Desconhece-se o autor do cruzeiro quinhentista mas, na capela que o alberga, existe, numa das pedras do arco, um letreiro onde se encontra insculpido o nome de Isabel Gonçalves. Segundo Augusto César Esteves, “esta boa mulher viveu na viIa e faleceu em 21 de Dezembro de 1773 no estado de viúva de João Gonçalves; mas o testamento da mesma esclarece por esta forma como o alpendre se fez: «Em nome de Deus amen. Aos seis dias do mês de Dezembro de mil setecentos setenta e três, nesta vila de Melgaço e casas de morada da testadora... a qual estava doente de cama... e quanto ao temporal disse pela maneira seguinte: que ela testadora administrava com licença do Reverendo Abade as esmolas do Cruzeiro de Carvalho do Lobo e que delas tinha feito obras, porém que ainda tinha das mesmas esmolas passava em sua mão oito mil réis, e que queria que estes ditos oito mil réis não os gastando ela testadora enquanto viva em obras pertencentes ao dito Senhor seus herdeiros os entregariam a quem por direito pertencer e quanto às esmolas que se tem arrecadado depois dela testadora estar doente delas dará conta sua sobrinha Maria Luísa na consciência de quem descarrega ela testadora a sua.»” (Esteves, 2003: 553).
Para Augusto César Esteves o documento refere a data em que se resolveu transformar o cruzeiro “no oratório do Senhor dos Aflitos, como sempre se ouve apelidar, não obstante um documento pouco mais recente, o testamento feito em Janeiro de 1787 por D. Caetana Vitória Teixeira Coelho de Castro Noronha e Melo, esposa de Miguel de Castro Sousa Vasconcelos, fidalgo da Casa Real e terceiro administrador do Morgado do Reguengo, se lhe referia por esta forma: «... e que se lhe daria ao Senhor da Carreira de Carvalho do Lobo meio alqueire de trigo...»”(idem, ibidem).
Hoje, esta Capela encontra-se em relativo bom estado de conservação mas poderia já não existir se tivesse sido concretizado em 1979 um projecto de loteamento e urbanização que implicava a sua demolição.
Valeu-lhe o Prof. Dr. José Marques com um texto, publicado no ‘Diário do Minho’ e ‘Voz de Melgaço’, apelando às entidades responsáveis pela aprovação do referido projecto “para a urgente necessidade de se impedir a demolição da referida capela e de se exigir o estudo de uma solução urbanística que a enquadre correctamente, lhe respeite a função tradicional e valorize o seu significado histórico e artístico” (Leite, 2002: 189-191). Recomendava ainda que “deve ser criada uma área de protecção, sem esquecer a fixação de cércea adequada para os prédios circundantes mais próximos” (idem, ibidem: 189-191).
O apelo foi ouvido, organizou-se o processo de classificação que se enviou à Comissão Organizadora do Instituto de Salvaguarda do Património Cultural e Natural a qual emitiu em 29 de Novembro de 1979 um parecer, homologado na mesma data pela Secretaria de Estado da Cultura, “ficando, assim, a capela do Santo Cristo e o cruzeiro manuelino que ela abriga classificados como monumentos de valor concelhio” (idem, ibidem).
Decorridos cerca de nove anos após a sua classificação, a Capela de Santo Cristo estava ainda sem o arranjo urbanístico reclamado pelo Prof. Dr. José Marques de que resultava estar “entulhada, por três lados até à altura de uns dois metros”(idem, ibidem), após terem sido “construídos muros de suporte que entestam na capela, tanto do poente como do nascente, e para aí foi removida grande parte da terra da nesga de uma pequena leira de cultivo e vinha até então existente à frente deste monumento. O proprietário do campo, para segurar as ramadas chumbou prisões metálicas na parede da Capela”(idem, ibidem).
Para aquele investigador seria indispensável “proceder ao desaterro da área circundante de modo a evitar as infiltrações de água provenientes da superfície do campo” (idem, ibidem). O seu estado de degradação acentuou-se após a queda da cobertura “decepando o braço esquerdo do cruzeiro manuelino e da imagem do Santo Cristo” (idem, ibidem) o que justificou novo alerta do Prof. Dr. José Marques no sentido de ser efectuado o restauro da capela e de dotar o seu espaço envolvente da ‘solução urbanística correcta’.
A Câmara Municipal de Melgaço correspondeu a este novo apelo tendo nomeado uma Comissão para o restauro da capela “comprometendo-se a subsidiar parte das referidas obras, quer em atribuição de verbas, quer na cedência do pessoal para limpeza” (idem, ibidem). A população ficou de tal modo sensibilizada que também quis contribuir para as despesas promovendo um peditório.
Restaurou-se a capela e desafectou-se do cultivo o seu espaço envolvente podendo-se agora circular à sua volta. Contudo não se resolveu o problema do altar de cimento adossado à base do cruzeiro e que o Prof. Dr. José Marques recomendava fosse retirado “com a máxima cautela, não só evitar que o fuste da coluna do cruzeiro venha a quebrar, também para se verificar se na base está gravada a data da eventualmente coincidente com a de 1516, pintada num dos cunhais da fachada” (idem, ibidem).
Esta capela aparece implantada em meio urbano periférico, numa pequena placa envolta por vias e construções, apresenta planta quadrada com paredes autoportante de granito caiadas e realçadas por cunhais pilastrados que sustentam entablamento e cornija saliente, elementos em granito aparente, de apoio ao vigamento do telhado de quatro águas.
Na fachada, virada a norte, abre-se portal com arco pleno resguardado por gradeamento em ripado vertical de madeira. Pequenos bancos enquadram a entrada.
No interior encontra-se o Cruzeiro de Santo Cristo, obra de escultor popular com o fuste da coluna pintada a azul e incrustada de bosantesdourados. Encima-a capitel também azul onde se insere cruz com a imagem de Cristo.
- DORDIO, Paulo/DGEMN - Capela de Santo Cristo e o cruzeiro de Santo Cristo do Carvalho de Lobo, n.º IPA: PT011603180021, 1995. Disponível em WWW: <http://www.monumentos.pt>.
ESTEVES, Augusto César - Obras completas, reed. C. M. de Melgaço, Melgaço, 2003, Vol. 2.
LEITE, Antero -A conservação do Património e o Desenvolvimento Rural, in ‘Boletim Cultural’,n.º 1, 2002, p. 162-216.
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