quinta-feira, 6 de setembro de 2012

Lendas de Melgaço II: A história de Gregório Vaz de Roussas



"Pelos annos de 1660, durante a guerra da Restauração, hindo Gregorio Vaz, natural d’esta freguezia de Roussas, e soldado do exercito portuguez, com mais dois camaradas, reconhecer os movimentos do exercito castelhano, que se achava acampado nos Arcos (Galliza), cabiram todos trez em poder do inimigo.
Gregorio Vaz, invocou o patrocinio de Nossa Senhora da Graça, e prometteu-lhe, se o livrasse da morte, de ser eremitão da sua capella, e de a servir toda a vida.
Filippe IV, mandava enforcar todos os prisioneiros que cahiam nas garras dos seus soldados, e os nossos trez portuguezes tiveram a mesma sorte.
Gregorio foi o ultimo a ser enforcado, mas a corda partiu-se e o desgraçado cahiu no chão, sem sentidos, e com a garganta horrivelmente ferida.
Foi julgado morto, e, como os seus camaradas, foi abandonado aos pés da forca; mas, quando no dia seguinte vieram os frades franciscanos para lhes darem sepultura, acharam Gregorio sentado, encostado a uma mão, e tendo na outra umas contas.
Os frades tambem eram castelhanos, e portanto, tão inimigos dos portuguezes como as tropas do Diabo do Meio Dia, e, em vez de terem caridade com tão grande infeliz, o entregaram ao carrasco, que lhe deu duas lançadas, que o atravessaram do peito ás costas.
Os frades o levaram a enterrar, mas, pelo caminho, viram que elle dava ainda signaes de vida. D’esta vez, emfim, attribuiram o caso a milagre, e o curaram.
Foi depois remettido para Corunha (então capital da Galliza), e mettido em um carcere. Filippe IV teve noticia d’este facto, e attribuindo-o tambem a milagre, fez o milagre (ainda maior) de o mandar soltar, e deixar vir em paz para Portugal. Gregorio cumpriu o voto e foi viver para junto da ermida da Senhora, como seu eremitão, mudando o nome para Gregorio da Graça, e alli falleceu de avançada edade, pois ainda vivia em 1712, quando frei Agostinho de Santa Maria publicou o 4.° volume do seu Santuario Mariano. Ainda então conservava as cicatrizes das feridas.
Isto consta de documentos que existem na secretaria das Mercês, e de um alvará, assignado por D. Pedro II, e pelo qual o rei mandou dar a Gregorio da Graça um tostão por dia, para seu sustento."


In: PINHO LEAL, Augusto Soares d'Azevedo Barbosa de Portugal Antigo e Moderno Lisboa, Livraria Editora Tavares Cardoso & Irmão, 2006 [1873] , p.Tomo VIII, p. 218

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