sábado, 31 de agosto de 2013

Parada do Monte (Melgaço) na segunda metade do século XVIII (Parte I)


Em 23 de Junho de 1766, o marquês do Pombal faz publicar uma Lei que pretende regular a ‘questão dos baldios’. Nela ‘legalizava-se o tapamento dos baldios - que, na sua opinião, tinham ido demasiado longe, a ponto de «ameaçarem os progressos da agricultura e a subsistência do povo» - e reforçava os cofres municipais para onde revertia a maior parte dos fundos assim obtidos, não continha nenhum incentivo à desarticulação radical dessa forma de propriedade’ (Feijó, 1992).
Para José Viriato Capela, a apropriação e divisão dos baldios insere-se no que é ‘comummente chamado de individualismo agrário que dos campos se passa aos montes’ (…) ‘O individualismo agrário remonta aos inícios do século XVIII com a divisão das veigas e a abolição progressiva das servidões colectivas no Minho’ (…) ‘ a apropriação individual atinge por todos os lados o seu clímax entre 1790 e 1810. É sobretudo uma realização das classes políticas (governanças das câmaras), proprietários e plutocratas que na apropriação dos baldios buscam os meios de completar os seus rendimentos de natureza rentística’ (Capela, 1997).
No caso do concelho de Valadares (ao qual pertencia Parada do Monte), ‘os foros e rendas produzem à câmara uma receita ilíquida muito reduzida… ’ (Capela, 2003). Entre 1782 e 1788, a média dos ‘foros, aferimentos, barcos e fornos e campo da Rebofa’ atingiu um valor de 8.260 réis com acréscimo de 25,6% entre 1782 e 1784 para depois manter um crescimento constante de 1% entre 1785 e 1788. (Idem, ibidem).
Significa este reduzido valor dos aforamentos que a privatização dos baldios não foi significativa no concelho de Valadares e naquele período? A resposta poderemos encontrá-la em Custódio José de Villasboas; a dificuldade em cultivar. Na ‘Descripção Topographica das Commarcas Fronteiras da província do Minho’ ao referir-se ao estado da agricultura escreveu: ‘O terreno das comarcas fronteiras he de natureza fria, tenaz, e difícil de cultivar; por isso o fabrico das terras demanda muito estrume, e assíduo trabalho. O estrume he feito de tojo curtido nos curraes com mistura de folha, feno e palha, porém nas terras mais frias, como é o concelho de Coura, e em todos os districtos que se avizinhão das serras da Peneda, e Amarella, são os estrumes feitos de giesta por dar milhor adubo para as mensionadas terras. Daqui vem a necessidade que os lavradores tem dos montes, não só para o pasto dos gados, mas para o roço dos adubos, o que he huma razão demais para ser menor a extensão das terras cultivadas que demandão sempre huma certa porção de baldios propicíos ao matto que as terras exigem: matéria para reflexão sobre as novas tapadas que se fazem nos baldios com obrigação de os rotear’ (Villasboas, 1800) . Para o capitão do Real Corpo dos Engenheiros e membro da Real Sociedade, a agricultura nas comarcas fronteiras do Alto Minho tinha na alta produtividade do milho a principal justificação para o porfiado trabalho dos lavradores. Os seus cálculos para a produção de sementes assim o demonstram: ‘por hum alqueire de milho , dá 22; por hum de centeyo 6; por hum de trigo 7, e por hum de feijão 5 e estes últimos semeão-se por entre o milho em pouca quantidade para não perturbar a recíproca vegetação’ (…) ‘O terreno que dá 30 alqueires de milho, só dá 10 ou 12 de trigo: esta diferença faz preferir aquelle ao trigo, além da conveniência de colher o feijão por entre o milho’ (Idem, ibidem).
Contudo, Villasboas chamava a atenção para a desigualdade nos rendimentos obtidos pelos agricultores: ‘Computando o número de lavradores entre 52 e 75 por cada freguezia, deve notar-se que destes só metade cultiva quanto baste para o seu sustento; porque a outra metade não chega o que cultivam para se manter todo o anno depois de pagarem o dízimo, e as pensões das terras, que ordinariamente são de prazo, e foreiras ou aos muitos conventos monachaes que há na província, ou às comendas, ou a cazas particulares de nobres que habitão nas villas e cidades: a ribeira do Lima e do Minho, como berço da Nobreza de Portugal, abunda muito destas cazas particulares. Hum terço porem dos mencionados lavradores tem algum supérfluo que vendem’ (Idem, ibidem). Relativamente aos ‘lavradores que não cultivão quanto baste para o seu sustento, procurão suprir esta falta hindo com os seus bois e carro conduzir os géneros de importação, exportação que navegão pelos rios Lima e Minho, mas como são muitos, e as distâncias pequenas tirão disto pouco lucro, razão porque preferem antes sahir a trabalhar para terras remotas, deixando a cultura entregues às mulheres e filhos’ (Idem, ibidem).
Segundo Villasboas, ‘esta he a genuína razão de se observar huma grande falta na população dos homens a respeito das mulheres, a qual sendo quazi geral na província do Minho he muito maior nas comarcas fronteiras…’ (Idem, ibidem).
Em Valadares e na freguesia de Parada do Monte, a demografia dos finais do Séc. XVIII apresentou um quadro diferente do esboçado por Villasboas. Em primeiro lugar, a evolução foi de crescimento: Dos 522 habitantes referidos pelo memorialista no Inquérito de 1758, passou-se para 662 habitantes em 1801, segundo o Censo do Conde de Linhares (Sousa, 1997).
Em segundo lugar não se conhecem, entre 1758 e 1800, movimentos de emigração e alteração na composição por sexos da população: Em 1758, o pároco Francisco de Caldelas Bacelar não referiu haver gente a trabalhar no exterior da freguesia mas apenas informou de que nas brandas de Travassos, Mourim e Fitoiro e em ‘cazas cobertas de colmo’ morava ‘gente somente no tempo do Verão coando não há neves’ (IAN/TT, 1758). Em 1801, pelo censo do conde de Linhares, no total da população, 52% eram homens e 48% mulheres (Sousa, 1997).

