sexta-feira, 25 de janeiro de 2019

Cozer o pão em Castro Laboreiro: crenças e orações




Os singulares costumes e tradições das gentes de Castro Laboreiro davam um longo compêndio. Um dos costumes ímpares nesta terra é o ato de cozer o típico pão castrejo, normalmente em forno comunitário. A importância e a qualidade deste pão desde tempos muito antigos comprova-se pelo facto de ser mencionado no foral, citado pelo Padre Bernardo Pintor, que D. Sancho I concedeu foral a Castro Laboreiro há cerca de 800 anos: «... quando fosse a Castro Laboreiro, o Rei recebia de cada casa 2 pães...».
Em tempos mais recentes, a investigadora Maria Lamas, no seu livro “As mulheres do meu país”, aludindo ao pão de Castro Laboreiro, acrescenta que é «... o mesmo pão negro e grande como a roda de um carro, cozido no forno comum, uma vez por mês, e conservado fora do alcance dos ratos nas prateleiras da "camboeira", suspenso do teto, a um lado da cozinha». O pão de Castro Laboreiro também é referido na obra da autora francesa Mouette Barboff na sua obra “O pão das mulheres”, por serem estas que geralmente o confecionavam.
O ato de cozer o pão em Castro Laboreiro, assim como noutros pontos do nosso concelho e do país, está repleto de rezas e crenças, umas de raiz religiosa e outras de raiz pagã as quais são consideradas pelas gentes castrejas como fundamentais. Localmente, a preparação do pão é assim descrita de forma muito sucinta: «Peneirar a farinha centeia. Peneirar a farinha milha ou triga. Misturar as farinhas e juntar água, sal e o fermento. Mexer com a mão. Amassar e dobrar a massa (palhada).» Como fermento, usa-se massa preparada anteriormente e deixada a levedar durante 12 Horas. Diz a lenda que «a água ou orvalho de S. Pedro quando usada para fazer o fermento não deixa o pão azedar». Pronta a massa, esta é colocada a levedar, durante 4 horas, coberta com um lençol de linho e uma manta de lã, fazendo-se a seguinte reza:

S. Vicente te acrescente
S. Mamede te levede
Imaculada Conceição
Faça de ti bom pão.”

Esta reza tem algumas variações. Por vezes, também se reza com os seguintes dizeres:

São Mamede te levede
São Vicente te acrescente
São João te faça pão
O Senhor te ponha a Sua mão.”

Ou ainda

São Vicente t’acrescente
São João te faça pão
Nossa Divina Senhora
Te ponha a sua mão”.

Enquanto o pão leveda, aquece-se o forno comunitário usando-se em especial a lenha de urze. Quando o forno está bem quente, retiram-se as brasas e com estas na pá fazem-se cruzes dizendo:

«Cresça o pão no forno
O Bem de Deus pelo mundo todo
P'rás feiticeiras um corno
E p'rá parranheira do forno”, e atiram-se as brasas para o chão.

Ao colocar cada broa de pão na pá, para de seguida enfornar, abençoava-se fazendo-se uma cruz sobre a sua carapaça, com um punhado de cinza retirado da fornalha.
No momento de colocar o pão no forno, dizia-se:

Cresça o pão no forno
E o bem de Deus pelo mundo todo
Saúde aos trabalhadores e aos bem feitores
Bruxas de Zangões vão para a
borralheira comer os carvões.”

Tradicionalmente a porta do forno é selada com estrume de bovino para evitar as perdas de calor. O tempo de cozedura é de 2 h aproximadamente, após o que o pão é armazenado na «camboeira».
A “tenda” era o primeiro pão a sair do forno e a ser consumido no interior da estrutura. Diz-se que só se podia “apartar” (partir) a “tenda” com as mãos, e se alguém passasse a lâmina do “cuitelo” (faca) pela “tenda”, as broas que estivessem dentro da “forneca” não coziam bem (CARVALHO, Diana, 2015).




- CARVALHO, Diana (2015) – Castro Laboreiro – do pão da terra aos fornos comunitários. Dissertação de Mestrado. FLUP, Porto.

