sexta-feira, 31 de janeiro de 2020

Onde era a forca em Melgaço em tempos antigos?




Em 1867, é abolida em Portugal a pensa de morte. Nos séculos anteriores, muitos foram aqueles que, julgados, eram condenados à morte através de enforcamento entre outras formas. Em Melgaço, como noutras terras, havia, desde tempos antigos, uma forca para cumprir as sentenças capitais. Onde ficava? Numa praça central de Melgaço, ou noutro local? O saudoso Padre Bernardo Pintor encontrou, há mais de meio século, num documento antigo do século XVI, uma pista sobre a localização da dita forca em terras melgacenses durante a Idade Média. Atentemos: "Desde a sua emancipação pelo foral de D. Afonso Henriques, Melgaço teve os seus juízes e portanto julgamentos, de que necessariamente resultavam penalidades.
Não posso desenvolver o estudo da posição judicial de Melgaço através dos tempos. No reinado de D. Afonso III, aparece-nos como couto dentro do julgado de Valadares.
No tempo de D. Dinis, já absorveu todo o termo de Valadares que voltou a tornar-se independente. Segunda vez, foi anexado Valadares a Melgaço por D. Pedro I e depois novamente restituído por D. Fernando à sua autonomia.
Os de Valadares, termo extenso, não aceitavam de bom grado a justiça ministrada pelos juízes de Melgaço que era concelho muito pequeno.
Do que não resta dúvida é que em Melgaço já antes do século XVI havia uma forca para executar as pessoas à morte. Nós podemos ainda saber onde ela esteve mas não quer dizer que sempre fosse ali o seu lugar. A informação é dada pelo Tombo de Rouças, freguesia que teve preponderância na vida política de Melgaço pelos seus fidalgos de Eiró. Dali foram os primeiros alcaides que podemos conhecer pelos documentos do Cartulário de Fiães.
A vida burocrática dos concelhos nem sempre se desenrolava nos seus castelos, onde eles existiam. A maior parte das terras nem sequer tinha castelo, e de muitas não é conhecida a sede de administração nos tempos medievais.
A forca dos primeiros séculos esteve em local não muito distante do Eiró, como no-lo testemunha o Tombo de Rouças elaborado em 1540 sendo pároco e Reverendo António de Castro. Deste Tombo foi tirada uma certidão em 1651 pelo pároco João Lopes Vilarinho. Dessa certidão, guardada na Mitra de Braga, foi tirada um pública forma em 1798 pelo pároco Francisco Lúcio de Sá Sotto-Maior de Amorim Leones, que se encontra no arquivo paroquial de Rouças, e que eu agora consultei segunda vez, mercê da boa vontade do pároco atual, Reverendo António Esteves, dali natural.
No Tombo se lê que o limite de Rouças “...parte pelo Rio do Porto arriba, pela água, até ao Porto de Bolegais e dali arriba deste porto está um marco derriba do que arrincou um Vasco Carneiro, defunto, o qual marco se furtou de junto da herdade de João Rodrigues e se levou à parede da Granja do Mosteiro de Fiães, e que entra pela herdade que quedou de Mendo Álvares dali ao outeiro onde soia estar a forca...” A palavra “Soia” quer dizer costumava. Dá a entender que isso havia sido em tempos anteriores e que já não estava lá nessa à época. A localização desta antiga forca devia ser ali pelas imediações do antigo colégio externato.