No decurso destes anos, Parada do Monte ter-se-ia revelado atractiva na fixação humana para o que teria concorrido a sua economia de base agro-pastoril permitindo a subsistência dos agregados e o crescimento equilibrado demográfico. (continua)...


Informação extraída de:
LEITE, Antero & LEITE, Maria Antónia Cardoso - Parada do Monte, História e Património. ACER.
IAN/TT–Memórias Paroquiais, vol. 27, memoria 58, pp. 383-388 (publicado em CAPELA,J.
FEIJÓ, Rui Graça – Liberalismo e Transformação Social, Ed. Fragmentos, Lisboa, 1992
Viriato - As freguesias do concelho de Melgaço nas Memorias Paroquiais de 1758-Alto
VILLASBOAS, Custódio Jozé Gomes de – Descripção Topographica das Commarcas
Fronteiras da Província do Minho, 1800 (inserido em Fernando de Sousa e Jorge
Fernandes Alves- ‘Alto Minho. População e Economia nos Finais de Setecentos,
Editorial Presença, Lisboa, 1997,
Minho: Memória, História e Património, Ed. C. M. de Melgaço, 2005). 

quinta-feira, 29 de agosto de 2013

A fortaleza de Melgaço no tempo de D. Afonso III (1248-1279)



Durante o período em que D. Afonso III governou, o castelo foi, objecto de medidas para a sua conservação e reforço defensivo. A inscrição, situada à direita da porta noroeste (porta, que a sanha demolidora da edilidade por pouco não destruiu em 1917) e estudada por José Leite de Vasconcelos, é um claro testemunho disso. Transposta para português atual, diz o seguinte:
"No tempo d'el-rei D. Afonso, de Portugal, era de 1301, o mestre Fernando consertou este muro. Martinho Gonçalves, castelleiro d'el-rei nosso senhor, cercou de muros a vila neste ponto."
Peça importante no sistema nacional de defesa, o castelo de Melgaço beneficiou, à semelhança de todos os outros, também integrados nesse sistema, dum costume - emanado directamente do poder régio ou surgido em consequência da constante reclamação dos povos -, que consistia em “reservar as terças dos rendas dos concelhos não só para o repairo desses muros e castelos, mas também para o mais que necessário fosse à defesa dos lugares. ( ... ). Era, como se nota com facilidade, a anúduva ou nudívia do foral henriquino ainda em vigor no tempo do rei venturoso, mas alargado este imposto a todo o concelho. Ao produto destas terças só raras vezes outro destino lhe foi dada e quando isso sucedeu não deixaram os reis consultar as câmaras dos concelhos e pedir-lhes a sua aquiescência”.
A D. Dinis é atribuída pela maioria dos autores, que a este assunto se referem, a fundação duma forte «cinta de muralhas» para defesa da povoação. No entanto, a lógica exige, que nos debrucemos sobre as últimas palavras da inscrição, atrás referida, e nos interroguemos se essa «cintura amuralhada» não tem, de facto, começado no tempo de D. Afonso III, porque, como muito bem nota Bernardo Pintor: “Não adiantava fazer a muralha pela parte de onde se conserva a inscrição se não abrangesse todo o circuito da vila.”
Mas o que mais interessa salientar é a relação íntima entre o aparecimento da fortaleza, ou seja, do conjunto «castelo e muralhas citadinas», e a expansão do povoado, acompanhada, claro está, pela sua importância sócio-económica (era local de passagem e de negócios), numa área onde, também, os Mosteiros de Fiâães e Paderne foram notáveis centros irradiadores de desenvolvimento.





