Com a morte de António Augusto de
Sousa e Castro, seu pai e herdeiro, António Cândido de Sousa e Castro Moraes
Sarmento, proprietário do terreno das Caldas, requereu ao Ministério das Obras
Públicas, patente de invenção, por espaço de quinze anos, da aplicação
terapêutica das águas das freguesias de Prado e Paderne, concessão que obteve
em Julho de 1889 (idem, ibidem). Os outros sócios sentiram-se prejudicados e em
17 de Agosto de 1891 intentaram no Juízo de Melgaço uma acção de anulação do
privilégio resolvida por uma transacção que transitou em julgado por sentença
de Julho de 1893 (idem, ibidem).
Pouco tempo depois, em 1 de Maio
de 1894, constituiu-se, por escritura pública lavrada no Tabelião Silva, de
Monção (idem, ibidem), a ‘Empresa Santos, Sobral& C.ª’ com um “capital de
20 contos representado no Campo das Caldas. Os quinhões eram repartidos entre
sete sócios” (Lopes, 1949: 65). A esta empresa foi “transmitida a concessão
legal pelo primitivo concessionário António Cândido de Sousa e Castro Morais
Sarmento” (Jornal de Melgaço, Setembro 1917).
Em 1895 já existia um hotel
construído por António Guerreiro Ranhada, regressado do Brasil e que encontrou
no Peso a cura para o mal do fígado que o debilitava(1). A construção do hotel
não foi fácil “porque a gente do lugar não queria admitir estranhos” (Lopes,
1949: 66-67). O terreno, onde se situava uma pedreira (depoimento de D. Judite
Ranhada), foi-lhe vendido “caro, por 40$00 reis. Os recursos de Guerreiro
Ranhada parece que não eram grandes e consta que foi o industrial portuense
José Bento Pereira que o auxiliou e animou na empreza. A lotação dos dois
pavilhões construídos era, segundo Mons. Silvano, de 80 hóspedes” (idem,
ibidem: 67). Havia ainda um Parque, desenhado pelo filho José Ranhada e onde se
aplicou o granito retirado da pedreira (depoimento de D. Judite Ranhada).
As águas do Peso começaram,
então, a conhecer um período de grande procura e a proporcionar grande animação
na localidade “quando a sociedade dos aquistas convivia com a sociedade
distinta dos arredores. Foi uma prova dessa animação a festa que teve lugar no
dia 26 de Julho de 1895 presidida pelo Visconde de Fragosela, festa oferecida
pela colónia aquista do Peso às pessoas distintas dos «povos das cercanias» com
Zé Pereira, jantar, foguetes, jogos, ornamentação, música...” (idem, ibidem:
71).
Ainda não eram os bailes dentro
dos hotéis que animavam as tardes e noites do Peso. Os aquistas seguiam os
conselhos de Ramalho Ortigão: “Não será dançando os lanceiros ao som de um
piano ou da filarmónica da terra, no meio de tão mau ar, tão viciado e
miasmático como o do teatro de S. Carlos em Lisboa ou do Baquet no Porto, que
vós ajudareis a vossa cura e a vossa alegria. As festas que vos convêm são as
festas ao ar livre, em pleno dia, sobre a relva, debaixo de árvores, à grande
luz” (Ortigão: 25).
Entre 1897 e 1898 inscreveram-se
nas Termas 731 aquistas. “Eram diabéticos, hepáticos, gastrálgicos, nefríticos,
etc., de perto e de longe, não faltando também de Lisboa. Os provenientes da
Galiza faziam o transbordo na estação de Guilharei para o comboio da linha de
Orense e apeavam-se em Arbo, em frente do Peso. Atravessando o rio - o morgado
de Reguengos pusera uma barca para passar de graça, evitando as disputas dos
barqueiros portugueses e espanhóis - com mais meio quilómetro a pé, estavam na
estância. O pior era esse meio quilómetro, a subir. Outros preferiam a
diligência, que da estação do caminho de ferro de Valença os conduzia em 5
horas por 450 rs., ou em trens por 5$000 rs. faziam o mesmo percurso em menos
de uma hora ou hora e meia” (Lopes, 1949: 71).
