O edifício do antigo asilo da Quinta do Eiró
Este
edifício terá sido construído por volta de 1872 conforme a data
inscrita em cartela na escadaria da fachada sul. O
mesmo era propriedade de Dona Maria Pia Pereira de Sousa, da ilustre
Casa de Galvão, que, no estado de
viúva de Francisco Pereira de Sousa, por escritura de 6 de Agosto de
1919, fez doação à Santa Casa da Misericórdia de Melgaço, com
reserva de usufruto vitalício,
deste edifício e dos terrenos da Quinta de Eiró, situados neste
lugar dos arredores da vila de Melgaço.
Na
dita escritura de doação pode ler-se: ”Ela, doadora, faz
esta doação para o fim altruísta de
iniciação e base de uma obra de caridade, como preito de admiração
e da sua maior homenagem pelo caráter austero de seus falecidos
marido e cunhado, Francisco Pereira de Sousa e Dr. António Pereira
de Sousa, que nesta linda e acolhedora terra de Melgaço viveram por
longo tempo e que como sua adoptaram com afincada dedicação, como
contador de Juízo e Médico Municipal, não podendo e não sabendo
como melhor enaltecer-lhes as sua lídimas qualidades de coração e
como que interpretando-lhes o seu sentimento caritativo,
que possuem e exerciam com
piedade, sendo esta doação feita com o fim de nos bens doados, se
estabelecer um asilo de inválidos com as condições que seguem:
este asilo denominar-se-á Pereira
de Sousa e será destinado ou terá por fim receber e sustentar os
inválidos de ambos os sexos, absolutamente indigentes, moradores
nesta vila de Melgaço. Na falta de indigentes naquelas condições,
serão admitidos, em igualdade de circunstâncias, os das
freguesias do concelho preferindo os das mais próximas”.
D.
Maria Pia Pereira de Castro e Sousa viria a falecer em 24 de novembro
de 1935 e como o estipulado na doação, nessa data, passaram os bens
citados para a administração da Santa Casa da Misericórdia de
Melgaço.
Dando
cumprimento às vontades expressas na doação por
D. Maria de Castro e Sousa, o asilo Pereira de Sousa viria a ser
inaugurado em 20 de Setembro de 1936.
Na
ata da inauguração lemos:
“Aos
vinte dias do mês de Setembro de mil novecentos e trinta e seis,
pelas dezasseis horas, no sitio de Eiró, extramuros desta
vila de Melgaço, achando-se presente o provedor da Santa Casa da
Misericórdia desta mesma vila, cidadão Duarte Augusto de Magalhães,
comigo, José Maria Pereira,
secretário, aí foram também presentes o Excelentíssimo Governador
Civil, substituto, deste distrito, doutor João da Rocha Páris,
doutor João de Barros Durães, na qualidade de Presidente da Câmara
e Administrador deste concelho, doutor Victoriano da Glória Ribeiro
Figueiredo e Castro, médico do Hospital, doutores Cândido Augusto
da Rocha e Sá e Sérgio da Silva Saavedra, facultativos municipais,
José de Sousa Lobato, professor e representante da Câmara Municipal
e muitas outras pessoas, que devido ao seu grande número não podem
ser mencionadas, procedendo-se assim à abertura solene deste Asilo,
como previamente havia sido anunciado.
Assim
reunidos, pelo provedor foi dito, entre outras cousas que:
-
Agradecia a comparência do Excelentíssimo Governador Civil deste
Distrito, que sempre se tem interessado por todos os assuntos, quer
de ordem moral quer de ordem material, ocorridos e a tratar dentro da
área da sua jurisdição, bem como ao Excelentíssimo Administrador
deste concelho [sic] e a todos os outros assistentes.
Nos
encontrávamos numa casa modesta e pobre, para a sua inauguração em
instituto de caridade e beneficência que, pelo seu significado,
representa uma obra de grande alcance social e de reconhecido
interesse regional. Que as pequenas iniciativas, com o decorrer do
tempo, se podem converter em grandes empreendimentos. Dois prestantes
cidadãos que, não sendo filhos desta terra, a ela muito se
dedicaram, e pelos bons exemplos do seu digno procedimento,
inspiraram nos seus sucessores o ardente desejo de perpetuar os seus
nomes, com uma obra de caridade e beneficência na terra onde
sempre foram respeitados e amados.
Refiro-me
aos senhores doutor António Pereira de Sousa, que exerceu o cargo de
médico municipal neste concelho, e a seu irmão, Francisco Pereira
de Sousa, que nesta comarca exerceu o seu cargo de funcionário
judicial, ambos de saudosa memória.
