quinta-feira, 28 de novembro de 2013

A Igreja de Santa Maria da Porta (vila de Melgaço): referências históricas e caraterísticas arquitetónicas


Segundo Bernardo Pintor a Igreja de Santa Maria da Porta “existia nos fins do século XII, e já seria antiga. Foi então que se construiu outra, se não foi que se reconstruiu a que já havia, para comportar a população da nova vila” (Pintor, 2005).
O mesmo investigador refere um acordo datado de 30 de Junho de 1183 entre, D. Martinho, abade do Mosteiro de Fiães e o concelho de Melgaço, pelo qual “o mosteiro tomava conta da igreja de Santa Maria de Melgaço durante 15 anos para a reparar e depois ficaria sendo metade do concelho e metade do mosteiro mas sempre indivisa e administrada pelo mosteiro” (idem, ibidem). Este acordo foi renovado em 30 de Junho de 1185 “e poderá ter sido motivado pela mudança do D. Abade de Fiães” (idem, ibidem).
“Passados mais 2 anos, a 1 de Abril de 1187, novo acordo desta vez com o arcediago de Valadares D. Garcia e «todos os moradores de Melgaço, tanto homens como mulheres», em concessão ao referido arcediago sobre a igreja de Santa Maria com a condição de a restaurar e edificar com a ajuda deles proporcionando-lhe materiais até que ficasse acabada e pronta. Depois ficaria o arcediago com uma terça parte para si e seus herdeiros, e eles com duas terças, continuando indivisa e em boa concórdia” (idem, ibidem).
“A 13 de Abril foi outorgado novo acordo relativo à Igreja de Melgaço, desta vez entre o arcediago de Valadares D. Garcia Nunes e seu protegido André Garcia com o mosteiro de Fiães de que era abade D. Domingos. O referido André Garcia devia ter em seu poder a «igreja de Melgaço que está edificada junto à porta da mesma vila» mas sob a tutela do dito arcediago em sua vida. Após a morte do arcediago conservá-la-ia em sua vida mas por alma dele daria todos os anos no dia da Ceia do Senhor (5ª feira santa) oito soldos para o refeitório do mosteiro. Por morte de André Garcia ficava a igreja de Melgaço em propriedade do mosteiro. Este documento é assinado pelo beneficiado André Garcia juntamente com o concelho de Melgaço” (idem, ibidem).
Pela relação das igrejas do bispado de Tui elaborada em 1259 e publicada no estudo de Avelino de Jesus da Costa, fica-se a saber que Santa Maria da Porta era ‘tres quartas regis’, ou seja pertencia em 75% ao Rei (Costa, 1981).
“Em 1320, o Papa concedeu ao rei D. Dinis durante três anos a décima parte das rendas eclesiásticas para a guerra contra os mouros. Fez-se uma estimativa geral dos rendimentos das igrejas de todo o reino. Nesse rol aparece-nos Santa Maria da Porta taxada em 110 libras” (Pintor, 2005).
Pelo Igrejário de D. Diogo de Sousa, (1505 a 1532), Santa Maria da Porta era “metade do mosteiro de Fiães e metade do concelho” (idem, ibidem),
O memorial “feito em tempo de Dom Manoel de Sousa (1545-1549) por Rui Fagundes, vigário da comarca de Valença” (Costa, 1981), alude à Igreja de Santa Maria da Porta como pertencente à terra de Melgaço encontrando-se anexa à de ‘Santa Maria do Campo’ (idem, ibidem). Esta igreja foi extinta em Dezembro de 1564 pelo arcebispo Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, incorporada na Misericórdia de Melgaço e os ‘seus fregueses’ ficaram abrangidos pela igreja de Santa Maria da Porta. Esta pertencia “em metade ao Mosteiro de Fiães e em outra metade ao conselho de Melgaço, sendo de apresentação do duque” (idem, ibidem).
Em 1758, o ‘Inquérito’ pombalino revela que o pároco da igreja de Santa Maria da Porta era de “aprezentação por alternativa da Mitra e padroado da Sereníssima Caza de Bragança’ e tem de renda coatro centos mil réis” (IANTT, 1758).
A Igreja de Santa Maria da Porta desenvolve-se longitudinalmente em nave e capela-mor rectangulares, tendo adossados dois corpos do lado sul, um anexo à capela-mor servindo de sacristia e outro anexo à nave. No lado norte da nave existe um outro corpo alojando capela lateral. Coberturas diferenciadas a duas e três águas.
É construída em cantaria e alvenaria autoportante de granito, aparente, de aparelho regular e irregular.
A frontaria, orientada a poente, apresenta pequena escada (de faces laterais convexas) e patamar a preceder o portal encimado por óculo circular e remate por cimalha angular com cruz no vértice e pináculos boleados nas extremidades laterais. Diferenças no aparelho denunciam, por exemplo, a elevação da cobertura relativamente ao templo original.
Apesar da remodelação a que foi sujeita no séc. XVIII, subsistem alguns elementos românicos. É disso exemplo, o portal axial que apresenta duas arquivoltas em arco pleno reentrantes, uma lisa e outra decorada com enxadrezado, envolvidas por arco com meias esferas, também pleno. Assentam em impostas corridas suportadas por colunas com capitéis vegetalistas. O tímpano é liso, o que não acontece com o do portal do lado norte, insculturado com uma figura de animal que tem tido várias identificações: ‘lobo’ (Santos, 1955), ‘feroz canídio de guarda’ (Almeida, 1986), ‘leão’ (Alves, 1987) ou “um daqueles compósitos animais medievos” (Saramago, s/d) Para  Carlos Alberto Ferreira de Almeida ao esculpirem-se animais ferozes  nos  portais das igrejas românicas procurava-se 'afugentar o temor dos espíritos que vinham do Norte, com o frio e a noite, fenómeno este também averiguado em algumas zonas de França.' (Almeida, 1971) A envolver o tímpano, este portal apresenta arco ligeiramente quebrado, de aduelas chanfradas e insculturadas com linhas onduladas, assente em impostas de perfil convexo sobre pés-direitos.
As fachadas nascente, da nave e a da capela-mor, também evidenciam no aparelho as alterações decorrentes das referidas obras.
A torre, adossada a sul, subdividida em dois registos por cornija, contempla fresta rectangular no inferior e campanário de quatro sineiras no superior, rematado por coruchéu piramidal coroado por cruz latina e envolto por pináculos esferoidais.
No interior, na capela do lado da Epístola, encontra-se um retábulo barroco envolvendo tela e escultura de Cristo, constituído por três arquivoltas arrancando de impostas suportadas por colunas pseudo-salomónicas. A decoração exubera-se em folhas de acanto e parras. Os retábulos da capela-mor e da capela do lado do Evangelho são de concepção influenciada pelo Maneirismo, estando subdivididos em nichos. Os da capela do lado do Evangelho encerram tábuas quinhentistas atribuídas por Vítor Serrão a António Figueiroa (Serrão, 1998).


