sábado, 25 de junho de 2022

A instituição da capela de S. Miguel, na Quinta do Reguengo (1681)


 

O capitão Agostinho Soares de Castro, que era cavaleiro professo na Ordem de Cristo e “capitão de cavalos e coirassos”, foi o primeiro Senhor da Quinta do Reguengo, situada, à época, na Juradia da Várzea, termo de Melgaço, depois de a ter comprado à Santa Casa da Misericórdia de Melgaço em 1675. 

Por seu pai, Miguel de Castro Soares Azevedo, primeiro senhor da Casa da Granja, sita junto da Ponte da Folia, na freguesia de Remoães, e provedor da Santa Casa da Misericórdia da vila de Melgaço em 1629, descendia dos nobres Castros, alcaides-mores de Melgaço, desde que em tal cargo D. João I investiu Diogo Gonçalves de Castro. 

O capitão Agostinho de Castro era neto de Tristão de Castro Azevedo, abade da freguesia de Rouças, tendo sido também provedor da Santa Casa da Misericórdia de Melgaço em 1591, ano em que deu a avultada esmola de quatro mil réis para a pintura de retábulo da igreja da confraria melgacense. 

Foi depois da compra da quinta à Misericórdia melgacense que o capitão Agostinho Soares de Castro mandou construir este bonito solar que ainda hoje podemos contemplar. 

Este mesmo capitão Agostinho de Castro é o responsável pela construção de uma capela sita nesta quinta e dedicada ao anjo S. Miguel. A sua devoção seria tão grande que em 11 de Outubro de 1681 lhe instituiu uma capela, cuja escritura diz o seguinte: “Instituição de doaçam e obrigaçam de capella que fez frei Agostinho Soares de Castro, Capitam de Cavallos e courassas entretenido, Cavalleiro professo da hordem de Cristo e sua mulher Donna Constança de Abreu e Ssa Soto Mayor moradores na sua quinta de Barzea deste termo. 

Saibam (...) que no ano de 1681, aos 11 de outubro, dentro das casas da quinta do Reguengo, presentes aquelles, moradores na dita quinta de Barzea, disseram: que elles tinham feito huma ermida junto das ditas suas casas da quinta do Reguengo ahonde tinhão per Imbocassam a Imagem de São Miguel o Anjo de quem heram devottos e que pera efeito de se dizer missa nella todos os dias santos e annos no dia da dita imbocassam ao dito santo São Miguel o Anjo em todo o tempo do mundo lhe quirião hipotecar como de feito hipotecavão em especial pera satisfação do dito encarguo e fabrica da dita Irmida disserão que elles empunhão e hipotecavão e doavão doje pera todo sempre o seu Campo e Vinha e monte que elles tinhão e pessuhião asim como o comprarão a Anna Velha e asim como tudo estava demarcado e devizado e cerrado ao redor sitto tudo na Juradia de Barzea junto da dita quinta do Reguengo asim como tudo parte do nascente com caminho publico da ponte follia e corgua que vaj por entre as ditas terras e campos da dita sua quinta e do poente com terras do Capitão Francisco Pereira do Lago e terras delles doadores e com quem mais direitamente deva e haja de partir e o Campo e monte levara de semeadura dez alqueijres de sentejo e a vinha serão sinco cavaduras tudo pouco mais ou menos e todas eram terras dizimas a Deus e vallião trezentos mil reis conforme foram avaliadas por louvados e rendirião cada hum anno dez mil reis forros e livres dos grangeos. ” Para tal, estabeleciam e davam “...pera o dito encargo da dita capella e fabrica da dita irmida o dito seu Campo e Vinha e Monte pera dos rendimentos em todo o tempo do mundo se satisfazer o dito leguado asima decllarado e a fabrica da dita irmida as coais propriedades se não vendiriam nem obrigariam por modo algum sem irem com o encarguo asima declarado e pera tudo comprir e goardar obrigavão suas pesoas e benz moveis e de raiz ávidos e por aver e ha em tempo algum ir contra esta instituição, doação e obrigaçam

A capela é descrita pelo Prior de Paderne em 1758 com estes termos: ...tem mais o mesmo lugar na Quinta do Reguengo huma capella pegada às Cazas da Quinta com o título de S. Miguel, na qual está um altar com três imagens, huma de S. Miguel, outra de S. Gregório e outra de S. Caetano...".

domingo, 19 de junho de 2022

A Quinta do Reguengo (Melgaço) há cerca de 400 anos


 

A Quinta do Reguengo assim se chama devido ao facto de ser, em tempos antigos, uma propriedade do rei, situação já expressa no foral de D. Manuel I de 1513 passado a Melgaço. 

Esta quinta, antes chamada como "quinta da Várzea", era uma propriedade de terreno fértil e foi administrada durante várias gerações da família fidalga dos Castros de Melgaço. 

Em 24 de Março de 1606, Inácio Velho de Araújo, um homem de negócios melgacense regressado da Índia, onde tinha amealhado considerável fortuna, comprou esta quinta, tendo-a deixado em testamento à Santa Casa da Misericórdia de Melgaço.

