Em finais do século XVIII, por ordem da Coroa, o Capitão Custódio Gomes de Villasboas, do Corpo Real de Engenheiros, passou por Melgaço e deixou-nos um raro conjunto de descrições sobre o nosso concelho na época, que seriam publicadas em 1800. Tais descrições integravam um completo conjunto de estudos sobre as áreas fronteiriças. Sobre o nosso concelho, o Capitão Villasboas, escreveu que: “Ao noroeste deste Couto de Fiães, e ao nascente de Valadares, fica o termo e villa de Melgaço, confinando pelo norte com o rio Minho, e pelo nordeste com a Galiza. He da sereníssima Caza de Bragança, e por isso pertence à comarca de Barcellos, donde dista 15 legoas. ´He governada por um Juiz de Fora, com três vereadores, e Procurador do concelho, como he costume nas judicaturas de vara branca. A villa he pequena e pobre; fora dos muros tem huma rua aonde passa a estrada, e nela alguns mercadores de pano.
O termo he de pouca extensão, e só tem 7 freguezias. Além da da Villa, a saber: S. Payo, S. Lourenço de Prado, Remoaens, Rouças, Chaviaens, Passos, S. Martinho de Christoval, a parte da freguezia de Paderne, que pertence ao ocncelho de Valadares, das quaes três ficam núm valle mais largo ao sul da villa, limitada pela serra da Peneda; e outras correm ao longo do rio Minho, por uma ladeira estreita, e empinada, até à freguzia de Christoval, espaço de uma légoa, aonde intesta com a Galiza.
Por esta ladeira, vai também a estrada, que se dirige à Ponte das Várzeas, perto da qual há um pequeno lugar pertencente àquella última freguezia aonde se faz hum grande comércio de sal, e de panos, com os galegos. A extensão do destricto anda por légoa e meia quadrada, e a população comprehendendo a villa, 1364 fogos; 1632 homens, 2016 mulheres, 553 rapazes, e 444 raparigas, o que dá 4645 pessoas. Há nesta villa Caza de Mizericórdia com rendimento annual de 500$000, e há, extramuros da mesma villa, hum convento de Capuchos.
Também para o sul do couto de Fiães existe o concelho de Castro Laboreiro da sereníssima Caza de Bragança, que ali põe as justiças, e pertencente à Comarca de Barcellos, donde dista mais de 14 legoas; he regido por dois juízes ordinários, de que o mais velho delles serve de Capitão Mor. Parte pelo nascente, Sul, e Norte, com a Galiza, como fica dito, pelo Poente com os concelhos de Valadares, e de Soajo. Nos mezes de inverno, hé quazi impossível aos moradores daquelle concelho, comunicar-se com a cabeça da sua comarca, por serem obrigados a vadear a nevoza e áspera serrania da Peneda. Seria mui cordato, e útil aos povos, unir este concelho e a villa de melgaço às jurisdições da borda Minho, que lhes ficam próximas, e mais comunicáveis.
Este concelho tem huma só freguezia, pobre, mas em terreno tem quazi 10 légoas de cercuito, occupado pelas referidas montanhas, foras das quaes há poucos sítios planos e producentes. Não produz mais do que centeio, se os frios da Primavera o não tolhem, e ainda assim está um anno na terra, desde que se semeia até se colher: o valor desta produção anda por 16 mil cruzados hum anno por outro, e não chega para o sustento dos habitantes, que nos mezes de Inverno sahem para fora do concelho a trabalhar pelo offício de pedreiro, para ganharem o resto do sustento que o seu paiz não produz. Há poucos pastos e os lavradores são obrigados o vender no Inverno algum do gado vacum, porque a neve queima o sustento delle, e além disso não lhes são necessários, porque neste concelho não há cultura senão nos mezes de Verão, semeando hum centeio e colhendo o do ano precedente. Tem algumas ovelhas do que tiram lá para a sua vestidura, que he hum grosseiro burel, e bastantes cabras que lhe dão leite.
