Parti para ali no dia 18 de Junho do corrente anno
(1894). Acompanhou-me por alguns dias o nosso amigo, o Sr. Augusto
Nobre, redactor d'esta revista, que desejava explorar a fauna do rio Minho e seus
afluentes.
S. Gregório é uma pequena povoação que fica situada na fronteira
e dista de Melgaço oito kilometros. Outrora esta povoação teve um commercio importante, mas depois
decahiu muito; actualmente porém tende outra vez a animar-se. A estrada que a liga
com Melgaço tem já 7 kilometros concluídos, falta-lhe o oitavo e último, que
anda em construcção.
S. Gregório não é sede de freguezia, a igreja matriz está
n'uma pequena povoação a cerca de um kilometro de distancia. Este facto, de povoações
importantes não serem sedes de freguezia, dá-se em vários pontos do paiz, como por
exemplo na Mealhada e no Cargal do Sal que são cabeças de concelho e têm a matriz
em aldeias próximas. A parte alta de S. Gregório está a cerca de 250 metros acima
do nível do mar e o rio Minho fica-lhe ao norte à distancia aproximada de 1,500
metros.
Do nascente, banha a parte bnixa d'esta povoação o pequeno
rio ou ribeira de Trancoso, affluente do Minho, que limita Portugal da Galiza e
tem a sua origem próxima a Alcobaça, Há uma pequena ponte internacional sobre a
ribeira de Trancoso, que liga S. Gregório com uma pequena aldeia hespanhola e onde
existe um posto de fiscalização aduaneira.
A estação do caminho de ferro da Galliza, marginal ao Minho
e chamada Frieira, está approximadamente a 1,800 metros de distancia de S.
Gregório, porém, o caminho que conduz alli é mau e tem de se atravessar o Minho
em barco.
Dos lados sul e poente de S. Gregório está a serra que tem
por ponto culminante o castello de Castro Laboreiro o qual fica a cerca de 1,250
metros de altitude. Para se ir a esta povoação passa-se pela aldeia denominada
Alcobaça, situada na fronteira e que fica perto de 2 horas e meia de caminho de
S. Gregório.
A poente de Alcobaça há um monte que tem a mesma altitude
de Castro Laboreiro. D'esta parte da serra já me occupei n'uma noticia que dei
sobre a serra do Soajo no Jornal de Horticultura Pratica, do Porto, no numero de
Novembro de 1890.
O solo em volta de S. Gregório ó todo de origem granítica.
Esta povoação é abundante em água e de boa qualidade. S. Gregório é saudável e o
seu clima é temperado na estação invernosa e quente durante a calmosa. Para exemplo
diremos que, no dia 26 de Junho ás 2 horas da tarde estando a atmosphera bastante
carregada de electricidade, dentro de casa marcava o thermometro 30° C. O quarto
onde fiz esta observação thermometrica tinha duas janellas voltadas para o
norte e estavam com as vidraças abertas. Na mesma occasião fiz a leitura do meu
aneróide o qual marcava 738 mm.
A cultura principal de S. Gregório e povoações limítrofes
é a vinha, milho, batata, algum centeio e os prados. A videira é toda cultivada
em parreiras ou ramadas, mas estabelecidas a pouca distancia do solo, isto é, em
média a cerca de 1 metro e meio d'altura.
O vinho é magnifico e achamo-lo muito mais agradável ao
paladar do que o affamado de Monsão. Árvores fructíferas observamos a cerejeira,
em grande quantidade, pereiras, macieiras, ameixoeiras, pessegueiros, laranjeiras,
etc. N'outro tempo cultivava-se ali a oliveira, mas como a producão era muito incerta
os lavradores foram-nas arrancando, de sorte que hoje esta árvore é ali rara. Talvez
valesse a pena introduzir as variedades hespanholas de maturação precoce e próprias
dos climas septentrionaes do paiz.
S. Gregório, em 1911
Enquanto árvores florestaes encontram-se : o carvalho,
castanheiro, pinheiro, vidoeiro, amieiro e alguns salgueiros.
