A igreja do convento de Paderne - porta principal
Estamos perante uma igreja predominantemente
românica-gótica ou protogótica, apresentando elementos barrocos como, por
exemplo, a capela-mor rectangular e profunda e a decoração azulejada existente
no interior.
Enquadra-se em meio rural, dispõe de vasto largo fronteiro,
de espaço envolvente e adro murado, acedido por pequena escadaria no portão de
acesso e definido a sul pelo corpo das dependências conventuais a que se
adossa, corpo projectado significativamente para oeste relativamente à
frontaria.
No adro encontram-se duas cruzes de granito. A norte
desenvolve-se cemitério confinante com o braço do transepto. Como outras
igrejas conventuais da época e da região do Alto Minho, é construída em
cantaria autoportante de granito aparente com a introdução pontual de contrafortes,
excepto o preenchimento dos paramentos da torre, introduzida posteriormente,
que são rebocados e pintados a branco. A planta é disposta longitudinalmente,
em cruz, com nave única rectangular (estreita, alta e pouco profunda) com coro
alto, transepto acentuado, cabeceira de três capelas: capela-mor rectangular,
com corpo de largura e profundidade semelhantes ao da nave, e duas capelas
laterais, também rectangulares. Sobre a capela do lado da epístola, eleva-se a
torre sineira acedida por escada lateral, situada entre a sacristia anexa a sul
e a cita capela. As coberturas são diferenciadas a uma, duas e três águas. A torre tem
dois registos, o último dos quais reservado a campanário de quatro sineiras, e
é rematada por cobertura ‘plana’ e pináculos a coroar os cunhais. A frontaria,
voltada para poente, composta por portal ‘axial’ em arco pleno de cinco
arquivoltas e capiteis decorados com motivos vegetalistas, ombreiras salientes
e arcadas marcadas por chanfros acentuados, denunciando uma linguagem
protogótica (Almeida, 2001: 89-90), encimado por janelão rectangular, possui
remate angular protegido por cápeas de granito, coroado por cruz latina no
vértice e pináculos nas extremidades elevados sobre bases paralelipipédicas.
Por exemplo, para Reinaldo dos Santos, o portal de Paderne, bem como o da
Senhora da Orada, tem “mais afinidades com a visão plástica de Paço de Sousa
que com a de Ganfei e Longos Vales” (Santos, 1955: 105). Voltado também para
poente, no braço norte do transepto, um outro portal que, apesar de ser lateral
(à semelhança do que acontece, entre outras, com a Igreja de Santa Cristina de
Ribas Sil na Galiza), apresenta características de portal principal. Por isso,
pela sua originalidade, despoletou diferentes interpretações acerca das suas
motivações, origens e acerca da morfologia da primitiva igreja e respectiva
evolução arquitectónica até à actualidade.
Tem uma traça estilística mais característica da
segunda fase do românico do Alto Minho, é em arco pleno composto por
arquivoltas com motivos sobretudo geometrizados, enxaquetados e boleados, e
capitéis com suaves adornos vegetalistas. Segundo Almeida, tal como o portal da
nave, este “grande portal do transepto tem também uma organização protogótica
e, embora mais austero, datará quase da mesma época.” (Almeida, 2001: 90).
Sobre o dito portal uma arcatura, acompanhando a sua
largura, enquadrada por contrafortes, encimada, no mesmo quadro, por um óculo
circular reentrante com circunferências ornamentadas com ‘dentilhados’.
Esta fachada, bem como a fachada nascente e a fachada
norte da nave, é rematada por cornija recta sobre cachorrada e sob beiral. A
ornamentação esquematizada e de inspiração vegetalista destes elementos bem
como a dos capitéis denunciam a evolução estilística do templo para o
protogótico afastando-se do tradicional românico da região do Alto Minho.
A fachada norte evidencia o escalonamento e as
morfologias dos volumes e apresenta, marcando ainda o mesmo braço do transepto,
um outro portal, mais austero, em arco quebrado, também protogótico, que não
será muito posterior aos dois anteriormente referidos.
Este portal está inserido numa fachada, ligeiramente
proeminente, também composta por um janelão e por irregularidades que denunciam
a existência, outrora, de outras dependências anexas a norte. É rematada por
paramento recto de ‘cantos’ cortados obliquamente e protegidos por cápeas.
