Desde
tempos imemoriais que, pelas aldeias de Melgaço, se celebram festas
e romarias, algumas delas bastante concorridos. Desde que existem
jornais em terras melgacenses, em finais do século XIX, os mesmos
costumavam fazer eco das ditas festividades, especialmente quando
aconteciam cenas de pancadaria. Se passarmos os olhos pelos jornais
locais de Melgaço de há cerca de 100 anos, vemos frequentes
notícias de desacatos com uma certa violência, em romarias da nossa terra.
Por
exemplo, no jornal “Correio de Melgaço”, na sua edição de 18
de Janeiro de 1914, conta-nos que a 15 do mesmo mês e ano, foi a
festa de Santo Amaro, realizada na freguesia de Prado. Ao terminar a
romaria, quando a Filarmónica Nova, regida por Rafael Paulo
Fernandes, vinha saindo do arraial, tocando um ordinário,
originou-se uma desordem, tendo sido agredido António Joaquim, que
vinha acompanhando a dita filarmónica, com bengaladas dadas por
Manuel Joaquim Barreiros, solteiro, lavrador, natural de Prado. O
agredido pegou numa pedra e atirou-a à cabeça do agressor,
causando-lhe um ferimento na cabeça «fazendo-lhe jorrar sangue em
abundância.» «Depois, prisões, socos, revólveres em cena, o
diabo, terminando por António Joaquim de Sousa ter dado entrada na
cadeia e o Barreiros ter-se ido curar a uma farmácia. Dizem que, a
causa desta desordem são rixas velhas entre rapazes da Vila e da
freguesia de Prado”.
No
mesmo periódico, na sua edição de 22 de Agosto de 1915, ficamos a
saber que na festa da Senhora dos Remédios, realizada em Sante
(Paderne) no dia 15 do mesmo mês e ano, houve pancadaria. Um dos
feridos foi Manuel José Soares, conhecido por o “Cerdeira”, de
Cavaleiro Alvo, o qual teve de ir fazer tratamento ao hospital da
Vila. Outro dos atingidos foi Joaquim Garelha, do lugar de Pomares,
freguesia de Paderne, tendo um dos contendores cortado uma das suas
orelhas a meio, parecendo ter o desgraçado três orelhas.”
Desacatos
nas romarias melgacenses eram de facto muito frequentes. No Jornal de
Melgaço, na sua edição de 3 de Agosto de 1919 escreve: “Está em
moda, nas romarias, à tarde ou à noite, haver grossa bordoada. Em
Pomares, quando no dia 25 se realizava a festividade em honra de São
Tiago (Santo Iago), foi o que se viu. No dia 27, quando em Paços se
realizava a festividade em honra de Santa Ana, também não faltou a
traulitada entre a rapaziada de Paços e a de Chaviães. Que ela se
desse em Pomares, quando se festejava o São Tiago, admitimos, visto
tratar-se de um herói na traulitada aos moiros; mas tratando-se da
avó de Jesus, que decerto devia ser toda bondosa, parece que não
fica bem. Mas, como os desordeiros acham sempre bem, toda a vez que
podem pregar a sua traulitada, à tarde, pouco depois de recolher a
procissão, houve alguns socos, misturados com bengaladas, o que deu
em resultado alguns dos de Paços virem até ao lugar do Esporão
onde perguntaram aos de Chaviães se queriam guerra ou harmonia. E
como os de Chaviães respondessem que se estavam ali era para bater,
e como logo em seguida fizessem com uma traulitada baixar ao chão o
Ricardo Alves, de Paços, os companheiros deste desafrontam-no,
fazendo também ir a terra uns quatro ou cinco de Chaviães. Não
podemos de forma alguma elogiar tais proezas, mas se temos de
censurar estas, como não devemos classificar o facto de os
“valentes” de Chaviães, depois desse dia, baterem em qualquer
pessoa que à Portela do Couto passasse, pelo simples facto de ser de
Paços? Desconhecemos as razões anteriores que naquele dia os
levaram a vias de facto, não podendo, por isso, avaliar bem a
responsabilidade de cada grupo, mas o que toda a gente, desconhecendo
embora essas razões e até esses factos, tem de censurar com toda a
energia dos seus nervos, é o facto de certos “valentes” da
Portela do Couto baterem há dias numa mulher de Sá, conhecida por
Maria do Romão. Essa mulher deve ter 60 anos de idade
aproximadamente, é viúva e doente, e vive distante um único filho
que tem. Nada mais julgo necessário para aquela mulher ser digna de
todo o respeito; mas os “valentes” da Portela não o entenderam
assim. Saem à estrada, onde lhe perguntam de onde é, e – como ela
dissesse que era de Paços – dão-lhe logo duas bofetadas. Por
acaso será crime o ser natural de Paços porque os desta freguesia
bateram nos de Chaviães? Mais juízo, ó “valentes” da Portela,
pois do contrário teremos de chamar a atenção da digna autoridade
administrativa para as vossas proezas, mandando-vos chamar a
capítulo!”
A
festa de S. Bento em Fiães no ano de 1932 também foi notícia pelas
más razões, tal como nos conta o “Notícias de Melgaço”, na
sua edição de 17 de Julho de 1932: “A
romaria de São Bento, em Fiães, ficou assinalada por algumas
desordens que se desenrolaram durante o arraial da tarde do dia 11
(Julho
de 1932), e de que resultaram bastantes feridos, sendo dois
gravemente. O princípio da desordem foi provocado por dois rapazes
da Vila de Melgaço. Generalizou-se, e das várias refregas havidas
saíram muito maltratados, em estado grave um rapaz de Sante e um
outro conhecido por José Canelas, com uma facada no rosto o
comerciante desta Vila, senhor José Maria de Sousa, tendo este, em
sua defesa, agredido com um guarda-sol o senhor José Correia de
Amorim, de Cristóval. Houve alguns feridos mais, sem gravidade, e
felizmente não houve mortes. Bom seria que os arraiais não fossem
perturbados com estas alterações da ordem que bastantes prejuízos
acarretam, não só a quem ali acorre para fazer o seu negócio, como
a quem vai com devoção, ou [apenas] para se distrair.”
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