sábado, 30 de junho de 2012

OS SOLDADOS MELGACENSES NA BRIGADA DO MINHO (1ª GUERRA MUNDIAL)

Homenagem aos melgacenses caídos em combate em França e na Flandres (1917 e 1918)

Para que nunca esqueçamos, deixo uma referência aos mortos em combate, oriundos do concelho de Melgaço, durante a 1ª Guerra Mundial. Uma boa parte deles pertencia à chamada Brigada do Minho (4ª Brigada de Infantaria do C.E.P. - Corpo Expedicionário Português). Esta Brigada teve um papel muito ativo na batalha de La Lys (9 de Abril de 1918) onde foi dizimada pela ofensiva alemã apesar de ter aguentado durante 24 horas. Para o leitor ter uma ideia do heroísmo desta Brigada do Minho, deixo aqui uma nota para o desequilíbrio quanto ao número de soldados entre portugueses e alemães neste setor. No dia anterior, os alemães alteram o seu dispositivo militar. Colocam quatro divisões com quase 50 mil homens, reforçadas nesse dia com mais 30 mil soldados. Os portugueses são só 20 mil.

A 4ª Brigada de Infantaria (Brigada do Minho) que desde 7 de Fevereiro do ano de 1918 guarnecia e tinha a seu cargo a responsabilidade do sector de "Fauquissart" (França), tendo a cooperar com ela tacticamente o 6º Grupo de Metralhadoras Pesadas e as 4ªs baterias de morteiros médios e morteiros pesados, tinha as suas forças distribuídas no referido sector no dia 8 de Abril da seguinte forma:

- Batalhão Infantaria 20: com sede do comando em Temple-Bar, ocupava o S.S.1. (Fauquissart I) com 3 companhias na 1ª linha e uma em apoio;
- Batalhão Infantaria 8: com a sede do comando em Hyde-Park, ocupava o S.S.2. (Fauquissart II) com 3 companhias em 1ª linha e uma em apoio;

- Batalhão Infantaria 29: com sede do comando em Red-House, constituia o apoio dos batalhões em primeira linha, tendo as suas companhias distribuídas pelos postos de apoio da 2ª linha;

- Batalhão Infantaria 3: com sede do comando em "Laventie" constituia a Reserva tendo todas as companhias acantonadas nesta posição;

- Morteiros médios e pesados, 4ª B.M.L., grupo de metralhadoras pesadas, achavam-se distribuídos pelas respectivas dos dois sub-sectores.

A 4ª Brigada de Infantaria ligava-se no seu flanco direito com a 6ª Brigada de Infantaria e no flanco esquerdo com uma Brigada Escocesa (119ª Brigada da 40ª Divisão Britânica) que havia dias ocupava o sector de "Fleurbaix", vinda da ofensiva do "Somme" de 21 de Março. O efectivo da brigada do Minho achava-se extremamente reduzido, pois em principio de Abril faltavam-lhe em pessoal e animal, para o seu completo, aproximadamente 51 oficiais, 1300 praças e 85 solípedes, o que era devido não só ás baixas que dia a dia a brigada vinha sofrendo nas operações com o inimigo nas ainda ao rigor do clima a que os Portugueses não estavam habituados e ao violentos e árduos trabalhos que sem descanso eram exigidos ás tropas da Brigada, desde que seguiu da zona da retaguarda para a frente em 21 de Julho de 1917, primeiro para instrução em 1ª linha por enquadramento sucessivo de companhias, e depois de batalhões sem e com responsabilidade, nos sectores ocupados por tropas inglesas desde "Fleurbaix" a "Armentiére" e em "Beuvry" depois nas reparações do sector "Neuv-Chapelle", ocupado pela 2ª Brigada, durante o período intensivo de instrução no mês de Agosto e parte de Setembro de 1917.»

Desde 7 de Fevereiro a Brigada do Minho ocupa o sector de "Fauquissart", onde rendeu a 6ª Brigada de Infantaria, ficando neste até ao dia 9 de Abril em que se deu a ofensiva alemã contra a frente Portuguesa.

Durante todo este período de tempo, comportaram-se as tropas da Brigada sempre de molde a merecer o elogio e louvor das instâncias superiores, quer Portuguesas quer Inglesas, repelindo com energia todos os "raids" e ataques inimigos e tendo evidenciado sempre uma alto espírito ofensivo. No entanto as poucas horas de descanso, o tardar da rendição e os fortes e constantes ataques do inimigo levou a um evidente cansaço e fadiga física das tropas.
9 de Abril

«Foi sem dúvida na esquerda da linha, no sector de Fouquissart, guarnecido pela Brigada do Minho, que mais incarniçada foi a luta. Ao mesmo tempo que, na batalha, morreram 22 officiaes das tropas d'este sector, sendo 15 de Infantaria, 4 de metralhadoras, 2 de morteiros e 1 d'artilharia (...)»  (1)

«Tendo um efectivo reduzidíssimo e ocupando uma área de entrincheiramentos excessivamente grande, sem abrigos suficientes para pessoal, quer pelo seu restrito número, quer pela sua resistência, sob a acção do mais terrível e mortífero fogo de metralha, vomitado por centenas e centenas de canhões e morteiros, a Brigada sacrificou-se no seu pôsto de honra, segundo as ordens recebidas.» (2)

«No lado esquerdo da 1ª linha portuguesa, guarnecido pela "Brigada do Minho", a luta foi mais violenta e, por isso, com maior numero de baixas: os alemães atacaram o lado esquerdo da "Brigada do Minho", zona fronteiriça com uma Brigada Inglesa, aproveitando as dificuldades de ligação e de comunicação aliada, inerentes a uma zona de junção de Brigadas de nacionalidades diferentes.

Os actos heróicos de resistência foram múltiplos na Brigada portuguesa que assistiu á morte e ao aprisionamento dos seus camaradas, num ritmo altamente destruidor e desmoralizador. Graças aos Minhotos, os alemães não cumpriram o seu objectivo: romper a linha aliada, através dos portugueses para atravessar o rio Lys.

Segundo António Rosas Leitão, a Infantaria 20 (originária de Guimarães), a Infantaria 8 (originária de Braga) e a Infantaria 3 (originária de Viana do Castelo) sofreram 60% das baixas, entre mortos, feridos e prisioneiros, dos seus efectivos, justificando a atribuição, após o final da I Guerra Mundial, de medalhas de valor militar e cruzes de guerra quer às unidades da "Brigada do Minho" quer individualmente.»


