Foi há cerca de 100 anos que os
primeiros soldados do contingente que Portugal enviou para combater em França
na I Guerra Mundial chegaram à Flandres. Com base nos dados de que disponho, de
Melgaço, partiram para a guerra 69 homens, oriundos das diversas freguesias.Estes
homens foram autenticamente “roubados” às suas vidas e obrigados a ir para uma
guerra para a qual não estavam preparados. Paderne, com 13 homens, Penso, com
11 homens e Vila, 10 homens são as freguesias melgacenses que mais contribuiram
em termos de número de efetivos. Estes homens da nossa terra, feitos soldados, tinham
todos à data do embarque, idades entre 22 e 27 anos completos (nascidos entre
1891 e 1895).
Assim, entre Janeiro e Novembro
de 1917, partiram estes homens do porto de Alcântara, rumo ao porto de Brest
(França) numa viagem de navio de vários dias. Daí seguiram de comboio até à zona
sul da Flandres francesa perto de Armentières, nos vales dos rios Lys e Aire.
Depois de uma curta estadia em
Brest, porto de desembarque das tropas portuguesas, seguia-se o transporte, de
comboio, até à região de “Aire”, zona destinada às tropas do CEP.
E foi num clima
agreste, de neve, chuva e frio, língua e costumes tão diferentes dos seus, que
estes homens da nossa terra e as tropas portuguesas tiveram de suportar mais de
um mês de treino complementar, junto do exército britânico, para se poderem
“familiarizar” com as armas inglesas com que iam combater e com as novas formas
da guerra que iam conhecer de perto.
Na guerra, dos 69 homens de
Melgaço que partiram, 10 morreram caídos em combate ou devido a outras causas
como doenças. O primeiro melgacense a morrer em combate foi o soldado António
Alberto Dias, natural do lugar da Verdelha (Paderne) que faleceu a 9 de Outubro
de 1917 na Flandres (França).
Quatro dos caídos em combate,
faleceram durante a Batalha de La Lys (9 de Abril de 1918). São eles os
soldados José Cerqueira Afonso, de Paços (Melgaço); José
Narciso Pinto, de Chaviães; João José Pires, da freguesia de
Paços (Melgaço), António José da Cunha, natural da freguesia da Santa
Maria da Porta (Vila – Melgaço). O último pertencia ao 6.º Grupo
de Baterias de Metralhadoras e os três primeiros eram soldados que pertenciam à 4ª Brigada de
Infantaria do CEP, Regimento de Infantaria n.º 3 (Viana do Castelo). Esta era conhecida como a Brigada do Minho, a que pertenciam a maioria dos soldados melgacenses, e já tinha
conquistado uma reputação de bravura na frente de batalha muito antes de lhe
ser confiada, em Fevereiro de 1918, a defesa do sector de Fauquissart, em
Laventie, na Flandres francesa, perto da fronteira com a Bélgica, onde ainda se
encontrava nesse fatídico dia 9 de Abril de 1918, quando foi dizimada pelos
alemães na dita batalha de La Lys. Faz amanhã, 9 de Abril, 99 anos...
MELGACENSES MORTOS NA BATALHA DE LA LYS (LEVANTIE, FLANDRES FRANCESA)
- João José Pires, soldado da 2.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 28 de Abril de 1893 no Outeiro, lugar da freguesia de Santa Maria de Paços, filho de José Joaquim Pires e de Alexandrina Pires; solteiro e morador em Paços; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 15 de Abril de 1917, onde pertenceu à Brigada do Minho; falecido em combate na Batalha de La Lys a 9 de Abril de 1918. Encontra-se sepultado no Cemitério de Richebourg l`Avoué (França), Talhão C, Fila 10, Coval 5.
Sepultura do soldado João José Pires
(Cemitério Militar de Cemitério de Richebourg l`Avoué, França)
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- José Narciso
Pinto, soldado da 4.ª Companhia do Regimento de Infantaria
n.º 3; nascido a 3 de Março de 1893 na Igreja, lugar da
freguesia de Santa Maria Madalena
de Chaviães, filho de Manuel António Pinto e de Cândida Maria
Alves; casado e morador em Chaviães; embarcou para França integrado no
Corpo Expedicionário Português a 22 de Abril de 1917, onde pertenceu à
Brigada do Minho. Falecido em combate na Batalha de La Lys a 9 de
Abril de 1918. Encontra-se sepultado no Cemitério de Richebourg l`Avoué
(França), Talhão D, Fila 3, Coval 24.
Sepultura do soldado José Narciso Pinto
(Cemitério Militar de Cemitério de Richebourg l`Avoué, França)
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- António José Cardoso Ferreira Pinto da Cunha, segundo-sargento do Regimento de Obuses de Campanha; nascido a 28 de Julho de 1892 na Rua Direita, vila e freguesia Santa Maria da Porta de Melgaço, filho de António José Ferreira Pinto da Cunha e de Carlota Amália Cardoso; solteiro e morador na vila de Arcos de Valdevez; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 20 de Agosto de 1917, onde pertenceu ao 6.º Grupo de Baterias de Metralhadoras. Participou na Batalha de La Lys. Inicialmente dada com desaparecido em combate. Mais tarde considerado morto em combate na dita batalha a 9 de Abril de 1918. Desconhece-se o paradeiro dos seus restos mortais.