Extraído de: www.acer-pt.org (Antero Leite/Susana Ferraz, 2007)
Outras fontes:
ALMEIDA, Carlos Alberto Ferreira de - Primeiras impressões sobre a Arquitectura Românica Portuguesa, in 'Revista da Faculdade de Letras-Série História', I série. vol. II, Faculdade de Letras da Universidade do Porto, 1971, pp. 65-116.
ALMEIDA, Carlos Alberto Ferreira de - O Românico, in ‘História da Arte em Portugal', Ed. Publicações Alfa, Lisboa, 1986, Vol. 3.
ALVES, Lourenço - Arquitectura Religiosa do Alto Minho. I - Igrejas e Capelas do séc. XII ao séc. XVII, Viana do Castelo, 1987.
CAPELA, J. Viriato (Coord.) - As Freguesias do Concelho de Melgaço nas «Memórias Paroquiais» de 1758. Alto Minho: Memória, História e Património, Ed. C. M. de Melgaço, Melgaço, 2005.
COSTA, Avelino de Jesus da - A Comarca Eclesiástica de Valença do Minho (Antecedente da Diocese de Viana), in Separata do 1º Colóquio Galaico Minhoto, Associação Cultural Galaico-Minhota, Ponte de Lima, 1981, Vol. 1, p. 69-235.
PINTOR, P.e Bernardo - Mosteiro de S. Salvador de Paderne (Alto Minho), in Revista ‘Theologica', Braga, 1957, reed. in PINTOR, P.e Bernardo - ‘Melgaço Medieval. Obra Histórica', Ed. Rotary Club de Monção, Monção, 2005, Vol. 1, p. 25-36.
SANTOS, Reinaldo dos - O Românico em Portugal, Editorial Sul, Lisboa, 1955.
SARAMAGO, José - Viagem a Portugal, Ed. Caminho, Lisboa, s/d.

SERRÃO, Vítor - André de Padilha e a Pintura Quinhentista entre o Minho e a Galiza, Ed. Estampa, Lisboa, 1998.

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