sexta-feira, 29 de março de 2019

A freguesia de Rouças (Melgaço) em finais do século XIX




A freguesia de Rouças pertence atualmente ao concelho de Melgaço. Em finais do século XIX, já pertencia à comarca e concelho de Melgaço mas já pertenceu em tempos à comarca de Monção. Em finais do século XIX, havia nesta freguesia 225 fogos ao passo que em 1757, havia apenas 88 fogos.
O orago desta freguesia é Santa Marinha de Antioquia, santa mártir do século IV. Contudo, no livro “Portugal Sacro e Profano” é referido que é Nossa Senhora dos Anjos. No livro “Portugal Antigo e Moderno” do professor Pinho Leal, editado em 1876, fala-se da freguesia de Rouças nestes termos: A mitra apresentava o abade, que tinha 350 000 réis de rendimento. Esta paróquia foi primeiramente padroado da antiga e nobre família dos senhores do Paço de Rouças, que era nesta freguesia, mas que há alguns séculos pertence à de S. Payo, contigua a esta. Ainda se vêem as ruínas de uma antiquíssima casa chamada o Paço, solidamente construída, e, em parte, ainda habitada. O lugar em que está, chama-se mesmo Paço, nome tomado da dita casa. O padroado passou depois para Manoel Pereira (o Mil-Homens) da vila de Monção, e o solar para os Castros, de Melgaço. Por fim, passou o padroado para os arcebispos de Braga. O território desta freguesia, tem 7 kilómetros de comprido, por 5 de largo, estendendo-se desde a encosta oeste da serra de Pernidelo, até junto das muralhas da vila de Melgaço, pertencendo ainda à freguesia de Rouças, as primeiras casas da vila. Ainda que em terreno muito acidentado, os seus vales são fertilíssimos, e o vinho que produz é de óptima qualidade principalmente o dos sítios das Barreiras e Vale de Cavaleiros, em nada inferior ao excelente vinho de Monção. É nesta freguesia a grande quinta que foi do mosteiro de Fiães, deste concelho, e que, ficando sobranceira à vila, é uma belíssima vivenda. É hoje propriedade particular do Sr. Dr. José Joaquim Gomes. A igreja matriz é das maiores, não só da comarca, mas do distrito administrativo. O zelo do reverendo abade atual, e a devoção e religiosidade dos paroquianos, tem convergido para que este templo esteja ornado com a maior magnificência. Estes melhoramentos principiaram em 1864. Tem altar-mor e quatro laterais, todos ricamente adornados, e as santas imagens que os decoram, são de excelente escultura, sendo notável a de Nossa Senhora da Soledade, de tamanho quase natural, e oferecida à freguesia pela benemérita família Salgado, aqui residente. A sua torre dos sinos, é bastante alta e tem dois bons sinos. O coro é bom, e tem um pequeno órgão. Tem óptimas alfaias e paramentos, para o culto divino, tudo feito há poucos anos. No teto da igreja há boas pinturas, representando os apóstolos e os evangelistas; e a Fé, Esperança e Caridade. Na parede exterior da capela-mor, está embutida uma lapide, com esta inscrição:

BLAZIUS D'ANDRADA DA
GAMA, ABBAS, IN UTRO-
QUE JURE LAUREA-
TUS, A FUNDAMENTIS
EREXIT. MDCLXXXX

Colige-se desta inscrição que o templo foi fundado em 1690, à custa do benemérito abade da freguezia, Braz d'Andrada da Gama. Está construída em um formoso sitio, pela sua posição elevada, e com dilatados horizontes. A festa da padroeira, faz-se a 18 de julho, que é o seu dia. É uma romaria concorridíssima, vindo gente até da Galiza, em grande número, com ofertas, para que Santa Marinha os cure, ou preserve de sesões. O lugar presta-se maravilhosamente para a romaria, porque é um vasto terreiro, o maior que se vê na província, em frente das igrejas, depois do de Fiães. Fica ao sul da igreja, e é assombrado por gigantescos e vetustos castanheiros, contemporâneos do primitivo templo. A residência paroquial foi reconstruida em 1870, desde os alicerces. É um edifício no gosto moderno, cómodo e decente e feito à custa dos paroquianos, que da melhor vontade, e por amor ao seu digno pároco, se prestaram a esta não pequena despesa. Há nesta freguesia seis capelas, que são: Santa Rita, na aldeia de Vilela, com missa em todos os domingos e dias sancificados. É publica; Nossa Senhora da Conceição, no Côto do Preto. Tem uma bem esculpida pedra de armas, da ordem da Conceição, sobre a porta principal. É particular; Santo António, no logar da Corga. É particular; Nossa Senhora das Dores, no lugar de Cavaleiros, com missa em todos os domingos e dias santos. É publica; S. João Batista, no logar do Fecho. É particular; Nossa Senhora da Graça, a poucos metros de distância da antecedente, e que é a melhor de todas, tanto pela sua posição eminente à vila, como pela magnifica pedra de cantaria de que é construída. Do monte onde está a capela, é que sabe o finíssimo granito para as construções de todos os edifícios destes arredores.
Nasceu nesta freguesia, o padre Manoel Alves Salgado, que, enquanto estudante, foi o maior perito caçador do Minho. Foi servidor do infante D. Gaspar, arcebispo de Braga, filho natural reconhecido de D. João V, e depois secretário da câmara eclesiástica do arcebispado, no tempo do mesmo príncipe. Era o padre Manoel Alves Salgado, um eclesiástico exemplar, e muito inteligente, sabendo reunir ao rigoroso cumprimento dos deveres do seu então importantíssimo cargo, a maior modéstia e afabilidade. Era sumamente caridoso, pelo que a sua morte foi sinceramente chorada, pelos desvalidos a quem a sua beneficência jamais deixara de socorrer. Por sua morte, nomeou sua herdeira, sua sobrinha, a Sra. D. Thereza Alves Salgado da cidade de Braga, hoje representada por suas duas filhas, as Srs. morgadas do Carvalhal, da mesma cidade. Ao reverendíssimo Sr. José Manoel Alves Salgado de Castro, que, por varias vezes, se tem dignado mandar-me valiosos e curiosíssimos apontamentos, para várias povoações do Minho; e que teve a bondade de me mandar bastantes sobre esta freguezia, agradeço tanta generosidade. Se todos os homens ilustrados das províncias fizessem como o Sr. Padre Salgado, sairia esta obra mais completa e perfeita.”





Informações extraídas de:

- LEAL, Augusto de Pinho (1875), Portugal Antigo e Moderno, Livraria Editora de Mattos & Companhia, Lisboa.

