quinta-feira, 12 de julho de 2012

A Igreja Paroquial de São Paio: Do mosteiro medieval até à remodelação de 1930


Trata-se de uma igreja com planta longitudinal composta de nave única e capela-mor, mais baixa e estreita, tendo adossado à fachada lateral direita torre sineira quadrangular e sacristia rectangular. Volumes escalonados com coberturas diferenciadas em telhados de duas águas na igreja e sacristia, mas esta disposta perpendicularmente, e coruchéu bolboso na torre, coroado por cruz latina luminosa. Fachadas em alvenaria ou cantaria aparente, de aparelho muito irregular, denotando as várias intervenções ao longo dos séculos, com cunhais apilastrados na nave e torre sineira e terminadas em friso e cornija, sobreposta por beirada simples. Fachada principal virada a O., terminada em empena, levemente truncada, rematada por cruz latina de braços trevados sobre acrotério; é rasgado por portal em arco de volta perfeita, com chanfro, sobre dois colunelos de capitel vegetalista, e com tímpano liso sobre impostas salientes, e por janela rectangular com elemento estilizado sob a moldura; no topo, surge silhar com data de 1930 inscrita e elemento concheado. Nos extremos da fachada o aparelho no lado direito integra pilastra e arranque de um arco. Torre sineira no alinhamento da fachada, de dois registos, separados por friso, o segundo rasgado, em cada uma das faces, por sineira em arco de volta perfeita sobre pilastras e albergando sino; nos cunhais possui fogaréus. Fachada lateral esquerda rasgada na nave por duas janelas de verga abatida e moldura terminada em cornija, e capela-mor por janela rectilínea de moldura simples; na capela-mor o aparelho possui vestígios da abertura de uma fresta de perfil curvo. Na fachada lateral direita a torre tem o primeiro registo com cartela inscrita com a data de 1900 e é rasgada por vão quadrangular e óculo circular; na face posterior abre-se porta de verga recta sobrelevada, precedida por escada de pedra; sobre a sineira possui florão relevado. O aparelho desta fachada denota a existência de antiga porta travessa em arco de volta perfeita e a existência de várias frestas de perfil curvo; a nave é rasgada por duas janelas de capialço e, sensivelmente a meio, por porta travessa de verga recta, e a capela-mor por janela rectilínea; a sacristia é rasgada a O. por porta de verga recta, protegida por pequeno alpendre e, lateralmente, por duas janelas jacentes. Fachada posterior da capela-mor terminada em empena, coroada por cruz latina de braços quadrangulares e remate trevado sobre plinto, e a sacristia por duas janelas jacentes. Urbano, isolado no interior da aldeia, junto à estrada que a atravessa, integrado em adro, delimitado por muro de cantaria, com acesso frontal, por portão de ferro, ladeado por altos plintos paralelepipédicos, coroados por fogaréus sobre bases.
Na fachada lateral direita, entre a torre e a janela, existe nicho em arco de volta perfeita, interiormente albergando imagem pétrea, ladeado por duas pilastras suportando friso e cornija contracurvada, coroadas por pináculos piramidais sobre plintos; a bacia do nicho assente em larga voluta inferiormente decorada com pingentes.


