sexta-feira, 8 de janeiro de 2021

O lugar de Sante (Paderne) e a sua capela de Nossa Senhora dos Remédios: algumas notas históricas

 



Houve um tempo em que São Paio e Paderne eram uma só freguesias, tendo sido separadas há quase 900 anos. Junto aos atuais limites entre as ditas freguesias de São Paio e Paderne, situa-se o lugar de Sante, atualmente pertencente à segunda.

A origem do topónimo não é tão clara como possa parecer. A única questão que entendo que será clara é que o termo “Sante” deriva do latim “Sancti” ou “Sanctii”, genitivo de antropónimo “Sanctius”, do qual deriva o nome próprio Sancho. Trata-se de um topónimo que aparece na Galiza ou no norte de Portugal com alguma frequência e a explicação mais plausível é que o nome do lugar deve estar associado ao nome do seu primeiro povoador ou de um primitivo proprietário desta terra, “Sancho”. Assim, o termo “Sanctii” poderia significar que esta era a terra “do Sancho”. (ESTEVES, H., 2015 ou VASQUEZ, N., 2011).

Note-se que um pouco acima do Castelo de Sante, já em terrenos de mato, existe um local chamado “Monte do Sancho” ou também conhecido como o “Sancho”, podendo ter aqui alguma correspondência com a origem do nome da localidade. Certo é que a origem do termo “Sante” e do lugar é bastante antiga, podendo remontar à época medieval ou pré-medieval.

Esta povoação pertence atualmente à freguesia de Paderne, mas durante muitos séculos tinha o estatuto de lugar meeiro, ou seja, pertencia alternadamente às freguesias de São Paio e Paderne. Assim, num ano, o lugar pertencia a uma freguesia e no seguinte pertencia à outra. Desconheço a época desde a qual se praticou este costume, mas podemos atentar num assento de óbito de 1692 lavrado pelo pároco de São Paio onde se pode ler: “Aos nove de Setembro de mil seiscentos e noventa e dous, foi Nosso Senhor servido levar de vida prezente a Maria Lourença (…) fregueza este prezente anno desta freguezia...”. No caso dos óbitos, por norma, a pessoa era enterrada, ora em São Paio, ora em Paderne, conforme o ano.

Convém esclarecer uma questão que se prende com o facto de quando nos referimos aos anos, estes não coincidirem com os anos civis. Assim, para estes efeitos, a mudança de freguesia dos lugares meeiros dava-se por altura do S. João (24 de Junho). Se dúvidas houver, esta era prática antiga e que podemos comprovar se lermos o que escreveu o pároco de São Paio em 1758: “...Sante, meeiro com a freguesia de Paderne em qual entra a Verdelha (…) estes dois são da alternativa de S. Payo ou Paderne e neste presente ano de 1758 até ao S. João são da alternativa de Paderne”.

O facto de Sante ser um lugar meeiro faz-nos recuar à época em que a terra de Paderne foi dividida por iniciativa do rei D. Afonso Henriques. Anteriormente a 1141, a terra de Paderne era extensa e englobava o território das atuais freguesias de São Paio e Paderne, entre outras. Contudo, nesse ano, D. Afonso Henriques veio pessoalmente tomar o castelo de Castro Laboreiro e pediu ajuda à abadessa do mosteiro de Paderne, Elvira Serrazins. O auxílio foi materializado em 10 éguas com seus potros, 30 moios de vinho e um cavalo avaliado em 500 soldos e 100 áureos. Para recompensar o mosteiro de Paderne, D. Afonso Henriques concedeu ao mosteiro um território com privilégios: o Couto de Paderne, que englobava ainda a área das atuais freguesias de Cubalhão e Cousso. A consequência disto foi a separação das freguesias ficando S. Salvador de Paderne e São Paio de Paderne.

A questão destes lugares meeiros, Sante e Verdelha, teve um término em 1949 quando o Arcebispo de Braga se decidiu pela incorporação destas povoações na freguesia de Paderne, à qual já pertenciam civilmente.

