No lugar da Cela, na freguesia melgacense de São Tomé de Cousso, existe, desde há quase três séculos, uma ermida. Os moradores do lugar deram início ao processo da sua construção no ano de 1746 quando pediram licença à Arquidiocese de Braga para a construção de raiz de uma capela com a invocação de Nossa Senhor da Boa Morte. Todo o processo durou cerca de catorze anos, apenas se tendo concluído em Março de 1760.
Fomos investigar o arquivo da Arquidiocese de Braga e encontramos os documentos da sua fundação. Nesses manuscritos entendemos as razões pelas quais os habitantes da Cela nessa época tanto queriam construir uma capela no seu lugar. Assim, todo o processo se inicia num documento datado de 2 de Outubro de 1746 que tem o título “Registo de Provisão para se erigir de novo a capella de Nossa Senhora da Boa Morte no sítio do lugar de Sella, freguezia de São Thomé de Cousso, comarca de Valença na forma que nella se declara”. No mesmo documento, se diz que o lugar da Cella tinha, nesse ano, vinte e quatro moradores (entenda-se, fogos ou agregados familiares) e que queriam ter uma capela no seu próprio lugar porque, para irem à missa, a igreja de Cousso ficava-lhes longe e o caminho, no Inverno, era muito difícil e, com frequência, se cobria de neve. Referem também que, na estação invernal, os velhinhos e os enfermos ficavam, muito frequentemente sem ir à missa. Torna-se, por isso muito interessante dar uma leitura nos manuscritos referentes à fundação da capela e tentarmos compreender as motivações dos moradores na época. No documento pode ler-se que “Dizem os moradores do lugar de Sella, freguezia de São Thomé de Cousso, comarca de Valença que elles supplicantes têm summo desejo de fazer huma capella no dito lugar de invocação da Senhora da Boa Morte em razão de ficarem distantes da Igreja meya légoa toda de caminho fragoso e dezamparado. Dizem que de inverno fica munta gente sem missa e outra vay ouvilla às freguezias vizinhas como também por ser munto conveniente para della se administrar o sagrado Sacrifício aos doentes e velhos que pela sua idade e distância de caminho não podem hir à igreja e lhes querem fazer fábrica com as obrigasoens necessárias pois são vinte e quatro moradores todos abonados de benz por circunstâncias que as fazem dignos dessa mercê a vossa alteza se digne conceder-lhe licença para de novo erigirem a capella no lugar donde moram não prejudicando os direitos parochiais (...) Informa o próprio parocho debaixo de juramento do número de moradores que tem o lugar em que se pretende edificar a capella da distância que he delle à Igreja Parochial (...) Braga dous de Outubro de mil e sette centos e quarenta e seis. José Arcebispo Primaz Sereníssimo Senhor...”
O pároco de Cousso transmite ao Arcebispo de Braga o seguinte: “Informo Vossa Alteza que Deus guarde em como o lugar da Sella desta minha freguezia consta de vinte e quatro moradores e dista da Igreja Parochial quaze meia légoa de caminho áspero de serras e montes que muntas vezes se cobrem de neves. A capella que se pretende erigir de Nossa Senhora da Boa Morte é munto necessária para a administração dos sacramentos e o sítio he munto acomodado para ella no princípio do mesmo lugar (...) os moradores com grande zelo requerem abrigar a fábrica della e tudo o que for mais necessário. É o que posso informar a vossa alteza (...) dezasseis de Dezembro de mil e settecentos e quarenta e seis. (...)