O terreno he mui estéril e não produz árvores de fruto. Algumas que se dão em sítios abrigados reduzem-se a carvalhos, giesta, urze, carqueja e tojos. Servem-se do carvalho para emadeirar as suas cazas que cobrem com palha de centeio, e esta com segundo emadeiramento, para escapar aos tufões do vento. He notável que tão perto da rica e amena ribeira do Minho, haja um terreno de tão diverso clima, producções, e costumas tão particulares.
A freguezia tem 323 fogos, divididos em duas povoações, huma com 17 lugares tem o nome de “Verandas”, onde os povos vivem no Verão, e a outra com 23 lugares denominada “Inverneira”, aonde se recolhem no Inverno. A povoação anda por 470 homens, 454 mulheres, 247 rapazes, 188 raparigas, e ao todo 1359 pessoa. Descobrem-se neste concelho indícios de mineraes, particularmente no sítio as Coriscadas, há veas d’antimonio, e no das “Aveleiras”, encontra-se cristal de rocha, crystallus montana, de que também se acha abundância nas serras do Gerez, e da Amarella.”
Sobre Fiães, o capitão Villasboas escreveu que “o couto de Fiães he uma freguezia situada ao Nascente do concelho de Valadares, sobre um ramo da serra da Peneda, que se lança sobre a ribeira do Várzea, junto a Christoval, entre o concelho de Castro, e o termo de Melgaço. Ali há um convento de religiosos da Ordem de Cister, que são os donatários do couto. Este é subordinado ao concelho de Valadares, ainda que temo seu juiz Pedaneo que conhece tão somente das causas cíveis. É posto pelo Dom abade do mosteiro, com as mais justiças. Os moradores desta freguezia colhem milho, e algum centeio, muita castanha, e pouco dos outros géneros. O seu território abrange mais de uma légoa, e tem 211 fogos, 356 homens, 232 mulheres, 20 rapazes, 34 raparigas, e ao todo 642 pessoas (…).
O concelho de Castro Laboreiro está situado no centro daquella serrania perto da raya, equidistante dos dois mencionado rios Minhos e Lima. Ao sul da povoação de Castro, chamada Varandas, existe o castello, sobre hum penhasco. É obra antiga e pequeno recinto, guarnecido com algumas peças de artilharia. Hé bella situação para dalli descubrir as gargantas dos montes, ainda que estes pela sua amiudada ondulação, offerecem muitos esconderijos.
De Castro para o interior da província, há duas veredas principais através da serra da Peneda, de muito mau caminho, e contínuos desfiladeiros, por onde não passa carro. Huma dirige-se ao concelho do Soajo, que lhe fica em distância de 3 légoas para o sudoeste, e outra vai para o concelho de Valladares, donde dista 4 legoas ao Noroeste. Além daquellas avenidas, há outra que vai a Lindozo, correndo para o sul pelo lugar da Inverneira, passa na Portela da Pereira, que he uma garganta entre a serra das Chans de Castro e a Peneda pela qual corre a demarcação: entra na freguezia d’Entrimo, pertencete à galiza, e correndo pelo lugar da Ilha, vai atravessar o rio Lima em huma barca de passagem, que anda abaixo de Lobios.
Também de Castro Laboreiro para Christoval, ao longo da pequena ribeira de Várzeas, vai uma estrada mui trabalhoza, que passando pelos sítios da Portelinha e Alcobaça, atravessa o rio Trancozo no meio da ribeira, em huma pequena ponte denominada de “Pouzafolles”. Esta ribeira he cercada d’altos montes por hum e outro lado, e no fim della, em Christoval, passa a estrada que vai das terras da borda Minho para o interior da Galiza, a qual atravessa o rio Varzeas em huma ponte arruinada, para cuja defeza se construiu na Guerra de 1762, hum reduto sobre a eminência que lhe fica fronteira perto do lugar de S. Gregório, da mesma freguezia de Christoval. Este reduto hé de mui pouca monta para a defeza daquelle passo, entretanto que pela profundidade em que o rio corre, e pella mais circunstância do terreno que lhe fica sobranceiro, he assaz defensável.”
Extraído de:
VILLASBOAS, Custódio Jozé Gomes de (1800) – Descripção Topographica das Commarcas Fronteiras da Província do Minho.
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