IV Brigada, o Minho em nós confia
Seu nome honrado entrega em nossas mãos
E seu nome, que soou, de sempre, a valentia
Aos quatro batalhões, - unidos como irmãos
Tudo a mesma Família - há-de servir de guia
............................................................................
Canção da «Brigada do Minho»
França - Julho de 1917.





"Brigada do Minho", Ambleteuse, 1918
                                                                Bandeira da "Brigada do Minho"

 
MELGACENSES CAÍDOS EM COMBATE NA 1ª GUERRA MUNDIAL EM FRANÇA
  • António Alberto Dias, soldado da 4.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 17 de Janeiro de 1892 na Verdelha, lugar da freguesia de São Salvador de Paderne, filho de José Bernardino Dias e de Maria do Carmo Alves; casado e morador na freguesia de São Paio de Melgaço; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 22 de Abril de 1917, onde pertenceu à 4.ª Brigada de Infantaria (Brigada do Minho); falecido em combate a 9 de Outubro de 1917.
  • Raul Gomes, soldado da 2.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 27 de Agosto de 1894 no Queirão, lugar da freguesia de São Salvador de Paderne, filho de Manuel Joaquim Gomes e de Luciana Rosa Rodrigues; solteiro e morador em Paderne; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 15 de Abril de 1917, onde pertenceu à Brigada do Minho; falecido em combate a 9 de Outubro de 1917.
                                 
  • José Maria da Cunha, soldado da 1.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 11 de Março de 1893 na Portela, lugar da freguesia de Santa Maria Madalena de Chaviães, filho de Aníbal dos Anjos da Cunha e de Felisbela Cândida Alves; casado e morador em Melgaço; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 15 de Abril de 1917, onde pertenceu à Brigada do Minho; falecido em combate a 22 de Novembro de 1917.
  • Tito Arsénio Alves Gonçalves, segundo-sargento do 2.º Esquadrão do Regimento de Cavalaria n.º 11; nascido a 5 de Junho de 1895 na Bouça Nova, lugar da freguesia de São Lourenço do Prado, filho de Manuel Luís Gonçalves e de Albina Rosa Alves; solteiro e morador no Prado; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 22 de Fevereiro de 1917; falecido em combate a 5 de Dezembro de 1917.
  • António José Lourenço, soldado da 2.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 27 de Abril de 1892 no Louridal, lugar da freguesia de Santa Maria Madalena de Chaviães, filho de Augusto Cândido Lourenço e de Ana Marinho; solteiro e morador em Chaviães; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 15 de Abril de 1917, onde pertenceu à Brigada do Minho; falecido em combate a 12 de Março de 1918.
  • João José Pires, soldado da 2.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 28 de Abril de 1893 no Outeiro, lugar da freguesia de Santa Maria de Paços, filho de José Joaquim Pires e de Alexandrina Pires; solteiro e morador em Paços; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 15 de Abril de 1917, onde pertenceu à Brigada do Minho; falecido em combate a 9 de Abril de 1918.
  • José Narciso Pinto, soldado da 4.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 3 de Março de 1893 na Igreja, lugar da freguesia de Santa Maria Madalena de Chaviães, filho de Manuel António Pinto e de Cândida Maria Alves; casado e morador em Chaviães; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 22 de Abril de 1917, onde pertenceu à Brigada do Minho; falecido em combate a 9 de Abril de 1918.
  • António José Cardoso Ferreira Pinto da Cunha, segundo-sargento do Regimento de Obuses de Campanha; nascido a 28 de Julho de 1892 na Rua Direita, vila e freguesia Santa Maria da Porta de Melgaço, filho de António José Ferreira Pinto da Cunha e de Carlota Amália Cardoso; solteiro e morador na vila de Arcos de Valdevez; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 20 de Agosto de 1917, onde pertenceu ao 6.º Grupo de Baterias de Metralhadoras; falecido em combate a 9 de Abril de 1918.
  • José Cerqueira Afonso, soldado da 4.ª Companhia do Regimento de Infantaria n.º 3; nascido a 14 de Março de 1892 nas Fontes, lugar da freguesia de São Salvador de Paderne, filho de Inácio José Afonso e de Maria Cerqueira; casado e morador em Paderne; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 22 de Abril de 1917, onde pertenceu à Brigada do Minho; falecido em combate a 9 de Abril de 1918.

  • Simplício de Lima, soldado do 1.º Esquadrão do Regimento de Cavalaria n.º 4; nascido a 18 de Junho de 1893 em Paranhão, lugar da freguesia de Santiago de Penso, filho de Maria Teresa de Lima; solteiro e morador no Penso; embarcou para França integrado no Corpo Expedicionário Português a 26 de Maio de 1917; falecido vítima de ferimentos em combate a 18 de Dezembro de 1918.
                    Unidade do Corpo Expedicionário Português em coluna de marcha.


Informações recolhidas de:

1. General Fernando Tamagnini, "Os meus três comandos", Isabel Pestana Marques, Memórias do General 1915-1919

2.Eugénio Carlos Mardel Ferreira, Tenente-Coronel, 2º Comandante da 4ª Brigada de Infantaria

Memórias do General 1915-1919, Marques, Isabel Pestana, SACRE Fundação Mariana Seixas


Das Trincheiras, com Saudade, Marques, Isabel Pestana, A Esfera dos Livros

A Brigada do Minho na Flandres, Mardel, Eugénio, o 9 de Abril.
Listagem de baixas recolhida em http://historia-dos-tempos.blogspot.pt/2009/05/brigada-do-minho.html

