O santuário da Nossa Senhora da Peneda localiza-se na freguesia de Gavieira, em terras de Arcos de Valdevez. O culto à Senhora da Peneda
tem origem numa lenda de uma aparição de Nossa Senhora a uma menina
que guardava o gado naquele local que terá ocorrido há cerca de 800
anos. A dita lenda é-nos contada num livro publicado há mais de 300
anos, onde o autor também nos fornece alguns pormenores interessantes acerca de
como seria aquele lugar na época.
No dito livro, “Santuário
Mariano”, da autoria de Frei Agostinho de Santa Maria, podemos ler:
"Na Província de Entre Douro e Minho, para a parte da Galiza,
fica o Concelho do Soajo na Comarca de Valença, cinco légoas de
Ponte de Lima para o Nascente, terra tão fragosa, e de tão ásperas
montanhas e rochedos, que vivem ali os homens, pelo inculto e
inacessível de seus penhascos, como gente levantada, e assim são
poucos os tributos, que pagam, fiados no forte e seguro de sua
habitação, isenta de que lhos vão a pedir, e somente pagam a El
Rey cinco cães sabujos. Neste Concelho, está uma freguesia, ou
lugar a que chamam São Salvador de Gavieyra. Entre este lugar, e o
de Crasto, fica uma montanha altíssima (distante cinco légoas do
Soajo) de penedos muyto grandes, à vista soltos, e mal arrumados,
entre elles se vêm três, que entre si formam uma lapa; porque estão
dois divididos e em cima deles outro atravessado, de tamanha
grandeza, que he visto em distância de huma légoa. Neste sítio
apareceu a milagrosa imagem da Senhora da Peneda, ou das Neves, cujo
antigo aparecimento se refere nesta forma.
Em cinco de Agosto do anno de
1220, pouco mais ou menos, que é o tempo em que parece, somente se
pode chegar àquele sítio, pelas neves de que está coberto a mayor
parte do anno, pastoreava por entre aquellas penedias huma serraninha
algumas cabras, quando em cinco do mesmo mês lhe apareceu a Senhora,
e dizem que fora em forma de huma pomba branca voando ao redor della,
e que lhe mandara que dissesse aos do seu lugar da Gavieyra, lhe
edificassem naquelle lugar uma ermida.
Referiu a pastorinha a seus
pais, a embaixada da Senhora. Mas sem efeito, porque lhe não deram
deram crédito. Em outro dia, voltando a pastorinha com as suas
cabras por aquella mesma paragem, lhe tornou a apparecer a mesma
Senhora em a sua lapa , não como na primeyra vez, em forma de pomba,
(como ella referia) mas na mesma
forma em que hoje se vê e lhe
disse:
- Filha, já que te não
querem dar crédito ao que eu mando, vai ao lugar de Rouças (que
fica na mesma Freguesia de Gavieyra, e no mesmo termo do Concelho do
Soajo, aonde está huma mulher entrevada há dezoyto annos, diz aos
moradores do lugar que a tragam à minha presença, para que nela
cobre perfeyta saúde, e assim te darão crédito ao que eu te
ordeno.
Fê-lo assim a venturosa
pastorinha, e trouxeram a mulher, que se chamava Domingas Gregório.
Tanto que ella chegou à vista daquela Sagrada Imagem da Rainha dos
Anjos, logo alcançou huma perfeyta saúde, e ficou livre, e sã de
todos os achaques que padecia, louvando a Virgem Senhora pelo
singular beneficio, que lhe havia feito.
À vista deste grande milagre
se comoveram todos, e
acesos na devoção da
soberana Rainha da glória, deram logo ordem a lhe edificar a Casa,
como a Senhora pedia. Ma s como o sítio da lapa não era capaz, ao
que lhe parecia, se resolveram a fundá-la em outro, que pareceu mais
acomodado em distância de dois tiros de mosquete, junto a huma
ribeyra, que se vay meter no rio Lima. Mas a Senhora, que havia
escolhido aquella lapa, para se manifestar nella, e para theatro das
suas maravilhas, quis que junto à mesma lapa se lhe erigisse a sua
igreja; porque não quis estar naquella que se lhe começava a
edificar junto à ribeyra. E como por várias vezes desaparecesse e
fosse achada sempre no primeyro lugar de sua manifestação, se
resolveram a desistir de todo da obra, em o sítio da ribeyra e que a
igreja se fizesse aonde a Senhora mostrava que a queria, pois ella
era, a que havia de vencer as dificuldades, que se reconheciam em
aquele monte. E assim em pouco distância da lapa, se fez sítio
capaz, aonde se pudesse edificar uma fermosa igreja, como se fez,
capaz de recolher em si mais de trezentas pessoas, com sua Capella
mor.