Já aqui me referi a esta igreja num post anterior. Mencionei um antigo mosteiro que aqui existia construído durante a Idade Média. No que toca a esta construção, daquilo que se conhece, 1623 é a data do primeiro registo de baptismo documentado. O ano de 1624 é data do primeiro registo de casamento documentado sendo que 1626 é a data do primeiro registo de óbito documentado. O ano de 1687, a 4 Agosto, o visitador da Câmara de Valença, pelo arcebispo de Braga, D. Cristóvão da Costa Rosa, abade de Santa Eulália de Crespos, manda os fregueses fazerem um alpendre à porta da igreja, de grandeza e capacidade para receber a mais gente que a igreja não era capaz de albergar; devia fazê-lo, tornando assim a igreja com maior capacidade e as portas com maior resguardo dos temporais, até à Páscoa vindoura, sob pena de 10 cruzados. Em 1688, a 8 Novembro, o visitador, licenciado Manuel Dias, Abade de São Miguel de Soutelo, refere que os fregueses não cumpriram as ordens do visitador do ano anterior, nem consertaram o coro, nem fizeram o alpendre, incorrendo assim em 6$000 de pena, pelo que os aliviava na maior pena e os condenava apenas em 10 tostões. A 1690, em 6 Julho, o Dr. João de Araújo de Azevedo, Vigário Geral da Comarca de Valença, diz que os fregueses não deram satisfação ao pórtico da igreja como lhes fora mandado repetidas vezes, relevando-os das penas dos capítulos por saber que eles fizeram outras obras necessárias na igreja e por saber que eles queriam acrescentar a igreja ou no comprimento ou fazendo outra nave para o lado da Epístola, conforme fosse mais conveniente. Em 1695,  manda-se o fabriqueiro consertar o retábulo-mor, enquanto não houvesse rendimento para lhe pôr um novo. Em 1697, a 10 Novembro, o visitador Dr. João Rumate de Almonçan manda que, no prazo de 2 meses, os fregueses resolvam com o abade fazer o acréscimo da igreja ou, não querendo, façam o pórtico, conforme indicado nas visitas anteriores, sob pena de 8$000. Em 1698, a 11 Novembro, o visitador Dr. António Lopes da Fonseca refere que já estava armado o dito pórtico e tinham cal, e telha aparelhada para o cobrir. Em 1709, o visitador refere que a igreja necessitava de um retábulo-mor novo, pois o que tinha estava podre e aberto em duas partes, de tal modo que na Semana Santa, os fregueses tinham medo de montar o sepulcro para exposição do Senhor. Assim, mandava que, no prazo de um ano, fizessem um retábulo-mor novo pelo oficial perito na arte. Em 1711, a 30 Novembro,  o visitador Dr. Pinheiro Ramos achou a igreja disforme e desproporcionada no corpo, de modo que não era possível todos os fregueses ouvirem missa; o corpo principal da igreja era a menor parte dela, sendo muito maior a nave que tinha do lado da Epístola, da qual não se via o altar-mor. Achando que a igreja não se podia remediar, manda assim fazer no mesmo sítio, uma igreja nova, de uma só nave, ou um só corpo, com proporção, valendo-se do dinheiro necessário das confrarias. Para tal se devia fazer a planta da igreja por quem o entendessem, não lhe fazendo obras exteriores de pedraria desnecessárias, mas apenas as necessárias, como a porta principal, duas travessas e frestas e no interior só o púlpito, com sua escada, e coro, e tudo mais chão. A obra devia ser posta a lanços e ser arrematada por quem a fizesse mais barata. A capela-mor também se devia fazer de novo, correspondente à igreja. Em 1713, o Dr. Domingos da Mota, abade de Santa Maria de Ferreiros, anunciou haver conseguido para os gastos da obra do altar-mor mais de 40$000. O visitador impôs ao abade a obrigação de avisar o arcebispo e a Casa de Bragança para ambos concorrerem para a obra. Para as obras do corpo da igreja aconselha os fregueses a tirarem algumas esmolas na freguesia pelo São Miguel e que se fosse reservando para elas o dinheiro das confrarias. A 1714, em 19 Agosto, é mencionado que visto se demorar a obra do corpo da igreja, o visitador, Dr. João de Carvalho Leitão, abade de São Tiago do Castelo de Neiva, manda os fregueses, repararem o telhado e forro, para