sábado, 29 de maio de 2021

O lugar de Lobiô (Rouças - Melgaço) e a desaparecida capela de São Paio

 


Lobiô é um lugar da freguesia de Rouças situado junto ao limite administrativo com a vizinha freguesia de São Paio e relativamente próximo da cabeceira da Ribeira de São Lourenço que separa, desde tempos muito antigos, estas duas freguesias do concelho de Melgaço.  

A origem do topónimo Lobiô é germânica, sueva, muito antiga, e deriva do termo primitivo “Laubjo” que significa “alpendre” ou “alboio”, palavra antiga e em desuso para designar um coberto. Contudo, o termo citado tem um significado alternativo que é o de “emparrado de pouca altura”, segundo o Dicionário da Real Academia Galega. Posto isto, não dispomos de bases documentais para apontar com precisão a origem do topónimo devido à sua antiguidade.

Na Galiza, temos, por exemplo, Lobios, ou Lobio, que derivam da mesma raiz evolutiva. É provável que se tenha aplicado este substantivo para se referir a este lugar devido à presença de construções com alpendres ou alboios. Todavia, chama-se à atenção para o facto de o topónimo se apresentar no singular o que não será irrelevante. 

Trata-se sem dúvida de um topónimo muito antigo. Ainda que em relação a este lugar, não tenhamos menções em documentação medieval, na Galiza, em topónimos de origem similar tais como Lobios, temos referências desde o século XII. (VILLAR, 2014) 

Um pouco acima do lugar de Lobiô, até inícios do século XVIII, existia uma capela dedicada a São Paio.  Nessa época, esta ermida estava arruinada e os visitadores já tinham chamado à atenção anteriormente para o seu estado de avançada degradação.  

O ilustre e já saudoso cónego José Marques, natural da freguesia desta Rouças, num artigo escrito no jornal “Voz de Melgaço”, refere-se às últimas ruínas desta ermida que ainda chegou a contemplar, na sua infância, e fala-nos dos “restos das paredes, emergentes do solo, até à altura de uns cinquenta ou sessenta centímetros, muitas vezes vimos, quando menino e moço, com os nossos companheiros, depois das sementeiras dos campos, íamos bem cedo, por causa do calor, apascentar os gados para o monte baldio da encosta de S. Paio, cuja designação lhe adveio da presença da capela...” (MARQUES, J., 2019). Sabemos que, em 1707, a capela de São Paio já estava em ruína e por determinação do padre visitador, deveria ser reedificada junto do lugar de Lobiô, como deixou determinado o pároco de Rouças, Brás Andrade da Gama, Doutor em Direito Canónico e Civil no livro “Livro que serve para os Títulos das Sepulturas, Capellas, Altares e Irmidas desta Freguezia de Santa Marinha de Rouças”, rubricado e assinado, nos serviços arquidiocesanos de Braga, no dia 26 de outubro de 1707.  

Segundo MARQUES, J. (2018), a capela que o visitador mandou erigir junto de Lobiô, acabou por ser construída no local onde atualmente se encontra o Santuário de Santa Rita, praticamente implantada, dentro da cabeceira desta nova igreja.  

No documento do pedido de licenciamento para a construção da nova capela de São Paio em Vilela, datado de 26 de Junho de 1739, explica que a velha capela em Lobiô, estava em muito mau estado e que o caminho de acesso era muito difícil e tinha sido construído pelos moradores do lugar. No dito documento, pode ler-se: “… Diz Manuel da Cunha Lira, abade de Santa Marinha de Rouças, termo de Melgaço, comarca de Valença que havendo em a dita freguezia huma capella da invocassam de Sam Paio há tempo emmemorial sita em o lugar de Lovio que fica distante da egreja huma mea legoa e serra montuosa e caminhos empraticaveis fabricada pelos freiguezes por ser muito necessária para adeministrassam dos sacramentos para o sobredito lugar e outrossim, digo, e outro ser convizinho chamado Vilella que consta de sessenta vizinhos a sobredita  capela [em Loviô] por estar em parte desabrigada e sujeita às tempestades se foi arruinando; e vendo os Reverendos Vezitadores a grande necessidade que dela havia para os lugares sobreditos e desamparo do sítio, mandaram que os freguezes a reedificassem em milhor sítio e mais abrigado…” No documento, também se refere que a capela existia desde tempos imemoriais o que pressupõe que devia ser bastante antiga. 

MARQUES, J. (2012), acrescenta ainda que depois de “demolida a antiga capela de S. Paio, outrora, frequentada também pelas gentes de Cavaleiro-Alvo, os moradores dos seus dois lugares – o de Cá e o d’Além – construíram, a meia distância entre os dois aglomerados populacionais, a capela de S. Paio, que lá conservam, renovada e, recentemente, enriquecida com estrutura indispensável, na atualidade.  

A memória da utilização comum da antiga capela de S. Paio, demolida na sequência da referida legislação eclesiástica, deu origem a duas novas capelas a ele dedicadas: uma, em Rouças, no lugar da Eira – agora igreja de Santa Rita –, outra, comum aos dois lugares de Cavaleiro-Alvo, e, além de sobreviver no imaginário das populações dos lugares de Lobiô e de Cavaleiro-Alvo, vizinhos, mas de freguesias diferentes, traduz-se, anualmente, na gentileza dos moradores de Cavaleiro-Alvo, que levam a procissão da festa de S. Paio, realizada no primeiro domingo de Julho, até ao cruzeiro, donde se avista o lugar de Lobiô, situado na encosta fronteira, e ali aguardam, enquanto os moradores de Lobiô correspondem e agradecem a visita do Santo protector, com uma sessão de fogo, em sua honra, custeada por todos os habitantes”. 

Seguramente, o lugar de Lobiô é habitado desde tempos muito antigos. Sabemos com segurança que o povoado é, desde relativamente extenso, pelo menos desde o século XVII.  

Lobiô é referido nas Memórias Paroquiais de 1758 no rol dos lugares povoados. Podemos inclusivamente afirmar que teria dos povoados mais extensos da freguesia de Rouças, de acordo com a contagem de batismos e óbitos para os períodos analisados. Podemos ter uma ideia da dimensão do universo populacional de Lobiô ao longo dos últimos séculos na tabela seguinte: 

 


Por volta de 1885, passou no lugar de Cabana, desta mesma freguesia, o autor do célebre livro “O Minho Pittoresco”, José Augusto Vieira, deixando breve nota, na sua obra, de quando avistou este lugar de Lobiô: “Passamos em Cabana e vemos na baixa as pastagens de Lobiô, dum verde esmeralda macio e tenro.  

Estes lugares pertencem a ROUSSAS, cuja paroquial igreja nos fica à direita.” (VIEIRA, 1886). 


Fontes consultadas:

MARQUES, José (2012) – O culto de S. Paio em Portugal e em Melgaço. In: Jornal “A Voz de Melgaço; Edição de 1 de Junho de 2012.


MARQUES, José (2018) - De Rompecilha para Rouças - 1362. In: Jornal “A Voz de Melgaço; Edição de 1 de Março de 2018.


MARQUES, José (2019) – Origem da nova capela de São Paio – depois Santa Rita – em Rouças. In: Jornal “A Voz de Melgaço; Edição de 1 de Março de 2019.


VIEIRA, José Augusto (1886) - O Minho Pittoresco, Tomo I, Livraria de António Maria Pereira-Editor, Lisboa.

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