sexta-feira, 29 de junho de 2012

Tomás das Quingostas: herói do povo ou salteador? VI

O declinio, captura e assassinato do Tomás das Quingostas em 1839

A quadrilha de Tomás Quingostas acabou por entrar numa fase de franco declínio, o cerco apertou-se cada vez mais e vários dos seus companheiros foram presos ou fuzilados por militares ávidos de vingança. Em Maio de 1837, foi detido mais um dos seus parceiros, Francisco Xavier Sisneiros, natural da cidade de Lisboa. Conhecido como o “Lisbonense”, era considerado um agente do miguelismo no Alto Minho, tendo sido detido em Riba de Mouro, concelho de Valadares. Pouco depois, António Joaquim Rodrigues, conhecido como “Lourenço Correio”, foi capturado pelas forças do Major José de Figueiredo Frazão. Na mesma altura, foi detectada a presença de Quingostas no concelho de Melgaço, acompanhado apenas por um desertor e três camponeses. As autoridades planeavam a deportação da sua família, que residia no concelho de Melgaço, como forma de o punir. Pelo menos era essa a vontade do major Frazão, que considerava serem os membros da família os responsáveis pelo aviso da presença das tropas.
No entanto, o governador civil não anuiu a tal pretensão, por considerar que extravasava as suas competências.
Apesar de a quadrilha ser, essencialmente, uma organização masculina, o certo é em algumas ocasiões foram feitas referências à presença de elementos femininos, nomeadamente às duas irmãs que o acompanhavam e a duas mulheres, designadas pelas autoridades de “amigas” de Quingostas.
A tarefa do Major Frazão estava a ser dificultada pela escassa cooperação das autoridades administrativas locais, particularmente dos regedores. Várias explicações podem ser avançadas no sentido de explicar esta atitude, nomeadamente a sua baixa instrução, o desconhecimento das suas obrigações e o receio de represálias por parte dos salteadores ou dos seus companheiros e familiares.  
O certo é que esta sua postura tinha permitido que deambulassem livremente pelas feiras e festividades, cometessem delitos à luz do dia e circulassem pelas localidades, sem que fossem importunados.
A complacência das autoridades e das populações levou à presença de forças militares, desde Fevereiro de 1837, nos concelhos de Monção, Melgaço e Valadares, instaladas em casas de particulares, cujos proprietários não só os abrigavam, mas também os sustentavam. A situação arrastou-se pelo menos até Julho do mesmo ano. Após a saída das tropas, Quingostas reapareceu em Melgaço.
Entretanto, Quingostas tinha conseguido um indulto junto das autoridades espanholas, com a condição de não sair da província de Ourense. Mas acabou por desrespeitar o compromisso assumido e entrou em Portugal, onde os seus crimes não tinham sido perdoados.
Em Agosto de 1837, ficou sob custódia, à ordem do chefe político da província de Ourense, cabendo a Portugal reclamar a sua extradição, tendo sido solicitada, para esse efeito, a intervenção do Ministério dos Negócios Estrangeiros.
Contudo, os ventos pareciam soprar a favor de Tomás das Quingostas. Em 14 de Julho de 1837, iniciou-se a “revolta dos Marechais”, um pronunciamento militar anti-setembrista, de inspiração cartista, encabeçada pelos duques da Terceira e da Saldanha. Esta revolta iniciou-se em Ponte da Barca, com a sublevação dos militares que estavam envolvidos na caça a Quingostas e seus companheiros, tendo terminado oficialmente em Setembro de 1837, com a vitória das forças governamentais.
Durante o período do pronunciamento militar, as atenções deixaram de estar centradas em Quingostas, e este, tirando partido da situação, conseguiu estabelecer contactos com o Visconde das Antas, que lhe atribuiu um salvo-conduto, em Dezembro do mesmo ano.
Abandonada a clandestinidade, alguns dos seus sequazes saíram da clandestinidade, regressando às respectivas aldeias sem serem incomodados. Tomás Quingostas tornou-se comandante da guarda volante do Alto Minho, tendo como missão capturar soldados desertores que fugiam para a Galiza, bem como guerrilheiros galegos, adeptos do carlismo, e evitar roubos e furtos, cooperando na manutenção da ordem e da tranquilidade no Alto Minho.  No seu novo cargo, ia cumprindo, a preceito, as funções de que estava incumbido. Porém, em Agosto de 1838, assassinou o presidente da câmara do Soajo, João Manuel Domingues, e em Novembro do mesmo ano prendeu João Pires e o padre António José Alves, com a justificação de que davam guarida a guerrilheiros espanhóis. Apesar de não se terem confirmado essas suspeitas, a detenção foi efectuada com o pretexto de terem na sua posse pólvora e sabão contrabandeados. Algumas das acções levadas pelo seu “exército”, bem como a sua ligação a guerrilhas espanholas ditaram o seu fim. Acusado de assassinato, Tomás das Quingostas foi morto em Janeiro de 1839 junto à ponte da Alote (S. Paio) pela escolta que o transportava para a prisão, que alegou tentativa de fuga. Caía assim aquele que chegou a ser apelidado de “pequeno general do Alto Minho”, que foi assassino, salteador, guerrilheiro, comandante de tropas e herói popular.
As reacções à sua morte não se fizeram esperar. Além do já referido rapto do proprietário João Bento Pereira Dantas, uma quadrilha comandada pelo “Beira-Alta”, primo de Quingostas, miguelista, guerrilheiro e salteador, invadiu, em 1839, a casa de António José Afonso da Costa, na freguesia de Merufe, concelho de Monção, arrastou-o para fora da sua habitação e assassinou-o.
Nenhum dos salteadores que sucederam a Quingostas conseguiu granjear a sua popularidade e o reconhecimento junto das populações, talvez porque se tratava de homens considerados autenticamente marginais, que recorriam à violência, ao assalto e ao furto apenas para satisfazerem os seus interesses pessoais, sem quaisquer motivações de natureza política.

Capela de Barata
Conta-se que foi o Tomás das Quingostas foi abatido junto à ponte da Alote e enterrado junto à capela de Barata - S. Paio (na imagem).


Informações extraídas de:
in "ESTEVES, Alexandra Patrícia Lopes (2010) - Entre o crime e a cadeia: violência e marginalidade no Alto Minho (1732 - 1870). Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Instituto de Ciências Sociais.

SPORTING CLUB DE MELGAÇO???

