domingo, 30 de abril de 2023

Alguma vez ouviu falar no Orfeão de S. Gregório (Cristoval - Melgaço)?

 



Muito poucos se lembrarão do Orfeão de São Gregório, na freguesia melgacense de Cristóval. Apenas temos referências à sua existência nos anos 40 do século passado e são muito poucas.  

Terá tido uma curta existência e sabemos que existia em 1945, e em 1947 podemos ler uma pequena notícia na Voz de Melgaço de 15 de Julho desse ano acerca dos orfeões que existiam no concelho na época: “Já houve orfeões na nossa terra. Recordámo-nos do belo orfeão do prof. Ribeiro da Silva que, em boa hora, chegada a esta encantadora terra, pensou num orfeão. E conseguiu-o. 

Em S. Gregório, logar orgulhoso e bairrista, com justificadas razões. O D. Castor preparou um belo orfeão que se fez ouvir em S. Gregório e nesta vila. 

Ainda na linda e encantadora festa do dia 13 de Maio, no Monte do Facho, o orfeão, ressuscitado e, sob a chefia do consagrado maestro, fez-se ouvir nas cerimónias religiosas. Já houve orfeão na nossa terra. E agora, não existe. Porque será? 

Fomos procurar alguma notícia relativa à festa no Monte do Facho em 13 de Maio de 1947 em que se assistiu à coroação da Nossa Senhora de Fátima. Na Voz de Melgaço de 1 de Junho de 1947, podemos ler uma notícia com o título “Coroação de Nossa S. de Fátima” e onde se desenvolve: “S. Gregório - Cristoval. À povoação de S. Gregório e o seu pitoresco Monte do Facho foram pequenos para comportar a grande afluência de espanhóis e portugueses que no passado dia 13 de Maio ali acorreram para assistir à solene festa da Coroação de N. S. de Fátima. (…) 

As diversas cerimónias da missa foram explicadas pelo Ver. P.e Frei Leão do santíssimo Sacramento. A parte coral esteve a cargo do grupo orfeónico de São Gregório, coadjuvado pelo coro da Acção Católica da amiga freguesia de Arnoia (Espanha), e sob a regência do hábil e já de sobra conhecido amador D. Castor Castelle, estado ao harmónio o Rev. Padre António Pereira, superior dos R. P. Franciscanos de Orense que gentilmente aqui veio para tal fim.” 

Não mais encontramos referências na imprensa local ao Orfeão de S. Gregório. Ficam aqui estas parcas notas a assinalar a sua existência àqueles que desconheciam em tempos idos, houve um orfeão em S. Gregório... 

sexta-feira, 21 de abril de 2023

Onde ficava o Paço de Rouças e a primitiva capela de Santo André (S. Paio - Melgaço)?


 

A freguesia de São Paio existe desde tempos imemoriais e é uma das mais antigas do atual concelho de Melgaço, sendo mais antiga que a nação portuguesa. Em tempos muito antigos, fazia parte da terra de Valadares e integrava uma freguesia chamada de “São Paio de Paderne”. Contudo, D. Afonso Henriques, em 1141, ao constituir o Couto de Paderne, desmembrou o antigo território. 

A mais antiga referência a São Paio data de 1043. Nesse ano, a 17 de Março, um tal abade Aloito e os seus irmãos doam ao mosteiro de Celanova muitos bens e propriedades, incluindo “in ripa Minei ubi dicent Prato [Prado], sic alio monasterio de Sancto Pelagio [São Paio]”. 

Entre os lugares da freguesia, encontra-se o Paço, um lugar assim designado há muitos séculos por ali se ter encontrado, em tempos antigos, o chamado Paço de Rouças, casa senhorial que já existia no século XVI. Não estranhe o leitor o nome alusivo à freguesia vizinha já que os senhores do Paço tinham o padroado de Rouças, ou seja, tinham o poder de nomear o pároco da igreja de Santa Marinha, entre outras regalias. 