- LAMAS, Maria (1948) – Mulheres do meu país. Editorial Caminho, Lisboa.

sexta-feira, 18 de janeiro de 2019

O antigo solar e Quinta de S. Cibrão (Penso - Melgaço): algumas notas históricas


Solar da Quinta de S. Cibrão
(Foto em www.idealista.pt)

A Quinta de S. Cibrão situa-se na freguesia de Penso, no concelho de Melgaço, localizada entre a margem do rio Minho e a estrada nacional, no limite administrativo entre este concelho e Monção.  Hoje, creio ser conhecida como a Quinta da Casa Nova, e trata-se de uma propriedade com um antigo solar e capela no interior e que tem vários séculos de História, encontrando-se aqueles em processo de degradação. O nome da quinta é uma derivação de S. Cipriano, santo a quem tinha sido construída uma primitiva capela dentro da propriedade. De facto, há referências bibliográficas do século XIX que citam que no local onde se encontra atualmente a capela, existiu em tempos muito antigos um templo, de evocação a Júpiter, de origem romana. Contudo, creio não haver provas físicas da existência do mesmo sendo aludido até, como se pode ler adiante, que tal não passaria de um estória inventada para valorizar a quinta.
A Quinta de São Cibrão deve ter passado a pertencer a João de Araújo e Caldas e sua esposa Filipa de Sousa de Faria, por volta de anos 1620, já que alguns filhos deste casal nascerem na freguesia de Paderne e em 1640, estes ainda viviam nesta quinta de S. Cibrão. Posteriormente, foi senhor desta quinta o seu filho, o capitão-mor de Valadares Filipe de Araújo e Caldas, casado com Isabel de Sousa e Castro, e o irmão Manuel de Araújo e Caldas, veio viver para a quinta do Rosal em Valadares e foi sargento-mor. A Quinta de S. Cibrão foi destruída nos anos 1656 pelos Espanhóis, durante a Guerra da Restauração, pelo facto de o capitão Filipe de Araújo e Caldas ter destruído algumas aldeias na Galiza. A quinta depois passou, sucessivamente, para o filho de Filipe Caldas, Luís de Azevedo Araújo que era casado com Maria Teresa de Araújo, seu neto João de Araújo Azevedo casado com Maria Lima de Melo, seu bisneto Manuel Giraldo de Sousa Azevedo "Sottomaior" casado com uma terceira ou quarta prima da quinta do Rosal, Mariana de Araújo Azevedo Sottomaior.
O Padre Carvalho da Costa no seu livro “Corografia Portuguesa”, publicado em 1706, menciona que o nome da Quinta de S. Cibrão refere-se a uma capela dedicada ao dito santo que inclusivamente era, na época, destino de enfermos à procura de curas para certas maleitas. O autor refere acerca desta quinta que Aqui está a Quinta de S. Sybrão, que possui Felippe de Araújo de Caldas, Cavaleiro do Hábito de Cristo, Capitão-mor e Monteiro-mor de Valadares. Tomou este nome de uma capela antiga deste Santo Cipriano, que ali está; é tradição que foi templo da Gentilidade dedicado a Júpiter; o tio é fúnebre e desacomodado no meio de um campo com pouca veneração e menos o fora a não ser advogado das cézoens, ou maleitas, que muitos enfermos vem ali tremendo e voltam sãos”.
No livro “Portugal Antigo e Moderno”, volume VI, do professor Pinho Leal, publicado em 1875, menciona-se sobre a quinta que “É nesta freguesia a quinta de S. Cybrão, do Sr. Philippe d'Araújo Caldas. Segundo a tradição, no sítio onde está a capela desta quinta, houve um templo romano dedicado a Júpiter. Supõe-se que a existência do tal templo, foi uma fábula inventada para enobrecer esta propriedade, que, mesmo sem aquela circunstância, é notável, pela antiguidade e nobreza dos seus proprietários; e também porque produz óptimo vinho.”
No livro “O Minho Pittoresco”, José Augusto Vieira descrevia a freguesia de Penso, em 1886, como “uma vilota em miniatura” e confirma algumas informações já escritas pelo Padre Carvalho da Costa 180 anos antes. Replica também alguma informação já descrita pelo professor Pinho Leal: “Na quinta de S. Cibrião [Cipriano], é tradição que existiu um templo gentílico, dedicado a Júpiter, no ponto onde está hoje a capela. Há quem diga, porém, que essa tradição foi inventada com o fim de enobrecer a quinta, já de si notável pela família que possui e pelo bom vinho que produz.”

