O
jornal português mais antigo começou a ser publicado há quase 400
anos. Chamava-se a “Gazeta” e foi publicada entre 1641 e 1647. Em
alguns dos números, encontramos notícias sobre Melgaço, que se
centram sobretudo nos combates das tropas portuguesas na Guerra da
Restauração contra as hostes espanholas nestas terras.
Este
Periódico serviu também como um importante meio de propaganda
nacionalista portuguesa numa época de guerra e de consolidação da
independência. É também uma importante ferramenta de estudo da
Guerra da Restauração que deve ser usada com cuidado porque nem
sempre as notícias parecem ser verdadeiras. Atente-se numa notícia
sobre factos passados em Castro Laboreiro na primeira edição deste
periódico, em Novembro de 1641, que nos conta que onze camponeses de
Castro Laboreiro derrotaram doze cavaleiros espanhóis, matando sete
e prendendo cinco, e que desbarataram uma companhia de 300
castelhanos.
Na
edição da Gazeta de Fevereiro de 1642, conta-se que “por carta
escrita entre o Douro e o Minho, no dia 7 deste mês, avisas-se que o
Marquês de Val Paraíso entrou com quatro mil infantes pela Ponte
das Varjas (ponte velha de
S. Gregório), marchando por Lamas de Mouro, Mosteiro e
Coito das Travas e que fez dano porque não havia força bastante
para resistir a tanta gente. O relato ainda diz que quando chegou o
aviso na praça de armas, se preveniram em Braga o General Dom Gastão
Coutinho e o Coronel Francez, saindo ao encontro com a gente do
presídio. De Melgasso vieram três companhias. O Marquês de Val
Paraíso, vendo a multidão contra ele, não quis esperar e se
retirou para Lamas de Mouro, alojando-se em um reduto que os
portugueses haviam ganhado.”
Na
edição de Março de 1642, volta a falar-se de operações militares
em Melgaço e na região. Uma notícia fala-nos da presença de
oficiais franceses e holandeses na região, além de aventureiros que
procuravam, antes de tudo, enriquecer à custa dos saques, e que
lutavam ao lado dos portugueses leais à Casa de Bragança contra os
castelhanos e os aliados de D. Filipe III. A Gazeta, em diversas
notícias, revela essa situação, sendo que na peça seguinte se
revela, ainda, outra função do jornalismo – a explicativa, por
vezes com base no recurso a formas figurativas e adjetivas de
linguagem: “De Entre-Douro e Minho, no primeiro sábado deste
mês, veio uma carta em que se avisa que um capitão de infantaria
francês, tenente-coronel, enfadado da suspensão das armas e do
grande ódio em que os soldados estavam na cidade de Braga, por causa
do Inverno, deliberou sair em campanha e entrar por terras dos
inimigos, ele só com a sua companhia, para o que foi com muito
segredo, persuadindo aos seus soldados (os quais eram todos
portugueses que vieram da Flandres e da Catalunha; gastou oito ou
nove dias em lhes dispor os ânimos e em prevenir pólvora, balas,
corda e tudo o mais que era necessário para reduzir a acto esta
generosa deliberação. E um dia antes do amanhecer deu traça com
ele, e os seus soldados saíram à desfilada e caminharam para
Melgaço e daí foram marchando pela ponte das Varjas até que
entraram na Galiza, destruindo e subvertendo e assolando tudo aquilo
que com os olhos descobriam. Não ficou gado que não fizessem presa
nem encontraram pelo caminho homem nenhum que não rendessem. Com
esta bissaria foram avançando e metendo-se pela terra dentro. Porém,
acudiram os inimigos de várias partes e saíram-lhes ao encontro
divididos em dois troços, uns pela vanguarda e outros pela
retaguarda. Estes segundos se meteram pelos matos e, sem serem
vistos, nem sentidos, lhes armaram uma cilada com que lhes cortaram o
caminho por onde precisamente haviam de passar quando tornassem. De
modo que se marchavam para diante iam dar nas mãos dos que investiam
pela vanguarda; se se retiravam, era infalível a ruína, pois
metiam-se entre os que cortando-lhes o caminho os esperavam na
emboscada; e se faziam alto sem dúvida ambos os esquadrões os
acometiam e seria irremediável a perdição. Vendo-se o francês
neste tão horrível aperto, fez uma prática aos soldados,
representando-lhes o perigo em que a fortuna os havia posto e
exortando-os a que deliberassem a perder antes a vida do que a honra.
Não lhe deixaram os soldados acabar o discurso, porque todos
unânimes e conformes se resolveram a romper aquele esquadrão, que
emboscado pretendia tolher-lhes o passo antes que o outro (que já
lhe tocava arma pela vanguarda) lho estorvasse. Passou o capitão
para a retaguarda e logo viraram com muita destreza os soldados os
rostos e foram marchando com tão boa ordem que quando chegaram à emboscada lhe descompuseram a frente e com a primeira carga, a puras
feridas e mortes, abriram caminho muito antes que chegasse o
esquadrão que marchava em seu alcance. Pisando morto e pondo por
terra a todos os que lhe serviam de embaraço, romperam, penetraram e
saíram da filada até que se puseram a salvo com tanta galhardia e
admiração dos inimigos que nem o outro esquadrão, que já estava
perto, se atreveu a segui-los. E o maior assombro que houve nesta
heroica ousadia foi da nossa parte não ter morrido
ninguém e somente um soldado saiu ferido com uma bala no braço
esquerdo, o qual se veio curar à cidade de Braga, onde naquele tempo
estava o general Dom Gastão Coutinho. E com este exemplo deliberaram
todos sair em campanha e logo o coronel francês foi para as
fronteiras do Minho”.
Gostaria de terminar uma cópia de um desses jornais onde falam de Lamas de Mouro e Castro Laboreiro
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