Sabia que o segundo foral concedido a Melgaço pelo monarca D. Afonso III foi muito mal recebido pelo povo de Melgaço?
Na verdade, ainda durava a obra da construção da nova muralha de Melgaço, quando o rei D. Afonso III, estando em Braga, passou a segunda carta de foral a Melgaço no ano de 1258, a 29 de Abril, segundo o modelo concedido anteriormente a Monção. Segundo REIS (1998), um dos aspetos caraterísticos dos forais das áreas de fronteira, como Melgaço, é o da leveza fiscal imposta aos moradores, em comparação com outras terras, medida que tem por objetivo promover a fixação de pessoas. Por outro lado, não se estabelece qualquer imposto individual, mas apenas uma censo anual a pagar ao cofre régio, o que implica o direito de o concelho guardar para si as receitas provenientes das coimas e portagens e quaisquer outras rendas, que anteriormente pertencessem ao rei. O município, para aumentar as receitas próprias, via-se assim estimulado a fomentar o desenvolvimento económico e a diligenciar por uma boa administração da justiça, uma vez que as coimas aplicadas aos moradores revertiam para o cofre do concelho.
Por outro lado, no foral, determina-se igualmente que o alcaide fosse de nomeação régia e que não poderia ser negada a entrada na vila ao rico-homem encarregado da governação da Terra de Valadares, garantindo-lhes que ele não lhes faria qualquer mal ou violência na Vila de Melgaço, ou no seu termo, ficando obrigado a pagar-lhes tudo aquilo de que tiver necessidade, pelo que não poderia extorquir aos moradores fosse o que fosse – “et expendat ibi suos denarios” (MARQUES, 2003). Da mesma forma, competia ao rei nomear um alcaide de castelo, que o defendesse e por ele lhe prestasse menagem, não podendo também praticar qualquer tipo de violência sobre os moradores. Pelo contrário, devia conservar total independência em relação à população, no sentido em que nada deve extorquir aos moradores, devendo tudo pagar do que precisasse.
Segundo MARQUES, J. (2003), uma das grande preocupações de D. Afonso III era o da criminalidade, já que define como prioritários, no foral, alguns desses aspetos. Por outro, valoriza bastante a independência do poder judicial, determinando que em qualquer pleito, o meirinho não poderia intervir, sendo esse papel apenas para o juiz designado pelo concelho ou assembleia de vizinhos.
De facto, no dito foral, descreve-se a legislação primitiva da terra e se estabelece uma quantia certa de imposto real a satisfazer pelo concelho, que foi fixado em 350 morabitinos velhos às terças ao ano, ou seja, pagos em três prestações entregues em data fixas segundo velhos usos. Neste mesmo foral, concede que haja em Melgaço 350 povoadores, o que podemos interpretar como fogos. No entender de MARQUES, J. (2003), isto pressupõe que o rei queria ver a população aumentada e que o objetivo do primeiro foral não tinha sido alcançado. Esse pagamento anual previsto no foral vem alterar o foro que se encontrava em vigor de 1000 soldos leoneses, acordado no tempo de D. Sancho II, a pagar em três prestações anuais.
Segundo REIS, A. (1998), essa mudança do panorama demográfico obrigaria a uma redistribuição das terras reguengas que o rei tinha doado ao concelho, a qual, para além de outras perturbações no que dizia respeito às benfeitorias introduzidas pelos seus exploradores, forçosamente diminuiria as parcelas, perspetiva suficiente para provocar uma onda de descontentamento. Esse ponto de vista é corroborado por MARQUES (2003), que entende que o motivo do descontentamento generalizado da população melgacense residia no facto de a necessidade de conseguir parcelas de terreno para atribuir a futuros povoadores vindos de fora até o número de vizinhos chegar aos trezentos e cinquenta, desejados pelo rei, que obrigava a reduzir as áreas das parcelas então possuídas pelos povoadores que já eram aí residentes e que se viram prejudicados.
De facto, tais disposições não agradaram aos moradores da vila de Melgaço e que os levou a reclamar junto do monarca. O rei acolheu com compreensão as reclamações dos habitantes de Melgaço, que desejava continuar a ter por aliados e sentinelas da fronteira, numa época de consolidação da mesma.
Neste sentido, o rei D. Afonso III revogou o foral novo e restaurou o de D. Afonso Henriques com ligeiras alterações de carácter económico. Assim, numa carta régia datada de 9 de Fevereiro de 1261, justifica-se a suspensão do foral de 1258 e o regresso ao velho foral de 1183. Na mesma carta, D. Afonso III declara que, tendo sido informado de que os povoadores de Melgaço se sentiam agravados pelo foro que lhes tinha dado e desejando fazer-lhes graça e mercê, revogava-o e reconduzia-os ao estado em que se encontravam antes de lhes ter dado o foral agora contestado, pelo que cada um retomaria os bens que antes possuía, concedendo-lhes, de novo, o foral que tinham recebido de D. Afonso Henriques. (MARQUES, 2003).
Assim sendo, em Melgaço voltava a vigorar o foral concedido por D. Afonso Henriques em 1183...
Sem comentários:
Enviar um comentário