sexta-feira, 22 de fevereiro de 2019

O legado de Manuel José Gomes (S. Paio, Melgaço, 1825-1901): o mais famoso pedreiro do seu tempo




Na segunda metade do século XIX, Melgaço conheceu todo o esplendor da arte de trabalhar a pedra pelo maior mestre do ofício do seu tempo. Refiro-me a Manuel José Gomes, mais conhecido na época como o “Mestre do Regueiro”.
Nasceu em Julho de 1825 no dito lugar da freguesia de S. Paio, deste concelho de Melgaço, filho de Manuel José Gomes e de Anna Joaquina de Freitas, lavradores, naturais e residentes no mesmo lugar do Regueiro.
No livro “Padre Júlio Vaz apresenta Mário”, o autor elogia os dotes artísticos de Manuel José Gomes nesta palavras: Em terras de Melgaço, é de crer que nenhum outro artista tenha deixado de si tantas e tão belas memórias escritas no duro granito da região como as que deixou Manuel José Gomes vulgo Mestre Regueiro, canteiro distinto que de toscas e rudes pedras obrou maravilhas. Os seus trabalhos quer pela solidez e perfeição de acabamento, quer pela pureza e harmonia de linhas denotam ter sido ele não só um artista consumado, como também um homem consciencioso e de vistas largas. Não era ceguinho… e no Alto Minho, apenas o deve ter igualado, igualado, mas não excedido, Mestre Francisco Luís Barreiros, de Ponte do Mouro, autor do célebre «Pedro Macau» deste lugar, do sumptuoso e formosíssimo escadório da Santuário da Peneda e de suas respectivas estátuas e de muitos outros não menos apreciados lavores.
Associado com seu irmão António bom artista também, mas muito longe de chegar às solas daquele Mestre Regueiro, deixou no concelho uma obra vastíssima, entre ela os prédios do sr. dr. Pedro Augusto dos Santos Gomes, na Praça da República, do sr. dr. António Cândido Esteves, na Rua Nova de Melo (1873); o que foi do médico Francisco Luís Rodrigues Passos, na Vinha das Serenadas (1885), e o que foi de Joaquim Luís Esteves, na Rua da Calçada; o edifício do Hospital (iniciado em 1875) [e concluído em 1892]; o [casarão onde mais tarde iria funcionar] “Asilo Pereira de Sousa”, em Eiró; o frontal, ou melhor a escadaria, da igreja de Prado (1884) e pouco depois a de Remoães; o artístico e aprimorado cruzeiro do Regueiro (1859) e a capelinha da Senhora dos Aflitos no mesmo lugar (1866); o cruzeiro de Fiães (1875), a pia baptismal e uma imagem em pedra da igreja de S. Paio, cuja perfectibilidade e acabamento dão a impressão de terem sido feitas em mármore, etc., etc.
Porém, o seu maior título de glória, é o falado cruzeiro do Regueiro, onde o artista atingiu, por assim dizer, o sublime. O seu maior título de glória é este, é; mas… ainda assim… tenho para mim que há outra obra à sua autoria atribuída que, se não iguala aquela, pouco lhe ficará a dever. E esta é, nem mais nem menos, do que o arrebatador e elegantíssimo fontanário da Casa do Reguengo (1875) uma joia… uma maravilhazinha em pedra lavrada, desconhecida ou quase da maioria dos Melgacenses.”

Cruzeiro, junto à capela de Nossa Senhora dos Aflitos (S. Paio, Melgaço)

De facto, o cruzeiro junto da capelinha de Nossa Senhora dos Aflitos, no lugar onde nasceu, é a obra maior deste pedreiro e merece uma demorada contemplação. Foi construído em granito, tal como todas as restantes obras mencionadas, e constituído por uma base rectangular de três degraus na qual assenta um plinto paralelipipédico que sustém a coluna de secção circular, com o terço inferior do fuste canelado sendo a parte restante lisa. Sobre este apresenta-se um capitel compósito onde se insere a cruz de braços cilíndricos estriados. Diversas esculturas ornamentam o cruzeiro: sobre o capitel dois querubins suportam coroa encimada por ave; na parte superior do fuste e logo abaixo do capitel encontra-se uma imagem da Virgem vestida de manto e uma pequena estatueta sobre mísula. Todo este trabalho escultórico é de qualidade pela minúcia e perfeição dos lavrados.
Na enumeração das obras do Mestre do Regueiro, o Padre Júlio Vaz, certamente por esquecimento, não citou outra obra admirável de Manuel José Gomes que são as Almas de S. Jerónimo em Parada do Monte, neste concelho de Melgaço.

Almas de S. Jerónimo (Parada do Monte, Melgaço)

Manuel José Gomes, o Mestre do Regueiro, nunca casou nem teve filhos. Faleceu no lugar do Regueiro, onde nasceu e sempre viveu em de Agosto de 1901, com 76 anos de idade. Foi sepultado no adro da igreja de S. Paio no dia 5 do mesmo mês e ano. Ficou a sua herança que chegou até nós.


Informações extraídas de: 
- VAZ, Júlio (1996) - Padre Júlio Vaz apresenta Mário. Edição de Autor.

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