De facto, o topónimo refere-se, segundo LEAL, A. (1874), ao antigo Paço de Rouças, casarão dos antigos fidalgos da terra, que ainda existia neste lugar, na segunda metade do século XIX. Na dita obra, pode ler-se, que “Esta paróquia [de Rouças] foi primeiramente padroado da antiga e nobre família dos senhores do Paço de Rouças. (…) Ainda se vêm as ruínas de uma antiquíssima casa chamada o Paço, solidamente construída, e, em parte, ainda habitada.” O autor situa este lugar na freguesia de Rouças o que não corresponde à verdade já que a chamada Casa do Paço de Rouças ficava na vizinha freguesia de São Paio, como demonstraremos mais à frente com recurso a fontes documentais.  

Se corrermos as páginas do célebre livro “O Minho Pittoresco”, o autor confirma-nos que, ainda no último quarto do século XIX, que: “Roussas era padroado da antiga casa do Paço de Roussas e no lugar — chamado do Paço — se veem ainda as ruínas do antiquíssimo edifício, em parte ainda hoje habitado. Este padroado passou depois para Manuel Pereira (o mil-homens) de Monção e o solar para os Castros de Melgaço, e mais tarde para os arcebispos de Braga” (VIEIRA, 1886). 

Contudo, antes de pertencer à família Castro de Melgaço, o Paço de Rouças pertencia a uma família Besteiros, “gente valente e destemida, que se fazia respeitar por aquelas redondezas” (OLIVEIRA, 1903). Na Corografia do Padre Carvalho da Costa, publicada em 1712, este conta-nos que o tal palacete “foi dos senhores do Paço de Roussas, do apelido de Besteiros, família tão antiga, como nobre, a quem o tempo e pobreza tem atenuado de modo, que poucos lavradores o tomam hoje” (CARVALHO, 1712). Tais informações são confirmadas por OLIVEIRA, G. (1903) que escreve que “Os Senhores do Paço de Roussas, de apelido Besteiros — de antiga família nobre, foram atingidos pela pobreza. As suas armas eram em campo azul, uma torre fumada em penhas azuis, e três bestas de ouro, uma por cima e as outras aos lados.” Tratava-se de “uma antiquíssima casa (...), solidamente construída…” (LEAL, 1874)  

A passagem do Paço de Rouças para a família Castro ter-se à concretizado algures na segunda metade do século XVI. Dá-se pelo casamento de uma tal Francisca Rodrigues Besteiro, filha de Cristovão Rodrigues Besteiro e de sua mulher Constança Gomes, com um tal Belchior Castro, a quem – segundo justificação de nobreza feita em 26 de Novembro de 1601 – seu parente Pero de Castro deixou os cargos de Capitão-mor, sargento-mor e alcaide-mor de Melgaço, quando se ausentou para a jornada de Alcácer-Quibir (MONTEIRO, 1987), e por lá morreu, facto ao qual nos referimos mais à frente. 

Há cerca de meio século, num artigo na “Voz de Melgaço”, na sua edição 1 de Setembro de 1971, sem autor referido, menciona-se que “ainda hoje se podem ver ruínas daquele solar”. Para demonstrarmos inequivocamente a localização do Paço de Rouças naquele lugar da freguesia de São Paio, podemos socorrer-nos da leitura de uma escritura lavrada em 18 de Outubro de 1718 no lugar do Telheiro, Rouças, e nas casas de António Durães, onde foi o tabelião Baltasar Soares de Castro e Araújo, de Cortinhas, Prado, como procurador de António Pais Rebelo Soares de Castro e mulher Grimanesa Soares de Castro, moradores no lugar de Paços, na freguesia monsanense de Lara, vende àquele António Durães e mulher Maria Dias, o Telheiro, o Campo da Ponte do Rio, sito na freguesia de S. Paio por cento e vinte mil réis “o qual campo herdaram os seus constituintes por falecimento de seus pais e sogros Gregório de Castro Araújo e sua mulher Magdalena de Castro, moradores que foram no Paço de Rouças, da freguesia de São Paio… 

O que sabemos mais acerca dos senhores do Paço de Rouças? 

Os senhores do Paço de Rouças mais antigos que se conhecem através da documentação histórica são Cristóvão Roiz Besteiro e mulher D. Constança Gomes Podré e que ali viveram ainda no século XVI. 