Próximo a uma azenha que fica junto à ribeira de Trancoso
e não muito distante de S. Gregório, vimos um lindo exemplar de vidoeiro com o
tronco muito direito. Teria uns 20 metros de altura por 60 centímetros de
diâmetro na base. As essências florestaes abundam principalmente na parte inferior
da serra, próximo aos ribeiros e corgas. A parte elevada tem pouco ou nenhum arvoredo
e só matto rasteiro, e este mesmo não apparece em todas as localidades.
A flora em volta, de S. Gregório e bastante rica em espécies,
mas não apresenta grandes novidades. É, porém, possível que na Primavera se encontrem
nos montes espécies interessantes.
Na época em que ali estivemos, as plantas dos montes já estavam
seccas ou tinham já florescido. Só na parte baixa da serra e nos altos, nos pontos
onde havia água, é que se encontravam plantas em flor. Ainda assim fizemos uma colheita
muito sofrível. Enquanto à fauna, pouco pudemos observar, pois o nosso fim era
fazer uma exploração botânica e pouco tempo nos restava para outros estudos.
Ainda assim pudemos averiguar o seguinte : habitam ali alguns
mamíferos como a lebre, coelho, raposa, texugo, lontra e, nos pontos mais distantes,
o lobo, javali e corso.
De entre as aves que vi citarei: perdiz, codorniz, cuco, poupa, corvo,
pega, gaio, pardal, tentilhão, pintassilgo, alvéola, papa-figo, melro, pisco, chapim,
andorinha das chaminés, andorinhão, etc.
No rio Minho encontra-se a truta, boga, escalo, e a enguia,
camarões e mexilhões. Na época própria pescam-se salmões, truta marina, sáveis e
lampreias. Em Melgaço vimos a vender no mercado barbos que diziam ser pescados n'este
rio. Na ribeira de Trancoso só se encontram a truta e a enguia.
O Sr. Augusto Nobre n'um passeio que fez à serra, capturou,
ao atravessar um caminho, uma víbora que, quando ma mostrou, vi logo que me achava
em presença de uma espécie que não era uma espécie comum.
Depois de eu regressar a Coimbra este nosso amigo escreveu-nos
dizendo que já a tinha determinado e era a Vipera berus L., e que a descreveria
no presente número d'esta revista. Que saibamos, esta víbora até hoje só tinha sido
encontrada por Steindachner nas vizinhanças do Porto.
Algumas pessoas, tanto em S. Gregório como em Melgaço, afiançaram-nos
que na serra, e principalmente entre Alcobaça e Castro Laboreiro, habita uma lacertidea
a que lá dão o nome de Escorpião e da qual diziam ser um pequeno lagarto quasi com
o aspecto de uma lagartixa, pouco mais ou menos de um palmo de comprimento. Este
animal, segundo me disseram, tem a particularidade de apresentar duas membranas,
dos lados do corpo, que pôde desenrolar ou estender para saltar como que voando
ao mesmo tempo. Acrescentavam que este réptil aparece com mais frequência no tempo
das ceifas dos fenos, saltando ou voando diante das gadanhas e escondendo-se durante
o inverno nas medas das palhas e fenos. Diziam ainda que os caçadores temem este
animal, porque mordendo na cabeça dos cães, produz-se uma grande inchaço,
resultando muitas vezes a morte.
Talvez aqui haja confusão e seja antes a mordedura de uma
espécie de víbora (Vipera berus L.), que cause isto, e não a d'aquelle animal,
pois também ouvi dar o nome de escorpião a esta víbora. Não temos elementos bastantes
para conjecturar com segurança que espécie de animalejo possa este ser, ainda não
arquivado, que saibamos, em nenhum dos museus públicos do país.
Extraído de : MOLLER, Adolfo Frederico (1894) - Excursão à serra de S. Gregório. in: Annaes de Sciensias Naturaes, Volume Primeiro, publicado por Augusto Nobre.
Extraído de : MOLLER, Adolfo Frederico (1894) - Excursão à serra de S. Gregório. in: Annaes de Sciensias Naturaes, Volume Primeiro, publicado por Augusto Nobre.
Sempre com indformação importante do nosso Melgaço .de história de Melgaço.
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