Para conhecermos um pouco como era a Quinta do Reguengo há cerca de 400 anos, podemos ler uma escritura de medição e delimitação elaborada no início do século XVII, e que aqui partilhámos o seu teor: 

“A quinta de Varzea freguesia do mosteiro de Paderne e que possui Fernam de Crasto por Prazo de foro fatiozim 

— Demarcação —  

Comesa a demarcasão da dita quinta junto das Cazas do lugar de Vale que he de paderne na Cangosta e Entrada do Caminho que vai para a dita quinta e daly vai partindo para o nassente pello dito Caminho que vai do dito lugar do Valle para Melgaço e faz volta onde se toma o Caminho que vai para a quinta da Torre que he do mosteiro de paderne e vai partindo pello dito Caminho para Melgaso indireitando-se mais para o nasente athe hir dar na Estrada que vem de Monsão para Melgaso e daly partindo contra o sul athe hir dar no Caminho rial (?) do Ribeiro do Forno que atravesa a dita estrada e ahi deixa a Estrada e faz volta contra o poente ao lado da Corga e agoa athe a vinha de Rui Gonsalves certar que he de Paderne ficando fora da dita agoa e Ribeiro hua cham da dita quintã que se chama do forno que adiante se declarara e vai partindo por Ribeiro e Corga abaixo pella dita vinha e por Campo que esta abaixo della que também he de Paderne athe intestar em outro que se chama do Campo do Souto e então deixa a dita agoa e Corga e vai partindo e endireitando-se mais contra o norte partindo com o dito campo do Souto que he de Paderne e o pesohe [possui] o dito Fernão de Castro com a dita quinta athe entrar ao Caminho que bem do dito lugar do Vale para Melgaso e fas volta contra a dita quinta e cazas ao longo do Caminho athe hir dar no canto da Congosta servinthia da dita quinta donde começou. 

— Dentro da dita demarcação fiquão as cazas e azenha da dita quinta que são húa caza terrea e outra caza acostada a elle ambas sobradadas e telhadas com sua escada de pedra por fim com suas cortes, palheiros, eira e um llaranjal grande diante das ditas cazas e por [ilegíveis duas palavras] eira que he da banda do nascente e detrás das ditas casas tinhão pomar que dizem ser dizimo a deus como o assento da caza e parte do llaranjal e tem vinha com Pombal de carenta cavaduras e terra lavradia que serão quarenta Alqueires de semeadura. E mais o dito Campo do forno que fora fica da dita demarcasam ao llongo do caminho e estrada que vem de Monsão para Melgaço e parte com ella do nascente e do poente com a vinha de Rui Gonsalves prezente que he de Paderne e do norte com o Ribeiro de Corrego que o aparta do mais Reguengo da quintta e do sul com a mesma estrada para onde fas huma ponta athe pequeno ... [palavra ilegível, papel rasgado] que tem todo de comprido do nascente ao poente pella Banda do norte junto ao Ribeiro setenta varas e meia e em outro comprimento ao longo da estrada setenta e húa varas e meia de largo pella banda do poente sesenta e húa e pelo nasentte faz Ponta levara em semeadura tres Alqueires. 

— Na Boralha hu Campinho serrado sobre ssim com húa fonte para a banda do sul dentro delle que tem do norte ao sul quarenta varas e de largo trinta e oito e parte do nassente com vinha de João fernandes e Pascoal Femandes que he de Paderne que pesuhe [possui] Manoel Soares e do norte também com vinha de Paderne e do sul com serventhia do mesmo Campo leva em semeadura dous alqueires com o que tem um lameiro pera o sul. 

— Tem mais a dita quinta a Agoa de guarida e obrigatória das fontes do Barreiro e assim a Agoa da Corga que bem das fontes dos fornos também de goarida e por estar prezente Antonio de Castro morador na quinta do Pezo que he de sua mai Maria de Araújo Dise que a agoa da fonte do Barreiro que esta no caminho que ven da Toca do Oiteiro estavão de posse delia para sua quinta havia annos ora não vinha a dita agoa a dita quinta Reguenga nem estava nesa posse pello que requeria a elle juiz que a não llansase em tombo e que quem quizesse algúa couza o obrigasse a ella e a sua may. 

— Pesqueiras desta quinta — Tem mais a Coroa Real no Rio Minho o direito seguinte asim o dis o foral — em todas as pesqueiras antigas da freguesia de Varzia havemos de haver de coatro noites huma com seu dia e comesase pella manhão athe o outro dia aquellas horas e outro tanto pagarão dos naseiros e pesqueiras novas que são feitas ou sse fizerão nas paredes das ditas pesqueiras antigas e das outras novas em outro «lugar não pagarão o dito direito salvo se fizerão prejuizo às sobreditas antigas e as pesqueiras que se acharão são as seguintes: — A Mancelinha de furadella que esta junta no Ribeiro de Pedroza. A pesqueira de furadella — A serpente com as bocas afora que são Duas — A pesqueira de Caralhete — A pesqueira do geito— A pesqueira da llamella— A pesqueira darcao — o naseiro da alo goa — A pesqueira de sourelão derradeiro — escurella de Mazoura — A Bulha derradeiro — o Naseiro de VicozoRetortello — Figueira — Fopeiro — Palheiro— o frade — Freza — O Torto— o margalho— Matatua — O filho — Barco — Outeiro — Muzaranho — Pera de agoa — O Coelho — A pesqueira da Veiga — Belgaio — e de todas estas pesqueiras se paga o coarto. Para o dito cazeiro da ditta quinta e suas pertenças atras escritas de foro e pensão em cada hu anno a fazenda do Duque noso senhor seiscentos rreis em dinheiro e a pesuhe por titullo de prazo fatiozim” Dada a referência a Fernão de Castro, o documento deve ser de início do século XVII.” 

Em 1675, a Quinta do Reguengo é vendida pela Misericórdia ao capitão Agostinho Soares de Castro, que mandaria construir o solar da quinta que ainda hoje podemos apreciar.