sexta-feira, 22 de março de 2019

A freguesia de São Tiago de Penso (Melgaço) em tempos antigos



A primeira referência conhecida à igreja de São Tiago de Penso remonta ao ano de 1118. No catálogo das igrejas situadas ao norte do rio Lima, que o rei D. Dinis mandou organizar em 1320 para a determinação da taxa a pagar, São Tiago de Penso pertencia então à Terra de Valadares.
Em 1546 há notícia de que se encontrava já anexada ao mosteiro de São Salvador de Paderne. Na cópia do Censual de D. Frei Baltasar Limpo (1551-1581) sobre a situação canónica destes benefícios, diz-se que o abade de Messegães beneficiava dos frutos da igreja do Penso, de consentimento com o prior e cónegos do mosteiro de Paderne. O direito de apresentação desta igreja pertencia ao mosteiro a que era anexa.
Américo Costa descreve-a como vigairaria da apresentação do mosteiro de Paderne e, mais tarde, da Casa dos Caldas, no termo de Valadares. O mosteiro vendeu o direito de apresentação a esta família, que ficou com o padroado da igreja, recebendo os seus vigários a denominação de reitores.
No início do século XVIII, o Padre Carvalho da Costa na sua obra descreve esta freguesia nestes termos: “Santiago de Penso, Vigairaria do Morteiro de Paderne com de dez mil reis, ao todo oitenta mil reis, e para os Frades cento e dezoito mil reis, tem duzentos vizinhos. Aqui está a Quinta de S. Sybrão, que possui Felippe de Araújo de Caldas, Cavalleiro do Habito de Cristo, Capitão-mor, e Monteiro-mor de Valladares ;tomou este nome de uma Capella antiga deste Santo Cipriano, que ali está; he tradição foy templo da Gentilidade dedicado a Júpiter. O tio é fúnebre, e desacomodado no meio de hum campo com pouca veneração, e menos o fora a não ser advogado das cézoens, ou maleitas, que muitos enfermos vem alli tremendo, e voltam sãos”.
Temos notícias de Penso nas Memórias Paroquiais de 1758. Na resposta ao inquérito, o pároco Diogo Manuel de Sousa Gama de S. Tiago de Penso refere que, além da igreja paroquial, “tem esta freguesia quatro ermidas, uma de Sam Bartolomeu, outra de Sam Thomé, outra da Senhora da Boa Morte e outra de Sam Sipriano”. Mais acrescenta que são pertencentes da freguesia “exceto a da Senhora da Boa Morte e a de Sam Sipriano que pertencem à Casa de Manuel Giraldo de Azevedo e Sotto Maior”, da Casa e Quinta de S. Cibrão. Diz-nos ainda que a freguesia tem 209 fogos.
O pároco memorialista da freguesia de Penso refere-se, ainda em 1758, ao lado de “pescarias livres e dízimas a Deus que os donos usam sem foro algum e se pagam tão só as dízimas a Deus”, outras de “vários donos e senhorios que pagam foros de peixe, especialmente aos religiosos de Santo Agostinho do Mosteiro de Paderne e aos religiosos de S. Bernardo do mosteiro de Fiães”.
