A
velha Ponte Internacional de
S. Gregório era uma passagem sobre o rio Trancoso que se localizava
ao fundo da Rua Verde no referido lugar da freguesia de Cristóval,
deste
concelho de Melgaço e ligava à margem galega, à
localidade
de Ponte Barxas.
Neste
sentido, é bom salientar que a existência desta ponte é muito
antiga dando inclusivamente nome ao próprio lugar que tinha uma
designação comum de ambos os lados o rio: Ponte das Várzeas/Ponte
Barxas. Todavia, do lado português, o nome entrou em desuso algures
no início do século XX, enquanto que do lado galego, a localidade
conserva o nome arcaico (Ponte Barxas).
Esta
ponte era tão rudimentar
como estratégica
em
termos militares.
Historicamente, daquilo que se conhece, era a principal passagem de
Melgaço para
a Galiza no
vale do rio Trancoso e
por isso, um ponto fronteiriço sempre
sensível
em tempos de guerra. Sabendo que em tempos antigos, o rio Minho era
intransponível em praticamente todo o troço que passa por Melgaço,
restavam as outras linhas de fronteira natural, entre as quais o
traçado do rio Trancoso. Nesta
linha fronteiriça, a importância da Ponte das Várzeas é destacada
por MOREIRA, L. (2008) que refere que
“Desde
Castro Laboreiro, à entrada do rio Minho, a fronteira era
estabelecida
pelo vale do rio Trancoso - também designado por “rio das Várzeas”
- cujo vale de margens abruptas era considerado impenetrável. Os
únicos pontos de passagem seriam duas pontes: a Ponte de
Pouzafolles, ainda em área de montanha, e a
Ponte das Várzeas, construída em madeira no lugar de S. Gregório”,
relativamente
próximo do rio Minho.
De
facto, esta ponte internacional, com toda a importância que a sua
localização estratégica lhe oferece, é aqui referida como sendo
construída de madeira. Tal informação é confirmada na memória
paroquial de 1758 de Cristóval, onde o sacerdote refere que a
paróquia “tem
mais o lugar de Sam Gregório com uma capela antiga do mesmo
santo e com vinte vizinhos (fogos), por onde é a estrada deste Reino
de Portugal para a Galiza passando-se o regato por uma ponte de táboa
que chamam a Ponte das Varges.”
A
sua importância estratégica da perspetiva militar durante a Guerra
da Restauração (século XVII) é comprovada pela frequência com
que é utilizada por portugueses e espanhóis nas suas incursões em
território inimigo, além do cuidado por parte dos nossos em guardar
esse ponto fronteiriço. Podemos citar um trecho do livro “História
do Portugal Restaurado” que nos fala das manobras militares nas
fronteiras desta região: ”D.
Gastão, com outro troço, ficou alojado na Ponte das Várzeas
(Cristóval) e para que o inimigo divertisse o poder que tinha junto,
mandou entrar na Galiza pela Portela do Homem a Vasco de Azevedo
Coutinho e por Lindoso a Manuel de Sousa de Abreu, ordenando-lhes,
que segunda feira, nove de Setembro, entrassem na Galiza. No mesmo
dia ao amanhecer, dividiu D. Gastão a infantaria em três troços e
levantando uma plataforma, fez jogar as duas peças de artilharia que
levava, contra o reduto da Ponte da Várzeas (junto a Ponte Barxas) e
foram de grande efeito, recebendo o inimigo considerável dano. Os
três troços, que governavam Lourenço de Morim, Sargento Mor de
Caminha e os Capitães Gaspar Casado Manuel e Martim Coelho Vieira,
com grande valor e pouca ordem, superando o embargo de algumas
estacadas, avançaram três redutos, e entraram ao mesmo tempo,
degolando os soldados que os guarneciam. Ficando aberto o caminho
para Monte Redondo, que os galegos haviam reparado, se retiraram os
que fugiram para este lugar que ficava vizinho. Depois de arruinados
os redutos galegos, os portugueses investiram contra as trincheiras
de Monte Redondo, e desemparando o inimigo, entraram no lugar e
saquearam-no uma segunda vez. O mesmo fizeram a algumas aldeias que
ficavam pouco distantes. Os galegos acudiram àquela parte
com três mil infantes e 400 cavalos e achando a gente carregada
de despojos, avançaram com resolução e os soldados da ordenança,
não querendo pôr em contingência o que haviam roubado, voltaram as
costas, não valendo a D. Gastão as grandes diligências que fez
para os deter na Ponte das Várzeas. Os oficiais e 500 soldados que
ficaram, fizeram rosto ao inimigo e valendo-lhe a aspereza do sítio,
se vieram retirando pelas veredas mais estreitas, e deixando 15
soldados mortos e dez prisioneiros, conseguiram valorosamente passar
a Ponte das Várzeas sem maior dano.
