sábado, 27 de março de 2021

Sobre a "Auto Melgaço": a mais antiga empresa de camionagem de Melgaço


 

Desde que o comboio chegou a Valença em 1882, que se passou a realizar um serviço de transporte de passageiros até Melgaço. Nessa época, o transporte era feito numa carroça puxada por cavalos, tal como se mostra no recorte de jornal:


Nesta fotografia da autoria de Aurélio da Paz dos Reis tirada em 1903 no Peso ainda se pode ver a carreira que fazia ligação ao comboio. Carros, nesta época, eram raríssimos em Melgaço.

Em Melgaço, surge em 1912 a mais antiga empresa de camionagem. No dizer de ROCHA, J. (2010), a “Auto Melgaço” era uma “empresa de transporte de passageiros criada a 24 de Maio de 1912 por Cícero Cândido Solheiro (1878-1947), um dos maiores empreendedores que Melgaço conheceu. A garagem era na Corredoura, Prado, e o seu 1º motorista foi Emídio Augusto Marques. O “auto-ómnibus”, «Berliet» de 22 HP, com lotação para 20 passageiros e capacidade para 600 kg de bagagens, chegara a Melgaço a 5 de Maio de 1912. Fazia carreira diária entre Melgaço e Valença, com serviço combinado com o caminho de ferro. (Nota: Os passageiros que partissem de Melgaço poderiam também embarcar no Rio do Porto, em frente à Loja Nova, onde havia paragem. O ómnibus, no regresso, iria a S. Gregório, quando o número de passageiros não fosse inferior a cinco, custando cada passagem mais 500 réis, não pagando pela bagagem mais do que até Melgaço (Vila). Logo que a estação de Lapela abrisse, o serviço seria feito a todos os comboios, havendo grandes alterações no horário e preços de passagem, com vantagens para o público (Melgaço, (10/5/1913. C.C.S.). Quando os hotéis do Peso abriam, reforçava a sua frota, contratando novos motoristas. A fim de tornar mais conhecida a sua empresa promovia passeios gratuitos, como aquele que efectuou a 16/5/1913, a Vigo. As relações de trabalho por vezes eram conflituosas. O “Correio de Melgaço” publica, a 26/4/1913, o seguinte anúncio: «Cícero Solheiro, proprietário do Auto-Melgaço, declara para os devidos efeitos que despediu dos seus serviços de chauffer o empregado, D. Manuel Róbinos, em virtude duma local publicada no “Jornal de Melgaço” 980, com a epígrafe «Um automóvel que se precipita». Pela mesma altura (1913) publicava-se no CM «A Empresa Sousa & Irmão abriu ao público (…) a carreira diária para aquela estância (Águas do Peso), sendo a partida desta Vila às 10 h… Aos domingos e dias de tribunal só virá um cavalo de sela fazer a carreira». Os animais ainda se aguentaram uns anos na estrada, mas os automóveis acabaram por vencer. Como o comboio chegou a Monção em 1915, a partir daí a carreira diária era efectuada entre Melgaço (partida 11 h) e aquela Vila (regresso 16.30). 

Curiosamente, no mesmo Correio de Melgaço, na sua edição de 24 de Agosto de 1913, encontramos um grande elogio ao proprietário da Auto Melgaço nestes termos: “Cícero Cândido Solheiro, que heroicamente trabalha para o engrandecimento material deste concelho, a quem adora, não se cansando de (…) lhe introduzir os melhoramentos indispensáveis à vida provinciana. O ano passado comprou (…) um magnífico camion para transporte de passageiros e bagagens, de Valença a esta Vila, e vice-versa, melhoramento de capital importância, já pela rapidez relativa da viagem, já pela comodidade com que nos transportamos, estradas em fora, numa distância de 42 kms. A sua actividade, porém, não parou aqui. Cícero Solheiro, estendendo as suas vistas de águia, reconheceu a necessidade de mais um camion, para quando houvesse grande movimento para as Águas do Peso e além disso poder facultar aos (…) hóspedes anuais digressões cómodas e agradáveis. Efectivamente, mais um luxuoso e elegante “Berliet” foi adquirido por este nosso amigo, melhoramento importante para o concelho, extraordinária e vantajosa comodidade para os seus hóspedes, que se podem transportar para onde lhes apraza, com a rapidez e conforto indispensáveis. Mas o Peso, dizia o bom do nosso Cícero, não tem uma única distracção, onde os aquistas possam relembrar a vida das cidades, onde passem algumas horas de ócio, despreocupadas e alegres.”

Cícero Solheiro mandou montar também o primeiro animatógrafo em terras de Melgaço. Assim, em 23 de Agosto de 1913, é inaugurado no Peso o animatógrafo «Salão de Melgaço» também explorado por este melgacense. Cada entrada custava 50 centavos e dava direito ao transporte de ida e volta da Vila na carreira (a «Auto Melgaço») que aquele empreendedor havia inaugurado no ano anterior...



Fontes consultadas: 

- VAZ, Júlio (1996) – Padre Júlio apresenta Mário, edição do autor.

-ROCHA, Joaquim (2010) - Dicionário Enciclopédico de Melgaço, volume II, Edição do autor.

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