Sporting Clube de Portugal.png


O Sporting Clube de Melgaço foi fundado no início dos anos 1940 e desapareceu em 1947, tendo sido filial do Sporting Clube de Portugal durante o seu curto tempo de vida.
A origem do Sporting de Melgaço está no Rápido Club Melgacense, um dos dois clubes formados nos anos 1930 em Melgaço. Numa altura em que o Sporting Clube de Portugal dominava o futebol nacional e o Porto conhecia um certo declíneo, tanto o presidente como o vice-presidente do Rápido eram sportinguistas, e decidiram mudar o nome do clube e filiá-lo no Sporting, adoptando as camisolas listadas verde brancas. Em 1947 , por sua vez, o Sporting de Melgaço desapareceu dando lugar ao clubde “Os Vitoriosos”.
Na wikisporting remetem para um texto publicado pelo blogue "Foz do rio Trancoso" com base ao testemunho de Manuel Felix Igrejas que nos situa na senda das primeiras coletividades futebolísticas de Melgaço. Deste texto, extraio algumas passagens interessantes:
"Numa das várias fases futebolísticas na nossa terra, nos anos quarenta, formaram-se os grupos Rápido e Unidos. O Rápido Club Melgacense era composto pelos remanescentes dos grupos anteriores, União, Atlético e Sport e alguns novatos. O Unidos Futebol Club em sua maioria eram rapazes saídos da puberdade, daí mais fogosos e habilidosos que sempre venciam, para meu desgosto, pois os atletas meus familiares, Gú e Carriço eram do Rápido.
Para tentar mudar a condição de perdedores, o Rápido trocou o nome para Sporting e filiou-se ao Sporting Club de Portugal. As camisolas originais às listas verdes e brancas na vertical, que tinham sido as do União, passaram a ser na vertical como as da matriz.
O facto de filiar-se ao Sporting deveu-se a imposição do Presidente e Vice-Presidente, irmãos, Zeca e Juca do Aurélio, contra vontade dos elementos portistas, meu irmão Augusto (Gú) e teu pai Alberto (Carriço) e outros, mas naquela época o Sporting era o maior Clube do país, campeão uma porção de anos seguidos. O Porto, depois dos sucessos do final dos anos trinta caiu muito. Lembro do Fernando da Cortiça que para nos aborrecer dizia que o Porto era o melhor grupo da província.
O nome do Rápido tem uma origem algo aparolada. Naqueles anos começou a chegar a Monção um comboio rápido denominado Flecha de Prata. Como havia pouco que comentar o tal comboio era tema para tudo. Nas vilas vizinhas achavam que tal progresso também lhes pertencia e se vangloriavam, também Melgaço, embora fosse o adversário natural.
Não havia jogo ou qualquer ajuntamento entre melgacenses e monçanenses que não acabasse em pancadaria. Houve barulhos (brigas) memoráveis comentadas durante anos. Ouvi contar que um domingo apareceu em Melgaço uma camionete de excursão, de Monção. Os ocupantes desembarcaram na Calçada e desceram em marcha rua Nova de Melo abaixo, exibindo aqueles bonecos em cima duma cana que accionados por um arame encostam um no outro, no compasso duma canção que entoavam, menosprezando Melgaço. O incidente não ficou sem resposta: na altura do terreiro já um grande número de rapazes munidos de varapaus desancaram os atrevidos provocadores. Devia ter acontecido no início dos anos trinta pois devia ter eu cinco ou seis anos quando comecei a ouvir esse caso.
Pois o comboio rápido que então representou grande progresso, serviu para nome do grupo de futebol melgacense. Na mesma época os rapazes de Monção formaram um grupo de futebol com o nome de Flecha de Prata”.
Voltando ao futebol em Melgaço: na mesma época do Rápido e Unidos, o Manuel Macarrão que tinha sido jogador nos anos vinte, estava de regresso à terra após ter sido motorista noutros locais, fundou o Club Comercial de Melgaço. Os atletas eram quase todos quarentões, sorte do Rápido que conseguiu vencer alguns jogos. O Comercial, pela proveta idade logo feneceu, o Unidos desfez-se pela debandada dos jovens para a tropa ou emigrados. Ficou o Sporting que também não durou muito dando lugar em 1947 ao “Os Vitoriosos” minha maior invenção na terra."
O Sport Club Melgacense só seria fundado em 1957...

terça-feira, 26 de junho de 2012

A Pena de Anamão: o refúgio mais popular do Tomás das Quingostas



Segundo Alexandra Cerveira Pinto S. Lima, a Pena de Anamão “poderá ter servido em dado momento de atalaia, a avaliar pelos entalhes na rocha criando um conjunto de pequenos e irregulares degraus que conduzem ao topo. Daí abarca-se uma vasta área em território galego até ao vale do Lima, e os montes sobranceiros ao Lindoso”.
 A Pena de Anamão é uma massa granítica que irrompe abruptamente do solo e segundo Alexandra Cerveiro Pinto S. Lima, constitui referência visual obrigatória.
Neste sítio agreste tinha o salteador Tomás das Quingostas o seu reduto instalado num edifício “misto de construção humana e da natureza, constituído por duas partes ou salas divididas por um muro atravessado por uma porta ou padieira em forma de arco de construção antiquíssima. 
Ainda está na mente dos castrejos uma quadra que Tomás e os seus sequazes cantavam como ordinário de marcha em forma de combate:

«Os pobres não o teem
Os ricos não o dão
Quem quer assentar praça
Vem à fraga de Anamão»”
(Jornal ‘A Neve’, 1921).

Segundo o Sr. Armando Veloso, residente em Castro Laboreiro, a Lapa do Tomás das Quingostas situa-se por detrás da Fraga de Anamão e em frente ao marco fronteiriço n.º 45.


Informações extraídas de:
- Jornal‘A Neve’, n.º 8, Castro Laboreiro, 13 de Janeiro de 1921.
- LIMA, Alexandra Cerveira Pinto - Castro Laboreiro: povoamento e organização de um território serrano, Ed. Parque Nacional da Peneda - Gerês/Câmara Municipal de Melgaço, Braga, 1996.

Tomás das Quingostas: herói do povo ou salteador? V

O bando do Tomás das Quingostas é agora levado muito a sério e em Março de 1837 é destacada uma força militar para o Alto-Minho para o neutralizar...



Em inícios de 1836, Quingostas foi visto a disparar contra soldados espanhóis que o impediram de utilizar um barco furtado no rio Minho.809 Alguns dias depois, realizava novo atentado, tendo mais uma vez a freguesia de Paderne como palco. Desta vez, o alvo foi uma pequena escolta militar, destacada para manter a ordem numa festividade daquela localidade:

“[…] Tendo os officiais ido a uma romage que se fez no dia 16 do corrente na freguesia de Paderne do concelho de Valladares, devertirem-se, levarão consigo huma escolta do mesmo destacamento, e na occasião de sahir a porcição, em alguma distancia de onde estava a dita escolta, apareceo-lhe o Monstro Thomas com dous companheiros e atirando-lhe três tiros, começou a insultallos chamando-lhe negros e outros vários nomes.”