Na mesma frente norte, no plano correspondente á nave,
apresenta-se um contraforte e duas estreitas frestas, uma de cada lado deste,
assentes em cornija corrida com modilhões ligeiramente abaixo; mais a nascente
desenvolve-se a capela lateral e capela-mor fenestradas por um vão rectangular
cada. A fachada nascente revela fresta na capela-mor e rosácea na nave (no pano
elevado acima da altura da capela-mor), proporcionando, juntamente com o
janelão da frontaria, uma iluminação axial da nave. Desta frente, observa-se
igualmente a singular torre. A forma, a espacialidade e as proporções denotam
francamente a mudança da traça românica minhota e as características do
protogótico da região, embora este exemplo não deva ser considerado um
paradigma pois está pejado de incoerências estilísticas e de anomalias
geométricas decorrentes de um certo descontrolo construtivo. No interior esta
percepção é muito acentuada.
O arq. Luís M. Fernandes Pinto destaca quatro
assimetrias flagrantes existentes na igreja: “implantação do portal [fora do
eixo da nave e frontaria], forma trapezoidal da nave [devido à diferença dos
vãos no transepto], dois panos de parede prolongados sobre o transepto [para
tornar semelhantes os vãos dos braços do transepto e os da nave no cruzeiro] e
não alinhamento dos eixos da nave e da capela-mor” (Pinto, 2000: 11).
Juntamente com estas dissonâncias
arquitectónico-geométricas e estilísticas anómalas, a excessiva e
desproporcionada altura da nave, quando comparada com a sua largura e
profundidade, sublinha o desequilíbrio e desconforto do ambiente gerado. Mesmo
as capelas laterais do transepto são diferentes. Seguindo os
mesmos paradigmas, no interior, os capiteis das colunas que suportam os arcos
apontados a separar o cruzeiro da capela-mor e do transepto “não lembram em
nada os exemplares túrgidos da região, em moda meio século antes. Há apenas um
historiado, com um personagem de báculo que aparece a castigar o pecado. (…) A
sua escultura é fruste, pouco volumosa, muito diferente do anterior estilo
tudense.” (Almeida, 2001: 89).
Luís Correia de Sousa destaca neste capitel a figura
de um 'arauto, um tocador de aerofone, instrumento de feitura bastante rude e
já um pouco danificado. Não se trata de uma lusão a uma qualquer prática
musical, mas antes uma representação plástica da mensagem sonora, a difusão
oral da mensagem cristã, como que chamando a atenção dos fiéis para a meditação
sobre esta representação, para os perigos de cair no pecado.
O instrumento assume então um significado simbólico,
como veículo de transmissão de uma mensagem aos fiéis, ao mesmo tempo que um
sinal de alerta' (Sousa, 2005: 5-6).
Paderne, segundo o Arq. Luís de Magalhães Fernandes
Pinto, também “surpreende pelos primores da integração do revestimento em
azulejo da capela absidal do lado do evangelho (…)
aplicado entre 1594 e 1640” (Pinto, 1981/2005: 172).
O mesmo investigadior realça que o revestimento do
forro “aparentemente modesto, não cobre os paramentos da capela absidal.
Limita-se a cobrir a parede da sua entrada, onde se abre um arco apontado, lembrando
um alfiz de tradição árabe, uma composição usada para valorização de vãos
principais.
A intenção que presidiu a este forro não foi, por
isso, pode afirmar-se, caracterizar um ambiente como azulejado, mas sim a de
destacar uma determinada parcela de um conjunto. Os azulejos encontram-se
adaptados apenas na face anterior da parede, a face vista pelos fiéis durante o
culto.
O pano superior dessa parede engloba um painel, com a
dimensão invulgar de 9x5 azulejos, representando o símbolo do Espírito Santo, a
Pomba, e é rematado no topo por três pináculos de clara influência árabe
improvisados com azulejos sobrantes. É uma atitude de pura decoração entendida
como sujeição à forma e valorização da arquitectura subjacente. A distribuição
dos padrões, barras, cercaduras e frisos foi executada por um azulejador
escrupuloso que eventualmente sem a oportunidade de outras escolhas, demonstrou
profundo e criterioso conhecimento do material a usar e do fim a atingir”
(Pinto, 1981/2005: 175-176).
Informações recolhidas em:
ADB - Registo Geral. Livro 330 (Censual), Braga, 1514-1532,
fls. 480-485. ADP - Cópia do Sequestro e Inventário dos bens do Mosteiro de São Salvador
de Paderne, 1770.
ADVC - Escritura de venda, quitação e obrigação feita
a 27de Novembro de 1772, pelo Cardeal da Cunha, Arcebispo de Évora e Inquisidor
Geral de Portugal a Luiz Rodrigues Caldas, do Mosteiro do couto de Paderne dos
cónegos de Santo Agostinho, com todos os seus edifícios, terras e todos os mais
bens, padroados da igreja de S. Salvador e suas anexas e mais igreja da
apresentação do dito Mosteiro, casas, lagares, moinhos, eiras, pesqueiras,
etc., à excepção dos foros, dízimos, dívidas activas, 1772.
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