sexta-feira, 5 de fevereiro de 2021

Quando o Dom Abade de Fiães foi excomungado (1734)



Na freguesia de Rouças (Melgaço), existem os lugares de Cavaleiros e do Estar. São lugares bastante antigos onde existiam antigas quintas que pagavam dízimos ao Mosteiro de Fiães desde tempos imemoriais. Ora, por causa da Granja do Estar e da vizinha Quinta de Cavaleiros de Baixo, há cerca de 300 anos, o Dom Abade de Fiães foi excomungado, de forma pública, pelo Vigário Geral de Valença, José Maria Pinto Brochado (ESTEVES, A., 1957). Qual a origem deste episódio insólito? 

Esta é uma história com quase 300 anos e para a contar, temos que recuar a 1732. Na época, o capitão Francisco Pinheiro de Figueiroa, era morador na quinta de Cavaleiros de Baixo, sita entre o Regado de Mijanços e o caminho da Vila para Fiães e entre a conhecida Quinta dos Frades e o caminho das Adegas para o lugar do Val. Ora, por causa dos dízimos desta Quinta de Cavaleiros e da vizinha Granja do Estar serem pagos desde tempos imemoriais ao Dom Abade de Fiães e seu Convento, por ser o direto Senhor das propriedades, em 1732, o abade de Roussas processou este Sargento-Mor e os possuidores da Granja do Estar no tribunal eclesiástico de Valença. O padre Manuel da Cunha Lira exigia que o pagamento dos referidos dízimos lhe fosse feito a ele e seus sucessores e não ao referido Convento, por os bens estarem situados na sua freguesia e os donos serem os seus fregueses. Depois de várias sentenças e apelações acabaram os réus por serem condenados em toda a linha, incluindo nas custas do processo, para cujo pagamento imediato foram citados nestes termos: 

Certificou eu o Padre Manuel Dias de Matos em como em vertude de hua sentença do Reverendo Doutor Francisco Da Cunha Rabelo notifiquei em suas pessoas ao prizidente do Convento de Fiains, frei Ricardo da Conçeiçam em auzencia do pade Dom Abade por se não achar no dito convento e aos Religiozos que nele se achavam para pagarem os dizimos das terras que pesuem  na freguezia de Rouças e largarem a poçem dos ditos dizimos no termo de dez dias e pagarem as custas cuja diligência lhe declarei de sortem que muito bem a entenderam assim e da formaque na dita centença se contem de que dou fé e por verdade passei a presente que assino. 

Rouças e julho vinte e nove de 1734 annos 

eu o padre Manuel Dias de Matos 

Aqui fica o documento da sentença transcrito: 

Certificou eu, João Gonçalves Rebello Meyrinho Geral desta Comarca de Valença que servi por provisão do Ilustríssimo Senhor Cabbido de Braga Sede Vacante Primaz e em como fui à freguesia de Rouças do termo de Melgaço e nella notifiquei Jorge Gomes e sua melhor, Alexandre Pereira e sua mulher, e os herdeiros de Maria Vidal, Francisco Pinheiro, Francisco Pinheiro Figuerioa, Domingos Fernandes, por virtude de uma sentença do juiz da coroa, o Reverendo Doutor Francisco da Cunha Rebello pera que os ditos não pagassem os dízimos das terras que em Rouças tem dos Padres do Convento de Fians os quais pagariam somente ao Reverendo Abbade de Rouças e também as custas da sentença e autos tudo na forma da dita sentença cuja diligência lhe declarei de sorte que bem o entenderão  e por verdade passey a presente de que tudo dou fé 

Rouças, vinte e nove de julho de mil setecentos e trinta e quatro annos.  Eu João Gonçalves Rebello escrivão o escrevi e assignei. 

João Gonçalves Rebello 

Declaro que a sentença porque notifiquei aos sobreditos asima he do juízo appostolico e os notifiquey na forma a pagarem as custas e Dízimos ao Reverendo Abbade de Rouças 

era et supra 

Na sequência desta sentença, o Vigário Geral de Valença teve uma reação muito intempestiva e absolutamente surpreendente e excomunga publicamente o Abade de Fiães. Deixa escrito o seguinte: “O Doutor Joseph Maria Pinto Brochado, Vigário Geral nesta vila de Valença e em toda a sua Comarca e administração pelo Ilustríssimo Cabbido de Braga Primaz sede vacante e a faço saber a todo fiel e povo christão em como sendo notificados os executados que consta a Sentença Apostólica Retro pera satisfazer o que nella se pede e não obbedeceram dentro do dito termo que lhe foi assignado e muito mais ainda contra elles mandey passar a presente carta de declaratória pello theor da qual os declaro e denuncio por publicos excomungados e mando que com elles se não diga missa nem celebrem oficios que com effeito obedessam e meressam o beneficio da Absolvição, e pera que chegue à notíciade todos mando aos Reverendos Parochos donde elles forem freguezes a estação da Primeira Missa Conventual que disserem a seus freguezes esta lhes leiam e publiquem pera que chegue à notícia de todos e outro sim sob a dita pena de excomunhão  qualquer clérigo ou oficial de justiça esta leiam e publiquem nos lugares costumados tantas vezes e quantas lhe forem requeridas e da deligência passarão sua certidão em modo que façam fé. Dado nesta vila de Valença aos dezassete de nobembro de mil setecentos trinta e coatro annos e Eu o Padre Bento Alvres franco escrivão ajudante no ofício da Camara que a escrevy.” 

Parece estranho mas o Dom Abade de Fiães foi excomungado!... 

Sem comentários:

Enviar um comentário