No lugar de Sante existe uma capela de invocação à Nossa Senhora dos Remédios. A devoção a Nossa Senhora por parte do povo de Sante já vem de tempos antigos ainda que não se conheça a data precisa da conclusão da sua construção. Contudo, a capela deve ter ficado concluída por volta de 1743 já que temos conhecimento de um documento com o título “Registo de licença para se benzer a capela de Nossa Senhora dos Remedios sita no lugar de Sante da freguesia do Salvador de Paderne, a favor dos fregueses da dita freguesia”. Tal licença foi pedida em 17 de Setembro de 1743 o que indicia que a conclusão da sua construção deverá ter acontecido por essa altura.

Em 1758, nas Memórias Paroquiais de Paderne, o pároco de Paderne faz uma descrição da capela de Nossa Senhora dos Remédios na época nestes termos: “Tem em Sante (…) uma ermida de Nossa Senhora dos Remédios, dentro do mesmo lugar, à qual vão romagens no dia da sua festa a 15 de Agosto e tem uma irmandade da mesma Senhora. Tem três altares esta ermida: o principal com a imagem da Senhora, uma de S. Francisco e outra de S. José e outra mais pequena de S. António. Nos colaterais, num está a imagem de S. Gonçallo; da outra parte à mão direita, está o altar de Santa Roza de Lima com a sua imagem.”

Aparentemente, em finais do século XVIII, foi erigido um novo altar-mor no interior da dita capela. Em 27 de Junho de 1790 é redigido um pedido para se poder usar o Altar-Mor da capela. Apesar de não termos mais informação documental a respeito da sua construção, a existência deste documento permite-nos situar no tempo a época em que foi edificado.

Nesta capela já existia sediada, em meados do século XVIII, a irmandade de Nossa Senhora dos Remédios. Temos conhecimento de uma escritura de “Provisão de confirmação de estatutos da irmandade de Nossa Senhora dos Remédios sita na capela da dita Senhora na freguesia de São Paio de Melgaço, meeira com a freguesia do Salvador de Paderne” datada de 2 de Novembro de 1745. Desconhecemos a data da fundação da dita irmandade, mas em face deste documento, podemos aferir que a sua fundação é anterior a esta data.

Dos dados apresentados, comprovamos que o povo de Sante é muito devoto da Nossa Senhora dos Remédios, desde há vários séculos, fazendo-lhe, desde tempos muito antigos, a sua festa a 15 de Agosto. Conforme lemos atrás, já no século XVIII, a sua festividade era bastante concorrida, assim como nos dias de hoje. A sua capela e a sua irmandade têm quase 300 anos...

 

 

 

 

Bibliografia:

-Arquivo Distrital de Braga (17/09/1743) - Registo de licença para se benzer a capela de Nossa Senhora dos Remédios sita no lugar de Sande da freguesia do Salvador de Paderne, a favor dos fregueses da dita freguesia.

- Arquivo Distrital de Braga (1745) - Provisão de confirmação de estatutos da irmandade de Nossa Senhora dos Remédios, sita na capela da dita Senhora, na freguesia de Sã o Paio de Melgaço, meeira com a freguesia do Salvador de Paderne.

- Arquivo Distrital de Braga (27/06/1790) - Provisão para se usar do Altar-Mor da Capela de Nossa Senhora dos Remédios do lugar de Sante, freguesia de Paderne.

-ESTEVES, Higino (2015) - Etimologias obscuras ou esconsas. Academia Galega da Língua Portuguesa.

- Arquivo Nacional da Torre do Tombo - “Memórias paroquiais da freguesia de Paderne (Valadares), 1758”, in Dicionário Geográfico de Portugal, volume 27, nº 15, p. 81 a 86.

- Arquivo Nacional da Torre do Tombo - “Memórias paroquiais da freguesia de S. Paio (Melgaço), 1758”, in Dicionário Geográfico de Portugal, volume 27, nº 25, p. 149 a 152.

-VASQUEZ, Nicandro Ares (2011) - Estudos de toponimia galega. Tomo I. Sección de lingua / Seminário de onomástica. Real Academia Galega. Corunha.


1 comentário:

  1. Meu avô José Joaquim Esteves nasceu nos anos 1800 nessa região do Minho, migrou com o irmão para o Brasil fugindo da guerra o pai tinha uma sapataria nessa época. Esse lugar tem história...

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