Deste modo, Quingostas e os seus companheiros alardeavam um atrevimento cada vez maior, não se coibindo de provocar as autoridades judiciais, militares e administrativas, nem de se exibirem em reuniões das populações, como eram as festas. Circulava com total liberdade pelas estradas que uniam o concelho de Melgaço ao de Valadares, sendo frequentador assíduo de uma venda, na freguesia de Penso, pertencente àquele concelho. Contudo, sofreu um revés, quando foi capturado João Pinheiro Albardeiro, seu amigo pessoal e membro da quadrilha que liderava. Meses mais tarde, será a vez de Joaquim José de Sá, um desertor, natural do concelho de Paredes de Coura, também ser preso. Apesar destas contrariedades, Quingostas continuava a movimentar-se impunemente por algumas freguesias dos concelhos de Melgaço e Valadares, dando-se ao luxo de arrancar os editais com mensagens contra si, substituindo-os por outros, da sua lavra, nos quais apregoava não só a sua invencibilidade, como a sua luta contra as autoridades locais. Um deles apresentava o seguinte conteúdo

“[…] Como as reais ordens são dadas por desavergonhados hé o motivo porque se rasgão e se fossem dadas pelo governo se aceitarião benignamente e portanto o que foi causa deste edital foi a de me roubar o quanto eu tinha em minha casa porque só em comedeiras se podem sustentar cai nas mesmas penas que me recolher também cai no mesmo tempo que este tirar, eu se bem o digo melhor o faço as minhas casas são debaixo das estrelas sou firme contra os meus inimigos.”
Em Março de 1836, as autoridades espanholas davam conta da presença de Quingostas na Galiza.
“[…] Por la Peroja y Caldela estan invadiendo esta Província los facciosos segun las partes que acabo de recibir; es pues preciso que V. immediatamente tome todas las medias convenientes para faborecer los pueblos atacados sem perder de vista esos puntos, y avisando a lo momento a las Authoridades Portuguesas para que se sirban tener pronta su tropa para ausiliarmos en caso necessário.”
Era evidente a união de esforços da quadrilha miguelista e da guerrilha carlista, comandada por Lopez. Quingostas e os seus companheiros eram os responsáveis por um sistema de angariação de desertores portugueses para as fileiras daquela guerrilha. O apoio logístico prestado à guerrilha carlista por parte do bando de Quingostas era evidente para as autoridades espanholas.
Em Junho de 1836, quando a quadrilha de Tomás Quingostas era já rotulada de miguelista, foi preso José Joaquim Codeceira “saltiador de reinos, ladrão de estrada, assacino, e sócio de Quadrilha e Miguelista”, um dos responsáveis pelo aliciamento de desertores portugueses para integrarem as forças inimigas de Isabel II, tendo ele próprio combatido ao lado dos guerrilheiros. Esta ligação entre apaniguados das causas miguelista e carlista tornava imperiosa a destruição da quadrilha portuguesa e elevava a fasquia do seu grau de perigosidade. A captura de elementos ligados ao bando de Quingostas resultava, em muitos casos, de acções de espionagem, executadas por homens a soldo das autoridades.  Todavia, a prisão desses criminosos não implicava, necessariamente a sua punição. Muitos acabavam inocentados e postos em liberdade, ou conseguiam evadir-se dos estabelecimentos prisionais e vingar-se dos responsáveis pela sua detenção. O administrador do concelho de Melgaço não se inibia de lançar suspeitas sobre a existência de protecção aos salteadores e aos miguelistas, por parte do poder judicial, e de apoio exterior nas evasões de criminosos. Em 11 de Junho de 1836, depois de ter sofrido várias ameaças e farto da chacota de que era alvo, vendo a sua autoridade ser desacreditada por indivíduos que viviam à margem da lei, apresentou o seu pedido de demissão ao governador civil, pois, segundo as suas palavras, “bibo bexado de ver a protecção que tem tais corifeus, e descaramento e ouzadia com eu elles se portão.”

Quingostas escapou por pouco à prisão, num ataque de surpresa lançado pelas autoridades, após terem sido informadas da intenção do salteador se deslocar a uma romaria, tendo que passar pela freguesia de Gave, situada no concelho de Valadares. A quadrilha foi realmente surpreendida, mas o seu líder não foi apanhado.

Em finais de 1836, eram conhecidos os encontros, que tinham lugar no concelho no Melgaço, entre salteadores e miguelistas, sob o comando de Quingostas, que se presumia terem como objectivo desenvolver acções de desacreditação do governo liberal, a nível local, através de investidas contra as autoridades e contra a propriedade. Durante esse ano, tinham circulado pelos diferentes concelhos do distrito boatos sobre a realização de reuniões miguelistas e a existência de depósitos de armas.

Em Outubro de 1836, realizou-se, naquele concelho, uma reunião que juntou 18 miguelistas, na sua maior parte oficias amnistiados, oriundos da cidade de Braga, aos quais se juntaram, dias depois, mais 13 da mesma cidade. Segundo as guardas nacionais de Arcos de Valdevez e Ponte da Barca, estes indivíduos incorporados na “gavilha” de Tomás Quingostas formaram um grupo de 45 homens, que, na noite de 21 para 22 de Outubro daquele ano, passou para a Galiza. O objectivo final seria a realização de um levantamento pró-miguelista a partir de Melgaço, contando com a participação dos vários adeptos do miguelismo nesta região.

Logo nos primórdios de 1837, Quingostas atacou a casa de uma viúva rica da freguesia de Merufe, concelho de Valadares. Seguido por mais de 20 homens, feriu com uma facada a dona da casa e, além de dinheiro e roupa, roubou-lhe papéis importantes com a intenção de a chantagear e, desse modo, obter mais dinheiro. Aliás, o guerrilheiro recorria frequentemente a este estratagema para extorquir dinheiro.

Em inícios de 1836, Quingostas foi visto a disparar contra soldados espanhóis que o impediram de utilizar um barco furtado no rio Minho.809 Alguns dias depois, realizava novo atentado, tendo mais uma vez a freguesia de Paderne como palco. Desta vez, o alvo foi uma pequena escolta militar, destacada para manter a ordem numa festividade daquela localidade:

“[…] Tendo os officiais ido a uma romage que se fez no dia 16 do corrente na freguesia de Paderne do concelho de Valladares, devertirem-se, levarão consigo huma escolta do mesmo destacamento, e na occasião de sahir a porcição, em alguma distancia de onde estava a dita escolta, apareceo-lhe o Monstro Thomas com dous companheiros e atirando-lhe três tiros, começou a insultallos chamando-lhe negros e outros vários nomes.”