O padre de Penso já em 1758 nos fala da chamada “Fonte Santa”, que seria rica em enxofre e teria “várias virtudes especialmente para” doença do fígado, lepra, tratamento de feridas e aumentaria o apetite de comer “se tiver fastio”, trataria também a dita água das doenças de “umores quentes”.
Em 1876, no livro “Portugal Antigo e Moderno” do professor Pinho Leal, a freguesia de Penso é assim descrita: “PENSO—freguezia, Minho, comarca e concelho de Melgaço (foi da comarca de Monção, extinto concelho de Valladares) 65 kilometros a Nordeste de Braga, 425 ao Norte de Lisboa. Tem 255 fogos. Em 1757, tinha 209 fogos. Orago, S. Thiago, apostólo. O prior dos cónegos regrantes de Santo Agostinho (crúzios) de Paderne, apresentava o vigário, que tinha 130 000 réis de rendimento. O mosteiro vendeu isto aos Caldas, de Badim, que, desde então até 1834, ficaram com o padroado d'esta igreja passando os seus vigários a denominarem-se reitores.
É n'esta freguezia a quinta de S. Cybrão, do sr. Philippe d' Araújo Caldas. Segundo a tradição, no sitio onde está a capella d'esta quinta, houve um templo romano dedicado a Júpiter. Supõe-se que a existência do tal templo, foi uma fábula inventada para enobrecer esta propriedade; que, mesmo sem aquela circunstância, é notável, pela antiguidade e nobreza dos seus proprietários; e também por que produz óptimo vinho. É terra fértil, gado, peixe do rio Minho (que lhe passa próximo, ao norte) e caça.”
A referência à Quinta de S. Cibrão é uma constante em alguma literatura e outros documentos desde o século XVII o que atesta a extrema importância da quinta e dos senhores da mesma na região. A mesma volta a ser citada no livro “O Minho Pittoresco” de 1886. O autor escreve na sua chegada a Penso: O carro segue sempre e aqui nos fica à esquerda a freguezia de PENSO, uma villota em miniatura, antiga vigararia do mosteiro de Paderne e depois da casa dos Caldas, de Badim, por compra que fizeram ao mosteiro.
Na quinta de S. Cibrão (Cypriano) é tradição que existiu um antigo templo gentilico, dedicado a Júpiter, no ponto onde está hoje a capela. Há quem diga, porém, que essa tradição foi inventada apenas com o fim de enobrecer a quinta, já de si notável pela familia que a possuiu e pelo bom vinho que produz. Em Penso existe ainda a capela de Santa Comba, cuja festa é pelo mez de julho, e junto da estrada, à nossa esquerda, está a capelinha de S. Bartholomeu, cuja festa se faz em 24 de agosto.
Sobranceira a essa capelinha fica um templosinho modesto, mas da religião do mais largo ideal— a instrução do povo. Um bando de rapazes, rodeando o professor, entrava na escola, no momento em que nós passávamos. E foi gratíssima, devemos confessa-lo, essa impressão ultima que em nós deixou a derradeira freguezia que percorríamos do concelho do Melgaço”...