Informações recolhidas em:
- ALMEIDA, João de (1943) - Reprodução anotada do Livra das Fortalezas de Duarte d’ Armas. Lisboa, Editorial lmpério, p. 430.
- SILVA, Armando Malheiro (1984) – A fortaleza de Melgaço: pedras e património. Separata da revista MÏNIA 

terça-feira, 27 de agosto de 2013

A viragem para o século XIX marca o início da decadência da fortaleza de Melgaço

Este é o aspecto da torre e da muralha na viragem para o séc. XIX para o séc. XX

No reinado de D. Joâo V (1707 - 1750), o ocaso da fortaleza de Melgaço ainda estava algo distante, e, por isso, a sua manutenção não foi descurada. É referido em documentos, que dão conta dumas obras que fizeram nesta praça de Melgaço nomeadamente nos “armazéns, paiol de pólvora, consertos de telhados, reboques de paredes, reforço de pregos nas carretas e consertos de coronhas e concertos de fechos”.
Contudo, as muralhas da fortaleza de Melgaço apresentavam em 1808, numa ou noutra parte, o desgaste do tempo e acusavam a incúria dos alcaides mores, para quem passara por força do costume, sancionado pelos reis e transitado para as velhas ordenações do reino, a obrigação dos reparos em todas as obras de defesa das praças d'armas.
Como o castelo apresentava também um estado deplorável, «arruinado ou quase de todo cahido» quando em 1786 faleceu o nosso alcaide mor Sebastião de Castro Lemos, coronel de infantaria e governador da praça de Caminha, o juiz de fora Dr. António José Pinto da Rocha, cujo nome honra a Santa Casa e desde 1785 a 1791 por aqui administrou a justiça, aproveitando a oportunidade oferecida pelo ocaso daquela vida, sequestrou todos os rendimentos da alcaidaria mor.
E como a rainha D. Maria I, ao ter conhecimento de tal diligência, ouviu a Casa de Bragança e só Ihe respondeu «Fizestes bem!». Assim, utilizaram-se as rendas e fizeram-se reparos no castelo à custa dos rendimentos do falecido alcaíde-mor “sequestrados” pelo Juiz.
Contudo, a receita não chegou para tudo e continuaram as muralhas, por isso, com “panos mais ou menos arruinados”, com troços mais ou menos caídos.

Com a implantação do Liberalismo em 1821, não tardaram a formar-se as condições, que converteram a fortaleza «num estorvo ao progresso». Na verdade, entre 1884 e 1917, boa parte das muralhas existentes à época, seriam desmanteladas e as pedras vendidas a particulares.