Deste modo, Quingostas e os seus companheiros alardeavam um atrevimento cada vez maior, não se coibindo de provocar as autoridades judiciais, militares e administrativas, nem de se exibirem em reuniões das populações, como eram as festas. Circulava com total liberdade pelas estradas que uniam o concelho de Melgaço ao de Valadares, sendo frequentador assíduo de uma venda, na freguesia de Penso, pertencente àquele concelho. Contudo, sofreu um revés, quando foi capturado João Pinheiro Albardeiro, seu amigo pessoal e membro da quadrilha que liderava. Meses mais tarde, será a vez de Joaquim José de Sá, um desertor, natural do concelho de Paredes de Coura, também ser preso. Apesar destas contrariedades, Quingostas continuava a movimentar-se impunemente por algumas freguesias dos concelhos de Melgaço e Valadares, dando-se ao luxo de arrancar os editais com mensagens contra si, substituindo-os por outros, da sua lavra, nos quais apregoava não só a sua invencibilidade, como a sua luta contra as autoridades locais. Um deles apresentava o seguinte conteúdo

“[…] Como as reais ordens são dadas por desavergonhados hé o motivo porque se rasgão e se fossem dadas pelo governo se aceitarião benignamente e portanto o que foi causa deste edital foi a de me roubar o quanto eu tinha em minha casa porque só em comedeiras se podem sustentar cai nas mesmas penas que me recolher também cai no mesmo tempo que este tirar, eu se bem o digo melhor o faço as minhas casas são debaixo das estrelas sou firme contra os meus inimigos.”
Em Março de 1836, as autoridades espanholas davam conta da presença de Quingostas na Galiza.
“[…] Por la Peroja y Caldela estan invadiendo esta Província los facciosos segun las partes que acabo de recibir; es pues preciso que V. immediatamente tome todas las medias convenientes para faborecer los pueblos atacados sem perder de vista esos puntos, y avisando a lo momento a las Authoridades Portuguesas para que se sirban tener pronta su tropa para ausiliarmos en caso necessário.”
Era evidente a união de esforços da quadrilha miguelista e da guerrilha carlista,
comandada por Lopez. Quingostas e os seus companheiros eram os responsáveis por um sistema de angariação de desertores portugueses para as fileiras daquela guerrilha. O apoio logístico prestado à guerrilha carlista por parte do bando de Quingostas era evidente para as autoridades espanholas.
Em Junho de 1836, quando a quadrilha de Tomás Quingostas era já rotulada de miguelista, foi preso José Joaquim Codeceira “saltiador de reinos, ladrão de estrada, assacino, e sócio de Quadrilha e Miguelista”, um dos responsáveis pelo aliciamento de desertores portugueses para integrarem as forças inimigas de Isabel II, tendo ele próprio combatido ao lado dos guerrilheiros. Esta ligação entre apaniguados das causas miguelista e carlista tornava imperiosa a destruição da quadrilha portuguesa e elevava a fasquia do seu grau de perigosidade. A captura de elementos ligados ao bando de Quingostas resultava, em muitos casos, de acções de espionagem, executadas por homens a soldo das autoridades.  Todavia, a prisão desses criminosos não implicava, necessariamente a sua punição. Muitos acabavam inocentados e postos em liberdade, ou conseguiam evadir-se dos estabelecimentos prisionais e vingar-se dos responsáveis pela sua detenção. O administrador do concelho de Melgaço não se inibia de lançar suspeitas sobre a existência de protecção aos salteadores e aos miguelistas, por parte do poder judicial, e de apoio exterior nas evasões de criminosos. Em 11 de Junho de 1836, depois de ter sofrido várias ameaças e farto da chacota de que era alvo, vendo a sua autoridade ser desacreditada por indivíduos que viviam à margem da lei, apresentou o seu pedido de demissão ao governador civil, pois, segundo as suas palavras, “bibo bexado de ver a protecção que tem tais corifeus, e descaramento e ouzadia com eu elles se portão.”
Quingostas escapou por pouco à prisão, num ataque de surpresa lançado pelas autoridades, após terem sido informadas da intenção do salteador se deslocar a uma romaria, tendo que passar pela freguesia de Gave, situada no concelho de Valadares. A quadrilha foi realmente surpreendida, mas o seu líder não foi apanhado.
Em finais de 1836, eram conhecidos os encontros, que tinham lugar no concelho no Melgaço, entre salteadores e miguelistas, sob o comando de Quingostas, que se presumia terem como objectivo desenvolver acções de desacreditação do governo liberal, a nível local, através de investidas contra as autoridades e contra a propriedade. Durante esse ano, tinham circulado pelos diferentes concelhos do distrito boatos sobre a realização de reuniões miguelistas e a existência de depósitos de armas.
Em Outubro de 1836, realizou-se, naquele concelho, uma reunião que juntou 18 miguelistas, na sua maior parte oficias amnistiados, oriundos da cidade de Braga, aos quais se juntaram, dias depois, mais 13 da mesma cidade. Segundo as guardas nacionais de Arcos de Valdevez e Ponte da Barca, estes indivíduos incorporados na “gavilha” de Tomás Quingostas formaram um grupo de 45 homens, que, na noite de 21 para 22 de Outubro daquele ano, passou para a Galiza. O objectivo final seria a realização de um levantamento pró-miguelista a
partir de Melgaço, contando com a participação dos vários adeptos do miguelismo nesta região.
Logo nos primórdios de 1837, Quingostas atacou a casa de uma viúva rica da freguesia de Merufe, concelho de Valadares. Seguido por mais de 20 homens, feriu com uma facada a dona da casa e, além de dinheiro e roupa, roubou-lhe papéis importantes com a intenção de a chantagear e, desse modo, obter mais dinheiro. Aliás, o guerrilheiro recorria frequentemente a este estratagema para extorquir dinheiro.

Em Março de 1837, uma força militar marchou em direcção aos concelhos de Monção, Melgaço e Valadares, com a missão não só de pôr termo aos roubos, mas também de perseguir e destruir a quadrilha de Quingostas. Mas este conseguiu escapulir-se para Espanha com cinco dos seus companheiros. O objectivo das autoridades passou então a ser impedir o seu regresso a Portugal. No entanto, esta empresa não era fácil de executar, dada a extensão da raia, a facilidade em transpor o rio Minho e a falta de zelo e de empenho das autoridades administrativas. O major José Figueiredo Frazão, comandante das forças destacadas para o Alto Minho para darem caça à quadrilha do Quingostas, denunciava precisamente esse desinteresse e as implicações daí advenientes. Estas acusações surgiram na sequência das picardias, que, desde 1834, impediam uma colaboração mais estreita entre o poder militar, judicial e administrativo, e davam azo ao aparecimento de suspeitas, intrigas e à troca de acusações entre os seus responsáveis.

(CONTINUA...)

