«Castro Laboreiro, 6 de
Agosto de 1948
— Não, não terei a hipocrisia de dizer que seria aqui o meu
paraíso, aqui que não há papel, nem tinta, nem cinema, nem livrarias, nem
cafés, nem nenhum dos tóxicos de que necessito. O homem põe, mas a vida dispõe.
A cidade é como as prostitutas: o seu amor é falso, mas vence o de qualquer
mulher honrada. Agora que são estas pedras, estes gados, estas alturas que
vivem recalcadas no meu sangue, não há dúvida. (...)
Mal apanho uma aberta,
sou como um galgo pelos montes acima. Não posso dizer o que sinto, nem o que
procuro. Mas as pedras parecem-me fofas debaixo dos pés. A parte mais íntima de
mim encontra-se e expande-se. Citadino e perdido, sou na verdade uma montanha
comprimida.»
Miguel Torga, Diários IV
Miguel Torga, Diários IV
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