Informações extraídas de: 

- SILVA, Armando Malheiro (1984) – A fortaleza de Melgaço: pedras e património. Separata da revista MÏNIA.

domingo, 25 de agosto de 2013

A Igreja Paroquial de Cristóval: referências históricas e características arquitetónicas


Vista para a Igreja Paroquial de Cristoval (Melgaço)
(Foto em http://coxo-melgaco.blogspot.pt)

A data da fundação de uma primeira igreja nesta freguesia remonta a 1509, segundo documentos da Torre do Tombo. Contudo, apenas em 1621 se encontra o primeiro registo de casamento documentado. O ano de 1622 é a data do primeiro registo de baptismo documentado.
Em documentos da época, refere-se que em Julho de 1641, o governador da Galiza, o Marquês de Valparaizo enviou um exército de oitocentos homens para retaliar o ataque português de D. João de Sousa e incendiou as igrejas de Cristóval e Paços, casas e searas da freguesia.
Em 30 de Maio de 1758, segundo o abade Duarte Cerqueira Araújo nas Memórias Paroquiais, Cristóval era do termo da vila de Melgaço, pertencendo à Casa de Bragança na época incorporada na Casa Real, comarca de Valença e Arcebispado de Braga. A freguesia tinha 180 fogos ou vizinhos, com 183 pessoas maiores de sacramento e 47 menores. A igreja de uma nave tinha o altar principal na capela-mor, onde está a imagem do orago no lado do Evangelho e a de Santo Anão no da Epístola, com sacrário e Santíssimo. No corpo da igreja tem dois altares colaterais encostados à parede do arco cruzeiro, sendo o do Evangelho dedicado a Nossa Senhora da Apresentação e o oposto a São Sebastião. Por ser pequena, a igreja não tinha irmandades, mas apenas a confraria das Almas. O abade tem de dízimos, rendimentos e emolumentos cerca de 500$000 anuais. A data de 1849, inscrita na lápide de granito colocada na parede posterior da capela-mor parece apontar a data da sua construção. No ano de 1902, decorreu construção da torre sineira por Daniel José Rodrigues em obediência à vontade de sua esposa Antónia de Silos Rodrigues.
Trata-se de uma igreja com planta longitudinal composta por nave única e capela-mor, mais baixa e estreita, tendo adossado à fachada lateral esquerda torre quadrangular e sacristia rectangular. Possui volumes escalonados com coberturas diferenciadas em telhados de duas águas na igreja e de uma na sacristia. Fachadas da nave em cantaria de granito aparente, muito irregular na zona superior, denotando o seu alteamento, as da sacristia em alvenaria de granito e as da capela-mor e torre rebocadas e pintadas de branco, terminando em friso e cornija (capela-mor) ou apenas cornija, sobreposta por beirada simples. Fachada principal virada a oeste, terminada em empena encimada por cruz latina de braços quadrangulares trevados sobre plinto paralelepipédico. A mesma é rasgada por portal em arco de volta perfeita, de aduelas largas sobre os pés direitos e por janela rectangular. Fachada lateral esquerda com a nave rasgada por porta travessa de verga abatida, portal de verga recta de acesso ao coro-alto, precedida por escada de cantaria com guarda de ferro, e janela de capialço e, na capela-mor, janela de capialço. Fachada lateral direita com a sacristia rasgada a oeste por porta de verga recta e a sul por pequena fresta jacente e janela rectangular; torre sineira de dois registos marcados por friso e cornija, com pilastras toscanas nos cunhais, sendo o primeiro registo rasgado a sul por porta de verga recta moldurada, e óculo polilobado, em cada uma das faces, tendo ainda a oeste. Possui também relógio circular; no segundo registo, percorrido por sacada com guarda em ferro e abre-se também em cada uma das faces sineira em arco de volta perfeita sobre pilastras e com fecho relevado, albergando sinos. É rematada por guarda de cantaria vazada, com plintos paralelepipédicos nos cunhais, coroados por fogaréus e com cobertura em coruchéu bolboso, decorado com elementos fitomórficos, coroado por cruz em ferro. Fachada posterior da capela-mor terminada em empena coroada por cruz latina de cantaria sobre acrotério e pináculos piramidais com bola nos cunhais apresentando uma placa em granito inscrita.
Esta igreja situa-se no interior da aldeia, junto à estrada que a atravessa. Insere-se em terreno parcialmente murado, formando adro, de cota bastante rebaixada relativamente ao nível da estrada, que passa frontalmente, pavimentado a lajes de cantaria e alvenaria de granito compactado. Junto à fachada lateral direita possui zona ajardinada, com canteiros recortados e ergue-se um coreto, de planta octogonal e de dois registos, o inferior rebocado e rasgado por porta de verga recta e janela, actualmente adaptado a instalações sanitárias, e o superior pintado de branco e tijolo, acedido por escada desde o adro e por uma outra desde a estrada, com guarda em alvenaria vazada por vãos oblíquos e cobertura facetada sobre pilares. Nas imediações, ergue-se a Casa Azul.