sexta-feira, 11 de janeiro de 2019

Melgaço, 1881 - Notícia de um violento temporal


Estamos em 1881, no último quarto do século XIX. Melgaço atravessava uma grave e longa crise que flagelou o concelho durante a quase totalidade dessa centúria. Para piorar o já delicado estado de coisas, em 27 de Janeiro desse dito ano de 1881, Melgaço é afetado por um episódio meteorológico extremo devastador e os estragos são imensos. Tal facto é contado, na primeira pessoa, numa notícia do jornal "O Valenciano": "Chegado de Melgaço, vou dar-lhe notícias daquela vila que parece separada completamente do país e como esquecida. Não faltaram ali sustos alaridos motivados pelo violento temporal do dia 27 do mês findo (27/1/1881), das 8 para as 9 da manhã daquele dia. O vento fortíssimo que então soprava levantou telhados, claraboias, chaminés, quebrando árvores e arrancando outras; foi pequena a sua duração, de contrário deixaria muitas casas apenas com as paredes. Em uma janela da casa onde se acha a repartição telégrafo-postal daquela vila, quebrou vidros e caixilhos, sendo para lamentar que ainda esteja sem eles e assim continue se o digno director da estação não pedir providências porque, segundo dizem, o dono do prédio esmera-se tanto com as casas que tem alugadas como se esmera com a sua; é como aqueles que estragam na farinha e poupam no farelo. O tempo de rigoroso inverno que ali tem havido, muito tem prejudicado os povos daquele concelho, que estará dentro em pouco a braços com a miséria se mão divina não melhorar o tempo e mão humana não puser termo aos actos de perfeita insensatez praticados pela municipalidade daquele concelho, que secunda a intempérie do tempo com a rigorosa inflexibilidade com que lhe exige o que ao tempo consegue escapar. A Câmara Municipal, para que os habitantes daquele pobríssimo concelho, onde só prospera a calúnia, a vingança e a miséria, não sintam tanto os males que a maior parte deles sofreram, exige-lhes mais de quatro contos de réis, derrama de cinquenta por cento! A medida não é má e pouco incomodativa. A criação de uma barca de passagem no rio Minho, em frente à estação do caminho-de-ferro (Arbo, Galiza), disso não trata, porque dá trabalho, e o rendimento da exploração é mais sólido e não fere os interesses dos compadres. Todos os meios indirectos de aumentar a receita são postos de parte para só os conseguir directamente, da algibeira dos contribuintes, que não podem, se não mal, adquirir meios de subsistência. Em outros concelhos recorre-se sempre, em último caso, àquele extremo e isto é não só conforme com a justiça como com a lei. Mas a lei suprema daquela corporação é o querer e poder; aquele meio directo, é o mais produtivo e o menos incomodativo. Pague o povo e não bufe! Não tenha estradas, nem melhoramentos, nem regalias algumas das que são concedidas aos outros povos, mas pague, como eles ou mais do que eles! Melgaço, na escala das povoações, é sem dúvida a última; conhece a civilização por ouvir falar nela; sabe que há estradas, caminhos-de-ferro, todos os elementos de prosperidade, enfim, porque o ouve dizer. Quanto a possuir, nem um desses elementos: ignorante e apática, os seus deputados, em vez de a ligarem com o resto do país pela civilização e pelo progresso, ligam-na pelo sofrimento e pelos sacrifícios!”