que não chovesse no coro e pincelem o interior, até ao fim de Outubro, sob pena de 2$000. Em 1715, a 18 Julho, o visitador Dr. António de Sousa Marim, refere que muito havia que prover na Igreja, principalmente sobre o fazer-se de novo, porque a freguesia tinha cerca de 1.000 pessoas de sacramento, não cabendo nela nem a terça parte do povo, e dos que cabiam não viam o altar-mor nem o celebrante, por causa de um altar colateral colocado num arco com que se formava uma limitada nave, que lhe impedia a vista. Além disso, o madeiramento do corpo da igreja ameaçava ruir, estando já o coro incapaz de servir. À feitura da capela-mor devia concorrer a Casa de Bragança e o abade, cada um com a quarta parte. Não se devia fazer outras obras enquanto não se reedificasse a igreja e capela-mor. A 1716, em 20 Agosto, pela visitação sabe-se que a obra de reedificação da igreja ainda não tinha sido iniciada. O Dr. João de Carvalho Leitão manda apenas os fregueses retelharem o telhado sobre o coro e serventia dos sinos, que ameaçava ruína e reparar com madeira o dano do forro até ao fim de Outubro, sob pena de 2$000. Em 1718, o visitador Dr. Domingos Gomes da Mota, abade de Santa Maria de Ferreiros, refere que a obra ainda não fora iniciada, nem os fregueses fizeram diligências em ajuntar dinheiro para ela. Manda pois os fregueses, no prazo de um ano, iniciarem a obra do corpo da igreja pela planta que o abade tinha, sob pena de 20$000; os fregueses deveriam fazer logo a coberta da pia baptismal, devendo suspender a obra do coro. Em 1719, a 29 Agosto, o visitador Dr. Manuel Pinheiro Ramos manda os fregueses endireitar as campas do corpo da igreja e reformar o coro e respectiva escada. Em 1720, a 9 Dezembro, o visitador Dr. Manuel Ramos manda consertar o telhado do cabido e fazer de novo a porta travessa de madeira, com fechadura. Em 1724, a 16 Novembro, o visitador Dr. Francisco de Oliveira Rego, prior da colegiada da Matriz de Ponte de Lima, refere que os fregueses não retelharam o cabido ou alpendre da igreja, o que deviam fazer até à próxima visita, sob pena de 2$000. Em 1735, a 20 Julho, o visitador Dr. Gonçalo Pinto de Carvalho Medeiros, abade de Santa Marinha de Soutinhães manda os fregueses, no prazo de 6 meses, consertar o forro da igreja e telhados, por estarem arruinados e saber que chovia na igreja como na rua, sob pena de 2$000. Em 1736, manda-se aplainar o corpo da igreja, no prazo de 6 meses. Em 1737, manda-se fazer a mesma obra. Por ter falta de luz, o visitador mandou abrir uma fresta no meio da parede da nave com a altura e largura necessária para dar luz aos altares colaterais. O cabido da igreja ameaçava ruir por se lhe ter tirado muita telha para reformar o corpo da igreja, mandando assim retelhá-lo, tudo sob pena de 6$000. Em 1754, a 2 Setembro, o visitador Dr. Marcelino Pereira Cleto, abade de São Miguel de Entre os Rios, informa que, devido à grande despesa que seria necessário, não se reconstruiu a igreja, conforme fora ordenado, porém a igreja achava-se bem reformada, só lhe faltando reformar em correspondência a capela-mor, onde existia um retábulo mais antigo e que não podia servir, mandando fazer-lhe uma tribuna, como desejavam os oficiais da Confraria do Santíssimo. Assim, manda reformar a capela-mor do que fosse necessário e fazer um novo retábulo-mor, concorrendo os oficiais da dita confraria para a despesa da tribuna. Em 1755, a 1 Novembro, refere-se nos registos que não sofreu ruína no terramoto. Em 1758, a 8 Maio, segundo o abade Domingos Gomes nas Memórias Paroquiais, a freguesia pertencia à comarca de Valença, arcebispado de Braga e termo de Melgaço. A freguesia tinha 249 vizinhos e 713 pessoas. A igreja, com orago de São Paio, tinha naves, uma com três arcos, e cinco altares, o do orago, onde estava o Santíssimo Sacramento, o da Senhora do Rosário, o da Senhora do Carmo, o do Santo Cristo e o das Almas. Tinha a irmandade do Santíssimo Sacramento, a da Senhora do Rosário e a das Almas. Era abadia com apresentação da câmara eclesiástica de