Extraído de:


- COSTA, Padre António Carvalho da (1706) - Corografia Portuguesa, tomo I, Valentim da Costa Deslandes, Lisboa;
- LEAL, Augusto de Pinho (1875), Portugal Antigo e Moderno, Livraria Editora de Mattos & Companhia, Lisboa;
- VIEIRA, José Augusto (1886) - O Minho Pittoresco, Tomo I, Livraria de António Maria Pereira-Editor, Lisboa.

sexta-feira, 15 de março de 2019

O Mosteiro de Fiães e a Senhora da Orada (Melgaço) - Parte I




Há mais de 300 anos, um livro da autoria do Padre Carvalho da Costa, publicado em 1706, conta-nos como era o Mosteiro de Fiães (Melgaço) na época e como em tempos antigos era muito rico e poderoso. Esta obra fala-nos ainda das origens da Nossa Senhora da Orada e da sua relação com a antiga Quinta de Cavaleiros: No mesmo Concelho de Valladares, ficando-lhe para o Norte o de Melgaço, para o nascente o Reyno de Galliza, sobre huns altos montes, ao pé de outros mais altos está o Convento.de Fiães, fundado em tempo del Rey Ramiro Primeiro e de sua mulher a Rainha Dona Paterna, de que julgamos tomar o nome o valle de Paderne. Quando ella então não fosse a fundadora daquelle Morteiro, o seria do de S. Payo, que no termo de Melgaço houve. Foi este de Fiães de Monges Bentos com a invocação de S.Christovão, de que se acha noticia pelos anos de 851 e hum dos primeiros, que desta Ordem houve em Hespanha. Foi logo tão rico em seus princípios de rendas senhorios, que teve nesta Província, na de Trás os Montes e Galliza, que vulgarmentefe dizia não haver algum tão poderoso, como o Dom Abbade de Fiães, depois del Rey, pelo que se pode presumir ser obra sua. Ali viviam oitenta Frades de Missa, além dos Conversos, os quais em Lausperene assistiam continuamente no Coro de dia e de noite e com tão exemplar vida, que de todos eram chamados Santos e muitos faziam milagres pelo que se vinham aqui enterrar muitos príncipes, que lhe fizeram amplas doações. De três Infantes há noticia e de muitos fidalgos galegos, & portuguezes, Fernão Annes de Lima, pai do primeiro Visconde, está em sepultura levantada e magnífica com suas Armas junto da Capela de S. Sebastião. Tinha antigamente um banho, que por milagre de Nossa Senhora apareceu junto do Morteiro, e esta água era de tanta virtude, particularmente no dia do Bautista, que muitos doentes de várias enfermidades, e aleijoens incuráveis, que nele se vinham lavar, voltavam sãos. Mandou-se entupir há anos por mortes que houve entre os que haviam de entrar primeiro. Ainda hoje vem muitos buscar água, que dele emana e a levam a enfermos, que bebendo-a com fé , obra Deus por ela muitas maravilhas. Da imagem de S. Bento, que aqui está, e é visitada dos contornos em todo anno, particularmente em Teu dia, se contam grandes milagres. A fabrica deste Mosteiro, e celas dos Religiosos foi cousa grande, trezentos e tantos annos havia, que nele viviam estes Monges. Teve nesses tempos dois incêndios por desgraça, causa de sua total ruína, porque lhe queimarem os melhores títulos de suas rendas, com que se pôs em estado, que mal tem com que sustente oito frades, quanto mais para pagar à Capela Real quarenta mil reis, e vinte e cinco mil reis ao Convento do Desterro de Lisboa. Da primeira ruína o tirou a piedade Cristã de Afonso Paes, dois irmãos seus, que de novo o reedificaram e deram a Alcobaça. No ano de 1150 era tão grande a fama que corria da vida santa dos Frades Bernardos, que tinham vindo de França para este Reyno, que mandou o Dom Abade deste Mosteiro dois Monges ao de Alcobaça a pedir nova reformaçam dos institutos de Cister, e um Religioso para que melhor os instruísse pelo que haviam de obrar, ficando logo sujeitos àquela Real Casa, que de novo se ia edificando. Tanto que receberam a reforma, tomaram por Padroeira a Virgem Nossa Senhora, deixando a S. Christovão e se chama desde então Santa Maria de Feães, e em memória do grande gosto que tiveram de se mudarem a Bernardos, e da boa doutrina, que o novo Mestre lhes veio dar, puseram o nome de Alcobaça a uma aldeia arraiana, que então povoaram, e permanece. Donde seu princípio sempre teve Couto Cível, que lhe confirmaram EI Rey Dom Afonso Henriques, e seus sucessores; e o Dom Abade tem jurisdição Episcopal, Metropolitano imediato ao Papa, sem que o Arcebispo lhe visite os seus bditos, e reconhece os Breves Apostólicos, ou o seu Provedor, que é hum Religioso da Casa, a quem o Abade escolhe, e deles appella para Roma, ou Núncio. A mesma jurisdição tem em Galiza no Bispado de Tuy além do rio Trancoso em dois lugares chamados Lapella e A zureyra, em que exercita a dignidade Episcopal por sentenças que teve cá e lá contra o Primaz, e Bispo, que ambos lho quiseram tirar, cousa que não sei haja em outra Diocese. A Condessa Dona Fronilla deu a este Mosteiro e ao seu Abbade João em Janeiro do anno de 1166 a quinta de Cavalleiros junto de Melgaço, cousa boa, particularmente de vinhas entendemos que com ela lhe daria também a Igreja de Nossa Senhora da Orada alli pegado, que os Frades dizem foi Mosteiro de S. Bento, e fundado quando se edificou o de Feães, de que veio a ser Priorado. Outros dizem (o que tenho por mais certo, e alguns sinais mostra para isso) que foi de Cavaleiros Templários, de que esta quinta tomou o nome, que era passal seu. Pouco há se lhe viam ruínas de celas, claustros, e canos de pedra, pelos quais lhe vinha água.”

...............................CONTINUA...............................