Para se pedir licença para a construção de uma capela era preciso hipotecar um conjunto de bens que ficariam vinculados à fábrica da mesma. Então, diz-no o manuscrito que "Juntão os supplicantes moradores de Sella freguesia de São Thomé de Cousso nova escritura (...) com bens livres e estáveis para a fábrica da nova capella. Pedem a vossa mercê seja servido (..) a licença para a sua fábrica: “Em Nome de Deus amén. Saibam quantos este público instrumento de escritura da fábrica da capella da Nossa Senhora da Boa Morte (...) no aano de nascimento do Nosso Senhor Jesus Christo de mil e settecentos e sinquenta e nove annoa aos quinze dias do mês de Agosto do ditto anno neste lugar da Sella freguezia de São Thomé de Cousso e mosteiro de São Salvador de Paderne, termo da villa de Valladares aonde eu tabelião e testemunhas adiante nomeadas no fim destas assinadas apparecerão prezentes outorgantes João Rodrigues e sua mulher Anna Rodrigues e Fracisca Fernandes viúva e Manoel Domingues, viúvo, Alexandre Gregório e sua mulher Thereza Rodrigues e Manoel Alvarez e sua mulher Isabel Alvarez, Veríssimo Fernandes e sua mulher, Rosa Guimarães, Isabel Alvarez, solteira, António Domingues solteiro, Pedro Domingues e sua mulher Isabel Domingues, António Domingues e sua mulher Maria Alvarez, Brás Rodrigues viúvo, Pedro Gonçalves solteiro, Maria Gonçalves solteira, Manoel Gonçalves solteiro e Manoel Lourenço e sua mulher Isabel Fernandes, Manoel Domingues e sua mulher Anna Fernandes, Veríssimo Gregório solteiro, Augusto Domingues, Brízida Fernandes viúva, Manoel Fernandes e sua mulher Joanna Fernandes, João Rodrigues viúvo, todos moradores no lugar da Sella todos desta freguezia de São Thomé de Cousso do mosteiro do Salvador de Paderne, termo da villa de Valladares, comarca de Valença do Minho e Arcebispado de Braga, pessoas de mim, tabelião, conhecidas (...) para nella [capela] se celebrarem os Santos Sacrifícios da Divinos da Missa para que os outorgantes se obrigarão por escritura pública que por si e seus sucessores do mesmo lugar da Sella fabricarem, ornarem e terem sempre a dita capella findo os requerimentos (...) por este público instrumento hypotecavão a sua lavrada delles moradores chamado o Val da Gandaninha sito no ditto lugar da Sella, parte do nascente com monte de valdio e do poente com couttada de veríssimo Fernandes e Manoel Domingues, bem construído que rende por anno de matto melhor de seis mil réis além dos muntos pastos que produz a qual levam de semiadura melhor que oitto alqueires de centeyo a qual se obrigão por si e seus sucessores a não venderem, alterarem, trocar, transportar mas estar sempre (...) para fábrica da ditta capela que tem o título da invocação da Senhora da Boa Morte pondo-se um producto em guarda (..) para sempre...”
Os bens indicados pelos moradores da Cela para dotarem a fábrica da futura capela foram analisados pela Arquidiocese de Braga e esta acrescenta que “...atenta a informação do Reverendo Pachoro e mais deligências feitas sobre os bens dotados para a fábrica não se me appras dúvida que o munto Reverendo Senhor Doutor Provisor defira ao requerimento dos supplicantes (...) aos vinte e dous de Fevereiro de mil e sette centos e sesenta. Passe licença, Braga outo de Março de mil sette centos e sesenta.”
Acrescenta-se ainda no documento da licença que “...para que no ditto sítio possão erigir de novo a dita capella a qual se fará com toda a dessência e perfeição devida de sorte que fique separada de cazas e (...) com a porta principal sem janella friesta ou tribuna para caza (...) particular e sem prejuízo dos direitos parochiais (...) em Braga sob o sello desta Corte aos treze de março de mil e sette centos e sessenta...”
Na atualidade, a capela apresenta uma planta retangular, tendo adossado à fachada lateral esquerda pequena sacristia. Os volumes são escalonados com coberturas diferenciadas em telhados de duas águas, rematadas em beirada simples. As fachadas são construídas em cantaria de granito de aparelho irregular, com os cunhais firmados por pináculos, a principal virada a poente, terminada em empena, encimada por sineira e rasgada por portal de verga reta, entre dois janelos e encimado por óculo.
Na atualidade, a capela apresenta uma planta retangular, tendo adossado à fachada lateral esquerda pequena sacristia. Os volumes são escalonados com coberturas diferenciadas em telhados de duas águas, rematadas em beirada simples. As fachadas são construídas em cantaria de granito de aparelho irregular, com os cunhais firmados por pináculos, a principal virada a poente, terminada em empena, encimada por sineira e rasgada por portal de verga reta, entre dois janelos e encimado por óculo.
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