O último contraiu
matrimónio com a excelentíssima senhora dona Maria Pia de Castro,
desta vila de Melgaço. Esta nobre senhora, herdeira por falecimento
de seu marido dos bens que lhe advieram por parte deste e seu
referido irmão, quis ligar os nomes dos dois à sucessão dos seus
bens e, para isso fez doação deles à Santa Casa da Misericórdia
desta vila de Melgaço, destinando esta casa a um asilo para velhos
necessitados, e consignando o rendimento dos restantes à sustentação
do mesmo Asilo. Nobre exemplo de
isenção, generosidade e altruísmo que torna venerável a memória
daquela nobre e ilustre senhora.
O
seu gesto constitui mais um pergaminho de honra a acrescentar a
tantos outros que muito nobilitam os atuais representantes do
aristocrático Solar de Galvão e muito engrandecem a memória dos
já falecidos membros de tão distinta família.
É
grande o fim desta instituição, e como os seus recursos são
pequenos, cumpre aos vivos seguir o exemplo que os mortos nos deram.
É esta a esperança que nos anima. A vida desta casa fica dependente
da assistência pública e da
assistência particular. Dominados pelo sentimento altruísta dos
seus instituidores, empregaremos os nossos esforços para que nem uma
nem outra lhe faltem.
Posso
já mencionar que algumas almas generosas têm concorrido para a
sustentação e amparo dos velhinhos aqui recolhidos. O fim é
altamente humanitário.
Fica
inaugurado o Asilo “Pereira de Sousa”. Que ele mereça a proteção
de Deus para que lhe não possa faltar a protecção dos
homens.
Em
seguida fez uso da palavra o senhor José de Sousa Lobato, que
enalteceu as grandes qualidades dos doadores, e fazendo ver as
vantagens de todos, os que possam, auxiliarem nas suas posses esta
grande instituição.
Findo
o acto da abertura deste Asilo, foi este visitado por
grande número de pessoas deste
concelho e doutros limítrofes (...) ”.
Apesar
de inaugurado o asilo, os idosos continuaram nas duas salas do
primeiro piso do hospital, devido às dificuldades financeiras,
aproveitando-se assim o pessoal do serviço hospitalar para cuidar
dos idosos.
Também
por esta época, formou-se em Melgaço uma Liga de Senhoras,
constituída pelas mais ilustres da terra, para auxiliar na
angariação de fundos para as obras sociais da Misericórdia. Em
finais de 1949, a Misericórdia realiza obras na casa para transferir
os idosos, contudo eles ainda permaneceram no hospital e só mais
tarde seriam transferidos.
Em
1955, é realizada uma campanha contra a tuberculose lançada pelo
Provedor da Misericórdia. Nessa mesma altura, o deputado Elísio
Alves Pimenta apresentou ao Subsecretário de Estado de Assistência
Social o desejo do provedor de transformar a Casa de Eiró em
Enfermaria abrigo para tuberculosos. Para isso, tornava-se necessário
proceder a obras de reparação, no valor de cerca de 50.000$00, e
que constituiriam em ripar e estucar de novo os tetos de
várias divisões, reparar telhados, soalhos, portas e janelas. Além
disso, era necessário a reparação e
pintura de paredes interiores e exteriores, pavimentos a mosaico
no primeiro andar e no
piso térreo. Além disso, era ainda necessário,
a colocação de silhar de azulejos em várias dependências
do segundo piso e piso térreo,
instalar água corrente nas dependências no segundo piso
e fazer ajustes nas divisões, tapar portas e abrir outras. Era
necessário também encanar águas de lavagem e esgotos bem como
construir uma fossa, instalar sanitários, construir capela, reparar
a instalação elétrica e estende-la
ao piso térreo. Houve ainda
necessidade de adquirir todo o
mobiliário (camas para 18 doentes e 4 para o pessoal, mesinhas de
noite, cadeiras, mesas, armários para roupas, etc.), adquirir
roupas, loiças, fogão, artigos de cozinha, sanitários, entre
outros materiais.
As
despesas de apetrechamento rondavam os 90 contos, mas o custo total
da obra era de 120 mil escudos. Aprovando a ideia, o Subsecretário
de Estado da Assistência Social concedeu 100 contos, para a obra. Em
1956, a 5 Janeiro, é feita a inauguração da enfermaria, com
celebração de missa pelo Arcebispo Primaz de Braga e um discurso
proferido pelo Provedor a partir da varanda do edifício,
realizando-se ainda nesse mesmo dia a "Festa das Oferendas"
para angariação de fundos.