sexta-feira, 8 de março de 2019

A freguesia de Parada do Monte (Melgaço) no tempo dos nossos antepassados




Parada do Monte é uma freguesia que pertence ao concelho de Melgaço há pouco mais de 150 anos. Pertenceu ao antigo concelho de Valadares, tendo estado anexada, juntamente com a Gave, a Riba de Mouro, de Monção. Com a extinção deste concelho, por decreto de 24 de Outubro de 1855, foi desmembrada desta última freguesia, passando a fazer parte de Melgaço. No censo da população de 1864, figura sob a designação de Parada. Segundo o entendimento do saudoso padre Aníbal Rodrigues, o seu topónimo deverá indicar a existência de uma antiga via romana e do sítio onde os viandantes, a pé ou a cavalo, costumavam descansar depois de uma longa e difícil caminhada.
Há mais de 300 anos, mais concretamente em 1706, o Padre Carvalho da Costa, no seu livro refere-se a Parada do Monte nos seguintes termos: “S. Mamede de Parada do Monte, Vigairaria da mesma apresentação, que rende ao todo quarenta mil reis, e para o Commendador sessenta e seis mil reis. Tem cento e cincoenta vizinhos. Aqui se faz o melhor burel de lã das ovelhas Gallegas de todo o mais Reyno, donde he muy procurado para cubertas de camas de lavradores, ou criados, e ainda de muitos nobres para as meterem entre os cobertores. He muy branco, grosso e macio”. O Padre Carvalho da Costa refere-se ainda ao antigo Couto de Val de Poldros, que atingia os limites territoriais da freguesia de Parada do Monte: Nestas montanhas, em em que há muita caça e veação, houve antigamente hum Couto, a q chamavam Val de Poldros, o qual fez, marcou e defendeu Payo Rodrigues de Araujo, de que possui parte seu sexto neto Manoel de Araújo de Caldas, Sargento-mor de Valladares, ainda que atenuado em parte das grandes regalias que tinha”.
Em meados do século XVIII, o pároco Francisco de Caldelas Bacelar de Parada do Monte refere, nas Memórias Paroquiais de 1758, que os frutos que os moradores recolhem em maior abundância é o milho grosso, vulgarmente chamado milho maiz”. Cultivava-se nas leiras que bordejavam as margens do Mouro e onde também cresciam as latadas pois o vinho (12 cabaços) entrava na composição da renda que a freguesia pagava ao pároco. Na serra rodeavam-se as brandas de “centeio, algum milho miúdo, e pouco linho e muita herva no Verão de que fazem os labradores feno para darem de Inverno aos gados”. Mais afirma o pároco que “a criação de gados que tem esta serra é no tempo do Verão trazerem nella os labradores os seus bois de noutte [noite] e de dia dois outros mezes e as bacas e bezerros andam também na serra de dia e à noutte vão procurá-los e recolhem-nos nos lugares das brandas e o mesmo fazem ao gado miúdo de cabras e ovelhas”.
O Pároco de parada do Monte, em 1758, também refere que o rio Mouro tem um “curso arrebattado em toda a sua distância desde o seu nascimento até botar fora dos limites desta freguezia, somente em hum sítio chamado Agras de Mouro corre quite hum tiro de mosquete’. Rio pouco Mais refere que ”somente no tempo de Verão alguns rapazes caçam nelle algumas trutas pouca e pequenas, mas gostozas”.
