Melgaço - Vista Geral |
Melgaço na viragem para o século XX
Em 1839, foi aberta
uma investigação na sequência de um documento que chegou à junta de paróquia de
Paderne, contendo protestos de alguns dos habitantes daquela freguesia do concelho
de Melgaço, relacionadas com os cinco anos de aboletamentos contínuos que sobre
eles recaíam, devido à permanência de militares na praça de Melgaço. Segundo
aquele documento, reenviado ao general da província do Minho, as populações
estavam obrigadas a boletos de 10 dias consecutivos de água, lenha, luz e sal.
Ainda segundo a mesma queixa, em 29 de Agosto de 1839, tendo um dos habitantes
falhado com a sua obrigação, por falta de meios, um oficial atacou a casa do
padre Manuel Álvares, da referida freguesia, obrigando-o a fugir juntamente com
a sua família. No entanto, o comandante da linha do Alto Minho apresentava uma
versão diferente dos factos. Os boletos eram rotativos, afectando todas as freguesias
do concelho de Melgaço, por um período de 10 dias, entre as casas mais abastadas.
Em várias situações,
os aboletados mais afastados do local onde permanecia a força militar
substituíam a sua obrigação pelo pagamento dum montante em dinheiro. No que
respeita ao episódio de Paderne, o comandante afiançava, apoiado no depoimento
dos cabos de polícia e do regedor desta freguesia, que não tinha conhecimento
de tal ocorrência, concluindo que era falsa a acusação levantada contra as
tropas e que o documento apresentado ao general da província do Minho tinha
assinaturas forjadas.
De
facto, várias das pessoas implicadas declararam nos seus depoimentos, por
escrito, não ter assinado tal documento, como consta do excerto seguinte:
“Declaramos que não são nossas as
assignaturas que nos forão aperguntadas em hum requerimento contra tropa que
ficou aquartellada no lugar de Golães, pois pello contrario se comportarão
muito bem conforme hé constante. Melgaço 17 de Outubro de 1839.”
Alguns dos
subscritores, desconhecendo o conteúdo da queixa, insurgiram-se contra os aboletamentos,
mas não contra os militares, nem contra o seu comportamento, por isso assinaram
o documento, uma vez que lhes tinha sido prometido que este seria entregue à
Junta de Distrito com o propósito de serem aliviados dos aboletamentos. Concluiu-se que as acusações
eram falsas, algumas das assinaturas pertenciam a pessoas que nem sequer existiam,
ou que eram analfabetas, ou que tinham sido aliciadas para assinarem em branco.
Deste modo, tudo
apontava para um esquema montado no sentido de criar um episódio que, descredibilizando
o comportamento dos militares, poderia ditar o seu afastamento e, assim, promover
o fim dos aboletamentos sobre os habitantes da freguesia, até porque os
protestos não eram inéditos no concelho. Em 1838, na sequência de várias
queixas apresentadas pelos habitantes do concelho de Melgaço, o governador
civil determinou que não fosse exigida aos habitantes das povoações mais do que
cama, água, sal, lenha e luz.
De facto, os povos
sentiam-se vexados com este encargo, e disso mesmo davam conta aos
administradores dos concelhos, que consideravam que esta era uma obrigação
difícil de cumprir, sobretudo na época das sementeiras e colheitas, quando eram
mais intensas as tarefas no campo. Para além deste encargo, as populações
estavam ainda sujeitas aos abusos e excessos praticados pelos militares. As sucessivas
deserções de soldados armados, que ocorriam neste período, em nada contribuíam
para a segurança da região e para a dignificação da classe junto da opinião
pública.
Informações recolhidas em:
- "ESTEVES, Alexandra Patrícia Lopes (2010) - Entre o crime e a cadeia: violência e marginalidade no Alto Minho (1732 - 1870). Tese de Doutoramento, Universidade do Minho, Instituto de Ciências Sociais.
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