A Galiza foi a primeira região com fronteira com Portugal que
ficou debaixo do controlo das forças franquistas. Esta circunstância provocou
una avalanche de refugiados. Os galegos que conseguiram cruzar a fronteira
atravessando o Minho ou a serra de Castro Laboreiro encontraram no lado
português um ambiente solidário nas aldeias portuguesas, mas as autoridades
locais eram totalmente hostis. Os refugiados, quando descobertos, eram
frequentemente perseguidos a tiro pelos montes e os capturados, eram entregues
às forças franquistas, e inclusivamente a grupos de falangistas. Bastantes,
acabariam fuzilados.
De toda a linha de fronteira, a raia melgacense era das mais
patrulhadas pelas autoridades portuguesas e espanholas por ser bastante
permeável e nalguns locais ser de muito difícil acesso. Nas aldeias de Castro
Laboreiro, os exilados galegos tinham que iludir a forte vigilância, tanto da
polícia política (PVDE) como da Guarda Fiscal. A Guarda Fiscal
tinha ordens claras de deter todos os espanhóis indocumentados conotados com a
esquerda revolucionária. Posteriormente, seriam entregues à polícia política
para posterior expulsão do território português. Em contrapartida, os
carabineros e a Guarda Civil espanhola tinham instruções para entregar às
autoridades portuguesas os esquerdistas portugueses radicados na Galiza.
A fuga de galegos para as aldeias da raia era uma opção mais
favorável pelo facto de existirem contactos e ligações de parentesco, de
amizade ou da atividade do contrabando entre as populações dos dois lados da
fronteira. Contudo, também houve vários casos em que lavadores do concelho de
Melgaço acolhiam em sua casa galegos exilados a troco de trabalho agrícola nas
suas terras. Foi o caso
de Jose Juan Dominguez Rodriguez. Perseguido, fugiu para Melgaço onde esteve
refugiado em csas de um tal Manuel Lopes, morador em Sainde (Paderne, Melgaço),
pelo menos durante seis meses. Depois, viveu um relacionamento com uma
senhora chamada Benesinda Duque, também de Sainde, durante cerca de oito meses
e mais tarde foi servente numa casa de S. Martinho de Alvaredo, propriedade de
um tal Delfim Alves. Posteriormente, esteve em casa de um tal Eduardo conhecido
como o “Resineiro”, altura em que ambos foram presos pelas autoridades
portuguesas. Após a sua prisão, foi expulso de território português pela
fronteira de S. Gregório/Ponte Barxas.
Uma outra importante base de apoio para os galegos exilados era a
existência de redes de militantes do Partido Comunista e outros grupos
organizados de esquerda do lado português. Nestes grupos, encontrávamos, por
vezes, contrabandistas ou “passadores” que operavam ilegalmente dos dois lados
da fronteira.
Estes grupos funcionavam verdadeiramente em rede. Um caso
particular que prova esse modo de funcionamento é o do senhor Antón Alonso
Rios. Este exilado entrou em território português pela zona da Serra da Peneda
em Julho de 1938. Foi sendo acolhido por pastores que tinham contactos com
comerciantes de Melgaço e que conheciam outros negociantes em Arcos de Valdevez,
com ligações a um comerciante de café galego republicano e radicado no Porto e
a um velho amigo seu de Tomiño emigrado em Lisboa. Como se vê, tratam-se de
redes bastante complexas com muitas ramificações.
Havia um plano para conseguir documentos e fazer embarcar Anton
Rios num navio mercante rumo a França. Falhado o plano, conseguiu finalmente
documentos nos consulados argentinos e francês e embarcou rumo a Casablanca
(Marrocos, à data, território francês), e dali viajou para Buenos Aires
(Argentina). A obtenção da documentação argentina foi obtida através de uma
pessoa que forjou documentos de um cidadão argentino que já tinha falecido.
Assim, Alonso Rios assumiu essa identidade e foi isso que lhe permitiu
abandonar Portugal.
Alonso Rios não deve ter sido o único que recorreu a esta
estratagema. O diretor da PVDE informava em Outubro de 1937 o Chefe do Gabinete
do Ministro português do Interior que “bastantes foragidos espanhóis que se
encontram clandestinamente em Portugal, principalmente nas montanhas de Castro
Laboreiro, tem obtido da Argentina certidões de nascimento de outros
indivíduos, com que, possivelmente, procurarão documentar-se em Portugal" .
Muitos outros fugidos galegos sobreviveram clandestinamente
praticando o contrabando durante a Guerra Civil, enquanto esperavam uma
oportunidade de chegar até algum porto e embarcar rumo a algum país, sobretudo
da América do Sul.
Informações extraídas de:
- GALLARDO, Ángel Rodriguez (2011) - La condición de refugiados:
Gallegos em Portugal durante la guerra civil y la posguerra. Universidad de
Vigo;
- OLIVEIRA, César (1987) - Salazar e a Guerra Civil de
Espanha, Lisboa, O Jornal, 2ª edição;
- A represion franquista en Galicia. Actas dos traballos presentados ao Congreso da Memoria;
Narón, 4 a 7 de decembro de 2003; Asociación Cultural Memoria Histórica
Democrática.
- Comunicação Interna/Documento confidencial nº 31/938 ao Secretário Geral
da PVDE, endereçado pelo Posto da Guarda Fiscal de Valença.
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Très intéressant et rare blog sur cette histoire méconnue et peut être volontairement peu débattue dans un contexte de guerre civile que l'on cherche à oublier.
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