sexta-feira, 30 de dezembro de 2022

O presunto de Melgaço em receitas culinárias no século XIX





Muito antes de Melgaço ser conhecido pelos seus excelentes vinhos, já a nossa terra era associada às suas águas medicinais com caraterísticas singulares e aos seus distintos presuntos. 

A fama do presunto de Melgaço vem de há vários séculos, sendo manjar conhecido dos reis, pelo menos desde 1513, altura em que D. Manuel I passou foral a Melgaço e nele constava que ele e seus sucessores passariam a receber, em cada ano, três presuntos da nossa terra. Um traço distintivo do presunto melgacense feito à moda antiga era ser preparado sem sal, caraterística que o diferenciava de todos os outros. Tal especificidade é descrita em documentação diversa desde o século XV. Pode conferir tais informações no artigo (CLICAR no título) "A excelência do presunto de Melgaço ao longo dos tempos".

O presunto de Melgaço, além de ser famoso em todo o Portugal, era também exportado para o Brasil e o seu destino não era apenas a comunidade emigrante portuguesa. A comprovar a sua fama em terras de Vera Cruz, podemos fazer alusão ao livro “Cozinheiro Imperial”, publicação gastronómica de referência no Brasil no século XIX e editado em 1887, onde encontramos duas receitas de pratos com presunto onde é especificado que deve ser utilizado presunto de Melgaço. Uma delas é uma receita de fiambre caseiro, que nada tem a ver com o fiambre industrial que hoje em dia consumimos: 


Maneira de fazer o presunto de fiambre  

Toma-se um presunto de Melgaço ou da Galliza (devem-se preferir destas procedências, porque nem precisão de ser demolhados, nem de temperos para ficarem gostosos); sendo desta qualidade, coze-se em bastante água durante 4, 6 ou 8 horas, conforme a grossura do presunto; depois de cozido limpa-se com uma faca toda a parte rançosa ou enegrecida pela cozedura, e tira-se-lhe a pelle, dando um golpe no couro do presunto pelo lado carnoso, e puxando-se ao de leve para que elle se vá desapegando; depois untam-se as partes gordurosas com ovo batido, e põe-se-lhe pão ralado; estando assim, vai ao forno para corar. Enfeita-se depois com um papel recortado a perna do presunto. 

Este preparo só se faz aos presuntos de Melgaço ou Galliza; sendo de outra qualidade, põe-se de molho em bastante água 24 ou 48 horas, segundo o grau de sal que elles tenham, e são cozidos em água, vinho branco, rodas de cebola, salsa, tomilho, etc,, fazendo-lhe depois de cozido o mesmo arranjo que fizemos aos outros. 


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Presunto estufado no forno  

Toma-se um bocado de bom presunto (prefere-se o de Melgaço, fresco), tira-se lhe o couro, limpa-se e põe-se de molho de um dia para o outro; estando demolhado, tira-se da ágoa e corta-se em tiras da grossura de dous vinténs, mette-se em uma cassarola com pranchas de toucinho, rodas de cebola e cenouras, pés de salsa, grãos de pimenta, louro (1 folha), um alho inteiro, e cobre-se com vinho branco; tapa-se a cassarola e mette-se em forno forte por espaço de 2 horas; findo este tempo, tira-se para fora do forno, extrahe-se a gordura ao molho, tempera-se de sal, se precisar, e serve-se com este mesmo molho.” 

 

Receitas extraídas de: 

  • LIMA, Constança Oliva de (1887) - Cozinheiro Imperial ou Nova Arte do Cozinheiro e do Copeiro em todos os seus ramos. 10ª Edição; Laemmert & Cª; Rio de Janeiro. 

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