sexta-feira, 4 de janeiro de 2019

O sonho da luz elétrica em Melgaço há um século atrás




Em Melgaço, os primeiros acessos à luz elétrica remontam há mais de um século. Contudo, para a generalidade da população não passava de um sonho nessa época. O Dr. António Augusto Durães, enquanto administrador do concelho entre 1913 e 1914, terá sido dos primeiros a pugnar pela luz elétrica para Melgaço ainda que nunca tenha conseguido que tal se concretizasse durante o seu mandato.
O Peso e Castro Laboreiro seriam dos primeiros locais, em Melgaço, a possuir engenhos de produção de energia elétrica para diferentes fins em meados da segunda década do século XX. Em terras castrejas, foi Abílio Alves Carabel o primeiro a ter acesso a energia elétrica na sua fábrica de chocolate. Até então, as primitivas instalações que ocupavam parte do edifício em pedra do atual Núcleo Museológico de Castro Laboreiro, não tinham ao tempo energia elétrica, e o carvão, a que o pai Domingos Carabel sempre recorrera, onerava os custos. Abílio Carabel consegue então autorização dos Serviços Hidráulicos, onde chegou a trabalhar, para um barracão no rio Laboreiro, e aproveita a força motriz da água para gerar energia para a sua nova fábrica de chocolate.
No Peso, em 1913, as termas e os hotéis estão muito concorridos mas necessitam de se modernizarem. O complexo termal sonha com a luz elétrica. No jornal "Correio de Melgaço", na sua edição de 1 de Junho desse mesmo ano de 1913, podemos ler acerca de Cícero Solheiro que aspirava a instalar no Peso um cinematógrafo para a projeção de cinema e para isso precisava de energia elétrica: “Há indivíduos que pela sua ilustração e inteligência se impõem à nossa consideração e estima; outros, que pelo seu espírito verdadeiramente regional e empreendedor se impõem à nossa veneração. Neste caso está (…) Cícero Cândido Solheiro, que heroicamente trabalha para o engrandecimento material deste concelho, a quem adora, não se cansando de (…) lhe introduzir os melhoramentos indispensáveis à vida provinciana. O ano passado comprou (…) um magnífico camion para transporte de passageiros e bagagens, de Valença a esta Vila, e vice-versa, melhoramento de capital importância, já pela rapidez relativa da viagem, já pela comodidade com que nos transportamos, estradas em fora, numa distância de 42 kms. A sua actividade, porém, não parou aqui. Cícero Solheiro, estendendo as suas vistas de águia, reconheceu a necessidade de mais um camion, para quando houvesse grande movimento para as Águas do Peso e além disso poder facultar aos (…) hóspedes anuais digressões cómodas e agradáveis. Efectivamente, mais um luxuoso e elegante “Berliet” foi adquirido por este nosso amigo, melhoramento importante para o concelho, extraordinária e vantajosa comodidade para os seus hóspedes, que se podem transportar para onde lhes apraza, com a rapidez e conforto indispensáveis. Mas o Peso, dizia o bom do nosso Cícero, não tem uma única distracção, onde os aquistas possam relembrar a vida das cidades, onde passem algumas horas de ócio, despreocupadas e alegres. O Peso não tem outra distracção que não seja a beleza do nosso solo, tapetado de verdura e coberto de luxuriante vegetação. Dotar o Peso com luz eléctrica e um cinematógrafo era a ideia que mais o preocupava e que pôs imediatamente em execução, mandando-o construir e aplicar-lhe os mais aperfeiçoados aparelhos que a Companhia Cinematográfica Portuguesa pode fornecer e com cujo mecanismo fornecerá, de luz eléctrica, não só o salão cinematográfico, mas também os hotéis e estância das águas, caso queiram tal melhoramento, o que é muitíssimo plausível. Para deliciar os amadores de música adquiriu um lindíssimo e completo piano eléctrico, que também pode ser manual, ao qual adaptará belas composições musicais, ficando assim o Peso, até aqui de uma monotonia aldeã, transformado numa aprazível e encantadora estância. Sabemos que em 15 de Junho (…) será inaugurado o cinematógrafo, onde todos iremos, como verdadeiros regionais e amantes do progresso deste lindo rincão, prestar a nossa homenagem de consideração, veneração e estima, a esse novo, mas corajoso e intrépido trabalhador, a quem Melgaço deve todos os melhoramentos que possui. Mas a nossa veneração aumenta de intensidade ao lembrarmo-nos que Cícero Solheiro se não fora o grande amor pela sua terra (…), podia gozar despreocupado e sem canseiras, os seus avultados rendimentos. Mas não! Cícero Solheiro quer melhorar a sua terra, por cujo engrandecimento trabalha afanosamente, crendo nós bem que não haverá nenhum melgacense que ao pronunciar o seu nome não sinta por ele a veneração devida aos beneméritos da sociedade. Receba o nosso Cícero os cumprimentos do “Correio de Melgaço” pelo seu gesto dum verdadeiro patriota, dum sincero e desprendido regional”.
