sábado, 5 de setembro de 2020

Fiães (Melgaço) no início do século XX


 


No início do século passado, a freguesia de Fiães, herdeira do seu velhinho couto do antigo mosteirera algo diferente da atual. Na altura ainda estavam de pé algumas ruínas das instalações monásticas 

Num dicionário enciclopédico da época, Fiães é assim descrito: “Povoação e freguesia de Santa Maria, concelho e comarca de Melgaço, distrito de Viana dCastello, arcebispado de Braga. Possui 783 habitantes e 208 fogos. Tem escola do sexo masculino. A povoação dista 4 quilómetros da sede do concelho e está situada em terreno acidentado. É vasto o seu território. Houve aqui um importante convento de frades beneditinos, é muito antigo, pois, segundo a tradição, já existia em 851, no tempo de D. Ramiro II, rei de Leão. Consta que era o mosteiro mais rico das Hespanhas. O convento pagava 40$000 réis à capela real, e 251 000 réis ao convento do Desterro, de Lisboa. Já era couto no tempo de D. Afonso Henriques, primeiro rei de Portugal. Tinha muitos privilégios. 

Na igreja deste convento está actualmente estabelecida a freguezia. Ainda se conserva em bom estado, é de arquitetura góthicae tem o tecto sustentado por fortes arcarias. A entrada principal é ornada de muitas colunatas da mesma ordem arquitetónica, revelando a mais remota antiguidade. O interior do templo é escuro e triste, as cornijas e cimalhas são ornadas de diferentes figuras, mais ou menos phantasticas. Com a extinção das ordens religiosas, o convento foi posto em venda, mas por falta de compradores, chegou a vender se em detalhe, a pedra das paredes, colunas, arcarias, telhados, portas, janelas, varandas, grades de ferro, etc. 

Pela povoação, passa o pequeno rio Trancoso, que divide Portugal da Galliza, e entra na margem esquerda do rio Minho, 6 quilómetros acima de Melgaço. A 1500 metros do mosteiro, ergue-se a elevada serra de Pernidello, d’onde se disfruta um vastíssimo panorama. Acerca do mosteiro publicou o senhor Guilherme de Oliveira, em Lisboa, uma monographia intitulada: Uma visita ao real mosteiro de Fiães 

Fiães pertence à 3ª divisão militar e ao Distrito do Recrutamento nº 3, com a sede em Vianna do Castello. 

Talvez a melhor descrição do convento de Fiães em início do século XX é a que nos deixou OLIVEIRA, G. (1903) no seu livro, antes citado, sobre a sua visita a Fiães nesse ano: Parei. Deixei o animal em que montava, e a pé, comecei por trilhar uma extensa e larga alameda de castanheiros, olmos e carvalhos, sobre o chão claro e plano, que forma a antiga via principal do mosteiro. 

Ao centro, há um cruzeiro moderno de pedra, com a data 1875! Representa uma coluna, tendo no alto uma pequena cruz com duas imagens regularmente esculturadas, e de costas entre si. Esta parte, é pintada e dourada de pouco, e a sua conservação está de acordo com a mesma data. 

Achei esquisito aquele luxo, em contraposição com tanta coisa abandonada que o rodeia. No fim da alameda, e em seu paralelo, ha uma fonte de excelente e frigidíssima água, com bancos formando um círculo. 

Convida o lugar a descanso e meditação. Seguem-se as ruínas. Da torre, que devia ser grandiosa, restam alguns metros de grossas paredes, formadas de grandes pedras desconjuntadas, tendo, mesmo assim nelas cravado, o enorme sino que ainda tange para o serviço da igreja. Havia neste lugar uns vestígios de muralha, que foram propositadamente demolidos para a construção do cemitério que hoje ali existe, o qual é fechado por moderna grade de ferro. (…) 

No adro, que contorna o edifício, há grandes carvalhos seculares, achando-se o que enfrenta o pórtico fendido a meio por faísca, que o dilacerou há muito, vendo-se ainda a sua vestutez. Existem também de pé as paredes frontais de uma parte da ala direita do convento, a qual, como o requeria o lugar, que é de grandes ventanias e temporais tem fortes cantarias. 

As janelas e portas são de pequeno formato e sem nenhuma importância arquitetónica. Eram por detrás, os claustros, dos quais ainda se vêm algumas elegantes e finas colunas, sustentando aqui um arco, ali um resto de flecha, e além formando monte. 

São bem lançadas as curvas e dignas de atenção. Existem também, dispersas pelo terreno transformado em campo de lavoura, paredes com restos de janelas, ombreiras e escadas, e o lugar da fonte que abastecia o convento. 

Examinando a área larga por onde se estendem os vestígios das construções extintas, é que se pode avaliar a grandeza do antigo mosteiro (…) Tinha o D. Abade capela particular, — chamada abacial, — a qual está assinalada por pedaços de grossos muros mal conservados. Ali, em um altar, veneravam-se as imagens de Nossa Senhora da Conceição, de grande formato, e outra menor, de S. Bernardo. 

 

 

 

Fontes consultadas: 

-PEREIRA, Esteves & RODRIGUES, Guilherme (1909) - Portugal - Diccionário Histórico, ChorographicoBiográphicoBibliográphico, Heráldico, Numismático e Artístico. João Romano Torres & Companhia; Lisboa. 

-OLIVEIRA, Guilherme (1903) - Uma visita às ruínas do Real Mosteiro de Fiães. Livraria Ferreira, Lisboa. 

Sem comentários:

Enviar um comentário