domingo, 28 de julho de 2013

Parada do Monte (Melgaço) em meados do século XVIII


Nas Memórias Paroquiais de 1758, em 28 de Abril, o pároco Francisco de Caldelas Bacelar respondendo ao ‘Inquérito’ dizia: ‘Os frutos que os moradores recolhem em maior abundância hé o milho grosso, vulgarmente chamado milho mais’. Cultivava-se nas leiras que bordejavam as margens do Mouro e onde também cresciam as latadas pois o vinho (12 cabaços) entrava na composição da renda que a freguesia pagava ao pároco. Na serra rodeavam-se as brandas de ‘centeio, algum milho miúdo, e pouco linho e muita herva no Verão de que fazem os labradores feno para darem de Inverno aos gados’ (…) ‘A criação de gados que tem esta serra hé no tempo do Verão trazerem nella os labradores os seus bois de noutte e de dia dois outros mezes e as bacas e bezerros andam também na serra de dia e à noutte vão procurá-los e recolhem-nos nos lugares das brandas e o mesmo fazem ao gado miúdo de cabras e ovelhas’.
Ao descrever o Rio Mouro salientava ser de ‘curso arrebattado em toda a sua distancia desde o seu nascimento athé botar fora dos limites desta freguezia,  somente em hum sítio chamado Agras de Mouro corre quite hum tiro de mosquete’. Rio pouco piscoso, pois ‘somente no tempo de Verão alguns rapazes caçam nelle algumas trutas pouca e pequenas, mas gostozas’.
Das ‘Memórias Paroquiais’ e ainda pela análise das prestações entregues pelos foreiros e rendeiros aos monges de Fiães e Paderne (Marques 1990: 62-63) poder-se-á esboçar qual seria a composição da dieta alimentar das populações do interior montanhoso do Vale do Mouro. A base da alimentação era fundamentalmente constituída por caldo de couves e feijões engrossado com farinha de milho à qual, por vezes, se seguia alguma carne de aves de criação, de porco (conservada nas salgadeiras) e em certas ocasiões a do cabrito ou a obtida pela caça nos montes onde abundava a perdiz, o javali e em menor número os corços, cuja carne ‘he como a de vittela ‘ no dizer do pároco memorialista. O pescado raramente entrava nas ementas e limitavase às sardinhas de Caminha descarregadas na Lapela ou vindas de Arbo (Galiza) e vendidas em Melgaço pelas ‘sardinheiras’. A lampreia, o sável e o salmão ‘pilhados’ nas cabaceiras e botirões armados nas pesqueiras do Rio Minho eram quase exclusivamente consumidos pelas populações ribeirinhas ou pelos monges de Paderne e Fiães, detentores da propriedade de grande parte daquelas construções fixas para a pesca fluvial. Recebiam o sal vindo de Caminha ‘em barcos pello Minho acima, até á Lapella e depois em carros até o lugar de S. Gregório, aonde há armazéns, aos quaes se vem prover todos os povos do bispado d’ Orense’ .
O núcleo populacional, em 1758, era já expressivo com os seus ‘cento e oitenta  nove vizinhos e quinhentas e vinte e duas pessoas entre grandes e pequenos’. Esta população havia justificado a construção de uma igreja com três altares estando o da capela-mor dotado de uma tribuna. O seu pároco era apresentado pela reitoria matriz de São Pedro de Riba de Mouro e tinha uma ‘renda doze mil réis, doze fanegas de pão, doze cabaços de vinha e dois alqueires de trigo pera hóstias , que lhe paga o colhedor dos fruttos desta terra e tem mais de cada freguês cazado hum alqueire de pão e sendo veuvos meio e solteiros hum coarto’. Era uma comunidade que procurava a autarcia no vestir para o que dispunha de ‘duas cazas de pisoins chamados nesta terra folloins, cada caza tem duas rodas e nelles se apizoam os buréis para mantas de cama e vestiários dos labradores e também se apizoam ou folloam outros materiais ordidos de estopa e tecidos de lam, de que se fazem manteos pera as molheres e calçoins pera os homens e vestias pera meninos’.

Contudo, existiam debilidades como e am a da não existir ‘hospital algum’ nem ‘caza da misericórdia’, a falta de correio servindo-se do da villa de Monção distante por ‘sima de duas legoas’ (idem, ibidem). As estradas apesar de colocarem o agregado em relação com outros mais distantes não permitiam, pelo seu traçado e piso, deslocações rápidas das diligências e malapostas. Existem descrições de viajantes estrangeiros que, nos séculos XVII e XVIII, se deslocaram por outras regiões do País manifestando o seu descontentamento pelas condições em que se viajava. Na reposta ao’Inquérito’ de 1758, o pároco Francisco de Caldelas Bacelar não alude a quaisquer intenção de apropriação privada dos baldios da freguesia. Contudo, o processo de tapamento dos montes comuns já se havia iniciado em outras freguesias do Vale do Minho. Em Gondarém (Vila Nova de Cerveira), no dizer do memorialista, as populações sentiam ‘consternação por não terem onde cortar lenhas para seu uso e matos para a cultura das terras’ desde que ‘pessoas sem título algum acoutaram para si muita parte do monte’. E rematava que ‘ faria Sua Magestade que Deos guarde hum grande serviço a Deos se mandasse demulir todas as tapadas e coutadas desta freguezia de quarenta annos a esta parte e se puzesse tudo a monte commum como antigamente se conservava’.


Extraído de:
LEITE, Antero & LEITE, Maria Antónia Cardoso - Parada do Monte, História e Património. ACER.
IAN/TT–Memórias Paroquiais, vol. 27, memoria 58, pp. 383-388 (publicado em CAPELA,J.
Viriato - As freguesias do concelho de Melgaço nas Memorias Paroquiais de 1758-Alto
Minho: Memória, História e Património, Ed. C. M. de Melgaço, 2005).

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