Informações extraídas de:
- www.monumentos.pt;
Outra bibliografia: 
ALMEIDA, Carlos A. Brochado, O sistema defensivo da vila de Melgaço. Dos castelos da reconquista ao sistema abaluartado, Melgaço, 2002; CAPELA, José Viriato, As freguesias do distrito de Viana do Castelo nas Memórias Paroquiais de 1758, Braga, Casa Museu de Monção / Universidade do Minho, 2005.

sexta-feira, 23 de agosto de 2013

Miguel Torga em Castro Laboreiro (1948) - "Sou na verdade uma montanha comprida"


«Castro Laboreiro, 6 de Agosto de 1948

 — Não, não terei a hipocrisia de dizer que seria aqui o meu paraíso, aqui que não há papel, nem tinta, nem cinema, nem livrarias, nem cafés, nem nenhum dos tóxicos de que necessito. O homem põe, mas a vida dispõe. A cidade é como as prostitutas: o seu amor é falso, mas vence o de qualquer mulher honrada. Agora que são estas pedras, estes gados, estas alturas que vivem recalcadas no meu sangue, não há dúvida. (...)

Mal apanho uma aberta, sou como um galgo pelos montes acima. Não posso dizer o que sinto, nem o que procuro. Mas as pedras parecem-me fofas debaixo dos pés. A parte mais íntima de mim encontra-se e expande-se. Citadino e perdido, sou na verdade uma montanha comprimida.»

Miguel Torga, Diários IV

quarta-feira, 21 de agosto de 2013

O ermita de Fiães e as moçoilas



Num cabeço de quase setecentos metros de altitude, um pouco acima de Melgaço, lado a lado com a raia galega, a agrura do lugar, a pobreza da terra e a localização à roda de mil perigos, valeu-lhe desde os fundamentos da nacionalidade, privilégios e benesses.Afonso Henriques, ele mesmo cumulou de mimos essa terra de coutos e, principalmente, o Convento. A sua origem, cuja origem remonta a meados do século IX; de origem beneditina, mais tarde adoptaria a reforma cisterciense, que o manteria até à sua decadência, aí pelos finais anos quinhentos do passado milénio. Do núcleo conventual, hoje, apenas resta o Mosteiro e algumas memórias da sua história.
Encimado sobre essa terra estéril e montuosa, da qual alegavam os monges ermitas, ser terra que não dava aos mais ricos, para seis meses, o Convento em louvor de Santa Maria de Fiães, ao novelo da sua idade, juntou algumas linhas, de uma rubra história com o seu quê de brejeiro, que sempre encontrou alguém que lhe acrescentasse mais um ponto para dela tirar alguma lambedura ou sorriso mais maroto...
Pois então, diz-se que aí por Janeiro (nos primeiros anos do século XVI) o visitador da casa-mãe de Cister, um tal abade francês de nome Saulieu, acompanhado pelo seu acólito, Claude de Bronseval (afinal, o narrador desta pequena estória, das tais que o crivo censório eclesiástico sempre tinha artes de fazer silenciar...), depois de ter visitado o mosteiro do Ermelo, umas léguas mais abaixo, nas margens planas do Lima, dirigiu-se para Fiães. Desviando-se do caminho mais curto, mas mais custoso, pelas vertentes da serra da Peneda, fizeram-se aos caminhos do Arcos de Valdevez e Melgaço. Daqui, lá sobem por uma linheira no monte, cheia de precipícios, que os leva até ao Convento.
Recebidos por D. João de Cós, abade do Convento, por este sabe Saulieu de um motivo de grande escândalo. Vai, lampinho, Saulieu, com o seu secretário e mais o abade João, até Orada, uma capela mesmo no termo de Melgaço, que pertencia aos preceitos do Convento.
E, então, qual foi o motivo desta estugada e santa indignação, e caminhada de Saulieu? Por ali, um eremita do mosteiro, ganhara hábito de se escapar, cerrado abaixo, para abstrusos encontros com moçoilas perdidas. A uma das raparigas, o extremoso abade, até dera uma casa, ali, na Orada. E foi para lá que a comitiva se dirigiu. Em má hora, parece, já que a dita amásia se entregava a altos e inconfessáveis prazeres com mais outras duas mocinhas do sítio. Logo,  Saulieu convoca o juiz de Melgaço. Explica-lhe a ignomínia (que, parece, não era nenhuma novidade para o julgador...) e, de seguida, leva-o ao local da vergonhaça.
Intima, o juiz, as pecadoras a abandonarem a casa; e dá-lhes um prazo de quinze dias. Nem mais. Voltou, assim, Saulieu, para Fiães, de consciência tranquila e certo de ter eliminado aquela pedra de escândalo na virtuosidade da irmandade. Do reinadio abade trataria ele, de caminho, despachando-o para bem longe...