Extraído de: PINTOR, Padre M. A. Bernardo (1975) - Melgaço Medieval. Augusto Costa & Cª Lda. Braga.

sexta-feira, 17 de janeiro de 2020

Nevão em Melgaço em 1969 - Reportagem RTP



Tratam-se de imagens impressionantes de uma reportagem da RTP de 10 de Janeiro de 1969, que nos mostram o manto de neve nas terras altas de Melgaço, especialmente em Lamas de Mouro e na estrada para Castro Laboreiro...
Confira tudo no vídeo abaixo...


sábado, 11 de janeiro de 2020

Melgaço descrito há cerca de 150 anos




Há cerca de 150 anos, Melgaço era bastante diferente do atual. Algumas décadas antes, tinha visto o seu território praticamente duplicar com a incorporação das antigas freguesias que pertenciam aos antigos concelhos de Castro Laboreiro e Valadares. No livro “Notícia Histórica das Cidades, Villas e Casas Ilustres da Província do Minho” (1873), Melgaço é descrito nestes termos: “A mais antiga noticia que se encontra da fundação desta villa, data do reinado de D. Affonso Henriques, que em 1170 a mandara povoar, cercando-a duma fortaleza no logar em que outrora existira uma chamada Minho.
Anteriormente a esta noticia, nada se sabe a respeito da povoação que ali existira, e que necessariamente fora praça de guerra, visto ter uma fortaleza ou baluarte.
Esta villa é uma das raias que dividem Portugal da Galliza pelo poente. Foi-lhe dado foral, ao que parece, por D. Sancho II. No entanto o título pelo qual El-Rei D. Sancho I dera a um mosteiro de S. João de Longos Valles bens e coutos, em mercê do assignalado serviço que lhe fizera D. Pedro Pires, prior que então governava o convento, mandando construir à sua custa a torre e fortaleza de Melgaço, parece indicar que fora este monarcha, que mandando reformar a villa lhe dera também foral.
O monarca que mais foros e privilégios concedeu a Melgaço, foi efectivamente D. Sancho II: e por tanto é de crer que fosse elle também quem lhe desse o mais distincto de todos, que é o foral.
D'El-Rei D. Diniz recebeu Melgaço também muitas graças e favores, entre outros o cerca-la de novos muros, e o escolher alcaide para o castello.
Tem Melgaço casa de Mizericordia e hospital, e as egrejas de Santa Maria e S. Paio, que são os edifícios mais importantes da villa: aquella, era apresentada alternadamente pela casa de Bragança e mosteiro de Fiães, e está situada a pequena distância da ermida de Nossa Senhora da Orada, imagem de muita devoção. O templo de S. Paio a que Sandoval chama mosteiro de S. Paio de Paderno, é um edifício curioso pela sua origem: pois segundo alguém pretende pertencera aos árabes, até que a infanta D. Urraca, filha d' El-Rei D. Fernando Magno, o concedera à Sé de Tuy, e ao seu bispo D. Jorge no anno de 1071.
A. rainha D. Thereza, e seu filho D. Affonso Henriques, confirmaram-lhe esta doação na parte a que tinham direito.
Os arrabaldes de Melgaço são férteis em cereaes e pastagens : no rio Minho que a banha, se pescam magnificas lampreias e salmões. Entre as produções de Melgaço é a mais importante, sem duvida, o saborosíssimo presunto.
Nas suas cercanias tem Melgaço muito honrosas casas e quintas, sobresahíndo entre todas as dos Castros e Sousas, tronco de muitas famílias illustres. A população da villa ascende hoje a mais de 2:000 almas e as suas armas são — em campo de prata um Pelicano de sua cor, amamentando os filhos com sangue que tira do próprio peito.”



Extraído de FIGUEIREDO, António Lopes de (1873) - Notícia Histórica das Cidades, Villas e Casas Ilustres da Província do Minho. Typografia Luzitana. Braga.

sexta-feira, 3 de janeiro de 2020

Acerca da contribuição de guerra de Melgaço para os franceses (1808)