A filha destes, D. Páscoa Rodrigues Podré, casou com Belchior de Castro Azevedo, filho de António de Castro Azevedo Silva Coutinho e de Maria Soares, moradores na Casa e Quinta do Fecho (Rouças), e é aquele melgacense de quem se disse numa justificação de nobreza feita no tribunal de Melgaço em 1601: “...que indo desta terra Pero de Castro era o alcayde moor desta villa pera affrjqua [África] na jornada de EI Rei dom sebastião deixou ho carrego de capitão moor e sargento moor e allcaj darias moor a belchior de castro tio do sobplycante lopo de castro o quall serbio os ditos carregos athe a Ora de sua morte athe entregar esta villa a sua magestade por mandado do duque noso Snr por ser o dito belchior de castro seu parente primos segundos…". Belchior e a esposa moraram no Paço de Roucas.  

Entre outros filhos, tiveram Gregório de Castro. Este também foi capitão e capitão-mor das ordenanças das vilas de Melgaço e Castro Laboreiro e seus termos. Como filho único, herdou a casa do Paço de Rouças de seus pais e tendo casado com D. Trujiana Gil de Araújo, padroeiros dos benefícios de Ribaterme e Santa Cristina de Baleixe, na Galiza, ainda viviam ambos em 1645. (ESTEVES, 1989) No fim desse ano, no dia 28 de Dezembro, em Rouças e no casal do cura Belchior de Castro, o prior do convento de Paderne, D. Simão da Paixão arrendou a Domingos de Araújo, de Paços, “os dizimos e premissas da igreja de santa Maria de Paços anexa in perpetuum ao dito seu mosteiro que são de pão, vinho, linho, pescado, castanhas e todos os mais dizimos e abenças pertencentes a dita sua igrejapor dois anos e por setenta mil réis cada ano. Ora como testemunhas do ato serviram aquele cura de Rouças e o Gregório de Castro e mulher Trujiana Gil de Araújo, e que aparecem referidos como moradores no Paço de Rouças. Estes tiveram pelo menos uma filha chamada Ana de Castro, que foi moradora em Rouças. 

A última referência aos senhores do Paço de Rouças data de 1718 e refere-se a um tal Gregório de Castro Araújo e sua mulher Magdalena de Castro como moradores no mesmo, tal como se faz referência em documento atrás. 

Aos senhores do Paço de Rouças se deve a construção de uma primitiva capela de Santo André, em São Paio. Não nos referimos à atual capela, mas sim a uma outra e anterior ermida que foi construída não no sítio onde a podemos ver atualmente, mas sim no lugar do Paço. Tal informação fomos encontrá-la num documento redigido em 4 de Agosto de 1687 e outros que à frente apresentamos. Na dita escritura, o sacerdote visitador, Doutor Cristovão da Costa Rosa, veio pessoalmente à igreja de São Paio, e escreveu que “Por constar que a capela de Santo André tem fábrica como consta de huma licença que deu o Senhor Dom Frei Bartolomeu dos Mártires, arcebispo que fora de Braga para que se dissesse a missa nela e por huma certidão que deu o Reverendo Gonçalo Pereira, abade desta igreja, tirada do livro dos batizados de uma obrigação que Belchior de Castro e sua mulher fez de uma vinha sita à Cruz de São Gião, à ermida de Santo André, mando que seja notificado o possuidor ou possuidores della para que fabrique a dita capella de todo o necessário o que farão até dia de Páscoa de flores para vindoura, e não satisfazendo no dito tempo, o Reverendo pároco proceda contra elles até de participantes...” Assim, tendo em conta que Dom Frei Bartolomeu dos Mártires foi arcebispo de Braga desde 1559 a 1580 e que neste tempo também terá vivido Belchior de Castro no Paço de Rouças, podemos assim situar a origem da primeira e primitiva capela de Santo André, no lugar do Paço, ainda na segunda metade do século XVI, naquela janela temporal. 

Por fim, um documento redigido em 1719, atesta-nos que a capela antiga ainda existia nessa época e ficava no lugar do Paço. É neste lugar que a situa o Doutor Manuel Pinheiro Ramos, sacerdote visitador quando escreve, no seu relatório de 29 de Agosto desse ano: “Consta-me que a capela de Santo André sita no lugar do Passo está indecente... 

Não restam dúvidas da localização da primeira capela de Santo André na freguesia de São Paio. A capela atual foi construída entre 1745 e 1746 por iniciativa do padre de São Paio, Domingo Gomes, mas acerca da História desta capela, vamo-nos referir com mais pormenor num próximo artigo...