No dia seguinte, sempre acompanhado com o seu fiel assistente, Saulieu toma o caminho de Espanha. Crónica alguma ou mesmo mexerico, conto ou ponto que seja, explica qual foi o desfecho da história. Mas houve sempre quem suspeitasse, que dando Saulieu costas a Fiães, tudo tivesse ficado como dantes e, assim, as três mocinhas por lá tenham continuado a contribuir para adoçar as melgacenses agruras deste vale de lágrimas...


Retirado de: http://coisasdoarco-da-velha.blogspot.pt/

domingo, 18 de agosto de 2013

1ª Festa do Presunto de Castro Laboreiro - 21 de Maio de 1972

Veja o programa da 1ª Festa do Presunto de Castro Laboreiro, realizada no dia 21 de Maio de 1972, domingo que trouxe a esta terra muitos visitantes...




segunda-feira, 12 de agosto de 2013

Vila de Melgaço, 1933 - Torre de Menagem em postal antigo

Postal antigo enviado de Melgaço para Londres em 1933, a partir do Grande Hotel do Peso. Na frente do postal encontramos uma panorâmica parcial da vila de Melgaço na época com a sua Torre de Menagem e as muralhas, ambas num mau estado de conservação. Vemos também parte da vila,especialmente o centro histórico.





sexta-feira, 9 de agosto de 2013

Capela de Nossa Senhora da Encarnação (Chaviães), algumas referências históricas do sec. XVIII e XIX


O dia 23 Abril de 1707 corresponde à data do testamento de um tal João Durães, viúvo, que deixou à Senhora da Encarnação de Gondufe meio almude de vinho e é a primeira referência documental que existe a esta capela. Contudo, o ano de 1708 é a data inscrita na verga do portal que deve corresponder à data da sua construção.
Em 1739, a 18 Julho, o visitador Abreu Soares recomenda aos moradores que fechem o adro da capela, com um muro à roda, com fossos nas entradas, para evitar o acesso a animais imundos e carros, bem como consertar o caminho para o cruzeiro e fazer de novo a cruz deste, a qual se acha quebrada. Recomenda também retalhar o telhado e comprar 4 sanguinhos.
Em 1755, o visitador, tesoureiro-mor da Colegiada de Valença, o Pe António de Vasconcelos de Almeida de Queiróz, diz ter achado a Capela da Encarnação pouco decente e sem que nela se terem cumprido as obras capituladas nas visitações anteriores. Assim, se até ao dia de Nossa Senhora da Natividade (8 Setembro), não estivesse rebocada por dentro, caiada, com forro posto, sanguinhos, véu branco, cálix dourado por dentro e por cima a patena e pronta para se poder fazer a festa, o pároco mandaria fechar a porta, trazer a chave, porque a dava por suspensa, e conduzir a Senhora para a Igreja Matriz. Por lhe constar o zelo e devoção do Pe Manuel Rodrigues Souto e querer incumbir-se da inspecção das obras precisas para a capela, poderá cobrar as esmolas que os moradores do lugar de Gondufe derem e os mais devotos quiserem e aplicá-las para o culto e decência da dita Senhora e capela. Nesta época, refere-se que o pároco elege anualmente um mordomo no dia da festa, a votos dos moradores que contribuam para o ornato da capela e capelão que nela diz missa, o qual devia ser de sã consciência; neste ano elegeu-se Tomé Esteves, do lugar de Gondufe.
Em 1758, a 13 Abril, existe referência à capela pelo Pe António José de Sousa Gama nas Memórias Paroquiais da freguesia, como tendo sido feita pelos moradores do lugar para nela ouvirem missa de alva aos domingos e dias Santos, visto ficarem distantes da Matriz um quarto de légua. Diz ainda que a capela era antiga e não tinha romaria alguma.
Em 1822, a 11 Agosto, o visitador João da Cunha Alves, abade de Santo Estêvão de Alvim, diz que a capela precisava muito de ser caiada de cal, e areia, por dentro e por fora, de um crucifixo para o altar, porque o que tinha estava totalmente indecente. O pároco daria parte à casa do despacho para se proceder contra eles, ou pagar mil réis.

