Mathias de Sousa Lobato, em Castro Laboreiro num enterro, à esquerda segurando o chapéu (1914)
O Comendador Mathias de Sousa Lobato nasceu em Alvaredo
em 29 de Junho de 1859. Frequentou a Escola do Magistério Primário na capital do
Minho e tornou-se professor aos 22 anos.
Em 12 de Maio de 1887, foi nomeado professor vitalício de Castro Laboreiro.
Durante muitos anos, foi ali o Presidente da Junta da Paróquia. Eram merecidos
todos os votos da grande maioria da população castreja, pois o Professor
Mathias estava sempre disponível para os castrejos. Ia-lhes sempre à vila de
Melgaço tratar de assuntos relacionados com as Finanças, Conservatórias,
Tribunal, Câmara, Administração, etc. Conseguiu obter um sino para a igreja e a
ele se deve a construção do cemitério (até aí, os mortos eram enterrados na
igreja).
O título Leão das Montanhas, foi atribuído pelo próprio
ministro Hintze Ribeiro, contam uns, ou por um Governador Civil de Viana,
contam outros. Não se sabe ao certo.
Em Agosto de 1916, quando já se encontrava doente,
recebeu, na sua casa em Castro Laboreiro, a visita de alguns fidalgos da vila
de Melgaço acompanhados do Administrador do concelho e de um deputado, o Dr.
Amaro de Oliveira, que estava nas Águas do Peso. O narrador dessa excursão a
Castro descreve-o assim: “O Zé e o Esteves partiram a galope avisar o Comendador
Mathias da nossa chegada . E lá estava ele no meio da ponte, a barba
desgrenhada, a barriga proeminente, escancarando a boca enorme numa saudação: - Sejam
bem-vindos!
O professor Mathias em Castro Laboreiro em 1914
Depois, os seus braços compridos estenderam-se e, abrindo
a mão papuda, mostrando o pulso rijo e peludo, gritou: - Alto!
O meu povo há-de vir esperá-los aqui, pois então?
A uma pergunta do Zé e do Henrique: - Ó parente?! Então? Rijo, hein!? Ele respondeu: Bem, bem.
E o narrador conta-nos “e do fundo do peito saía uma
gargalhada forte que atroava os ares, enquanto o olho esquerdo piscava (...),
obrigando-o a enrugar aquela face corada e coberta de pêlos. Apresentaram-lhe
os Doutores Joaquim e Amaro Oliveira. E ele, na sua figura imponente,
apertava-lhes a mão, muito direita, muito firme, conservando um ar de “grand
seigneur”, mostrando a sua pose rústica que o título de Leão das Montanhas
tinha a sua razão de existir. E entre uma piscadela de olho e uma casquinada de
riso, os bem-vindos cruzava-se, saíam numa confusão atroando a aldeia. Quando o
povo chegou, o comendador botou discurso: “Meu
povo! Sois honrados com visita de um deputado...”, e – diz-nos o
narrador – uma piscadela de olho rematou as reticências. E por ali fora,
continuou, ora erguendo a bengala ameaçadora, ora mexendo na barba inculta,
gritando, misturando frases, confundindo pontos e vírgulas. O arroz, o
bacalhau, o açúcar, o Dr. Afonso Costa, o Bernardino Machado, a liberdade, a
honradez, o povo de Castro, saíram misturados, em união sagrada, numa dança
macabra de palavras, de exclamações... O discurso acabara e ele, na sua voz
forte, comandou: “Tudo para suas casas,
ala...”.
E mais à frente “entramos em casa do comendador Mathias,
por uma escadas toscas de degraus altos, comidos pelo tempo e pelo uso. A
porta, muito baixa, dava entrada para a casa da escola, com carteiras
desarrumadas, esbranquiçadas do pó. No andar de cima, os outros aposentos,
muito pequenos, duma simplicidade quase desconfortável, de chão esburacado e
teto baixo...”
Comia que nem um javardo! Diz o narrador: “... fazendo
sair mais a barriga, trincando dois pasteis folhados ao mesmo tempo...”. E logo
a seguir: “... com um copo enorme entre os dedos, abria a boca negra para lhe
meter mais pastéis; na barba desgrenhada, havia pedaços de comida; e o bigode
entrava-lhe pela boca, misturado com o vinho que ele bebia, todo deitado para
trás, a mão afagando a barriga, o colete desapertado para estar mais à vontade.”
E durante o piquenique fala aos seus hóspedes “ ... num retrato, num célebre
retrato que ele tinha encaixilhado em madeira, junto a uma caixa de charutos, com o peito
coberto de medalhas, e com a sobrecasaca vestida, uma sobrecasaca muito antiga –
que lhe ficava a matar – dizia ele”.
Depois do repasto, em direção ao castelo ”... o
comendador, que caminhava à frente, monologava: - Oh! Que gente! Meio copinho e pronto! Eles estão aí que nem cachos!
Olhem para mim! Nem com vinte canadas!”.
O comendador viria a falecer em Agosto de 1920 em casa de
sua irmã Ana. Morreu solteiro. Contudo, a pessoa que narrou este encontro conta-nos que na sua casa de Castro tinha a sua mais que
tudo, de nome Isabel, que de criada fora promovida a governanta! Aquando da
visita do deputado, ela traz café da cozinha “dentro de uma garrafa de vinho.
Dentro de um cesto, aparecem as chávenas, uns copos muito grossos, quase opacos”.
O administrador do concelho, depois de provar perguntou “Que licor é este?” “Isso é café!”,
cantarolou a Isabel, encostada à porta da cozinha, descansando as mãos na
barriga proeminente.
Apesar de ter sido um altruísta, arranjou alguns
inimigos, do grupo do Jornal de Melgaço, sobretudo por causa da política. Não
se pode agradar a gregos e a troianos ao mesmo tempo.
Mathias de Sousa Lobato, à porta de sua casa em 1911
Informações recolhidas em:
- ROCHA, Joaquim (2007) - A Febre Tifóide e os seus protagonistas. in: Boletim Cultural de Melgaço, Câmara Municipal de Melgaço, Melgaço.
NOTA: Um enorme OBRIGADO a Diana Carvalho pela partilha de documentos que possibilitou a publicação deste texto.
- ROCHA, Joaquim (2007) - A Febre Tifóide e os seus protagonistas. in: Boletim Cultural de Melgaço, Câmara Municipal de Melgaço, Melgaço.
NOTA: Um enorme OBRIGADO a Diana Carvalho pela partilha de documentos que possibilitou a publicação deste texto.
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