Segundo LEITE, A. & LEITE, M. (2009), tendo como base as Memórias Paroquiais e ainda pela análise das prestações entregues pelos foreiros e rendeiros aos monges de Fiães e Paderne (MARQUES, J., 1990) é possível reconstruir a composição da dieta alimentar das populações do interior montanhoso do Vale do Mouro. “A base da alimentação era fundamentalmente constituída por caldo de couves e feijões engrossado com farinha de milho à qual, por vezes, se seguia alguma carne de aves de criação, de porco (conservada nas salgadeiras) e em certas ocasiões a do cabrito ou a obtida pela caça nos montes onde abundava a perdiz, o javali e em menor número os corços, cuja carne ‘he como a de vittela” no dizer do pároco memorialista. O pescado raramente entrava nas ementas e limitavase às sardinhas de Caminha descarregadas na Lapela ou vindas de Arbo (Galiza) e vendidas em Melgaço pelas ‘sardinheiras’ (MARQUES. J., 2004). A lampreia, o sável e o salmão “pilhados” nas cabaceiras e botirões armados nas pesqueiras do Rio Minho eram quase exclusivamente consumidos pelas populações ribeirinhas ou pelos monges de Paderne e Fiães, detentores da propriedade de grande parte daquelas construções fixas para a pesca fluvial (LEITE, A., 1999). Recebiam o sal vindo de Caminha em barcos pello Minho acima, até á Lapella e depois em carros até o lugar de S. Gregório, aonde há armazéns, aos quaes se vem prover todos os povos do bispado d’ Orense” (VILLASBOAS, J., 1800).
Em 1758, Parada do Monte possuía cento e oitenta e nove vizinhos [agregados familiares] e quinhentas e vinte e duas pessoas entre grandes e pequenos”. Segundo o pároco, a igreja paroquial tinha três altares estando o da capela-mor dotado de uma tribuna. O seu pároco era apresentado pela reitoria matriz de São Pedro de Riba de Mouro e tinha uma “renda doze mil réis, doze fanegas de pão, doze cabaços de vinha e dois alqueires de trigo pera hóstias, que lhe paga o colhedor dos fruttos desta terra e tem mais de cada freguês cazado hum alqueire de pão e sendo veuvos [viúvos] meio e solteiros hum coarto”.
Na segunda metade do século XIX, a freguesia volta a ser citada em algumas obras de referência da época. No livro “Portugal Antigo e Moderno” do professor Pinho Leal, publicado em 1876, a mesma é chamada de PARADA e descrita como freguesia já não pertecente a Valadares mas à comarca e concelho de Melgaço, 65 kilometros ao norte de Braga, 430 ao norte de Lisboa. Tem 180 fogos [agregados familiares]. Em 1757, tinha 189 fogos. O orago é S. Mamede. Arcebispado de Braga, districto administrativo de Vianna. O reitor de S. Pedro de Riba de Mouro, apresentava o vigário, collado, que tinha de rendimento 130 000 réis.” O autor volta a elogiar a qualidade da lã aqui produzida, nestes termos “Ha n'esta freguezia muito gado lanígero, que produz excelente Ian.” Replica a informação relativa ao antigo Couto de Vale de Poldros: Em Valle de Poldras, limites d'esta parochia, houve um couto, que marcou e defendeu Paio Rodrigues de Araujo. Em 1720, era este couto possuído pelo 6º neto do dito Paio, Manuel d' Araujo Caldas, de Valladares mas tinha já perdido a maior parte dos seus antigos privilégios.” Por último refere que “dá-se a esta freguezia, para a distinguir das outras, o nome de Parada do Monte.
Poucos anos depois, em 1886, é publicado o livro “O Minho Pittoresco”, obra incontornável da época para esta região. Na publicação, diz-se que ”a egreja de PARADA DE MONTE fica um kilometro ao sul do Rio de Mouro e dista de Melgaço uns dez kilometros. Foi reitoria que o reitor de Riba de Mouro apresentava e pertencia ao extincto concelho de Válladares. A freguezia é montanhosa e especialmente se entrega à industria do gado ovino, sendo muito apreciada a sua lã para a fabricação dos buréis e cobertores”. (VIEIRA, J., 1886).