Em Novembro de 1807, iniciava-se a primeira invasão francesa a Portugal, comandada pelo general Junot. Rapidamente, as tropas de Napoleão ocupam o país, contando com a preciosa ajuda de tropas espanholas, sem encontrar qualquer tipo de resistência por parte das nossas tropas. Durante a ocupação, o nossa país foi saqueado, tendo inclusivamente os franceses exigido a Portugal uma contribuição de guerra de 100 milhões de francos. Não satisfeitos, ordenaram a entrega das peças de ouro e prata das igrejas, capelas e confrarias.
De Melgaço, terão saído também algumas peças valiosas como parte dessa pesada contribuição de guerra, ainda que sejam muito escassas as provas documentais da entrega desses artigos. Um dos poucos documentos que atestam tais factos é um termo lavrado em Março de 1808, pertencente à velhinha Confraria do Espírito Santo, da vila de Melgaço, fundada no século XVI mas desaparecida há muito tempo. Esse velho manuscrito é citado por Augusto C. Esteves num livro publicado há quase 70 anos, “Melgaço e as Invasões Francesas”, onde o autor nos fala da entrega de um conjunto de artigos de prata da citada confraria, com vista a serem entregues aos franceses.
No dito livro, podemos ler: “Se por qualquer capricho da Fortuna, não ficou no Porto para os espanhóis, naqueles primeiros carros, como lembranças de Melgaço, lá ia também alguma coisa, afim de ser conduzida para França, no fim da campanha, graças à malfadada Convenção de Sintra.
E isto se escreve apesar de ninguém saber onde param os termos de entrega das pratas das igrejas, capelas, confrarias e irmandades do nosso concelho, termos lavrados na primeira quinzena do mês de Março [de 1808] , ao abrigo das instruções publicadas no dia 27 do mês anterior na casa do tesoureiro da décima, onde os culturais foram obrigados a levar aqueles bens igrejários confiados à sua guarda para serem relacionados e pesados na frente do Juiz de Fora da comarca, e isto se escreve e isto se afirma, porque na falta de tais documentos, guarda-se na minha casa memória de outra espécie.
Com toda a simplicidade, mas a reacender tanto limpeza de mãos como receio das consequências susceptíveis de surgirem num futuro incerto, ainda e sempre possível naqueles tempos de invasão estrangeira, se acaso não representa somente o simples protesto contra a forçada entrega ao invasor das coisas de Deus, di-lo um velho Livro de Actas duma velha confraria da Vila – a do Espírito Santo, fundada aí por 1578 e há muito desaparecida para os actos do Culto.
Ouçamos a voz longínqua:

"Aos seis dias do mês de Março de mil oitocentos e oito annos por Ordem do Governo deste nosso Reino se remeteu para a Cabeça da Comarca a prata desta confraria que foi a Cruz com sua haste, o Caldeiro com seu hezope, humas galhetas com seu prato, hum turibulo com sua naveta, e a vara do Reverendo Prior, que tudo pezou doze arrateis e meio, e meia quarta digo e meio, e hua quarta. E determinamos que para o transporte da dita prata visto as ordens determinarem ser à custa da Confraria, o Thezouro desta satisfará e enporte do seu transporte que se lhe levará em conta. E para constar se fez este termo que assynamos. Em meza do dia, mês, anno ut supra.
O Prior, Pedro da Ribeira Araújo Castro
O Padre Francisco António da Cunha
O Eleito, o Padre João Manuel Durães
O Prometor, Padre Manuel Alvarez Torres
O Procurador, Padre José Lopes”

E isto sabia-se aqui na terra, era público e era notório. Comentava-se. Havia más vontades...”
Em Melgaço, não há provas que atestem que tropas napoleónicas tenham passado por aqui. Sabemos que as autoridades melgacenses, ao contrário das ordens dos franceses no sentido de destruírem todas as armas reais nos edifícios públicos, mandaram colocar argamassa sobre as mesmas. Esse procedimento foi seguido, por exemplo, na Fonte da Vila ou na Câmara Municipal.
Os franceses foram expulsos de Portugal em 1808 mas voltariam mais duas vezes…





Fontes consultadas:
- ESTEVES, Augusto César (1952) – Melgaço e as Invasões Francesas. Tipografia Melgacense, Melgaço.
- SILVA, João Paulo Ferreira (2015) – Primeira Invasão Francesa – 1807 – 1808 – A invasão de Junot e a revolta popular. Academia das Ciências de Lisboa, Lisboa.