Em 3 de Junho de 1898, a
concessão atribuída a Santos, Sobral & C.ª foi“ratificada por alvará do
Ministério das Obras Públicas ficando a empresa investida na posse de todos os
direitos de exploração vitalícia das nascentes”(Jornal de Melgaço, Setembro
1917).
Um diploma, publicado no Diário
do Governo de 24 de Setembro de 1898, havia fixado os preços dos serviços
termais: “Por 1$500 rs. o aquista tinha direito ao uso das águas na copa, a
levar 330gs. para cada refeição ao preço de 20 rs., a duas consultas, uma no
início e outra no final do tratamento para conhecer o regime a seguir, e uma
análise de urinas. Fora disto, consulta no gabinete a 500 rs., e a 1$000 rs. No
hotel e análises a 1$500 rs” (Lopes, 1949: 73).
Estes preços contribuíram, de
certo, para a cada vez maior afluência de aquistas justificando a construção em
1901 do ‘Novo Hotel Quinta do Peso’. Um dos seus primeiros hóspedes foi o
conselheiro Manuel Francisco Vargas, ministro das Obras Públicas, que era
acompanhado de sua esposa (Vaz, 1996: 214).
O maior afluxo de pessoas às
Termas do Peso e consequente maior consumo de água mineral obrigou a Empresa
Santos, Sobral & C.ª a executar o projecto de pesquisa de novas captações
aprovado na reunião de 14 de Setembro de 1899. Surgiu então um conflito com a
Viscondessa do Peso, proprietária dos terrenos adjacentes e onde a empresa
pretendia efectuar os trabalhos de pesquisa. Havendo recusado a proposta de
entrar como sócia da empresa resolveu também efectuar uma exploração de
nascente de água mineral que brotava no seu prédio rústico tendo requerido em 5
de Março de 1904 a respectiva licença. A empresa reclamou com o fundamento de
serem “más as condições das águas de Melgaço; o caudal da nascente é pequeno, 1
litro por 24”,8 e tem sofrido variações grandes, chegando quási a desaparecer
em consequência de trabalhos executados nas proximidades” (Lopes, 1949: 74-76).
Pela Portaria de 11 de Novembro
de 1904 entrega-se à Empresa Santos, Sobral & C.ª um “perímetro reservado
de 15 hectares para a exploração das águas, só então tornando possível o início
da sua expansão, com todos os investimentos a ela associados” (Câmara Municipal
de Melgaço). Captações definitivas foram então efectuadas e concluídas em
Agosto de 1906, com resultados que ultrapassaram as melhores expectativas - “o
caudal disponível sofreu um enorme aumento, tendo passado de 2.482 litros/dia
(verificados em 1904) par um débito de mais de 8.000 litros/dia (medições de
1907), mais do triplo!” (idem, ibidem).
Foram realizadas outras análises
químicas e bacteriológicas, efectuadas pelo Prof. Charles Lepierre e Dr.
António Cruz Magalhães. “As águas repartiam-se por três nascentes muito
próximas, mas de diferente composição. As duas, descobertas em época posterior
à Principal, vieram, em gradual diminuição a extinguir-se. A Principal, a mais
rica das bicarbonatadas cálcicas portuguesas” (Lopes, 1949: 77) revelava
elevado teor em magnésio e ferro, sendo também ‘arsenical’ e‘litinada’ (idem,
ibidem).
Com estes resultados das
análises, a empresa decidiu realizar a construção de um pavilhão para a
Nascente Principal substituindo a ‘buvette’ existente. As obras do novo
edifício, concebido pelo Eng.º Couto dos Santos, iniciaram-se em 1909 tendo
importado em 43 contos, o equivalente a cerca de 600.000 euros considerando a
reavaliação decorrente da inflação (Câmara Municipal de Melgaço).