Em 1825, a 28 Junho, o visitador Pe António de Araújo Figueiredo, abade de São Pedro de Valbom, diz que os moradores não têm dado satisfação ao que foi capitulado. Já tem a cal para o reboco de paredes e telhados, mas ainda não fizeram a obra, pelo que incorrem em pena de mil réis. Desta forma, dava o prazo de três meses para a feitura da obra, solicitando também umas sacras para o altar de baixo, sob pena de 2$000 na futura visita.
Trata-se de um capela setecentista de planta longitudinal simples, interiormente pouco iluminada. Possui uma fachada principal terminada em friso e cornija truncada por sineira e rasgada por portal de verga recta encimada por cornija. As fachadas laterais terminam em cornija e são cegas, tal como a posterior que remata em empena.




NOÉ, Paula (2009) - Capela de Nossa Senhora da Encarnação. em www.monumentos.pt

quarta-feira, 7 de agosto de 2013

Miguel Torga escreve em Castro Laboreiro... e teme que a globalização destrua este modo de vida.


 "Castro Laboreiro, 17 de Julho de 1976"

« (…) Teimo, portanto, nestas visitas, mesmo que de progressivo desencanto. Tenho como verdade de fé que o homem há-de acabar por reagir contra a massificação planetária em que vai embarcado. A razão e o instinto hão-de acabar por dizer-lhe que todas as flores artificiais do nosso mundo plástico não valem um lírio dos campos, que todas as químicas laboratoriais não valem a fermentação dum carro de estrume, que todos os apitos imperativos do progresso não valem o som cordial dum chocalho. Nessa hora redentora, que não deve tardar – e, quanto mais tardar, pior -, estes santuários serão redescobertos, reconstruídos e dignificados. De aí que eu sofra mas não desanime a vê-los desmoronar. A minha esperança está nos alicerces.»

Miguel Torga, 
Diário, vol. XII.

segunda-feira, 5 de agosto de 2013

A "Espada do Norte", semanário melgacense de 1892



A "Espada do Norte" é um semanário do nosso concelho que foi publicado durante o ano de 1892 durante 52 semanas. O seu editor era J. António Baleixo e a sua sede era situada nos números 79 e 81 da Rua da Calçada na vila de Melgaço. Foi o seguimento de uma outra publicação com o nome "Melgacense".
Este é o cabeçalho do seu último número (nº 52) de 29 de Dezembro de 1892. Neste editorial, o administrador tenta explicar aos seus assinantes as razões da suspensão da sua publicação. Além disso, informa os seus assinantes que no lugar da "Espada do Norte", passa-se a publicar um outro semanário com o nome "O Melgacense" a partir de Janeiro de 1893


Dê uma vista de olhos nas quatro páginas desta publicação 
(CLIQUE NAS IMAGENS PARA AMPLIAR"





sábado, 3 de agosto de 2013

Postal Antigo - Praça da República, Melgaço (1916)

Postal redigido em Remoães (Melgaço) e enviado da estação de correios do Peso em 31 de Outubro de 1916. Na frente do postal vemos o aspeto da Praça da República nesta época. Reparem que no meio do largo vemos um par de candeeiros a petróleo que asseguravam a iluminação noturna da praça. A iluminação possível...   



quinta-feira, 1 de agosto de 2013

A história de um melgacense no cativeiro da guerra na Guiné Conakry (1963-1970)


António Lourenço de Sousa Lobato, nascido em 11 de Março de 1938 na aldeia  de Sante (freguesia de Paderne, no concelho de Melgaço). Em 26 de Julho de 1961, sendo 1º Sargento piloto-aviador da Força Aérea Portuguesa, chega à Guiné e fica colocado no AB2-Bissalanca. Na manhã de 22 de Maio de 1963, quando, em missão operacional sobre a região litoral centro-oeste da Guiné, após forçada aterragem no mato, é capturado pelo PAIGC e mantido cativo na República da Guiné-Conackry, vindo a ser, em 22 Novembro de 1970, resgatado, com outros 25 portugueses, no decurso da Operação Mar Verde, após o que regressa a Portugal.