Em
início de Dezembro de 1961, parece estar tudo preparado para a
entrada em funcionamento do asilo. O Padre Carlos Vaz, provedor da
Santa Casa, escreve na “Voz de Melgaço” de 1 de Dezembro,
onde assegura: “Exatamente, no
dia oito de Dezembro (…) começará a funcionar (…) na casa de
Eiró, o “Lar dos Inválidos de Melgaço”. Vamos começar com
dez internados. É nossa intenção recolher todos aqueles que
procurem esta casa. Temos lugar para 20.
Nas
vésperas do dia 8, aqui chegarão as irmãzinhas, pois só elas
com o seu desvelo e carinho, é que
podem estar à frente duma obra como esta. Esperamos que uma ilustre
Comissão de Senhoras da nossa terra possa dedicar a esta,
o carinho e atenção que lhes for possível.
Vamos
começar.”
Em
8 de Dezembro de 1961, o asilo recebe os
idosos que estavam no hospital e
começa a funcionar. O Padre Carlos Vaz escreveu
no jornal “Voz de Melgaço”, na sua edição de dia 15
seguinte, onde nos conta tudo: “Foi
no dia 8, como estava previsto. Sem festas, sem discursos, quase em
silêncio, humildemente, inaugurou-se pelas 15:30 precisas, da tarde
do dia 8, o Lar dos Inválidos (…) A casa foi benzida pelo
Reverendo do Arcipreste que, a seguir, fez uma pequena alocução já
na capelinha. Aludiu ao fim da obra que estava a inaugurar-se e
lembrou o benemérito fundador, Sr. Dr. Passos de Almeida que, na sua
alta missão, de médico, reconheceu a grande necessidade de se valer
aos pobres inválidos da nossa terra. Lembrou o trabalho das Mesas
anteriores que possibilitaram o clima propício para que esta obra
fosse um dia uma realidade. Saudou as ilustres Senhoras Madrinhas e
Protetoras desta obra, de quem há muito a esperar.
Depois
de algumas orações, foi dada a bênção do
Santíssimo e a Casa ficou patente, durante a tarde, ao numeroso
público que, apesar de não haver festa, quis associar-se à
abertura desta Casa. E foram várias as almas caridosas que deixaram
nas bondosas mãos da senhora Diretora, a Irmã Rosa, as primeiras
ofertas”.
Na
década de 1980, o Asilo albergava 18 idosos. Como se mostrava
insuficiente para as necessidades locais, a Misericórdia decide
construir um novo Lar, para o qual comprou terrenos no Lugar da Loja
Nova, junto ao Bairro do Santo Cristo, com capacidade para 60
idosos.
Em
1989, a 5 Novembro, é realizada a inauguração do novo Lar pelo
Professor Aníbal Cavaco Silva,
na qualidade de Primeiro-ministro em
funções. Em Julho de 1990, é concretizada a transferência dos
idosos da Quinta do Eiró para o novo Lar.
Em
tempos recentes, foi construído em
terrenos pertencentes a esta Quinta do Eiró, novas instalações
para acolhimento de idosos que foram inauguradas em Junho de 2015.
Nascia assim, o “Cantinho dos Avós”, que se constitui como mais
uma resposta fundamental de apoio à terceira idade que esta Santa
Casa presta a uma população de um concelho profundamente
envelhecimento.
Atualmente,
o edifício e a quinta anexa continua
a ser propriedade da Santa Casa da Misericórdia de Melgaço
procurando esta reabilitar o edifício para lhe dar uma novas e
nobres utilidade.
Informações extraídas de:
- 1936, Setembro 20, Melgaço – Acta da sessão de inauguração do Asilo Pereira de Sousa, da Misericórdia de Melgaço;
- PAIVA, José Pedro et al (2011) - Portugaliae Monumenta Misericordiarum - Misericórdias e Secularização num século turbulento (1910 - 2000). Volume 9, Tomo II; Centro de Estudos de História Religiosa; Universidade Católica Portuguesa. Edição da União das Misericórdias Portuguesas.
- www. monumentos.pt.
Adoro ler os vossos textos mas confesso que o faço com alguma dificuldade devido a pouco contraste entre o texto a azu e a imagem de fundo em cinzento claro. Talvez seja tempo de renovar o layout do blog. De resto só posso dar os parabéns pelos interessantíssimos conteúdos postados.
ResponderEliminar