Informações extraídas de:
in "ESTEVES, Alexandra Patrícia Lopes (2010) - Entre o crime e a cadeia: violência e marginalidade no Alto Minho (1732 - 1870). Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Instituto de Ciências Sociais.

segunda-feira, 25 de junho de 2012

A capela e o cruzeiro de Nosso Senhor dos Aflitos (Regueiro - S. Paio)

A Capela do Senhor dos Aflitos


Atribui-se a sua construção a Manuel José Gomes ou ‘Mestre do Regueiro’ no ano de 1886. O cruzeiro, ao qual me referirei mais abaixo, em frente à capela também é atribuída ao mesmo "artista".
Tal nome artístico seria alusivo ao lugar de nascimento ou lugar de residência: o lugar do Regueiro, na freguesia de S. Paio (Melgaço), a poucas centenas de metros do lugar de Outeiro, na estrada camarária que liga esta localidade ao lugar do Cruzeiro (de onde sou natural) e outros.
Envolvida por espaço agrário e à margem de caminho rural antigo, com um pequeno espaço fronteiro lajedo em granito e cruzeiro, a Capela do Senhor dos Aflitos é um pequeno templo com nave única de planta rectangular e cobertura com telhado de duas águas.
Os paramentos em alvenaria autoportante de granito apresentam indícios de terem sido rebocados a branco.
Na fachada frontal abre-se porta de verga encurvada encimada por cartela. O remate da fachada é por cimalha angular tendo ao centro um campanário (vazio) e nos extremos laterais urnas que coroam os cunhais.

O Cruzeiro da Capela de Nosso Senhor dos Aflitos

Atribuído também a Manuel José Gomes, este cruzeiro, inserido em meio rural, encontra-se no adro da Capela do Senhor dos Aflitos, outra obra da autoria do ‘Mestre do Regueiro’.




É construído em granito e constituído por uma base rectangular de três degraus na qual assenta um plinto paralelipipédico que sustém a coluna de secção circular, com o terço inferior do fuste canelado sendo a parte restante lisa. Sobre este apresenta-se um capitel compósito onde se insere a cruz de braços cilíndricos estriados. Diversas esculturas ornamentam o cruzeiro: sobre o capitel dois querubins suportam coroa encimada por ave; na parte superior do fuste e logo abaixo do capitel encontra-se uma imagem da Virgem vestida de manto e uma pequena estatueta sobre mísula. Todo este trabalho escultórico é de qualidade pela minúcia e perfeição dos lavrados.

A parte cimeira é de uma beleza ímpar


Informações extraídas de:
-http://acer-pt.org/vmdacer/index.php?option=com_content&task=view&id=158&Itemid=65

quinta-feira, 21 de junho de 2012

Em 1923, Governo decreta aumento do preço das água termais do Peso

Melgaço: Geografia do desemprego!

Relembro esta reportagem (2011) elaborada e transmitida pela estação de televisão SIC associada aos dados do INE em que situa Melgaço como um dos concelhos do país com menor taxa de desemprego. Motivo de orgulho? Não. Talvez signifique que as pessoas deixaram de ter esperança nesta terra e resolvem procurar oportunidades nas cidades ou então no estrangeiro. Que mais fazer para os convencer a ficar? Resposta difícil. O certo é que a terra é lindíssima mas sem o seu melhor, as sua gentes, Melgaço não têm futuro. Este concelho perde população desde os anos 60 do século passado. Em menos de 50 anos, Melgaço perdeu quase metade da sua população residente. Uma boa parte da sua população atual é idosa. Perdeu-se o SAP, o tribunal, uma boa parte das escolas e o que há-de vir aí?
Quem ficará para dar um rumo a Melgaço? Cabe aos melgacenses a resposta...


quarta-feira, 20 de junho de 2012

O Mosteiro de Paderne na Idade Média e Renascimento

Pelo arrolamento das igrejas de Entre Lima e Minho feito entre 1258-1259, verifica-se que o ‘Monasterium de Paderni’ pertencia ao bispado de Tui (Costa, 1981). Confirma-se este enquadramento pelas ‘Inquirições’ de D. Afonso III, de 1258 ao referir que o Rei não era padrom (padroeiro) do mosteiro mas que recebia dos frades, em cada ano, a ‘quarta de collecta’ (PMH, 1888: 377).

Como outras congregações, a de Paderne aumentou a sua riqueza patrimonial por doações testamentárias de terrenos feitas por habitantes da Ribeira Minho. Os monges exploraram estes domínios por arrendamento recebendo dos cultivadores rendas e foros. Do rio Minho obtinham recursos piscícolas quer pela exploração directa de pesqueiras quer pelo seu emprazamento e consequente entrega das prestações em pescado. Não admira pois que a situação económica do mosteiro fosse tida em conta quando em 1320 se determinou “a taxa a pagar a el-Rei D. Dinis pelos benefícios eclesiásticos do bispado de Tui” (Costa, 1981): 500 libras. Era, depois da contribuição do mosteiro de S. Fins de Friestas (1.100 libras), a maior taxa. Ganfei pagava 300 libras e Longos Vales apenas 100 (idem,.

A acumulação do mosteiro em bens veio a desencadear a intervenção do procurador de D. Pedro I que lhes embargou umas ‘casas e vinhas e herdades’. Os monges reclamaram ao rei justificando-se que ‘dessas herdades e posições’ pagavam-lhes ‘foros e direitos’.D. Pedro veio a ordenar que não lhes fossem embargadas as referidas propriedades obrigando-se o mosteiro a continuar a pagar-lhe os ‘meus foros e direitos’. (INIC, 1984: 485). Em 27 de Março de 1360, o mesmo rei confirmou e outorgou ao mosteiro “privilégios, liberdades e foros e bons costumes” (Marques, 2002: 18) e D. Afonso IV, em 26 de Abril de 1475 “estendeu os privilégios do mosteiro a todos os moradores do couto, tendo-os isentado de todos os encargos e servidões do concelho” (idem). D. Manuel I, em 8 de Setembro de 1497 “confirmou-lhe todos os privilégios que lhe tinham sido outorgados até essa data” (idem, ibidem). Pelo Censual de D. Diogo de Sousa (1514-1532), o rendimento do mosteiro de Paderne foi avaliado em 714 e ½ reis, mantendo, assim, uma boa posição relativamente aos outros mosteiros da Ribeira Minho: Ganfei rendia 723 reis; Longos Vales: 713 e ½ reis (ADB, 1514-1532: 480-485).

Como outros mosteiros crúzios, o de Paderne também não escapou ao processo, desencadeado a partir de meados de Quatrocentos, de “apropriação por comendadores, uma boa parte dos quais estrangeiros, usurpando até à exaustão os rendimentos das mesas priorais para proveito pessoal, descuidando a vida claustral e a vivência espiritual dos religiosos residentes” (Gomes, 2000). Em 1527 inicia-se a reforma da Congregação “para acabar com as vicissitudes dos Priores Comendatários” (Dias, 2000). O Papa Paulo III confirmou os estatutos que haviam sido elaborados por Fr. Brás de Barros como reformador de Santa Cruz de Coimbra. Os priores deixaram de ser perpétuos para serem trienais. Em 1539, o Capitulo Geral “resolveu constituir como Prior mor da Congregação de Santa Cruz o Prior de Santa Cruz de Coimbra” (idem, ibidem) o que foi confirmado logo a seguir pelo Papa Paulo III (idem). Em 1594, por morte do Comendatário perpétuo, Diogo de Alarcão, Paderne aderiu ao mosteiro de Santa Cruz de Coimbra tendo sido eleito D. Nicolau dos Santos como seu primeiro Prior Trienal (Costa, 1868; Silva, 1983: 9).