Em
finais do século XIX, os tempos já são outros mas esta
estratégica Ponte Internacional de S. Gregório conserva-se como uma
estrutura rudimentar em madeira. No livro “O Minho Pittoresco”
(1886), podemos ler uma curiosa mas detalhada descrição da ponte e
refere-se que “S.
Gregório é, por assim dizer, uma rua única, uma rua verde, em
ladeira íngreme até à ponte da Várzea, essa ponte que o nosso
desenho representa, e que é a primeira ponte internacional lançada
entre os dois países, se não quisermos falar nas poldras de
Pousafoles, mais ao nascente, no curso do Trancoso.
Mas,
enfim, a ponte da Várzea tem já os seus 4 metros de
altura, 6 de comprimento e 2 de largo! É quase a ponte de um
lagosinho!
Não
se riam dela, contudo, que ali onde a vêem, com os seus dois troncos
de castanheiro, lançados de margem a margem, e os seus torrões como
pavimento macio, é um símbolo de fraternidade entre dois países
que vivem em plena paz, e seria um baluarte de independência a
conquistar, quando o clarim de guerra ressoasse desoladoramente por
aquelas quebradas fora.
Ponte
Várzea é o lugar espanhol, donde o pontilhão tira o nome e que
pertence à alcaidaria de Padrenda, com quem S. Gregório faz o seu
comércio meio lícito, meio... de contrabando!
Que
diabo queriam, porém, que fizesse S. Gregório, se no inverno é a
margem de Ponte Várzea que lhe dá por empréstimo um bocadito de
sol, a cujos raios vão aquecer-se aqueles pobres friorentos gelados
das suas sombras de meses!”
Em
1911, a
singularidade
desta ponte de
S. Gregório chegaria
a provocar risos
o Parlamento numa
altura em que se temia que Paiva Couceiro e as forças realistas
entrassem em Portugal por esta mesma ponte. Num livro que se debruça
sobre o Governo de Pimenta de Castro, pode ler-se que “Circulava
o rumor de que Paiva Couceiro estava atravessando a ponte
internacional de S. Gregório com sete mil homens. — «Como o caso
é gravíssimo, quero saber, senhor Ministro da Guerra, que medidas
de defesa adoptou e quais as que tenciona adoptar?» — Pimenta de
Castro, natural de Monção, sabia que a ponte internacional sobre o
rio S. Gregório, não passava de um tronco de árvore atravessado
sobre o pequeno rio. Desfrutou o mulato dizendo-lhe:
— «Sete
mil homens devem despender quinze dias a atravessar a ponte
internacional de S. Gregório».
— «Que
defesa pensa estabelecer o senhor Ministro da Guerra e que tropas
mandou para lá?»
— «Tenho
lá as tropas que lá estavam (não estavam nenhumas!) e mais as que
para lá vou mandar (não mandou coisa alguma!)».
Paiva
Couceiro não estava em S. Gregório, nem pessoa alguma. Isso porém
é que ele não quis confessar...”
Esta
ponte seria destruída nos tempos da guerra civil espanhola e nunca
mais seria reconstruida. A Nova Ponte Internacional de S. Gregório
já era uma realidade desde 1935...
Informações
extraídas de:
-
MARÇAL, Bruno José Navarro - (2010) - Governo de Pimenta
de Castro - Um General no Labirinto da I República. Universidade de
LIsboa, Faculdade de Letras, Departamento de História;
-
MENEZES, Luiz de (1751) – História de
Portugal Restaurado. Tomo I; Oficcina de Domingos Rodrigues; Lisboa;
-
MOREIRA, Luís Miguel (2008) - O sistema defensivo do Alto Minho em
finais do sés. XVIII. In: Cad. Vianenses; nº 41;
-
VIEIRA, José Augusto (1886) - O
Minho Pittoresco, tomo I,
edição da livraria de António Maria Pereira- Editor, Lisboa.
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