A actividade termal passou a
justificar investimentos como o de José Figueiroa Granja, de Vigo, que adquiriu
em 19 de Fevereiro de 1912 a José Joaquim Esteves o ‘Novo Hotel da Quinta do
Peso’ e para a sua exploração constituiu-se a sociedade ‘Figueiroa & Ribas’
na qual participava um outro galego Don Francisco Ribas (Vaz, 1996: 221). Em
Maio daquele ano, Iniciou-se o transporte de passageiros entre Melgaço-Valença
e vice-versa por ‘auto-ónibus’, de Cícero Cândido Solheiro, utilizando uma
‘Berliet’ de 22HP com lotação para 20 de passageiros e capacidade para 600
quilos de bagagens(2) (idem, ibidem). Em 23 de Agosto de 1913, é inaugurado no
Peso o animatógrafo «Salão de Melgaço»também explorado por Cícero Cândido
Solheiro. Cada entrada custava 50 centavos e dava direito ao transporte de ida
e volta da Vila na carreira (a «Auto Melgaço») que aquele empreendedor havia
inaugurado no ano anterior (idem, ibidem: 222).
O crescimento da actividade
termal estava a causar alguns problemas por falta de um normativo regulador da
prestação dos serviços aos aquistas. No ‘Jornal de Melgaço’ de 10 de Março de
1917, a empresa publica o ‘Regulamento do estabelecimento hidrológico das Águas
Minerais de Melgaço’. Estipulava que o pessoal técnico ficaria subordinado a um
Director Clínico e será “composto de um médico legalmente habilitado para o
exercício clínico em Portugal e do pessoal para fazer os engarrafamentos e
fornecer junto às nascentes a água para bebida”(Jornal de Melgaço, 10 de Março
1917). Não era permitido ao aquista fazer uso das águas sem prévia consulta do
director clínico. Exceptuavam-se desta disposição as pessoas que apresentassem
prescrição escrita do seu médico assistente, a qual seria homologada pelo
director clínico (idem, ibidem). Também só era permitida a entrada no pavilhão
da nascente mediante a apresentação do cartão de admissão. Aos doentes
afectados de ‘doenças contagiosas’ (na altura a sífilis e a tuberculose eram as
principais) ou‘asquerosas’ (?) era imposta a “condição de isolamento em lugar
apropriado devendo todos os seus objectos serem apartados e desinfectados
tantas as vezes quantas forem necessárias” (idem, ibidem).
Contudo, existiam carências nas
Termas e na sua envolvente. No ‘Jornal de Melgaço’de 21 de Julho de 1917, um
artigo de Gregório Fernandes chamava a atenção para o estado da estrada de
acesso à estância “empoeirada, sem arborização, na qual invoca um atalho
íngreme, pedregoso, interrompido quase no final por uma tosca ponte de pinho
que atravessa um riacho” (Jornal de Melgaço, 21 de Julho de 1917). A seguir
referia-se ao edifício da ‘buvette’ como um “pesado pavilhão ainda por
concluir” (idem, ibidem) e afirmando que “à sua volta não se podia passar pois
o espaço é acanhadíssimo e a higiene pouco recomendável” (idem, ibidem). Citava
ainda a falta de um balneário “indispensável a completar o tratamento por
ingestão e absolutamente reclamado e preconizado pela sciência”(idem, ibidem).
Como respondendo a este libelo
acusatório, em Agosto de 1917, a gerência das Termas apresentou na Repartição
de Minas um plano de melhoramentos. Da autoria do Eng. Couto dos Santos, o
projecto incluía a ampliação do Hotel da Quinta do Peso passando a dispor de
capacidade de alojamento até 350 hóspedes; a construção de um casino, um ginásio
e um lago com função hidrostática servido de barracas de natação.
Paralelamente desencadeia-se,
segundo o ‘Jornal de Melgaço’ de 8 de Setembro de 1917, uma‘campanha de
descrédito’ pela falta de higiene na ‘buvette’ com a entrada no Ministério do
Interior de uma queixa da Delegação de Saúde de Viana do Castelo no qual se
afirmava que “o engarrafamento das águas se fazia sem prévia esterilização das
garrafas e que não era perfeita a lavagem” (Jornal de Melgaço, 8 de Setembro de
1917). Para o articulista, tais informações eram‘inexactas’, pois não só as
estufas estavam a funcionar à vista do público, como se empregavam os ‘melhores
processos’ sendo a água utilizada “potável e quimicamente puríssima, conforme a
análise n.º 897 do Laboratório de Análises do Posto Médico Central do Porto”
(idem, ibidem).
Informações recolhidas em:
- http://acer-pt.org/vmdacer/index.php?option=com_content&task=view&id=602&Itemid=65
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