domingo, 6 de dezembro de 2020

Castro Laboreiro, 1938 - Na pista dos espanhóis fugidos à guerra

 


O período da guerra civil em Espanha nos anos trinta do século passado marcou a História contemporânea no país vizinho. O conflito provocou, na época, a fuga de várias centenas de espanhóis para este lado da fronteira. Em Castro Laboreiro (Melgaço), terão chegado a estar escondidos, cerca de 400 fugidos ao conflito e que se refugiaram, muitos deles, em casas de castrejos. Contudo, noutras freguesias melgacenses também terão estado escondidos alguns mais, apesar de num número muito menos significativo. As ordens das autoridades portuguesas tinham, era no sentido de os capturarem e os entregarem a Espanha.

Em terras de Castro Laboreiro, a polícia política, com a colaboração da Guarda Fiscal e da GNR, teve muitas dificuldades em controlar a entrada de espanhóis pela fronteira castreja, assim como localizá-los devido à proteção dado por muitos castrejos a estes refugiados. Essa extrema dificuldade é-nos relatado em vasta documentação oficial. Numa missiva, datada de 12 de Maio de 1938, enviada para Lisboa, pelo Chefe do Posto da PVDE do Peso (Melgaço) para o Secretário Geral da Polícia de Vigilância e Defesa do Estado (PVDE). pode ler-se: 

 

"Posto de Melgaço - Mês de Maio 

Relatório Extraordinário 

Ex.mo Senhor 

Tendo sido informado que nos lugares de Estivadas (Paderne) e Rodeiro (Castro Laboreiro) se encontravam refugiados alguns espanhóis, entre eles, Eudozia Diz, Agustin Lorenzo e Basilia Diz, a que se refere a O. S. (Ordem de Serviço) nº 338/37, para estes lugares me dirigi, a fim de proceder as respetivas capturas. 

Em Estivadas, depois de muito trabalho, consegui encontrar um curral de cabras, escondido entre a palha, o espanhol refugiado Camilo Gonzalez Alonso, o que detive conforme dei conhecimento a Vossa Excelência, no meu ofício  nº 144/38, de 11 do corrente. 

No Rodeiro, serra de Castro Laboreiro, trajeto que tive que efetuar durante toda a noite, para não ser pressentido e onde cheguei ao romper da manhã, não me foi possível deter a Eudozia e seus pais, visto se terem ausentado de véspera para um local que os castrejos denominam de inverneiras, em virtudes das últimas batidas levadas a cabo pela Guarda Fiscal. 

Procedendo a buscas a todas as casas deste lugar, verifiquei que na sua maior parte eram refúgios de espanhóis pois os seus locatários não sabiam explicar a existência de camas que nas residências ou nos palheiros se encontravam, isto em número muito superior às pessoas que nestas residiam. 

Numa destas casas, cuja locatária se dizia estar ausente já há meses, que para entrar dentro, foi preciso fazê-lo pelos baixos de um curral, fui encontrar umas quatro camas com roupas remexidas, dando tudo indícios de uma retirada precipitada. Entre outra papelada, encontrei a fotografia de Eudozia Diz e de seu pai Agustin Diz, um envelope dirigido para o Consul de Cuba no Porto, e outros retratos de espanhóis refugiados. 

Estava pois, dentro do refúgio dos epigrafados mas interrogada a vizinhança do seu paradeiro ou da locatária, não me foi possível obter quaisquer informes concretos, que me facilitasse uma pista para a sua captura. Acresce ainda, que a Eudozia, traja agora de castreja para mais facilmente poder andar entre estas e não ser reconhecida. 

Como já é do conhecimento de Vossa Excelência, este povo da serra, embora com costumes bastante selvagens, são dotados de uma invulgar astúcia, preferindo a prisão e as maiores torturas a denunciarem o paradeiro dos espanhóis refugiados, que para eles, representa um governo de vida, pelas pesetas que recebem da comida albergue e outras incumbências, que se escrúpulos, executam. 

Assim, torna-se difícil a captura de grande número de refugiados espanhóis que ainda hoje se encontram pela serra, que ao mais leve aviso da aproximação da polícia ou da Guarda Fiscal, desertam dos lugarejos onde se encontram, para se esconderem entre os rochedos, alguns já com furnas por estes preparadas, onde dificilmente poderão ser encontrados. 

Junto envio a Vossa Excelência as fotografias da Eudozia Diz e de seu pai Agustin Lorenzo, “El Masidao”, para que V. Exa. se digne ordenar que sejam tiradas umas reproduções e enviadas com a possível brevidade a este posto, para distribuir pelos Postos da Guarda Fiscal, desta área. 

Com novos elementos sobre o paradeiro de outros refugiados, que consegui obter do espanhol Camilo Alonso, que detive em Estivadas e salvo ordens de Vossa Excelência em contrário, espero levar a cabo nova diligência, da qual oportunamente darei conhecimento a V. Exa. do seu resultado. 

A bem da Nação. 

Lisboa, 12 de Maio de 1938 

Ao Exmo. Snr. Secretário Geral da PVDE 

O Chefe do Posto, 

João G. da Cunha".


Na missiva, são citados a professora Eudozia e seus pais que estiveram escondidos em terras castrejas. Foram posteriormente presos devido a uma denúncia de um outro espanhol. Mais tarde, saíram de Portugal em direção a Marrocos...




2 comentários:

  1. https://diariodeunmedicodeguardia.blogspot.com/2019/12/buscando-rastros-de-un-medico-galego.html?m=0

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  2. https://diariodeunmedicodeguardia.blogspot.com/2019/12/buscando-rastros-de-un-medico-galego.html?m=0

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