A nova administração procurou rentabilizar os recursos monásticos adoptando uma gestão mais consentânea com a conjuntura. Uma das vertentes utilizadas foi a alteração do modo do recebimento das rendas substituindo-se o pagamento em dinheiro pelas entregas em espécie. Ao assim procederem, os frades de Paderne procuravam ladear as consequências das crises monetárias conduzindo a frequentes desvalorizações. Não foi fácil a aplicação desta medida. Houve reacções dando lugar a processos litigiosos. Um deles ocorreu em 1604 entre os frades crúzios e os herdeiros de Gregório de Mogueimas Fajardo e de sua mulher D. Catarina de Távora. Estes, foreiros da Quinta de Pontizelas, entregavam ao Mosteiro a pensão em dinheiro desde o tempo do comendatário Agostinho de Mogueimas que havia mudado o modo de pagamento da referida pensão originariamente em espécie.

O Mosteiro considerava que a mudança da pensão do pão meado, vinho e galinhas para dinheiro lhe causava ‘lezão enormíssima’ pois a pensão “não se podia mudar nem diminuir conforme a constituição signodall do arcebispado” (idem).

Os foreiros alegaram que as terras da Quinta de Pontizelas eram “antigamente terras infructífferas mattos agrestes, corcovas e penedias muito ásperas, e pedregulhaes tudo cousas incapazes de fructo e muito cheas de cobras e bichos peçonhentos, e tall era fama em toda a freiguesia, e o sabião os antiguos e ouvirão aos mortos. E que os antecessores dos reos seu pai e avoos e os outros possuidores atrás romperão as dittas terras e as levantarão de fogo morto desbastando mattos, arrazando montes e penedias, e com grande custo de suas fasendas reduzirão as terras ao culltura, e nellas fizerão vinhas, cazas e devesa, que tinhão de maneira que quoanto na quintam avia erão obra do reo e dos seus antecessores, e nada os comendatários nem frades fizerão nas terras sobreditas e que o reo tinha feito nellas valia muitos mill cruzados (…) que pelas razões sobredtitas numqua o mosteiro autor nem seus comendatários e priores ouverão mais pensão dos possuidores da ditta quintam que quinhentos e sesenta reis em dinheiro e numqua em tempo algum receberão pão nem vinho e gallinhas de pensão della, e de tempo inmemorial a esta parte de mais de cento e duzentos annos estava o reo em poses per si e seus antecessores de não paguar mais que a ditta copia de quinhentos e sesenta reis em dinheiro, e o sabem os vivos e o (ouvir)ão aos mortos” (idem ibidem: 33). Estes argumentos convenceram o Rei Filipe II que, em 23 de Janeiro de 1607, decidiu a favor dos foreiros (idem ibidem). Durante a Guerra da Restauração, o prior de Paderne, “fez grandes serviços à pátria, como capitão-mor do seu couto” (Leal, 1875).

Tomás das Quingostas: herói do povo ou salteador? IV








A partir do Verão de 1835 as coisas aquecem ainda mais...
No Verão de 1835, multiplicaram-se as investidas de Quingostas e da sua quadrilha e as várias tentativas para conseguir o seu desmantelamento revelavam-se infrutíferas, o que ditará uma mudança de estratégia. Em Outubro desse ano, lançou-se um novo plano, que previa a atribuição de um prémio pecuniário a quem o denunciasse e entregasse às autoridades.

No mês seguinte, face ao pendor cada vez mais político assumido por esta organização,foi planeado um ataque, que envolveu alguns batalhões de guardas nacionais, do qual resultou a prisão de vários dos parceiros do guerrilheiro. Aliás, os poderes nacionais tomaram consciência da verdadeira importância desta guerrilha, quando, nesse mesmo mês, Quingostas sitiou a vila de Valadares, arrombou a cadeia e dela retirou José Luís Alves Azevedo, um preso político que tinha sido oficial do exército realista, mais propriamente ex-capitão das ordenanças da freguesia de São Miguel de Valadares.

Segundo testemunhas, praticou este acto “dando vivas ao usurpador e cantando o Hynno Absolutista”. Neste ataque, Quingostas comandava cerca de 40 homens bem armados. As autoridades, nomeadamente as judiciais, mostravam-se atemorizadas com o aumento do número de rebeldes e com a aceitação que estes gozavam em algumas povoações.



Apesar da realização de uma batida e da captura de alguns dos seus sequazes, nomeadamente do famigerado “Branco”, o certo é que Quingostas continuava a monte. O apoio de que desfrutava, optou, mais uma vez, por uma nova estratégia, que assentava na responsabilização das populações. Assim, em Dezembro do mesmo ano, foram afixados editais em todos os concelhos da raia, ordenando que “logo que conste que o chefe dos salteadores, ou alguns de seus sócios he acoutado em qualquer casa, o chefe de família ficará desde logo responsável pelo individuo que agasalhou, e será entregue à authoridade judiciária para o julgar conforme a lei.”
Havia agora a tentativa de responsabilizar como cúmplice quem contactasse com o grupo. No dealbar de 1835, José Manuel Gonçalves, professor, que tinha sido encarregado pelo administrador do concelho de Melgaço de vigiar Quingostas, foi ferido por este em plena feira, na freguesia de Paderne, concelho de Valadares, numa clara demonstração de poder, sob o olhar de várias testemunhas, que nada fizeram para impedir tal atentado nem para socorrer o ferido. Se o carácter político do bando era já uma certeza, também o apoio dos povos das freguesias de Valadares e Melgaço se tinha tornado uma realidade.
Por medo ou concordância, as populações mantinham-se silenciosas e apoiavam o grupo de rebeldes e saqueadores. Na freguesia de S. Paio, à chegada de militares e de representantes do poder administrativo e judicial, os populares afastavam-se, usando sinais para avisar o bando, quando este ali se encontrava, da presença das autoridades.
(CONTINUA...)

Informações extraídas de:
"ESTEVES, Alexandra Patrícia Lopes (2010) - Entre o crime e a cadeia: violência e marginalidade no Alto Minho (1732 - 1870). Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Instituto de Ciências Sociais.