sexta-feira, 23 de setembro de 2016

Os milagres da Senhora da Orada contados há 300 anos

Capela da Senhora da Orada
Um livro publicado há cerca de 300 anos fala-nos dos milagres da Senhora da Orada num tempo em que à sua capela em Melgaço acorriam muitos peregrinos para a sua romaria. Ora leia: “Um tiro de mosquete pouco mais ou menos de distância da Praça de Melgaço se vê situado o Santuário e Casa de Nossa Senhora da Orada. Foi edificada sobre o mais alto de um monte eminente ao rio Minho que lhe fica da parte do norte, em igual distância do arrabalde da dita praça e vila de Melgaço de onde vem uma estrada pública que vai para o Reino de Galiza e Castela que passa junto ao átrio da capela. E desta até à vila se vê a estrada povoada e pomares, que tudo suaviza e recreia muito a vista a todos os que passam e também aos devotos da Senhora da Orada quando a vão buscar e venerar, tudo isto é um passeio.
É este templo de excelente estrutura, porque é fabricado de boa cantaria e é da jurisdição e administração dos Monges de Santa Maria de Fiães. Porque dele lhe fez doação El-Rei D. Sancho I deste reino, como coisa sua, pelo ter herdado de seu pai, o rei D. Afonso Henriques, que foi o que o reedificou depois da restauração de Espanha. De onde se colhe, que houve um templo mais antigo do que este, pois este foi reedificado sem dúvida ou porque o primeiro ameaçava ruína, ou estava já arruinado. Tudo isto consta de uma escritura de doação feita pelo referido rei D. Sancho em Santarém aos 3 dos idos de Setembro do anos de 1207 que assinou o mesmo rei com todos os seus filhos e prelados do reino que ali se achavam como era costume naqueles tempos. Esta escritura está no Livro das Datas do mesmo Mosteiro de Fiães o qual se conserva no cartório do referido mosteiro e assim se verifica ser este templo da Senhora da Orada antiquíssimo, como também o título da Senhora. Também daqui se colhe a particular devoção dos reis, fundadores deste reino. Como foi informado o padre António Carvalho da Costa, em dizer que este templo da Senhora da Orada era da Condessa Fronilla. A Quinta de Cavaleiros podia ser sua e fazer dela doação ao Convento de Fiães no ano de 1166 mas a Casa da Senhora da Orada não. !
A imagem da Senhora antiga com o decurso dos anos se desfez e a que existe é muito devota. É de perfeitíssima escultura, tem ao Menino Deus sobre o braço esquerdo e tem cinco palmos de estatura. É de madeira com as roupas estofadas de ouro. É muito milagrosa e como tal é buscada e invocada da devoção dos fiéis, os quais por sua intercessão, alcançam de seu Santíssimo Filho, o que justamente pretendem. A este santuário, desde o dia da ascensão do Senhor até à festa do Espírito Santo, vão em romaria as mães das freguesias da vila de Monção e do seu termo, a oferecer o resíduo do Círio Pascal e vai acompanhar a procissão ao menos uma pessoa de cada paróquia, com os seus párocos e isto por voto que antigamente fizeram em tempo de uma grande peste, de que ficou preservada a mesma vila e as freguesias do seu termo, as quais fizeram o referido voto e também muitas freguesias do termo de Valadares e todas as do termo de Melgaço. As gentes vão em procissão à Senhora da Orada e no mesmo tempo, umas por devoção e muitas por voto, com clamores e procissão no mesmo santuário, para implorar da Senhora os favores do Céu. E também em tempo que se necessita de sol, ou de chuva, vão muitas freguesias em procissão com ladainhas a pedir à Senhora os seus favores. O que com evidência experimentam, porque esta misericordiosa Senhora lhes alcança logo os bons despachos de tudo o que pedem.
É tradição antiga, que por favor e intercessão desta milagrosa Senhora se livraram muitos cativos, que estavam em prisões em terras de Mouros e que milagrosamente ou por ministério dos Anjos, apareceram às portas do templo da Senhora da Orada com os grilhões e correntes com que estavam presos. Os quais invocando o favor da Senhora da Orada, ela compadecida do seu trabalho e os aliviava e trazia à sua Casa. Infinitos são os milagres que obra e tem obrado a Senhora, e o querer fazer deles relação, não haveria papel que os comprendesse.
O autor da Corografia, o Padre Carvalho, também confirma a grande devoção de todos aqueles povos para com esta Senhora mas queixa-se de que a devoção daqueles Monges de Fiães já hoje estava muito tíbia, tendo antigamente muito fervorosa e que esta indevoção se ia já pegando muito. Porque não só já hoje a gente é menos, mas a Casa da Senhora se via menos asseada e que temia que viesse a padecer ruína. Porque como os arcebispos primazes não se podem ali intrometer, também os não podem obrigar a que reparem a Casa da Senhora da Orada para que se não arruine de todo e extinga totalmente aquela grande e antiga devoção que todos aqueles povos tinham com aquela milagrosa e prodigiosa imagem da Senhora da Orada. Nem eu posso crer de religiosos tão solícitos da sua religião tenham tão grande descuido em uma matéria que merece tanto cuidado e atenção."


Extraído de: SANTA MARIA, Frei Agostinho de (1712) – Santuário Mariano e História das imagens milagrosas de Nossa Senhora. Tomo IV; Oficinas de António Pedrozo Galram; Lisboa.

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