Na
segunda metade do século XIX, Melgaço conheceu todo o esplendor da
arte de trabalhar a pedra pelo maior mestre do ofício do seu tempo.
Refiro-me a Manuel José Gomes, mais conhecido na época como o
“Mestre do Regueiro”.
Nasceu
em Julho de 1825 no dito lugar da freguesia de S. Paio, deste
concelho de Melgaço, filho de Manuel José Gomes e de Anna Joaquina
de Freitas, lavradores, naturais e residentes no mesmo lugar do
Regueiro.
No
livro “Padre Júlio Vaz apresenta Mário”, o autor elogia os
dotes artísticos de Manuel José Gomes nesta palavras: “Em
terras de Melgaço, é de crer que nenhum outro artista tenha deixado
de si tantas e tão belas memórias escritas no duro granito da
região como as que deixou Manuel José Gomes vulgo Mestre Regueiro,
canteiro distinto que de toscas e rudes pedras obrou maravilhas. Os
seus trabalhos quer pela solidez e perfeição de acabamento, quer
pela pureza e harmonia de linhas denotam ter sido ele não só um
artista consumado, como também um homem consciencioso e de vistas
largas. Não era ceguinho… e no Alto Minho, apenas o deve ter
igualado, igualado, mas não excedido, Mestre Francisco Luís
Barreiros, de Ponte do Mouro, autor do célebre «Pedro Macau» deste
lugar, do sumptuoso e formosíssimo escadório da Santuário da
Peneda e de suas respectivas estátuas e de muitos outros não menos
apreciados lavores.
Associado
com seu irmão António bom artista também, mas muito longe de
chegar às solas daquele Mestre Regueiro, deixou no concelho uma obra
vastíssima, entre ela os prédios do sr. dr. Pedro Augusto dos
Santos Gomes, na Praça da República, do sr. dr. António Cândido
Esteves, na Rua Nova de Melo (1873); o que foi do médico Francisco
Luís Rodrigues Passos, na Vinha das Serenadas (1885), e o que foi de
Joaquim Luís Esteves, na Rua da Calçada; o edifício do Hospital
(iniciado em 1875) [e concluído em 1892]; o [casarão onde mais
tarde iria funcionar] “Asilo Pereira de Sousa”, em Eiró; o
frontal, ou melhor a escadaria, da igreja de Prado (1884) e pouco
depois a de Remoães; o artístico e aprimorado cruzeiro do Regueiro
(1859) e a capelinha da Senhora dos Aflitos no mesmo lugar (1866); o
cruzeiro de Fiães (1875), a pia baptismal e uma imagem em pedra da
igreja de S. Paio, cuja perfectibilidade e acabamento dão a
impressão de terem sido feitas em mármore, etc., etc.
Porém,
o seu maior título de glória, é o falado cruzeiro do Regueiro,
onde o artista atingiu, por assim dizer, o sublime. O seu maior
título de glória é este, é; mas… ainda assim… tenho para mim
que há outra obra à sua autoria atribuída que, se não iguala
aquela, pouco lhe ficará a dever. E esta é, nem mais nem menos, do
que o arrebatador e elegantíssimo fontanário da Casa do Reguengo
(1875) uma joia… uma maravilhazinha em pedra lavrada, desconhecida
ou quase da maioria dos Melgacenses.”
Cruzeiro, junto à capela de Nossa Senhora dos Aflitos (S. Paio, Melgaço) |
De
facto, o cruzeiro junto da capelinha de Nossa Senhora dos Aflitos, no
lugar onde nasceu, é a obra
maior deste pedreiro e merece uma demorada contemplação. Foi
construído em granito, tal
como todas as restantes obras mencionadas,
e constituído por uma base rectangular de três degraus na qual
assenta um plinto paralelipipédico que sustém a coluna de secção
circular, com o terço inferior do fuste canelado sendo a parte
restante lisa. Sobre este apresenta-se um capitel compósito onde se
insere a cruz de braços cilíndricos estriados. Diversas esculturas
ornamentam o cruzeiro: sobre o capitel dois querubins suportam coroa
encimada por ave; na parte superior do fuste e logo abaixo do capitel
encontra-se uma imagem da Virgem vestida de manto e uma pequena
estatueta sobre mísula. Todo este trabalho escultórico é de
qualidade pela minúcia e perfeição dos lavrados.
Na
enumeração das obras do Mestre do Regueiro, o Padre Júlio Vaz,
certamente por esquecimento, não citou outra obra admirável de
Manuel José Gomes que são as Almas de S. Jerónimo em Parada do
Monte, neste concelho de Melgaço.
Almas de S. Jerónimo (Parada do Monte, Melgaço) |
Manuel
José Gomes, o Mestre do Regueiro, nunca casou nem teve filhos.
Faleceu no lugar do
Regueiro, onde
nasceu e sempre viveu em de Agosto de 1901, com 76 anos de idade. Foi
sepultado no adro da igreja de S. Paio no dia 5 do mesmo mês e ano.
Ficou a sua herança que chegou até nós.
Informações extraídas de:
- VAZ, Júlio (1996) - Padre Júlio Vaz apresenta Mário. Edição de Autor.