Braga, que na época era o abade Domingos Gomes, que tinha de renda 200$000, excepto os incertos, por não receber mais que a quarta parte dos frutos, pois a metade dos frutos da freguesia eram da Mitra Primaz e a outra quarta parte eram da Casa de Bragança. Em 1760, a 9 Março, segundo o visitador, o retábulo-mor estava muito velho e em parte comido pelo caruncho, não podendo expor o Senhor nas festividades da semana Santa devido à pequenez do retábulo. Em 1782, a 16 Novembro, o visitador, reverendo António Manuel da Costa e Melo, cónego da colegiada de Viana e prior de Nossa Senhora de Monserrate, refere que o retábulo-mor estava caindo aos pedaços, necessitando-se de um novo e, para melhor o acolher, manda acrescentar a capela-mor 4 ou 5 palmos de comprido, pedindo primeiro licença ao Arcebispo de Braga. Refere que se devia rebaixar o altar, tirando um degrau, e levantar-se o arco triunfal. Já que na fábrica havia dinheiro para as obras de São João Baptista, que estava em estado miserável, e as da igreja, manda o fabriqueiro dar cumprimento à obra no prazo de um ano. O retábulo devia ser feito à moderna, com pouca talha. Em 1784, a 15 Julho, o visitador, Dr. José de Barros Almeida, abade do Salvador Real, reafirma a necessidade de reformar a capela-mor e de se fazer um novo retábulo. Em 1795, a 14 Julho, pelo visitador Dr. Inácio José Caldas, abade de Cabanelas, sabe-se que tudo estava na mesma. Em 1797, o visitador considerou a capela-mor destituída de todo o zelo e cuidado religioso. Ela já não tinha decência para ter o sagrado viático, sendo necessário os fiéis aparelharam um altar decente ao lado da capela-mor. Em 1816, a 5 Agosto, o visitador António José dos Santos, abade de Santo André de Santa Cruz de Lima, refere que a igreja está em estado deplorável, com todas as paredes arruinadas, que ele mandou escorar. Menciona que os telhados e soalhos são indignos da casa do mais pobre cabaneiro, quanto mais da casa de Deus. A capela-mor devia-se chamar casa de guardar madeiras velhas para o fogo. Não tendo retábulo, nem altar decente, sem taburno nem frontal, tendo apenas uns pedaços de colunas velhas onde estava o padroeiro, ordena assim que fizessem uma igreja inteira e nova capaz de albergar todo o povo. Em 1824, a 11 Novembro, segundo o visitador Isaac Benevenuto da Silveira e Costa, professo na Ordem de Cristo e abade de Santiago de Sampris, a capela-mor e residência da igreja ameaçavam ruína total, recomendando ao pároco a sua reforma. Em 1900, dá-se a construção da torre de acordo com a data inscrita na fachada lateral da torre assinalando a sua construção. A data de 1930 aparece inscrita na empena da fachada principal, correspondendo às obras que o encomendado Padre Raimundo Prieto fez na igreja, nomeadamente alargando-a, por lhe retirar os arcos que possuía e quando tomou o aspeto arquitetónico que ainda hoje tem.





Hoje em dia, depois destas transformações, obervamos uma Igreja de construção medieval, conforme denotam os vestígios das frestas nas fachadas laterais e da porta em arco na lateral direita e o portal axial, ainda que este integre já elementos revivalistas, nomeadamente no tímpano. A igreja possui uma volumetria desproporcionada entre os vários volumes, situação que já era apontada pelos visitadores no séc. XVIII. Pelas visitações sabe-se que foi ampliada para três naves separadas por arcos e, já na primeira metade do séc. XX, para ampliar o espaço, esses mesmos arcos foram removidos. As diferentes modinaturas das janelas da nave e capela-mor apontam para a sua feitura em épocas distintas. O nicho com imagem do orago na fachada lateral direita é barroco.



Informações recolhidas em:
ESTEVES, Augusto César, Igreja Matriz de São Paio, in Obras Completas nas páginas do Notícias de Melgaço, vol. 1, tomo 2, Melgaço, 2003, pp. 409-424; CAPELA, José Viriato, As freguesias do distrito de Viana do Castelo nas Memórias Paroquiais de 1758, Braga, Casa Museu de Monção / Universidade do Minho, 2005.

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