Esse período em que foi mantido cativo foi contado em livro. Com o subtítulo "O mais longo cativeiro da guerra", este impressionante documento humano relata os longos anos em que o piloto aviador António de Sousa Lobato esteve prisioneiro na Guiné Conakry, após ser capturado pelas forças do PAIGC (Partido Africano para a Independência da Guiné e Cabo Verde), durante a Guerra Colonial, que opôs Portugal a grupos que lutam pela independência das antigas colónias de África.  O livro refere o drama físico e psicológico vivido por um jovem militar português, que durante mais de sete anos foi capaz de suportar um isolamento extremo num cubículo de dimensões exíguas, em condições sub-humanas, mas sem perder a esperança de alcançar de novo a liberdade. Aliás, por três vezes se evadiu, tendo a última escapadela durado ainda uma curta semana, mas tão longa para quem durante dias e meses a fio permanecia confinado numa fortaleza sombria e claustrofóbica. Mas o aspecto talvez mais saliente neste testemunho heróico tem a ver com a reflexão interior que o protagonista deste drama nos dá a conhecer, durante as longas horas que era obrigado a permanecer quase estático num espaço acanhado de quatro por dois passos, na medida do próprio autor. Sem a vastidão ilimitada do céu por onde se habituara a voar, António de Sousa Lobato é forçado, para sobreviver psiquicamente a essa provação extrema, a explorar uma outra dimensão ainda ignota: a do seu próprio ser interior do qual vai aprender a conhecer os limites ou, melhor ainda, a sua infinita transcendência. Recusando-se a desistir da vida e escudado na promessa que fez à sua jovem esposa, nos oito meses que ambos passaram na Guiné " "Se algum dia desaparecer não te preocupes, voltarei sempre." " o tenente Lobato estabelece consigo próprio um diálogo interior que lhe conserva a lucidez e o vai ajudar a passar os dias sufocantes e sempre solitários. Ao mergulhar nesta outra dimensão, comum afinal a todos nós, o prisioneiro revela não apenas a força inabalável do seu carácter, moldado também na dura disciplina militar, mas dá-nos sobretudo uma lição de sobrevivência e da admirável capacidade que o Ser Humano tem de se adaptar às condições mais inóspitas e adversas. Deste modo, e como ele próprio afirma, foi esta vitória sobre si próprio que o salvou e simultaneamente enriqueceu como pessoa, fazendo jus às palavras milenares de Buda, que a proclamou como "a maior de todas as vitórias".O livro baseia-se não só nas recordações do seu autor, mas também nos apontamentos que ele escreveu durante o cativeiro, quando outro preso importante de uma cela contígua lhe forneceu papel e lápis, o que permitiu inclusive o envio clandestino de algumas cartas para a família, e até informações sobre a prisão e várias outras de carácter militar. Parte destes documentos, incluindo desenhos da topografia local e um esboço do Forte de Kindia, encontram-se reproduzidos nas 26 páginas do anexo final do livro. E é só em Novembro de 1970, que a operação secreta "Mar Verde", durante muito tempo não admitida oficialmente pelo governo português, põe fim ao longo cativeiro de Lobato e outros jovens militares portugueses, entretanto capturados pelos combatentes guineenses. O regresso à Pátria e à família é apenas ensombrado por essa obrigação de não revelar o "modus operandi" da libertação, a qual é apresentada como uma fuga bem sucedida, já que o segredo de Estado assim o determina. Em suma, trata-se de um relato empolgante pela sua veracidade e que nos revela a faceta oculta da nossa própria humanidade, quando confrontados com situações limite em que apenas nos podemos valer de nós mesmos e de mais ninguém. Uns desistem e abandonam-se ao desespero e à negação, mas outros sempre acalentam o eterno sonho da liberdade recuperada, se não nos espaços exteriores, pelo menos na ampla vastidão do querer indómito de uma alma que não se verga a nenhuma adversidade, porque em si a Vida sabe!

Extraído de: http://ultramar.terraweb.biz/06livros_AntonioLobato.htm