Acabada a igreja, se lhe fez
hum excelente retábulo muyto bem dourado e para isto tudo acudiu a
divina providência, porque com as suas esmolas que os fiéis davam
para a obra da Senhora, se tornou a igreja de sorte, que está com
muito asseio e perfeição.
Outra tradição refere o
Padre António Carvalho da Costa na sua Corografia e idz que a
descubrira um criminoso, natural de Ponte de Lima, que acossado da
justiça, passava miserável vida entre aquelles solitários bosques
e rochedos, servindo-lhe as feras de companhia. E nestes termos, bem
se pode presumir que passava a sua vida muyto triste e desconsolado e
como a vexação abre o entendimento reconhecendo a sua culpa,
recorreria a Deus, pedindo-lhe perdão da sua culpa, interpondo o
favor e o patrocínio daquela Senhora que nunca desampara aos
pecadores e que sempre roga e intercede por elles. E faria estas suas
súplicas com tanta dor e lágrimas que mereceu com ellas que a
Senhora lhe aparecesse e o confortasse. Ele seria o primeyro que a
viu depois de muitos annos, que alli a teriam ocultado dos christãos;
senam é que os mesmos anjos a formaram, dispondo-o assim Deus, para
consolação e remédio daquellas gentes.
A imagem da Senhora é tão
pequenina que não passa de um palmo de altura e daqui se pode
entender que nem os homens a obraram nem em aquelle solitário sítio
a esconderam. Mas que foi formada pelos anjos, para acudir a remediar
aos pecadores. É formada em pedra e tem em seus braços ao doce
fruto do seu ventre. E porque se não atreveram a mandá-la pintar,
(nem era razão que as mãos dos homens a tocassem) lhe vestem umas
roupinhas ao estilo antigo, que a cobrem toda e se lhe não vê mais
que o rosto que é muito lindo e muyto agradável. A cor é
trigueira, em que se mostra muita antiguidade. Está em um nicho no
meyo do altar mor, sobre uma peanha. E melhor fora que estivesse em
um precioso sacrário, fechado com vidraças, por onde pudesse ser
melhor vista e assim estaria com mais veneração e respeito.
Os milagres que obra são
inumeráveis e à mesma medida é o número de dovotos e romeyros,
que concorrem à sua Casa no verão, que, como no inverno é aquelle
distrito mutyo frio e agreste, não é possível então lá ir.
Começam as festas da Senhora
em cinco de Agosto, dia próprio seu e dia em que se manifestou (Como
fica dito). Em dia de S. Lourenço, concorre muyta gente da Galiza e
de outras muytas partes; porque já o verão dá lugar, para se
acomodarem por entre aquelles matos e rochedos, que naquelle tempo
são bem vistosos e alegres, pels muytas fontes que nascem entre
elles. Todo o povoado lhe fica muyto distante e o que está mais
perto, é a freguesia de Gavieyra, a que a Casa da Senhora é anexa,
que lhe fica em distância de uma légoa.
Nas costas da Capella mor
desta igreja da Senhora, se vê um grande castanheiro e junto às
portas da igreja um fermoso freixo: estas duas árvores, que são de
estranha grandeza, afirmam terem mais de trezentos annos. Ambas
formam um fermoso docel, como mostrando a grande veneração que se
deve ter àquella Santa Casa da Senhora. Acima da igreja, em
distância de um tiro de pedra, nasce uma fonte de excellente água,
que faz aquelle sítio mais agradável e apetecido. Também se
conserva a lapa, em que a Senhora apareceu e do penedo de cima se vê,
estarem caindo umas gotas de água como lágrimas e se tem por
maravilha da Senhora, o serem contínuas e permanentes, maiormente
ficando tão levantado e afastado da terra. Estas gotas de água, que
aquella pedra destila, recolhem os romeyros com os lenços e com ella
se ungem em as partes em que padecem as queixas e pela intercessão
da Senhora, se vêm livres de todas."
Extraído de: SANTA MARIA, Frei Agostinho (1712) - Santuário Mariano e História das Imagens Milgrosas de Nossa Senhora. Tomo IV. Officina de António Pedroso Galram, Lisboa.
Magnífica a manifestação de Nossa Senhora.
ResponderEliminarNossa Senhora das Neves abençoe a todos.
Amém
Fiu lá em criança, era lindo, mas muito simples, dormimos no chao.
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