sexta-feira, 20 de maio de 2022

A lenda da origem da imagem e do sino de Santa Ana contada há mais de 250 anos (Paços - Melgaço)

 


As Memórias Paroquiais de 1758 são das maiores fontes de informação sobre a vida nas freguesias em meados do século XVIII. Na freguesia melgacense de de Paços, o redator do manuscrito foi o pároco à época, o padre Manuel Joaquim Pinheiro. No dito documento, o padre Manuel conta-nos que Santa Maria de Paços, na época, tinha uma população “duzentos vizinhos, pessoas, seiscentos e quarenta e sete”. Note-se que o número de “vizinhos” corresponde ao número de fogos. 

Indica-nos igualmente quais eram os principais lugares da freguesia e, genericamente, o número de casas que cada lugar tinha. Assim, o padre Manuel Pinheiro conta-nos que a freguesia de Paços tinha, na época, “a aldeia chamada dos Casais, que tem oito vezinhos, a aldeia de Belleco, que tem dezassette, a aldeia da Cruz, que tem catorze vezinhos, a aldeia do Outeyro que tem vinte e quatro, o lugar de Gobende, que tem doze, o lugar da Pedreyra, que tem doze, o lugar de Merelhe que tem dezanove, mais o lugar de Viladraque que tem trinta e três. Tem mais o lugar de Sá que tem satenta e nobe vezinhos”. O padre Manuel Pinheiro acrescenta que a igreja, com orago de Santa Maria de Passos, ficava isolada, sem vizinho algum e quase no meio do lugar. 

O padre refere-se ainda à igreja e aos seus altares e escreve que “o orago he Santa Maria de Passos que se celebra a oito de Dezembro. Tem três altares, hum delles, o altar mor onde estava colocada a imagem de Nossa Senhora da Luz e o Apóstolo Sam Barnabé, outro colateral da parte do Evangelho que he da Nossa Senhora da Conceição dedicado a Nossa Senhora da Conceição, terceyro da parte da Epystulla que he do martyr  Sam Sebastião. Tem esta igreja huma irmandade que he da Confraria das Almas.” 

Algumas das informações mais curiosas que o pároco deixou registadas dizem respeito à origem lendária da imagem de Santa Ana e do sino da igreja. O facto da capela estar no lado de fora também tem uma explicação numa lenda popular. Nesse sentido, refere-se à especial proteção do toque do sino contra as calamidades meteorológicas na região. Acrescenta que o sino chamado de Santa Ana chegou à freguesia, vindo pelo rio Minho abaixo com a imagem da milagrosa, como referem os antigos. Deixo aqui a transcrição do extrato onde se faz referência à curiosa lenda da imagem e do sino de Santa Ana: “Tem esta freguezia huma capella encostada à capella mor da parte de fora que he da millagroza Sancta Anna que por tradição antiga, dizem os velhos desta freguezia, veio pello rio Minho abaixo juntamente com hum sino chamado de Sancta Anna, não só os moradores desta freguezia, mas em toda a parte que se ouça tocar, tem tal fé que aonde elle se ouvisse não tem havido pedraça nem rayo... 

No dito manuscrito, o padre Manuel Pinheiro explica que o motivo da capela estar construída do lado de fora se devia ao facto de que, depois da imagem ter aparecido nos limites da freguesia e ter sido colocada dentro da igreja, ela no dia seguinte aparecia sempre da parte de fora. Assim, foi entendido que a imagem queria estar onde pudesse ver o rio, motivo que levou a construir-se a capela exterior à igreja. Atentemos naquilo que o pároco escreveu: “...pella mesma razão que o motivo de estar de fora a capella da Senhora é que em o tempo que apareceu nos limites desta freguezia, a puseram dentro da igreja e que aparecia, no outro dia, da parte de fora,e que se colocou várias vezes que entenderam que queria a Senhora estar em parte onde visse o rio por onde viera, por cuja razão se lhe fizera a capella da parte de fora, não consta o registo de assento por constar que nas guerras antecedentes, se queimarão as Casas da Residência... 

Estórias contadas há mais de 250 anos pelo pároco de Paços... 

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