer na obscuridade das nuvens,
sendo preciso um binóculo de longo alcance para os não perder de
vista.
Algumas
pessoas têm-se arriscado a ir no balão sem medo. Esses têm sido os
felizardos, pois têm tirado loucas vantagens ao passo que os que
esperam que o balão se incendeie, apenas vivem de esperanças como
os sebastianistas. Nós, o povo escravo de Castro Laboreiro, estamos
nas mesmas condições. As nossas esperanças são como as dos
sebastianistas.
Olhamos
para as casas, vemo-las com o mesmo colmo, alongamos a vista pela
montanha, aparecem-nos as mesmas fragas, os caminhos sempre os
mesmos! Mas voltemos ao assunto principal. Os caminhos estão velhos
e intransitáveis. Isto assim não pode continuar. Não deixemos que
nos esqueçam.
Gritemos
sempre bem alto, para que nos ouças os que estão lá no poder:
Queremos
uma estrada!
Queremos uma estrada!"
A estrada só chegaria a Castro Laboreiro mais de 25 anos depois...
Fonte: Jornal "A Neve", edição de 20 de Novembro de 1920.
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