Nesta investigação, fui
descobrir uma carta que este Segundo Sargento Pinto da Cunha, escrita algures na primeira metade de 1917, à data estudante
no liceu de Guimarães, escreveu a uma pessoa influente para que esta intercedesse
junto do ministro da Guerra, Bernardino Machado, no sentido de obter dispensa
do curso de sargentos até Julho de 1917, para poder frequentar o liceu e fazer
exame do então 5º ano. Argumentava que já no ano anterior não tinha podido
terminar este nível dos estudo por ter sido chamado ao quartel. Desconheço a resposta a esta missiva.
Carta de António José Cardoso Ferreira Pinto da Cunha |
- José Cerqueira Afonso, soldado da 4.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 14 de Março de 1892 nas Fontes, lugar da freguesia de São Salvador de Paderne, filho de Inácio José Afonso e de Maria Cerqueira; casado e morador em Paderne; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 22 de Abril de 1917, onde pertenceu à Brigada do Minho; falecido em combate na Batalha de La Lys a 9 de Abril de 1918.
Sepultura do soldado José Cerqueira Afonso
(Cemitério Militar de Cemitério de Richebourg l`Avoué, França)
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Esta batalha foi um dos maiores
desastres de toda a História Militar portuguesa. A mesma é contada por um
soldado português que nela esteve envolvido numa carta enviada à família. Na
mesma, datada de 11 de Julho de 1918, o soldado tentou reconstituir, em breves
palavras, os acontecimentos daquela noite: “Às quatro horas da manhã do dia
9 de Abril de 1918 rompe um enorme bombardeamento por parte do inimigo, coisa
essa que nós, à primeira vista, não estranhámos, visto que já estávamos
habituados a tudo isso, mas o prazo desse bombardeamento foi-se prolongando e
as horas foram-se passando, e já depois de o inimigo ter feito grandes
tentativas para avançar para as nossas trincheiras e sempre repelido pelo nosso
fogo, continua o grande bombardeamento com uma tal violência que ao fim de
algumas horas o chão estava todo voltado com o debaixo para cima, um completo
horror, é mesmo inexplicável. Milhares e milhares de infelizes portugueses tinham
desaparecido, uns despedaçados pelos ares, outros tinham ficado soterrados para
jamais serem vistos”.
De manhã, chegara a hora de
contabilizar as baixas: 398 mortos (369 praças e 29 oficiais) e uma esmagadora
maioria de prisioneiros (6585, dos quais 6315 eram praças e 270 oficiais).
Deste total de prisioneiros de guerra, nove soldados eram melgacenses. Inicialmente, estes homens foram dados como “desaparecidos em combate” e esse facto foi comunicado às famílias. Vários meses mais tarde, após o fim da guerra, em Novembro de 1918, a Comissão dos Prisioneiros de Guerra, comunicou que estes homens se encontravam em campos de prisioneiros na Alemanha, pondo fim a meses de sofrimento dos soldados e das suas famílias que os julgavam mortos. Chegaram-se a fazer funerais sem corpo por este país fora.
Fontes consultadas:
Deste total de prisioneiros de guerra, nove soldados eram melgacenses. Inicialmente, estes homens foram dados como “desaparecidos em combate” e esse facto foi comunicado às famílias. Vários meses mais tarde, após o fim da guerra, em Novembro de 1918, a Comissão dos Prisioneiros de Guerra, comunicou que estes homens se encontravam em campos de prisioneiros na Alemanha, pondo fim a meses de sofrimento dos soldados e das suas famílias que os julgavam mortos. Chegaram-se a fazer funerais sem corpo por este país fora.
Quem foram os soldados melgacenses desaparecidos em combate? De que freguesias eram? Em que campos de prisioneiros estiveram? Como regressaram a Portugal? E muitas outras respostas...
Conto-vos na próxima publicação!
Fontes consultadas:
- Arquivo Histórico do Exército;
- OLIVEIRA, Maria José (2011) – “Deste triste viver"
– Memórias dos prisioneiros de guerra portugueses na primeira Guerra Mundial. Faculdade
de Ciências Sociais e Humanas, Unoversidae Nova de Lisboa, Lisboa;
- MARQUES, Isabel Pestana, op. cit., p. 389;
AFONSO, Aniceto, 2008, Grande Guerra. Angola, Moçambique e Flandres.
1914/1918, Lisboa, Quidnovi, Col. Guerras e Campanhas Militares, p. 106;
- TEIXEIRA, Nuno Severiano, 1992, “A Fome e a Saudade. Os
Prisioneiros Portugueses na Grande Guerra”, in Penélope. Fazer e Desfazer a
História, Lisboa, nº 8, p. 102.
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