Portocarreiro (Fiães), próximo da localização da antiga aldeia de S. João
A 17 de Novembro de 1841, depois de dois meses de intenso
mau tempo, com muita chuva, um terrível desmoronamento de terras destroi em
momentos a povoação, morrendo soterrados muitos dos habitantes. Os prejuízos
materiais revelam-se catastróficos para a pequena comunidade. Logo no dia
seguinte, o regedor Manuel do Rego lança um apelo ao Administrador do Concelho,
depois de relatar sumariamente o ocorrido ”Participo
a vossa excelência que ontem pela uma hora da tarde rebentou uma parte do monte
denominado Anteiro e veio ao lugar de S. João/Porto Carreiro e arrastou e levou
9 casas com muita gente e gado e foi uma desgraça muito grande. Ora é preciso
que vossa excelência dê providências mandando vir gente do concelho para ajudar
a desenterrar a gente e gados e frutos e aparatos que ficaram debaixo dos
rochedos.”
A ajuda chegou principalmente dos lugares vizinhos, onde
se recolheram os sobreviventes e donde partiram os grupos de homens a
desenterrar os cadáveres e dar-lhes sepultura junto ao Mosteiro de Fiães. A
grande torrente de pedras e lama atingira também Porto Carreiro, chegando mesmo
ao leito do Trancoso. Na tradição oral, ao chegar à Igreja de Nossa Senhora da
Vista, a torrente dividira-se em duas, salvando-se milagrosamente o templo, que
ainda hoje se encontra soterrado. As consequências foram contudo destruidoras
nos campos, que levarão muitos anos a limpar e reconstruir.
Um importante núcleo existia no lugar de S. João, muito
próximo de Porto Carreiro, num lugar a meia vertente onde convergiam vários
pequenos ribeiros mas todos com algum caudal. S. João cresceu como um tentáculo
de Porto Carreiro, para cima ao longo da vertente, mas encaixado na apertada
garganta do pequeno afluente do Trancoso. Uma das suas riquezas era essa força
motriz que alimentava as suas azenhas: cinco num aglomerado de apenas cerca de
duas dezenas de casas. Mas, uma das fortes razões da sua existência explicará o
seu desaparecimento.
Quase um mês depois da catástrofe, o pároco fazia um
relatório ao Administrador do Concelho, inventariando o desastre de S. João: 15
casas “com todos os seus aparatos”, 6 pontes, 5 moinhos, 16 cabeças de gado,
200 de gado miúdo, 10 porcos, 30 “carros de pão” (cereal), canstros de milho e “terras
de lavradio que nuca mais tornam a dar pão, que tudo levou e desapareceu, foram
louvados em 16.000 cruzados”. O total geral é avaliado em 45.000 cruzados. O
número de mortos elevou-se a 14 pessoas, afetando 6 famílias, uma das quais perdeu
6 membros.
Organizava-se entretanto a ajuda às famílias atingidas.
Primeiro é o Administrador Geral do Distrito de Viana do Castelo que propõe uma
subscrição nos diferentes concelhos da sua jurisdição, depois a notícia chegou à
capital. Em Lisboa, a Revolução de Setembro parece ter sido o primeiro
periódico a divulgar o acontecimento, quase um mês depois, mas as providências
por parte do Governo tardarão muito mais. Só em Março do ano seguinte, a rainha
D. Maria II assina um documento encarregando as comissões de recolherem
donativos a favor das vítimas de S. João. Em Dezembro de 1842, os donativos
chegavam ainda a Melgaço.
Extraído de:
BATEIRA, Carlos; SOARES, Laura & GARCIA, João Carlos (1997) - O terramoto de S. João (Melgaço) em 1841: um percurso pela geomorfologia histórica. Instituto de Geografia. FLUP. Porto.
O site acer-pt.org diz: "O fenómeno voltou a repetir-se no inverno de 1996/1997 (cortando a estrada e destruindo um terraço agrícola) e em 2000/2001, “um dos mais pluviosos do séc. XX, o fluxo de detritos foi reactivado tendo destruído a capela construída no ano de 1988, em homenagem às vítimas de 1841” (idem, ibidem)."
ResponderEliminarPortoCarreiro
ResponderEliminarMoito. Grande conto é comentàrio.
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