O sonho do Sr. Cícero Solheiro apenas se realizou em parte. Para tal, podemos dar uma leitura no referido jornal “Correio de Melgaço”, na sua edição de 24 de Agosto de 1913, que nos conta que “Inaugurou-se ontem, no Peso, com extraordinária concorrência, este belo salão cinematográfico… É uma bela casa de recreio, dotada de todos os aperfeiçoamentos modernos e requisitos indispensáveis a edifícios desta natureza; profusamente iluminado a luz eléctrica e pintado com muito gosto artístico. Admira-se ali um magnífico piano-concerto accionado a electricidade, que também pode ser tocado por qualquer pianista – sensacional novidade entre nós. Hoje há quatro sessões, que prometem muito, pela variedade e importância das fitas: às 14, 16, 20 e 22 h, que corresponderão à carreira de automóveis, entre a Vila e o Peso, pelo preço de 50 centavos, ida e volta, com direito a uma sessão. Há sessões todas as noites”.
Contudo, o complexo termal do Peso apenas iria ter luz elétrica nos espaços públicos e nos hotéis em 1931. Esse momento marcante é-nos contado no jornal “Notícias” de Melgaço”, na sua edição de 17 de Maio desse mesmo ano onde nos relata a instalação da electricidade em vários prédios desta estância: 500 lâmpadas no Hotéis Rocha, Quinta do Peso e filiais, no Parque e avenidas da empresa das Águas. Anunciava a inauguração para os primeiros dias de Junho sendo a energia fornecida pela Companhia do Tambre com sede na vila de Noia, província da Corunha, Espanha.
Amiudadas vezes faltava a luz, como refere o correspondente no Peso daquele jornal: “É raríssima a noite em que nesta localidade se conserve a luz eléctrica toda a noute sem por vezes se apagar, o que causa grandes prejuízos não só à casas particulares, como aos hotéis, casas de pensão e casas comerciais… Assim é que os hoteleiros e casas de pensão são obrigados a ter em depósito em sua casa de caixas de velas”.
O emprego da electricidade possibilitou a que se fizessem no balneário aplicações de diatermia, para o que foi adquirido um aparelho; ampliou-se também a secção de banhos carbo-gasosos. O balneário ficou provido de um serviço completo de banhos de imersão, carbo-gasosos, duchas escocesas e sub-aquáticas. Em 1935 começou a direção clínica “a empregar sistematicamente as curvas glicémicas como meio de investigação dos efeitos das águas na diabetes”.
Com maior frequência o Parque, o Pavilhão das Águas, os salões dos hoteis se animaram com as galas de iluminações nocturnas, as harmonias de bandas de música e orquestras, a elegância dos bailes e a alegria das quermesses. Era a beneficência, o melhor incentivo das festas, segundo as boas tradições das estâncias portuguesas. Contribuir para a filial que a Associação Protectora dos Diabéticos Pobres, em 1931, instalou no Peso, contribuir para o hospital da Misericórdia de Melgaço, contribuir para os pobres, tornou-se pretexto para amiudadas festas”.
Em 28 de Agosto de 1932 o “Notícias de Melgaço” descrevia assim a animação na estância que agora se prolongavam durante o período noturno até à madrugada: “As 9 horas da manhã deu entrada no Peso a afamada Banda dos Bombeiros Voluntários de Melgaço, com um primoroso passo dóbli e depois de executar várias peças do seu vasto reportório no Parque do Grande Hotel Ranhada, dirigiu-se para o parque das Águas, e aí permaneceu até à noite, tendo início dentro do Pavilhão das Águas e fora, um concorridíssimo baile que se prolongou até às três horas do dia 29. Durante a tarde houve jogos variadíssimos e diferentes divertimentos. A ordem era mantida por uma patrulha de marinheiros fardados e devidamente armados, comandada pelo Sr. E. P. de Mendonça, que devido à boa educação de todo o povo que foi assistir a estes festejos, não foi alterada a ordem da força acima referida”.
Três dias depois houve, no Peso, um outro baile, “por iniciativa de alguns hóspedes no Grande Hotel Ranhada e realizou-se a convite, visto encontrarem-se ali as damas mais distintas não só da vila de Melgaço como também desta localidade. O baile correu animadíssimo até às 2 horas da madrugada; foi oferecido às damas à meia noute um explêndido chá. A música constava de um quarteto composto de uma concertina, violão, flauta e violino, dirigido pelo Sr. Dinis de Brito, que fez executar com a inteligência e exactidão inumeráveis peças do seu grande reportório”.
O Parque do Grande Hotel do Peso conheceu também noites animadas como a da ‘Festa da Caridade’ realizada em 17 de Setembro de 1932, “por iniciativa das Ex.mas Sras. D. Judit Alheas, D. Maria José Nascimento e D. Sara Brou da Rocha Brito que foi abrilhantada com Iluminação, Bailes, Quermesses, Barracas de chá e petiscos nacionais servido por gentis senhoras com trajes a carácter. As Barracas muito originais e de um fino gosto artístico foram obra do Ex.mo Sr. Lino do Nascimento tendo como auxiliar o incansável Ex.mo Sr. Rocha Brito.
Às vinte e duas horas, entrou com um primoroso passo doble a banda de Valadares que depois de dar entrada no seu respectivo coreto, ali se conservou executando inúmeras peças do seu vasto reportório até às três da madrugada”.
No concelho de Melgaço, além do Peso, em 1931, foi também montada a iluminação pública com luz elétrica na vila de Melgaço. Até esta altura, existia na vila de Melgaço ou em Castro Laboreiro, iluminação pública fornecida por candeeiros a gás. Para instalar luz elétrica nas ruas de Melgaço, a Câmara Municipal pediu autorização, à Secretaria Geral das Finanças, para contrair um empréstimo de 150 contos para financiar tal operação. Numa missiva enviada pelo Governador Civil de Viana do Castelo ao Secretário Geral do Ministério das Finanças em 9 de Janeiro de 1930, podemos ler:

Ex.mo Sr. Secretário Geral do Ministério das Finanças

Tendo sido autorizado por Sua Ex.a, o Ministro do Interior, um empréstimo de 150.000$00 a contrair pela Câmara Municipal de Melgaço para a instalação da iluminação pública na Vila sede de concelho e encontra-se o respetivo processo nesse Ministério, venho solicitar a Vossa Ex.a se digne mandar submeter este assunto a despacho com a urgência que for possível.
Saúde e Fraternidade.
Viana do Castelo, 9 de Janeiro de 1930.”

O empréstimo recebeu o aval do Secretário Geral do Ministério das Finanças em 22 de Maio de 1930. A iluminação pública seria inaugurada em 1931. A energia elétrica da rede pública será assegurada pela empresa espanhola J. Valverde & C.ª. Esta empresa galega, mais tarde, vai obter da Câmara Municipal a concessão da exploração da rede elétrica no concelho. A energia que alimentava esta rede elétrica era proveniente de Espanha através de uma linha de transporte. A dita empresa manterá esta concessão até Setembro de 1962, quando a Empresa Hidro-Eléctrica do Coura, Lda, a empresa já concessionária em quase todo o distrito, assume essa função.
A luz elétrica só chegou à última aldeia de Melgaço já no século XXI.

Fontes consultadas: 
- Correio de Melgaço, edição de 1 de Junho de 1913;
- Correio de Melgaço, edição de 24 de Agosto de 1913;
- FIGUEIRA, João José (2012) - O estado da eletrificação portuguesa. Dissertação de Doutoramento apresentado à Faculdade de Letras da UC; Coimbra.
- Notícias de Melgaço, edição de 17 de Maio de 1931;
- Notícias de Melgaço, edição de 28 de Agosto de 1932;
- Carta do Governador Civil de Viana do Castelo ao Secretário Geral das Finanças.