Fontes consultadas:
- COSTA, Padre António Carvalho da (1706) - Corografia Portuguesa, tomo I, Valentim da Costa Deslandes, Lisboa;
- LEAL, Augusto de Pinho (1875), Portugal Antigo e Moderno, Livraria Editora de Mattos & Companhia, Lisboa;
- LEITE, Antero & LEITE, Maria Antónia Cardoso (2009) - Parada do Monte, História e Património. ACER;
- MARQUES, José (1990) – O Mosteiro de Fiães, Braga;
- VIEIRA, José Augusto (1886) - O Minho Pittoresco, Tomo I, Livraria de António Maria Pereira-Editor, Lisboa;
- VILLASBOAS, Custódio Jozé Gomes de – Descripção Topographica das Commarcas Fronteiras da Província do Minho, 1800 (inserido em Fernando de Sousa e Jorge Fernandes Alves- ‘Alto Minho. População e Economia nos Finais de Setecentos, Editorial Presença, Lisboa, 1997.

sexta-feira, 1 de março de 2019

Sobre o traje de noiva típico de Castro Laboreiro (Melgaço)




O traje típico de Castro Laboreiro é de caraterísticas singulares. Foi por isso alvo de estudos etnográficos por alguns dos maiores investigadores na área durante o século XX.
Esta fotografia mostra-nos uma panorâmica da vila castreja em 1915. Onze anos antes, em 1904, já José Leite de Vasconcelos calcorreava os caminhos de Melgaço até Castro Laboreiro para estudar os costumes castrejos. Em relação ao traje típico de Castro Laboreiro, faz-nos, no seu trabalho publicado, uma descrição bastante pormenorizada. Quando chegou a Castro Laboreiro, era dia de feira e o investigador observou “muitos homens juntos: apresentavam-se geralmente de cara rapada, vestidos de çaragoça (jaqueta, calças e collete), traziam chapéus de panno ou carapuça, e varapau. Mulheres, por ser de gado a feira, não andavam lá muitas. O trajo ordinário d’ellas é: camisa; faxa vermelha; collete; jaqueta; saia branca; saiote; saia de cor, quási sempre,preta, feita de foloado «panno de lã de ovelha ou de linho» que se fabrica em Castro; mandil, singuidalho, do mesmo ou de outro panno; na cabeça capella, que pode ser substituída por lenço; nas pernas calções e piúcas, meias sem pés, que se prendem com uma liga ou baraça; e nos pés chancas.(…) No Inverno, tanto homens como mulheres, se abrigam das neves, chuvas e friagens com o corucho, espécie de capuz de burel que se traz na cabeça, e tem uma espécie de aba que se prolonga pelas costas abaixo."
Entre outros estudos etnográficos acerca das vestes típicas de Castro Laboreiro, é de salientar a obra de Alice Geraldes, publicado em 1979, que nos deixa um excelente apontamento sobre o traje de noiva típico de terras castrejas. Sobre o mesmo diz-nos que “a saia era feita de tecido xadrez, da Covilhã. Chegava a ter dois metros de largura e o comprimento ia até ao tornozelo. A beira da saia era debruada com uma fita de lã preta, à qual se seguia uma barra de um palmo de veludilho preto e cima desta uma tira de cetim da mesma cor. A barra de veludo era contornada com um fitilho de lantejoulas e vidrilhos.
A blusa era de castorina de cor escura. apertava à frente com botões e a manga era comprida. Por cima levava um peitilho em renda.
Algumas noivas, nem todas, vestiam um casaco de casimira ou saragoça preta, cujo comprimento não chegava bem à cinta. Aplicava-se-lhe também como guarnição uma tira de veludilho à volta e outra na ponta das mangas.
O "mandil" também preto, ou era de cetim com barra de veludo, ou de veludo com barra de cetim.
Na cabeça levavam as noivas um lenço de seda que, segundo a opinião da nossa informadora, era lindo: dourado, florido com franjas a toda a volta . Atavam as duas pontas sob o queixo.
Usavam ainda um xaile de casimira preta com barras às cores de larga franja tecida. O xaile era simplesmente posto sobre os ombros, sem ser traçado.
A saia, que usavam por baixo, era de linho e enfeitada com rendas e entremeios de crochet.
Ao pescoço, as noivas traziam um cordão de ouro com 3 ou 4 voltas, oferecido pelo noivo. Uma das voltas deste cordão passava por vezes debaixo do braço.
No dia da boda as noivas usavam sapatos.
(…) Segundo informações que nos foram prestadas, o primeiro casamento que se realizou na "Vila" com noiva à moda da cidade, isto é, sem ser à moda da terra, data de há 12 anos atrás [por volta de 1967]. Depois deste, o hábito pegou de forma radical e hoje já ninguém leva o trajo tradicional.
Sobre a quebra de tal costume, uma jovem na casa dos 19 anos, ainda solteira, deplorava que o tradicional trajo de noiva tivesse sido preterido por outro tão incaracterístico e a todos os títulos menos belo. Acalentava o sonho de ir vestida, se o namorado a isso não se opusesse, como as noivas antigas da sua terra, porque, segundo a sua opinião, a modernização não devia destruir o que de belo havia na vida da sua gente. Era uma moça inteligente, que tinha noções concretas e muito bem concertadas sobre o valor da cultura tradicional e do que havia de secundário e essencial nela.”




Extrato em: 

- GERALDES, Alice (1979) - CASTRO LABOREIRO E SOAJO - Habitação, vestuário e trabalho da mulher; Edição do Serviço Nacional de Parque, Reservas e Património Paisagístico, Lisboa.
 LEITE, Antero & LEITE, Maria Antónia M. Cardoso - O Trajo Castrejo. ACER - Associação Cultural e de Estudos Regionais.