O Dr. Augusto César Esteves
é um dos melgacenses mais notáveis de todo o século XX. Deixou-nos um enorme
legado…
Faleceu na sua casa
da Rua da Calçada, pelas 18 horas do dia 26 de Março de 1964. E a 5 de Abril
desse mesmo ano, o jornal Notícias de
Melgaço, prestou-Ihe uma sentida homenagem, enchendo a 1ª página
com um arrebatado elogio fúnebre:
Sit Tibi Terra
Levis
Morreu Augusto
Esteves!
Silêncio!
Deixou de bater um grande
e generoso coração. Paralisou para sempre um cérebro em constante evolução; uma
inteligência penetrante e esclarecida, em plena pujança, ansiosa de perfeição. Ao
recordá-lo vivemos uma hora de amargo abatimento, de emoção e profunda
concentração. Melgacense fiel e companheiro de lutas dedicado, passou entre nós
como um raio de sol quente, acolhedor, leal, acariciador e benfazejo.
O seu olhar franco e
amigo espelhava o fogo interior dos seus nobres sentimentos, do seu entusiasmo
e desejo de servir a sua terra, que tanto amou e para a qual viveu. Servir
Melgaço sem limitações; servir com ânimo firme e de coração aberto a todas as
causas justas; servir por devoção e por idealismo a sagrada causa da democracia
e os grandes problemas em que se debate a humanidade.
Disse um dos grandes
do pensamento de todos tempos, Gabriel d' Anunzio, referindo-se à morte de
Wagner: O mundo perdendo Wagner ficou menor... E se é verdade que só os homens
de sensibilidade rara, se podem aperceber da perda que o mundo sofre com a
morte de um dos seus elementos mais representativos, também os melgacenses
devem sentir, amargamente, o que para Melgaço representa a morte de Augusto
Esteves, como político, como bairrista até à loucura, como funcionário, como
jornalista distinto, como polígrafo e historiador notável.
Na visita que lhe
fizemos há poucos dias, aparentemente o seu estado de saúde e a sua boa
disposição na animada conversa que entretivemos, não nos revelou nada de grave que
fizesse recear e prever o inesperado e chocante acontecimento da sua morte! Porém,
a vida é um estágio efémero dentro da transformação da matéria, c o vendaval da
morte não poupa ninguém, atinge os fracos e os fortes.
De compleição débil
no conspecto físico, a sua vida interior revelava-se por verdadeiros clarões de
entusiasmo e de acrisolado amor a tudo quanto de longe ou de perto está ligado
a Melgaço e para ele, o distrito, o país, o seu único mundo, confinava-se nos
limites estreitos desta terra melgacense.
Existir e transitar
no plano terreno é comum a todos os seres. Porém viver e conviver é mais
transcendente, é próprio dos seres humanos.
Augusto Esteves não
compreendia um homem só no seu mundo melgacense, alheado de tudo e de todos. E
sim um mundo só, um único mundo, de todo sós melgacenses.
No seu admirável
espírito iconológico o bairrismo cegava-o, ampliava desmesuradamente o valor e
a beleza dos monumentos e da história dos sucessos a eles ligada. Para ele tudo
era incomensuravelmente grande, enorme, ímpar, desde que tivesse existido, em qualquer
época, nesta sua amada terra.
A origem nativa era
tudo e só isto contava; o resto estava fora de um mundo que não era o seu ...
Amigo de há quase
meio século, o nosso coração veste de crepes nesta hora emocional e triste e os
nossos lábios ciciam, baixinho, a oração que espontânea e amarguradamente a
alma reza e a saudade dita.
Morreu Augusto
Esteves!
Morreu para a vida
mas a sua memória viverá na nossa recordação para lodo o sempre.
Desapareceu um
companheiro de lutas, um correligionário e um amigo lealíssimo que criou no
nosso coração fundas raízes de amizade e de estima; que se impôs pelo espírito,
pela austeridade, pela força e brilho do seu pensamento.
Melgacenses:
curvemo-nos respeitosamente perante o seu cadáver e elevemos a nossa alma em
sentida prece para
Que a terra lhe
seja leve!
Texto de Ferreira
da Silva,
in: Notícias de Melgaço, edição de 5 de Abril de 1964.
Este obituario é de antologia! Já ninguém escreve obituarios deste jaez! Obrigado, Valter, por esta partilha!
ResponderEliminarObrigado pelo seu comentário! A pessoa, que não conheci, pela obra legada ao nível da História local, entre outras tarefas nobres em benefício da sua terra, mereceu-o bem!
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